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Avaliação do comprimento do colo uterino em gestantes normais entre 20 e 34 semanas de gestação por meio da ultrassonografia endovaginal

Resumos

OBJETIVO: Avaliar o comprimento do colo uterino pela ultrassonografia transvaginal em uma população de gestantes normais e construir uma curva de normalidade no período de 20 a 34 semanas de gestação. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo de corte transversal, incluindo 145 gestantes normais, com feto único, vivo, sem enfermidades, entre 20 e 34 semanas de gravidez, examinadas nos serviços de ultrassonografia do Hospital Universitário Júlio Müller e de uma clínica privada. As gestantes foram submetidas a ultrassonografia endovaginal, com registro do comprimento cervical. Critérios de exclusão foram: parto prematuro, rotura prematura pré-termo das membranas, placenta prévia, uso de fármacos tocolíticos e/ou progesterona, cerclagem ou qualquer intervenção cirúrgica prévia no colo. A associação entre o comprimento do colo uterino e a idade gestacional foi examinada por regressão linear. RESULTADOS: O comprimento cervical diminuiu progressivamente em 0,8 mm a cada semana, à medida que a idade gestacional progrediu (r = -0,351; p < 0,001). As mulheres que tiveram afunilamento cervical apresentaram colo mais curto que as demais (p = 0,001). A interpolação dos percentis 5, 50 e 95 provê gráfico passível de ser utilizado como referência. CONCLUSÃO: O comprimento médio cervical em gestantes normais diminui 0,8 mm por semana, entre a 20ª e a 34ª semanas de gestação.

Comprimento cervical; Ultrassonografia; Colo do útero; Trabalho de parto prematuro


OBJECTIVE: To evaluate the cervical length by means of transvaginal ultrasonography in a population of healthy pregnant women, developing a normality curve in the period between the 20th and 34th gestational weeks. MATERIALS AND METHODS: Cross sectional study involving 145 healthy singleton pregnancies with healthy fetuses between 20 and 34 weeks of gestation, evaluated at the units of ultrasonography of Hospital Universitário Júlio Müller and of a private center. Each pregnant woman underwent a single transvaginal ultrasonography study, with measurement and recording of the cervical length. Exclusion criteria were: preterm labor, preterm premature rupture of membranes, placenta previa, use of tocolytics and/or progesterone, cerclage or any surgical intervention prior to pregnancy. The association between cervical length and gestational age was evaluated by linear regression analysis. RESULTS: The cervical length presented a progressive decrease (0.8 mm/week) as the gestational age progressed (r = -0.351; p < 0.001). The women with cervical funneling presented shorter cervix (p = 0.001). Interpolation of the 5th, 50th and 95th percentiles provides a graph to be used as a reference. CONCLUSION: The mean cervical length decreases about 0.8 mm per week in the period between the 20th and 34th gestational weeks

Cervical length measurement; Ultrasonography; Cervix uteri; Preterm labor


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação do comprimento do colo uterino em gestantes normais entre 20 e 34 semanas de gestação por meio da ultrassonografia endovaginal* * Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT, Brasil.

Rejane Martins Ribeiro ItaborahyI; Anselmo Verlangieri CarmoII; Sebastião Freitas de MedeirosII; Ali YassinII

IMestre, Professora do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade de Cuiabá (UNIC), Cuiabá, MT, Brasil

IIDoutores, Professores Adjuntos do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Rejane Martins Ribeiro Itaborahy Rua Corumbá, 538, sala 09, Baú Cuiabá, MT, Brasil, 78008-400 E-mail: rejane_itaborahy@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar o comprimento do colo uterino pela ultrassonografia transvaginal em uma população de gestantes normais e construir uma curva de normalidade no período de 20 a 34 semanas de gestação.

MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo de corte transversal, incluindo 145 gestantes normais, com feto único, vivo, sem enfermidades, entre 20 e 34 semanas de gravidez, examinadas nos serviços de ultrassonografia do Hospital Universitário Júlio Müller e de uma clínica privada. As gestantes foram submetidas a ultrassonografia endovaginal, com registro do comprimento cervical. Critérios de exclusão foram: parto prematuro, rotura prematura pré-termo das membranas, placenta prévia, uso de fármacos tocolíticos e/ou progesterona, cerclagem ou qualquer intervenção cirúrgica prévia no colo. A associação entre o comprimento do colo uterino e a idade gestacional foi examinada por regressão linear.

RESULTADOS: O comprimento cervical diminuiu progressivamente em 0,8 mm a cada semana, à medida que a idade gestacional progrediu (r = -0,351; p < 0,001). As mulheres que tiveram afunilamento cervical apresentaram colo mais curto que as demais (p = 0,001). A interpolação dos percentis 5, 50 e 95 provê gráfico passível de ser utilizado como referência.

CONCLUSÃO: O comprimento médio cervical em gestantes normais diminui 0,8 mm por semana, entre a 20ª e a 34ª semanas de gestação.

Unitermos: Comprimento cervical; Ultrassonografia; Colo do útero; Trabalho de parto prematuro.

INTRODUÇÃO

A função central do colo uterino na manutenção da gestação e no parto normal está bem estabelecida. Opera como válvula responsável por manter o feto dentro do útero até o final da gestação. No parto, sofre novas mudanças, permitindo a passagem segura do concepto(1). O parto pré-termo, definido como parto antes de 37 semanas de gestação, é o maior problema associado a mortalidade e morbidade neonatal no mundo desenvolvido(2). Uma estratégia lógica de prevenção de parto prematuro começa com a identificação das pacientes de risco. Como o encurtamento do colo é parte normal da parturição humana, muitos investigadores têm avaliado a importância da ultrassonografia na medida do comprimento do colo uterino durante a gestação e tem sido relatado que este é um dos parâmetros que melhor correlação tem apresentado com o risco para o parto prematuro(3). Ainda que não haja consenso acerca do comprimento normal do colo durante as diferentes semanas da gestação, há ampla evidência de que um colo curto está associado a maior prevalência de parto pré-termo(4). O limite representativo de risco também é controverso, com muitos estudos sugerindo medidas entre 15 e 35 mm. Essa falta de consenso tem sido atribuída às diferenças nas populações estudadas: baixo ou alto risco para trabalho de parto prematuro, idade gestacional no momento do exame, tipo de investigação (longitudinal ou transversal) e paridade das pacientes(5-9).

As razões para o interesse no desenvolvimento de um gráfico do comprimento do colo são a presença de diferentes afirmações na literatura sobre as mudanças do colo uterino ao longo da gestação e o fato de o comprimento cervical poder diferir em diferentes populações. Na prática clínica, a detecção precoce das anormalidades do comprimento cervical é importante, sendo necessário, portanto, definir de modo preciso o comprimento cervical normal para cada semana de gestação. Este estudo propõe avaliar o comprimento do colo em uma população de gestantes normais, entre a 20ª e 34ª semanas de gestação, com o intuito de construir uma curva de normalidade nesse período da gestação.

MATERIAIS E MÉTODOS

Estudo de corte transversal, no qual foram incluídas 145 gestantes normais, em acompanhamento pré-natal.

As gestantes incluídas tinham idade gestacional entre 20 e 34 semanas. A idade gestacional foi determinada pela data da última menstruação e ultrassonografia realizada com menos de 20 semanas. Diferenças de até 8% entre os parâmetros biométricos e a data da última menstruação confirmavam a data da última menstruação como parâmetro para estimar a idade gestacional. Caso contrário, os parâmetros biométricos eram usados. Para que se estabelecessem valores normais, aguardou-se o desfecho da gravidez e apenas as mulheres que tiveram parto a termo (> 37 semanas) foram incluídas na análise final.

A amostra incluiu tanto primigestas como mulheres com gestação prévia. Inicialmente as pacientes foram submetidas a anamnese para avaliação dos critérios de inclusão e exclusão. Os critérios de inclusão foram gestações com feto único e vivo, idade gestacional entre 20 e 34 semanas, ausência de doenças maternas ou fetais. Os critérios de exclusão foram intervenções cirúrgicas (conização) no colo uterino anterior à gestação, cerclagem, malformações fetais, placenta com inserção baixa, membranas rotas ou alterações no índice de líquido amniótico e morte fetal. Além disso, presença de trabalho de parto, sangramento vaginal ou sintomas de vulvovaginite na época do exame também foram critérios de exclusão. Repouso, tocólise e esteroides foram usados quando clinicamente apropriado, mas, diante de intervenção medicamentosa, as pacientes foram excluídas do estudo. Foram também excluídas as gestantes com parto prematuro e aquelas em que não se obteve informações do parto. Se a paciente atendia a estes critérios, independente de sua idade, ela era orientada quanto à pesquisa e convidada a participar. Todas que deram sua concordância em participar do estudo assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Caso fosse menor de idade, era solicitado também consentimento de um responsável.

A medida do comprimento do colo do útero foi realizada pelo mesmo examinador, treinado e habilitado segundo os princípios da Fundação de Medicina Fetal - FMF Brasil, conforme Certificado de Competência em Avaliação Cervical, em condições padronizadas, por ultrassonografia transvaginal com transdutor de 4,0 a 9,0 MHz, conectado a um aparelho Voluson 730 Expert (GE Healthcare; Buckingham-shire, Inglaterra) ou Sonoace 9900 (Medison; Gyeonggi-do, Coreia do Sul). Depois de esvaziar a bexiga, as pacientes eram colocadas em posição de litotomia e a sonda era gentilmente inserida no fórnice vaginal anterior para obter a visão sagital completa do colo, incluindo orifícios externo e interno funcional e canal cervical, evitando-se exercer pressão indevida no colo uterino, o que poderia alongá-lo erroneamente. A sonda era então lentamente recuada até que a imagem estivesse borrada, reaplicando-se pressão suficiente para restaurá-la. A imagem era magnificada de modo que o colo e os orifícios externo e interno fossem bem visualizados. A distância entre o orifício interno e o externo ao longo do canal endocervical era então medida em milímetros. Cuidado era tomado para que, na visão sagital, as distâncias das superfícies do lábio anterior e posterior ao canal cervical fossem as mesmas. A mucosa cervical sonolucente era usada como guia para a verdadeira posição do orifício interno, evitando-se confundir com o segmento inferior do útero (Figura 1). O afunilamento foi considerado presente quando a abertura do orifício interno apresentava a forma de "U" ou "V", com largura superior a 5 mm.


Informações sobre o desfecho das gestações foram obtidas posteriormente dos médicos assistentes ou das próprias pacientes, por telefone. Os resultados são apresentados em gráfico e tabela. Variáveis com distribuição normal foram expressas como média e desvio-padrão. As médias foram comparadas pelo teste t de Student. A possível associação entre o índice de massa corpórea (IMC) e o comprimento do colo foi examinada por análise de variância a um fator. A associação entre o comprimento do colo uterino e a idade gestacional foi examinada por regressão linear. A significância de r foi verificada pelo teste t de Student. O cálculo dos percentis 5, 50 e 95 para cada idade gestacional foi realizado e mostrado em gráfico (Figura 2). Resultados com erro alfa de até 5% foram considerados estatisticamente significantes.


RESULTADOS

Foi realizada a medida do colo uterino em 200 gestantes. Após a exclusão daquelas com desfecho desconhecido, parto pré-termo ou intervenções para preveni-lo (uso de progesterona ou tocolíticos), 145 permaneceram no estudo. Dessas 145 pacientes, 84 (57,9%) foram provenientes de clínica privada (Fetalcare) e 61 (42,1%) do sistema público de saúde (Hospital Universitário Júlio Müller). Cento e trinta e uma gestantes (90,3%) residiam na grande Cuiabá (compreendendo as cidades de Cuiabá e Várzea Grande) e 14 (9,7%) residiam em outras cidades do interior de Mato Grosso. Cento e uma delas (69,6%) eram naturais da Região Centro-Oeste, 14 (9,7%) da Região Sul, 13 (9,0%) da Região Nordeste, 10 (6,9%) da Região Sudeste e 7 (4,8%) da Região Norte do País.

A média de idade das gestantes foi de 27,8 ± 5,6 anos e a mediana, de 27 anos. Quanto à cor da pele, 74 (51,0%) eram brancas, 62 (42,8%) eram pardas e 9 (6,2%) eram negras, cabendo menção à dificuldade em se distinguir as etnias em nosso País. Cento e trinta e seis gestantes (93,8%) alegaram ter um relacionamento estável com o pai da criança, não necessariamente co-habitando, enquanto 9 (6,2%) estavam sem parceiro. Quarenta e nove gestantes (33,8%) não exerciam atividade remunerada por serem estudantes ou donas-de-casa. Quanto à escolaridade, 24 (16,5%) não tinham completado o segundo grau, não tendo, portanto, formação profissionalizante, 79 (54,5%) tinham concluído o segundo grau e 42 (29,0%) cursavam ou tinham concluído curso superior.

A altura das pacientes variou de 1,47 a 1,80 m e o peso relatado antes da gravidez variou entre 39 e 127 kg. Considerando o IMC pré-gestacional, 10 (6,9%) estavam abaixo do peso, com IMC de até 18,4. As pacientes com IMC normal (entre 18,5 e 24,9) foram 102 (70,3%) e as com sobrepeso ou obesidade (IMC a partir de 25,0) totalizaram 33 (22,8%). Na história obstétrica, 59 (40,7%) das pacientes eram primigestas, 45 (31,0%) eram secundigestas e 41 (28,3%) tinham duas ou mais gestações anteriores. Trinta e quatro delas (23,4%) tinham tido abortamento e, destas, 28 (19,3%) tinham sido submetidas a curetagem. Parto prematuro estava presente na história de 6 (4,1%) pacientes. Apenas 5 (3,4%) gestantes assumiram ser tabagistas e 10 (6,9%) eram etilistas, mas o consumo não foi quantificado.

A distribuição de gestantes examinadas a cada semana do estudo é mostrada na Tabela 1. Afunilamento cervical foi observado em 7 (4,8%) dos casos. O comprimento do colo, para cada semana de gestação, é também mostrado na Tabela 1. Constata-se que o comprimento do colo diminuiu gradualmente com o avançar da idade gestacional, havendo relação linear negativa entre as duas variáveis, com R = -0,351 e R2 = 0,123. A linha de regressão y = 58,56 - 0,79x, sendo y o comprimento do colo e x a idade gestacional, é significante ( p < 0,001) e demonstra o encurtamento médio do colo em 0,8 mm a cada semana, entre 20 e 34 semanas. No grupo de gestantes sem história prévia de prematuridade o comprimento do colo foi de 38,1 ± 8,6 mm, e nas gestantes com história de parto pré-termo anterior o comprimento do colo foi de 35,5 ± 8,0 mm ( p = 0,473). No grupo sem história prévia de abortamento, o comprimento do colo foi de 37,7 ± 8,2 mm, sendo 37,9 ± 9,1 mm no grupo com pelo menos um abortamento (p = 0,937). Nos sete casos (4,8%) apresentando afunilamento, o comprimento do colo foi de 27,7 ± 5,6 mm, comparado com 38,3 ± 8,2 mm no grupo sem afunilamento (p = 0,001). As nulíparas, incluindo pacientes com passado de abortamento (71 pacientes; 49,0%), apresentaram média de comprimento do colo de 38,1 ± 8,4 mm, enquanto as pacientes com pelo menos um parto anterior (74 pacientes; 51,0%) apresentaram média de 37,4 ± 8,4 mm (p = 0,606). Em relação ao IMC pré-gestacional, calculado conforme o peso relatado pelas pacientes, as que estavam abaixo do peso tiveram comprimento médio do colo de 37,9 ± 9,7 mm, as com IMC normal apresentaram média de 37,3 ± 7,9 mm e nas com sobrepeso ou obesidade o comprimento médio do colo foi de 39,1 ± 9,4 mm ( p = 0,565).

A propósito de prover um gráfico para ser usado como referência, fez-se a interpolação dos percentis 5, 50 e 95 (Figura 2). A curva obtida pelo modelo polinomial quadrático demonstra que, na 20ª semana de gestação, os percentis 5, 50 e 95 foram, respectivamente, de 34 mm, 42 mm e 52 mm, e na 33ª semana foram, respectivamente, de 21 mm, 31 mm e 38 mm.

DISCUSSÃO

Muitos estudos com medidas do colo em gestantes normais, em determinadas idades gestacionais, têm sido feitos. Entretanto, há poucos gráficos disponíveis com medidas ao longo da gestação para que possam ser usados na prática clínica(10-12). Para verificar a possibilidade ou risco de parto prematuro em populações de baixo risco, a medida do comprimento do colo, como método preditivo, é superior, quando comparada a outros métodos de rastreamento (afunilamento, volume do colo ou ausência de área glandular ao redor do canal endocervical) baseados na ultrassonografia(4,8,13). Pequeno número de publicações tem enfocado o estudo do colo uterino pela ressonância magnética no período gestacional. A comparação entre os dois métodos de imagem na avaliação da biometria cervical não apresentou diferença estatística. Tal achado reforça a aplicação do exame ultrassonográfico, por apresentar custo reduzido e maior acessibilidade(14).

A população mato-grossense é originária de diversos Estados brasileiros, contando nossa amostra com pacientes naturais das cinco regiões do Brasil. Este estudo inclui população de baixo risco, gestantes com feto único, em que os testes de rastreamento para parto pré-termo têm baixa sensibilidade e baixo valor preditivo positivo. A prevalência de parto pré-termo nesta população é, de fato, baixa, tornando os protocolos de rastreamento imprecisos. Mesmo assim, acredita-se que a medida do comprimento do colo possa ser aplicada como método valioso para avaliação de risco de prematuridade(15). Portanto, estabelecer os valores normais é fundamental para que, por comparação, a detecção de anormalidades seja feita tão cedo quanto possível.

Em relação ao prognóstico, a definição do comprimento do colo pela ultrassonografia parece ser mais eficiente como preditor a curto prazo do que a longo prazo, assim, exames seriados a cada 10-14 dias devem ser recomendados para mulheres com colo curto ou com diminuição do comprimento do colo. Novaes et al., em estudo com gestantes com ameaça de parto pré-termo, demonstraram que o único fator preditivo independente de parto dentro de 48 horas foi o comprimento do colo uterino(16). Em estudo prévio realizado por outros autores, observou-se que um encurtamento semanal de 4,1 mm, medido entre 15 e 24 semanas de gestação em mulheres de alto risco, teve correlação significativa com colo incompetente(9). Em outro estudo, examinando 183 gestantes, observou-se encurtamento cervical semanal médio de 0,9 mm em gestantes entre 16 e 23 semanas e 6 dias; nas gestantes que tiveram parto pré-termo espontâneo antes de 35 semanas, o encurtamento médio do colo foi de 2,5 mm por semana(4).

O presente estudo mostrou uma diminuição cervical similar, de 0,8 mm por semana, embora tenha avaliado mulheres com idades gestacionais diferentes. Outra observação do estudo de Owen et al. foi que o risco de parto pré-termo antes de 35 semanas de gestação decresceu em 24% para cada 5 mm a mais no comprimento do colo(4). Além disso, os autores constataram que colos cujos comprimentos declinam por várias semanas consecutivas indicam maior risco de parto prematuro. Mesmo nas mulheres com comprimento do colo acima do percentil 10, o risco de parto pré-termo aumentou à medida que o comprimento do colo diminuía. Esta observação desafia o entendimento do que seria colo "competente" ou "incompetente". Na verdade, o comprimento do colo é um indicador indireto da competência cervical, devendo ser visto como uma variável contínua e não como uma variável dicotômica(4,5). Medidas de comprimento do colo entre 10 e 14 semanas de gestação não se mostraram confiáveis para predizer o trabalho de parto prematuro(17).

A implementação do uso da ultrassonografia na determinação do comprimento do colo uterino requer a identificação do melhor período, do método ideal para a avaliação, determinação do ponto de corte ideal e evidências de que a intervenção irá reduzir o índice de parto prematuro nas mulheres com colo curto. Deve-se lembrar que diferentes processos patológicos e fisiológicos levam ao parto prematuro. A incompetência do colo é apenas uma das múltiplas complexas causas e a medida de seu comprimento não deve ser nunca uma ação isolada na avaliação da paciente em risco para parto pré-termo.

Como o processo de amadurecimento cervical na primigrávida é diferente da multípara(12,18), este trabalho tem poder limitado pela heterogeneidade das pacientes em relação à sua história obstétrica. No entanto, resultados observados no presente estudo sugerem que a paridade não parece ser variável que influencia a dinâmica do colo uterino. Da mesma forma, não foi encontrada associação entre passado de abortamento ou diferenças entre os IMCs pré-gestacionais e comprimento do colo uterino. A pesquisa da existência de afunilamento parece não acrescentar benefício na predição de parto prematuro devido ao fato de que afunilamento significativo está sempre associado ao encurtamento do colo, não sendo, portanto, um preditor independente(19). Foi encontrada, também, correlação significativa entre presença de afunilamento e encurtamento do colo. O presente estudo não serviu para a identificação da incompetência istmocervical, visto que esta condição é usualmente detectada ao ultrassom entre 17 e 22 semanas de gestação(20,21) e, nesta pesquisa, a medida do colo teve início na 20ª semana de gestação. Na literatura revista, as indicações atuais para iniciar a medida do colo antes da 20ª semana são história de parto pré-termo ou intervenção cirúrgica prévia no colo(20), condições estas usadas como critérios de exclusão no presente estudo.

Os dados obtidos no presente estudo poderão ser de utilidade na identificação de gestantes com colo curto e maior risco de parto prematuro.

CONCLUSÃO

O comprimento médio cervical em gestantes normais diminui de forma estatisticamente significativa entre a 20ª e a 34ª semanas de gestação.

Recebido para publicação em 25/9/2010.

Aceito, após revisão, em 21/10/2010.

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  • Endereço para correspondência:
    Dra. Rejane Martins Ribeiro Itaborahy
    Rua Corumbá, 538, sala 09, Baú
    Cuiabá, MT, Brasil, 78008-400
    E-mail:
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    Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Jan 2011
    • Data do Fascículo
      Dez 2010

    Histórico

    • Recebido
      25 Set 2010
    • Aceito
      21 Out 2010
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