Acessibilidade / Reportar erro

Correlação entre a escala de coma de Glasgow e os achados de imagem de tomografia computadorizada em pacientes vítimas de traumatismo cranioencefálico

Resumos

OBJETIVO: Determinar a correlação da escala de coma de Glasgow, fatores causais e de risco, idade, sexo e intubação orotraqueal com os achados tomográficos em pacientes com traumatismo cranioencefálico. MATERIAIS E MÉTODOS: Foi realizado estudo transversal prospectivo de 102 pacientes, atendidos nas primeiras 12 horas, os quais receberam pontuação segundo a escala de coma de Glasgow e foram submetidos a exame tomográfico. RESULTADOS: A idade média dos pacientes foi de 37,77 ± 18,69 anos, com predomínio do sexo masculino (80,4%). As causas foram: acidente automobilístico (52,9%), queda de outro nível (20,6%), atropelamento (10,8%), queda ao solo ou do mesmo nível (7,8%) e agressão (6,9%). No presente estudo, 82,4% dos pacientes apresentaram traumatismo cranioencefálico de classificação leve, 2,0% moderado e 15,6% grave. Foram observadas alterações tomográficas (hematoma subgaleal, fraturas ósseas da calota craniana, hemorragia subaracnoidea, contusão cerebral, coleção sanguínea extra-axial, edema cerebral difuso) em 79,42% dos pacientes. Os achados tomográficos de trauma craniano grave ocorreram em maior número em pacientes acima de 50 anos (93,7%), e neste grupo todos necessitaram de intubação orotraqueal. CONCLUSÃO: Houve significância estatística entre a escala de coma de Glasgow, idade acima de 50 anos (p < 0,0001), necessidade de intubação orotraqueal (p < 0,0001) e os achados tomográficos.

Trauma craniano; Escala de coma de Glasgow; Epidemiologia; Tomografia computadorizada


OBJECTIVE: To describe the correlation between the Glasgow Coma Scale, risk factors, age, sex and tracheal intubation with the cranial computed tomographic findings in patients with traumatic brain injury. MATERIALS AND METHODS: A prospective, cross sectional study was developed with 102 patients who were given a Glasgow coma score and submitted to computed tomography at the first 12 hours following admission. RESULTS: The mean age of the entire series was 37.77 ± 18.69 years, with prevalence of male patients (80.4%). The most common causes of head injury were: automobile accidents (52.9%), falls (20.6%), pedestrian injuries (10.8%), falls to the ground (7.8%) and aggression (6.9%). In the present study, 82.4% of patients had traumatic brain injury rated as mild, 2.0% as moderate and 15.6% as severe. Tomographic findings such as subgaleal hematoma, skull fractures, subarachnoid hemorrhage, cerebral contusion, extra-axial blood collection and diffuse cerebral edema were observed in 79.42% of the patients. Most of the findings of severe traumatic brain injury were observed in the patients above 50 years (93.7%) and in this group, all the patients required tracheal intubation. CONCLUSION: Statistical significance was observed in the correlation between the Glasgow Coma Scale, age > 50 years (p < 0.0001), need for tracheal intubation (p < 0.0001) and CT findings.

Head injury; Glasgow Coma Scale; Epidemiology; Computed tomography


ARTIGO ORIGINAL

Correlação entre a escala de coma de Glasgow e os achados de imagem de tomografia computadorizada em pacientes vítimas de traumatismo cranioencefálico* * Trabalho realizado no Conjunto Hospitalar de Sorocaba, Sorocaba, SP, Brasil.

Fabiana Lenharo MorgadoI; Luiz Antônio RossiII

IMédica Estagiária de Radiologia e Diagnóstico de Imagem do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, Sorocaba, SP, Brasil

IIDoutor, Professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Coordenador do Estágio de Radiologia e Diagnóstico de Imagem do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, Sorocaba, SP, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dra. Fabiana Lenharo Morgado Avenida Onze de Junho, 600, ap. 172, Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil, 04041-002 E-mail: fabimorgado@ hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Determinar a correlação da escala de coma de Glasgow, fatores causais e de risco, idade, sexo e intubação orotraqueal com os achados tomográficos em pacientes com traumatismo cranioencefálico.

MATERIAIS E MÉTODOS: Foi realizado estudo transversal prospectivo de 102 pacientes, atendidos nas primeiras 12 horas, os quais receberam pontuação segundo a escala de coma de Glasgow e foram submetidos a exame tomográfico.

RESULTADOS: A idade média dos pacientes foi de 37,77 ± 18,69 anos, com predomínio do sexo masculino (80,4%). As causas foram: acidente automobilístico (52,9%), queda de outro nível (20,6%), atropelamento (10,8%), queda ao solo ou do mesmo nível (7,8%) e agressão (6,9%). No presente estudo, 82,4% dos pacientes apresentaram traumatismo cranioencefálico de classificação leve, 2,0% moderado e 15,6% grave. Foram observadas alterações tomográficas (hematoma subgaleal, fraturas ósseas da calota craniana, hemorragia subaracnoidea, contusão cerebral, coleção sanguínea extra-axial, edema cerebral difuso) em 79,42% dos pacientes. Os achados tomográficos de trauma craniano grave ocorreram em maior número em pacientes acima de 50 anos (93,7%), e neste grupo todos necessitaram de intubação orotraqueal.

CONCLUSÃO: Houve significância estatística entre a escala de coma de Glasgow, idade acima de 50 anos (p < 0,0001), necessidade de intubação orotraqueal (p < 0,0001) e os achados tomográficos.

Unitermos: Trauma craniano; Escala de coma de Glasgow; Epidemiologia; Tomografia computadorizada.

INTRODUÇÃO

O traumatismo cranioencefálico (TCE) é definido como uma agressão ao cérebro causada por uma força física externa, que pode produzir um estado diminuído ou alterado de consciência, resultando em comprometimento das habilidades cognitivas ou do funcionamento físico. Pode ser temporário ou permanente e provocar comprometimento funcional parcial ou total(1).

O TCE constitui um dos principais problemas de saúde pública mundial, apresentando elevada e crescente incidência no mundo de hoje e representando importante causa de morbimortalidade entre adolescentes e adultos jovens. Ele contribui diretamente para os óbitos decorrentes de causas externas, as principais representadas por acidentes automobilísticos, quedas, agressões e atropelamentos. No Brasil, em 2008, as maiores taxas de mortalidade por estas causas foram encontradas nas regiões Sudeste e Nordeste(1).

A avaliação inicial do paciente vítima de TCE inclui a escala de coma de Glasgow (ECG), dados relativos ao acidente e tomografia computadorizada (TC). É imprescindível a determinação da causa do traumatismo, a intensidade do impacto, a presença de sintomas neurológicos, convulsões, e sobretudo, documentar qualquer relato de perda de consciência(2), tempo decorrido entre o acidente e o exame, vômitos e crises convulsivas(3).

O TCE é classificado em leve, moderado e grave, através da ECG, que foi inicialmente descrita em 1974 por Teasdale e Jennett(4), e representa o parâmetro atualmente mais utilizado mundialmente para avaliação do nível de consciência, pois tem, entre as suas principais vantagens, um conjunto de exames físicos bastante simples de serem realizados(4).

O principal exame de imagem recomendado na avaliação de emergência há 19 anos era a radiografia, na qual um sinal de fratura era considerado como um fator de risco. Os protocolos foram então modificados para incluir a TC, a ECG e a presença de fratura craniana como fatores de risco.

Atualmente, o exame de imagem de eleição para diagnóstico e prognóstico do TCE é a TC(5), que também atua no controle evolutivo das lesões. Os resultados dos estudos que investigam a indicação de TC de crânio no TCE são contraditórios. Diversos trabalhos tentam estabelecer indicadores clínicos que justifiquem a não realização da TC de crânio em determinados casos de TCE, o que contribuiria para a redução dos gastos no financiamento da saúde(6-9) .

Protocolos mais recentes indicam a TC nas primeiras três horas do traumatismo, em pacientes com pontuação na ECG < 15 e ECG = 15 apresentando um ou mais dos seguintes achados: convulsão, cefaleia, vômitos, amnésia e/ou desmaio(10), extremos de faixa etária, déficit neurológico focal, suspeita de intoxicação, trauma craniano visível e história de coagulopatias(1).

Os achados em TC no TCE variam de acordo com a gravidade do traumatismo, ou seja, de acordo com a pontuação obtida na ECG. Encontramos dificuldade em estabelecer comparação dos achados tomográficos, em razão dos poucos trabalhos científicos disponíveis na literatura com esta finalidade. No nosso trabalho procuramos averiguar tais achados.

As relações entre os tipos de lesões encefálicas demonstradas pela TC, o tipo de TCE (gravidade da lesão) e o prognóstico são descritas na literatura por diversos autores(11,12), todos mantendo aproximadamente a mesma relação: quanto mais grave o TCE, mais numerosos e mais graves os achados na TC.

Procuramos, neste trabalho, além de avaliar fatores causais, idade, sexo e fatores de risco com a pontuação na ECG e os achados tomográficos, avaliar também a incidência da necessidade de intubação orotraqueal em pacientes com traumatismo cranioencefálico, o que poderá tornar-se mais um parâmetro importante na avaliação do paciente na sala de emergência. A proposta de um trabalho prospectivo, com um mesmo examinador classificando os pacientes quanto à ECG, e a avaliação da TC feita pelo mesmo médico radiologista, torna este trabalho peculiar, pois é levado em conta que esta pontuação e a descrição dos achados podem variar de observador para observador.

MATERIAIS E MÉTODOS

Foram estudados, prospectivamente, 102 pacientes com idade acima de 12 anos, sendo que 80,4% (82/102) eram do sexo masculino. A média de idade foi de 37,77 anos, com desvio-padrão de ± 18,69 anos, e 79,4% (81/102) dos pacientes tinham menos de 50 anos. Os pacientes foram escolhidos aleatoriamente, no período de janeiro a maio de 2009, de acordo com a sua entrada na emergência de hospital de referência em atendimento a politraumatizados de Sorocaba e região, com TCE nas primeiras 12 horas.

Os pacientes foram avaliados quanto a ECG e achados de imagem na TC de entrada e correlacionados com dados clínicos como: sexo, faixa etária, raça, fatores de risco relacionados ao trauma (cefaleia, vômitos, amnésia, desmaio e/ou convulsão), fatores de risco não relacionados ao trauma (coagulopatia, idade acima de 50 anos, uso de drogas ou álcool, epilepsia, cirurgia neurológica prévia e/ou tabagismo), presença ou não de intubação endotraqueal.

Foram excluídos da amostra os pacientes com: idade abaixo de 12 anos, diagnóstico tomográfico ou clínico de acidente vascular cerebral, outras lesões de natureza não traumática, e pacientes com diagnóstico de TCE com mais de 12 horas de duração.

Após atendidos no pronto-socorro, os pacientes foram encaminhados ao setor de TC, onde uma avaliação neurológica era feita sempre pelo mesmo médico radiologista. Os dados demográficos e fatores de risco eram coletados também neste momento, mediante respostas dos próprios pacientes, e quando impossibilitados, por meio de testemunhas e/ou acompanhantes.

Foram considerados como TCEs leves os com pontuação de 13 a 15 pontos na ECG, TCEs moderados, de 9 a 12 pontos, e TCEs graves, de 3 a 8 pontos(4). Todos os pacientes incluídos no estudo foram submetidos a TC de crânio sem administração intravenosa de contraste.

Todos os exames de crânio foram realizados com o paciente em decúbito dorsal, em aparelho Somatom Balance (Siemens Medical Solutions; Erlangen, Alemanha), single-slice, helicoidal, utilizando 130 kVp e 80 mAs. Foram feitos cortes axiais, paralelos à linha infraorbitomeatal, de 5 mm de espessura na região da fossa posterior e de 10 mm de espessura no restante do crânio.

Todas as imagens das TCs de crânio foram analisadas, tanto em janelas de partes moles (200 W e 40 C para base de crânio e 80 W e 35 C para encéfalo) quanto para as estruturas ósseas (1500 W e 450 C), pelo mesmo médico especialista em radiodiagnóstico, com experiência profissional em hospital de referência de trauma.

Padrões tomográficos

Foram utilizados como padrões tomográficos: hematoma subgaleal, fratura óssea da calota craniana, fratura da base do crânio, área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica (Figura 1) e coleção sanguínea extraparenquimatosa, edema cerebral difuso, hemorragia subaracnoidea, padrão de três ou mais achados (Figura 2).



RESULTADOS

Na amostra obtida do presente estudo, 82 pacientes (80,4%) eram do sexo masculino e 20 pacientes (19,6%) eram do sexo feminino. A média de idade foi de 37,77 anos, com desvio-padrão de 18,69 anos, sendo que 79,4% tinham menos de 50 anos, 79,4% eram da raça branca e 20,6% eram da raça negra.

A maioria dos pacientes (86,3%) tinha um ou mais fatores de risco relacionados ao trauma (cefaleia, vômitos, convulsão, amnésia e/ou desmaio), e somente 24,5% tinham um ou mais fatores de risco não relacionados ao trauma (coagulopatia, consumo de drogas ou álcool, cirurgia neurológica prévia, epilepsia, idade acima de 50 anos, tabagismo).

As principais causas de TCE foram: acidente automobilístico (52,9%) e queda de outro nível (20,6%).

A distribuição dos pacientes, de acordo com o nível de consciência avaliado no atendimento inicial, foi: 82,4% com TCE leve (pontuação igual ou maior que 13 na ECG), 15,6% com TCE grave (3 a 8 pontos) e 2,0% com TCE moderado (9 a 12 pontos) (Figura 3).


Do total de pacientes estudados, 79,42% (81/102) tiveram alterações relatadas na TC, sendo que 71,6% apresentaram hematoma subgaleal, 34,3%, fraturas ósseas craniofaciais, 18,6%, hemorragia subaracnoidea, 10,8%, área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica, 7,8%, fraturas específicas de base de crânio, 5,9%, edema cerebral difuso e 5,9%, coleção sanguínea extraparenquimatosa. Em 18,6% dos pacientes constataram-se três ou mais achados. Todos os pacientes que não tiveram alterações na TC (20,58%) apresentaram TCE leve no momento do diagnóstico.

A intubação orotraqueal foi necessária em 18 (17,6%) pacientes, sendo que 15 (83%) deles apresentaram TCE grave no momento inicial do atendimento.

Associando os diferentes tipos de TCE com os achados tomográficos, observamos que, dos 84 (82,4%) pacientes com TCE leve, 56 apresentavam hematoma subgaleal, 24 apresentavam fraturas craniofaciais, 8 tinham hemorragia subaracnoidea, 5 tinham área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica, 2 apresentavam fraturas de base de crânio, 2 tinham edema cerebral difuso, 2 apresentavam coleção sanguínea extraparenquimatosa e 7 tinham três ou mais achados associados (Figura 4). Outro achado importante nos casos classificados como TCE leve foi que apenas 2 pacientes (2,38%) eram maiores que 50 anos e ambos precisaram de intubação orotraqueal.


Dois pacientes (2%) apresentaram TCE moderado, dos quais um era maior que 50 anos, necessitando de intubação orotraqueal no atendimento inicial. Este apresentou, à TC, hematoma subgaleal, edema cerebral difuso, fraturas craniofaciais, área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica, hemorragia subaracnoidea, e três ou mais achados. O outro paciente tinha menos que 50 anos de idade e apresentava somente hematoma subgaleal na TC. Nenhum deles apresentou fratura de base de crânio ou coleção sanguínea extraparenquimatosa (Figura 5).


Apresentaram TCE grave 16 (15,6%) pacientes, dos quais 15 (93,7%) tinham mais de 50 anos e necessitaram de intubação orotraqueal. Outros achados tomográficos foram: 15 com hematoma subgaleal, 10 com hemorragia subaracnoidea, 10 com fraturas craniofaciais, 6 com fraturas de base de crânio, 5 com área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica, 4 com coleção sanguínea extraparenquimatosa, 3 com edema cerebral difuso e 11 com padrão de três ou mais achados (Figura 6).


Observou-se que, com o aumento da idade, também houve aumento da gravidade do TCE (Figura 7).


Houve significância estatística entre a ECG e as seguintes variáveis: achados na TC (Tabela 1), necessidade de intubação orotraqueal e idade codificada (Tabela 2). As demais variáveis - sexo, mecanismo de trauma, raça, fatores de risco relacionados e não relacionados ao trauma - não apresentaram significância estatística.

DISCUSSÃO

O TCE constitui importante problema de saúde pública. As estatísticas internacionais de mortalidade mostram que os acidentes são responsáveis por 3% a 10% do total de óbitos por todas as causas e o problema assume maior magnitude considerando-se que a maioria desses óbitos ocorre em pacientes jovens(13). No Brasil, os óbitos por causas externas têm registrado crescimento(14,15), cujas maiores taxas encontram-se nas regiões Sudeste e Nordeste(16).

No presente estudo, 80,4% (82/102) dos pacientes vítimas de TCE eram do sexo masculino. Semelhança estatística ocorreu em diversos estudos epidemiológicos disponíveis(17-23) . Tal fato é atribuído a uma maior exposição dos indivíduos do sexo masculino a fatores de risco para TCE, como acidentes com veículos motorizados e a violência. De modo geral, o sexo masculino possui maior acesso aos automóveis e executa mais frequentemente atividades laborativas fora de suas residências, expondo-se mais a condições de risco. Também, a incidência maior no sexo masculino está relacionada a localidades com maior índice de violência urbana(24). Houve predomínio do sexo masculino (80,4%), compatível com a cidade de Sorocaba, que é urbanizada e tem cerca de 700.000 habitantes.

Adolescentes e adultos jovens são a maioria dos pacientes com TCE, conforme descrito em estudos anteriores(17-23) . No presente estudo, 79,4% (81/102) dos pacientes tinham menos que 50 anos. A diminuição da incidência de TCE em grupos constituídos por adultos com mais de 50 anos (20,6%) refere-se ao fato da menor exposição a fatores externos, como violência e acidentes de tráfego(17-19,24) . No nosso estudo, a causa principal foram os acidentes automobilísticos (52,9%), em concordância com dados de outros autores(25). Em segundo lugar, quedas de alturas maiores que a própria altura (20,6%). Esses dados variam com a população estudada: acidentes automobilísticos são mais incidentes em densas áreas urbanas e as agressões podem ser a primeira causa em locais economicamente subdesenvolvidos(13). Quedas da própria altura são mais incidentes na população idosa ou em locais onde existe maior expectativa de vida(26).

Da amostra estudada, 86,3% (88/102) dos pacientes tinham um ou mais fatores de risco relacionados ao trauma (cefaleia, vômitos, convulsão, amnésia e/ou desmaio), e 24,5% (25/102) tinham um ou mais fatores de risco não relacionados ao trauma (coagulopatia, consumo de drogas ou álcool, cirurgia neurológica prévia, epilepsia, idade acima de 50 anos, tabagismo). Esses dados não apresentaram significância estatística, quando comparados com os diferentes tipos de TCE (p > 0,136). Também não foi observada significância estatística na correlação da raça com os tipos de TCE (p > 1,0), entretanto, na população estudada, brancos eram 79,4% (81/102) do total.

As diferenças de achados em TC no TCE variam de acordo com a gravidade do traumatismo, ou seja, de acordo com a pontuação obtida na ECG. Atribuímos a dificuldade na comparação dos achados tomográficos à escassez de trabalhos científicos na literatura com a finalidade descritiva dos achados tomográficos no TCE.

A porcentagem de TCE leve foi de 82,4% (84/102), a de TCE moderado, de 2,0% (2/102), e a de TCE grave, de 15,6% (16/102), concordando com o trabalho de Bruns e Hauser(24), em que as taxas de TCE leve representaram 80% de todos os casos de TCE, e o TCE moderado e o grave representaram 10% cada. Menores taxas de TCE leve foram relatadas por outros autores(27-29), porém, nesses estudos foram excluídas as alterações extracranianas.

Nas alterações associadas ao TCE leve, o hematoma subgaleal esteve presente, neste estudo, em 66,6% (56/84) dos casos, e fraturas craniofaciais em 28,5% (24/84). Autores relataram que as lesões mais frequentes no TCE leve foram os hematomas subgaleais e palpebrais, as fraturas e as contusões cerebrais(30), outros descreveram as fraturas craniofaciais como as mais frequentes(28), e um estudo demonstrou, em pacientes com TCE leve, prevalência de 26,8% de contusões cerebrais, 6,8% de hematoma extradural, 5,7% de hemorragia subaracnoidea e 4,5% de hematoma subdural(29).

No TCE moderado, o achado mais comum também foi o hematoma subgaleal (100%). Fraturas ósseas, hemorragia subaracnoidea, área de contusão cerebral com sufusão hemorrágica e edema cerebral difuso tiveram, aproximadamente, a mesma incidência (50%). Verificou-se, em diversos estudos, que no TCE moderado as principais alterações tomográficas foram os hematomas externos, as fraturas e as contusões; no nosso estudo, entretanto, observamos taxas mais elevadas de todas as alterações, como a hemorragia subaracnoidea.

No TCE grave observou-se aumento significativo de todos os achados na TC, com taxa de 100% de anormalidades, sendo as mais comuns a hemorragia subaracnoidea em 62,5% (10/16), as fraturas craniofaciais em 62,5% (10/16), as fraturas de base de crânio em 37,5% (6/16) e três ou mais achados em 68,7% (11/16). Metade dos pacientes com edema cerebral difuso apresentou TCE grave. Os dados acima comprovam que os achados de TC de pior prognóstico têm maior incidência em casos de TCE grave(31,32).

A idade avançada tem sido descrita como variável independente associada a pior prognóstico. No nosso estudo foi verificado que 100% dos pacientes com mais de 50 anos de idade necessitaram de intubação orotraqueal no primeiro momento do atendimento e tinham maiores chances de apresentarem TCE grave, corroborando os achados de outros estudos(33,34).

A baixa pontuação na ECG foi verificada em nosso estudo como um fator de gravidade, associado a um maior número de achados tomográficos. Os pacientes vítimas de TCE com baixa pontuação na ECG são acometidos de injúrias cerebrais com efeitos mais devastadores e apresentam uma tendência a instabilidade hemodinâmica, conforme observado em outros estudos(12,33,35-37) .

CONCLUSÕES

Neste estudo houve significância estatística entre a ECG e as variáveis: achados na TC, necessidade de intubação orotraqueal e a idade codificada. Quanto menor a pontuação na ECG, mais grave foram o TCE e as alterações tomográficas, predominando edema cerebral difuso, fraturas de base de crânio e hemorragia subaracnoidea. A necessidade de intubação orotraqueal foi constatada em 18 (17,6%) dos pacientes, sendo encontrada em todos os pacientes com TCE grave (83%), contribuindo como um fator prognóstico negativo auxiliar no atendimento ao politraumatizado. A idade maior de 50 anos foi outro fator de pior prognóstico, com 100% de chance de necessidade de intubação orotraqueal no primeiro momento do atendimento, e a maior incidência de TCE grave com achados importantes na TC. Com isso, concluímos que o uso da TC é de primordial importância para a avaliação inicial e prognóstica em pacientes com TCE.

Recebido para publicação em 11/4/2010.

Aceito, após revisão, em 19/11/2010.

  • 1. Leite CC, Amaro Jr E, Lucato LT. Neurorradiologia - diagnóstico por imagem das alterações encefálicas. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 182-214.
  • 2. Sarah. Traumatismo cranioencefálico. [acessado em 20 de outubro de 2009]. Disponível em: http://www.sarah.br/paginas/doencas/po/p_07_traumatismo_cranioence.htm
  • 3. Nitrini R, Bacheschi LA. A neurologia que todo médico deve saber. São Paulo: Editora Maltese; 1993.
  • 4. Teasdale G, Jennett B. Assessment of coma and impaired consciousness: a practical scale. Lancet. 1974;2:81-4.
  • 5. Foulkes MA, Eisenberg HM, Jane JA, et al. The Traumatic Coma Data Bank: design, methods, and baseline characteristics. J Neurosurg. 1991: 75(Suppl):S8-13.
  • 6. Miller EC, Holmes JF, Derlet RW. Utilizing clinical factors to reduce head CT scan ordering for minor head trauma patients. J Emerg Med. 1997; 15:453-7.
  • 7. Murshid WR. Management of minor head injuries: admission criteria, radiological evaluation and treatment of complications. Acta Neurochir (Wien). 1998;140:56-64.
  • 8. Klassen TP, Reed MH, Stiell IG, et al. Variation in utilization of computed tomography scanning for the investigation of minor head trauma in children: a Canadian experience. Acad Emerg Med. 2000;7:739-44.
  • 9. Halley MK, Silva PD, Foley J, et al. Loss of consciousness: when to perform computed tomography? Pediatr Crit Care Med. 2004;5:230-3.
  • 10. Shackford SR, Wald SL, Ross SE, et al. The clinical utility of computed tomographic scanning and neurologic examination in the management of patients with minor head injuries. J Trauma. 1992; 33:385-94.
  • 11. Gennarelli TA, Spielman GM, Langfitt TW, et al. Influence of the type of intracranial lesion on outcome from severe head injury. J Neurosurg. 1982; 56:26-32.
  • 12. Wardlaw JM, Easton VJ, Statham P. Which CT features help predict outcome after head injury? J Neurol Neurosurg Psychiatry. 2002;72:188-92.
  • 13. Jennett B, Teasdale G. Epidemiología de los traumatismos craneales. In: Jennett B, Teasdale G, editors. Diagnóstico y tratamiento de los traumatismos cráneo-encefálicos. Barcelona: Salvat; 1984. p. 325-42.
  • 14
    Brasil. Ministério da Saúde. Divisão Nacional de Epidemiologia. Estatísticas de mortalidade: Brasil - 1981. Brasília, DF: Centro de Documentação do Ministério da Saúde; 1984.
  • 15. Mortalidade de residentes e não residentes em Ribeirão Preto - SP, 1992. Boletim, ano II, número I. Ribeirão Preto, SP: Núcleo de Informática, Secretaria Municipal da Saúde; 1992.
  • 16. Brasil. Ministério da Saúde. Informações de Saúde. Departamento de Informação e Informática do SUS - DATASUS (online). [acessado em 13 de março de 2010]. Disponível em: www.datasus.gov.br
  • 17. Annegers JF, Grabow JD, Kurland LT, et al. The incidence, causes, and secular trends of head trauma in Olmsted County, Minnesota, 1935-1974. Neurology. 1980;30:912-9.
  • 18. Cooper KD, Tabaddor K, Hauser WA, et al. The epidemiology of head injury in the Bronx. Neuroepidemiology. 1983;2:70-88.
  • 19. Kraus JF. Epidemiology of head injury. In: Cooper PR, editor. Head injury. 3rd ed. Baltimore: Williams & Wilkins; 1993. p. 1-25.
  • 20. Wang CC, Schoenberg BS, Li SC, et al. Brain injury due to head trauma. Epidemiology in urban areas of the People's Republic of China. Arch Neurol. 1986;43:570-2.
  • 21. Nell V, Brown DS. Epidemiology of traumatic brain injury in Johannesburg - II. Morbidity, mortality and etiology. Soc Sci Med. 1991;33:289-96.
  • 22. Guerrero JL, Thurman DJ, Sniezek JE. Emergency department visits associated with traumatic brain injury: United States, 1995-1996. Brain Inj. 2000;14:181-6.
  • 23. Jager TE, Weiss HB, Coben JH, et al. Traumatic brain injuries evaluated in U.S. emergency departments, 1992-1994. Acad Emerg Med. 2000;7: 134-40.
  • 24. Bruns J Jr, Hauser WA. The epidemiology of traumatic brain injury: a review. Epilepsia. 2003;44 Suppl 10:2-10.
  • 25. Lee ST, Lui TN, Chang CN, et al. Features of head injury in a developing country - Taiwan (1977-1987). J Trauma. 1990;30:194-9.
  • 26. Koizumi MS. Avaliação do nível de consciência em pacientes com traumatismo crânio encefálico. Rev Bras Enferm. 1978;31:23-31.
  • 27. Jeret JS, Mandell M, Anziska B, et al. Clinical predictors of abnormality disclosed by computed tomography after mild head trauma. Neurosurgery. 1993;32:9-15.
  • 28. Smits M, Dippel DWJ, de Haan GG, et al. External validation of the Canadian CT Head Rule and the New Orleans Criteria for CT scanning in patients with minor head injury. JAMA. 2005;294: 1519-25.
  • 29. Stein SC, Ross SE. Mild head injury: a plea for routine early CT scanning. J Trauma. 1992;33: 11-3.
  • 30. Bordignon KC, Arruda WO. CT findings in mild head trauma: a series of 2,000 patients. Arq Neuropsiquiatr. 2002;60:204-10.
  • 31. Servadei F, Nasi MT, Cremonini AM, et al. Importance of a reliable admission Glasgow Coma Scale score for determining the need for evacuation of posttraumatic subdural hematomas: a prospective study of 65 patients. J Trauma. 1998;44: 868-73.
  • 32. Atzema C, Mower WR, Hoffman JR, et al. Defining "therapeutically inconsequential" head computed tomographic findings in patients with blunt head trauma. Ann Emerg Med. 2004;44:47-56.
  • 33. Freitas PE, Oliveira QE, Nerung L, et al. Traumatismos crânio encefálicos em crianças: estudo de 2173 casos. Rev Amrigs. 1999;34:19-23.
  • 34. Jennett B, Murray A, Carlin J, et al. Head injuries in three Scottish hospitals neurosurgical units. Scottish head injury management study. Br Med J. 1979;2:955-8.
  • 35. Tien HC, Cunha JRF, Wu SN, et al. Do trauma patients with a Glasgow Coma Scale score of 3 and bilateral fixed and dilated pupils have any chance of survival? J Trauma. 2006;60:274-8.
  • 36. Signorini DF, Andrews PJD, Jones PA, et al. Predicting survival using clinical variables: a case study in traumatic brain injury. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1999;66:20-5.
  • 37. Schreiber MA, Aoki N, Scott BG, et al. Determinants of mortality in patients with severe blunt head injury. Arch Surg. 2002;137:285-90.
  • Endereço para correspondência:
    Dra. Fabiana Lenharo Morgado
    Avenida Onze de Junho, 600, ap. 172, Vila Clementino
    São Paulo, SP, Brasil, 04041-002
    E-mail:
  • *
    Trabalho realizado no Conjunto Hospitalar de Sorocaba, Sorocaba, SP, Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jun 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2011

    Histórico

    • Aceito
      19 Nov 2010
    • Recebido
      11 Abr 2010
    Publicação do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem Av. Paulista, 37 - 7º andar - conjunto 71, 01311-902 - São Paulo - SP, Tel.: +55 11 3372-4541, Fax: 3285-1690, Fax: +55 11 3285-1690 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: radiologiabrasileira@cbr.org.br