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Tendão de Aquiles: curvas de normalidade em crianças como possível marcador para hipercolesterolemia familiar

EDITORIAL

Tendão de Aquiles: curvas de normalidade em crianças como possível marcador para hipercolesterolemia familiar

Alexandra Monteiro

Doutor, Professor Adjunto de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: alexandra@uerj.br

O processo de desenvolvimento humano, bem como suas doenças relacionadas, como a hipercolesterolemia, deve ser acompanhado periodicamente, haja vista as inúmeras referências bibliográficas que se aplicam ao estudo dos componentes metabólicos, hormonais e marcadores inflamatórios em crianças, notadamente as obesas. A literatura aponta para o início da aterosclerose, já na infância, pelo aumento do colesterol plasmático. No Brasil, assim como na maior parte dos países desenvolvidos, as doenças cardiovasculares representam a principal causa de morbimortalidade, ocorrendo em idade precoce, ou seja, levando a um aumento significativo de anos perdidos na vida produtiva que pode ser potencializado no decorrer da vida pelo tabagismo, uso de contraceptivo oral, sedentarismo, hipertensão arterial, dieta inadequada, obesidade e hipercolesterolemia(1). À medida que se consegue erradicar a miséria entre as camadas mais pobres da população, a obesidade desponta como um problema mais frequente e mais grave que a desnutrição. O aumento da prevalência da obesidade no Brasil é relevante e proporcionalmente mais elevado nas famílias de baixa renda. Além disso, a obesidade é comumente associada a um conjunto de doenças, como hipertensão arterial, dislipidemias e diabetes mellitus tipo 2, numa síndrome que tem sido denominada síndrome plurimetabólica, em que todos os seus componentes são fatores de risco para as doenças cardiovasculares(2-6).

No diagnóstico por imagem, a ultrassonografia é o método de eleição, sempre que possível, para a avaliação em crianças. Das suas inúmeras vantagens, como a portabilidade, a ausência de utilização de radiação ionizante e a reprodutibilidade, destaca-se a possibilidade da realização do exame sem a necessidade de sedação. No segmento musculoesquelético a ultrassonografia tem, ainda, papel de destaque(7), desde as aplicações nas alterações do desenvolvimento intraútero até o envelhecimento humano.

No que diz respeito ao estudo morfométrico do tendão de Aquiles e sua possível relação com a hipercolesterolemia familiar, por conseguinte, com o maior risco de doença cardiovascular, o trabalho de Bezerra et al.(8), intitulado "Medidas do tendão do calcâneo no primeiro ano de vida" e publicado nesta edição, justifica sua pesquisa na ausência de curvas de normalidade por idade, peso, comprimento e gênero na infância, o que, por muitas vezes, dificulta o diagnóstico precoce de algumas doenças. Citam os autores: "Não foi encontrado nenhum estudo na literatura que tenha verificado a espessura e largura de tendões do calcâneo em crianças de até 12 meses de idade", e é fato, como de costume na comunidade acadêmica, dedica-se pouca pesquisa para a definição de padrões e variações da normalidade e investiga-se muito a doença, especialmente na nossa especialidade. Na literatura há descritores para os valores de normalidade para as medidas do tendão com grandes intervalos em relação à idade infantil(9,10) e adulta(10-12).

Outro ponto citado no texto, e bastante relevante, é a análise inter e intraobservador. Descrevem os autores que a realização dos exames foi por meio de um "mesmo médico radiologista com experiência em ultrassonografia musculoesquelética". Tal procedimento pode parecer questionável, a princípio, mas está em consenso com outros autores, inclusive quando comparado a exames de ressonância magnética(13,14).

Por fim, a aplicação da pesquisa. Por que analisar a espessura do tendão de Aquiles em crianças abaixo de um ano de idade? Referem os autores que a aferição das medidas de espessura e largura do tendão de Aquiles, utilizando a ultrassonografia em crianças eutróficas, pode apoiar a avaliação qualitativa do possível dano metabólico da hipercolesterolemia familiar. E pode. Estudo publicado, recentemente, por Tsouli et al.(15) atesta uma resposta direta na espessura do tendão de Aquiles, com redução, após o tratamento específico para a hipercolesterolemia familiar.

  • 1. Coronelli CLS, Moura EC. Hipercolesterolemia em escolares e seus fatores de risco. Rev Saúde Pública. 2003;37:24-31.
  • 2. Grundy SM. Obesity, metabolic syndrome, and cardiovascular disease. J Clin Endocrinol Metab. 2004;89:2595-600.
  • 3. Goodman E, Daniels SR, Morrison JA, et al. Contrasting prevalence of and demographic disparities in the World Health Organization and National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel III definitions of metabolic syndrome among adolescents. J Pediatr. 2004;145:445-51.
  • 4. Kenchaiah S, Gaziano JM, Vasan RS. Impact of obesity on the risk of heart failure and survival after the onset of heart failure. Med Clin North Am. 2004;88:1273-94.
  • 5. Reilly JJ, Armstrong J, Dorosty AR, et al. Early life risk factors for obesity in childhood: cohort study. BMJ. 2005;330:1357-63.
  • 6. Steinberger J, Daniels SR. Obesity, insulin resistance, diabetes, and cardiovascular risk in children. Circulation. 2003;107: 1448-53.
  • 7. Fessell DP, Jacobson JA. Ultrasound of the hindfoot and midfoot. Radiol Clin North Am. 2008;46:1027-43, vi.
  • 8. Bezerra RFA, Campos Júnior D, Bezerra VLVA, et al. Medidas do tendão do calcâneo no primeiro ano de vida. Radiol Bras. 2009;42:141-144.
  • 9. Bialik V, Farhoud F, Eidelman M, et al. Achilles tendon length in children evaluated sonographically. J Pediatr Orthop B. 2007; 16:281-6.
  • 10. Grechenig W, Mayr JM, Peicha G, et al. Sonoanatomy of the Achilles tendon insertion in children. J Clin Ultrasound. 2004;32: 338-43.
  • 11. Mello RAF, Marchiori E, Santos AASMD, et al. Avaliação morfométrica do tendão de Aquiles por ultra-sonografia. Radiol Bras. 2006;39:161-5.
  • 12. Mathieson JR, Connell DG, Cooperberg PL, et al. Sonography of the Achilles tendon and adjacent bursae. AJR Am J Roentgenol. 1988;151:127-31.
  • 13. Brushøj C, Henriksen BM, Albrecht-Beste E, et al. Reproducibility of ultrasound and magnetic resonance imaging measurements of tendon size. Acta Radiol. 2006;47:954-9.
  • 14. O'Connor PJ, Grainger AJ, Morgan SR. Ultrasound assessment of tendons in asymptomatic volunteers: a study of reproducibility. Eur Radiol. 2004;14:1968-73.
  • 15. Tsouli SG, Xydis V, Argyropoulou MI, et al. Regression of Achilles tendon thickness after statin treatment in patients with familial hypercholesterolemia: an ultrasonographic study. Atherosclerosis. 2008 Nov 11. [Epub ahead of print]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Jul 2009
  • Data do Fascículo
    Jun 2009
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