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QUAL O SEU DIAGNÓSTICO?

Pedro José de Santana JúniorI; Jorgeana Milhomem BandeiraII; Ana Caroline Vieira AurioneIII; Renato Duarte CarneiroIV; Rubens Carneiro dos Santos JúniorV; Kim-Ir-Sen Santos TeixeiraVI

IMédico Radiologista, Estagiário do Serviço de Ressonância Magnética da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

IIMédica Radiologista, Estagiária do Serviço de Ressonância Magnética do CRER - Centro de Reabilitação e Readaptação Henrique Santillo, Goiânia, GO, Brasil

IIIAcadêmica de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

IVMembro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem (CBR), Médico Radiologista da Multimagem Diagnósticos, Goiânia, GO, Brasil

VMestre em Radiologia, Professor do Departamento de Radiologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Chefe do Serviço de Ressonância Magnética do Instituto de Neurologia de Goiânia, Goiânia, GO, Brasil

VIDoutor em Radiologia, Professor Adjunto do Departamento de Radiologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Pedro José de Santana Júnior Rua T-36, nº 3485, ap. 104, Edifício Solar dos Tocantins, Setor Bueno Goiânia, GO, Brasil, 74223-050 E-mail: psantanajr@hotmail.com

Paciente do sexo feminino, 67 anos de idade, veio ao ambulatório do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (HC-UFG) com queixa de dor e parestesia no membro inferior direito, de intensidade progressiva e evolução há cinco meses. Ela ficava limitada ao leito, em decúbito e com o membro afetado semifletido. Negava traumas. Ao exame físico, notou-se massa palpável com cerca de 15 cm e contornos imprecisos no flanco direito. Na história patológica pregressa, relatava carcinoma de colo uterino diagnosticado em 2007. Foram realizadas radiografia e tomografia computadorizada (TC) de abdome no Departamento de Radiologia e Diagnóstico por Imagem do HC-UFG.

Descrição das imagens

Figura 1. Radiografia de abdome mostra apagamento da linha do músculo psoas associado a opacidade no hemiabdome direito. Nota-se efeito expansivo caracterizado por deslocamento para a esquerda das alças de delgado e indefinição do cólon ascendente.


Figura 2. Tomografia computadorizada de abdome. Cortes axiais (A,B) e coronais (C,D), pós-contraste, revelam lesão expansiva heterogênea cística, multisseptada, apresentando realce periférico pelo meio de contraste iodado, localizada no compartimento iliopsoas direito. Notam-se, ainda, densificação dos planos adiposos adjacentes (em A,B,C,D) e deslocamento superior do rim ipsilateral (em C,D).


Diagnóstico: Metástase por carcinoma escamoso de colo uterino para o compartimento iliopsoas direito.

COMENTÁRIOS

O compartimento iliopsoas pode ser envolvido por diferentes processos patológicos, incluindo infecção, tumor e hemorragia. Os pacientes podem apresentar vários sinais e sintomas inespecíficos, ocasionando atraso diagnóstico. A avaliação desse compartimento por métodos de imagem, notadamente a TC, foi um marco de grande importância para o diagnóstico dessas lesões. Entretanto, é importante saber que os sinais radiológicos são superponíveis entre as diversas etiologias, o que dificulta, na maioria das vezes, um diagnóstico específico.

O envolvimento tumoral do iliopsoas, geralmente, é secundário à extensão direta de tumores adjacentes com origem retroperitoneal, abdominal, pélvica, neurogênica, óssea e linfonodal(1,2). Tumores primários do músculo iliopsoas (lipossarcoma, fibrossarcoma, leiomiossarcoma e hemangiopericitoma) são raros. Os planos fasciais retroperitoneais não oferecem barreira para a disseminação tumoral, ocorrendo invasão direta e aleatória, em contraste com o acometimento inflamatório/infeccioso(3). Na TC e na ressonância magnética observamse lesões com aspecto homogêneo ou heterogêneo em função da presença de necrose, hemorragia e alterações na estrutura celular(3). Os achados mais valorizados na distinção entre os tumores e os abscessos e hematomas são a presença de área central hipoatenuante, margens irregulares, adenopatia, destruição óssea e descontinuidade dos planos fasciais(2). Na série descrita por Muttarak e Peh(1), dos 14 casos tumorais relatados, houve acometimento secundário em 10, sendo a metástase por carcinoma de colo uterino a origem mais comum, a exemplo de nosso relato.

O acometimento infeccioso do compartimento iliopsoas pode ocorrer de forma primária ou secundária. Abscessos primários são raros e geralmente idiopáticos. Os microrganismos mais frequentemente envolvidos são o Staphylococcus aureus e gram-negativos. Pacientes imunocomprometidos, especialmente em uso de corticoterapia, quimioterapia e HIV-positivos, estão particularmente predispostos à infecção(1,3). O comprometimento secundário do iliopsoas é muito mais frequente e geralmente decorre da disseminação de processos infecciosos com origem renal (abscessos perinefréticos), óssea (osteomielite e tuberculose) e em alças intestinais (apendicite, diverticulite, doença de Crohn, carcinoma de cólon perfurado)(1). Os achados tomográficos mais comuns são aumento volumétrico muscular com centro hipoatenuante, bem como realce parietal pelo meio de contraste. Esses sinais são inespecíficos e indistinguíveis das metástases e linfoma. Achados secundários que podem corroborar esse diagnóstico são a densificação dos planos adiposos adjacentes, destruição óssea e focos gasosos de permeio.

Os hematomas do compartimento iliopsoas podem ser espontâneos ou secundários a diátese hemorrágica, terapia anticoagulante, trauma, tumor, cirurgia ou biópsia recentes ou decorrentes de extensão de sangramento em órgãos e vasos adjacentes(1,2). Correlacionando-se fator causal e idade do paciente, observou-se maior associação com coagulopatias e trauma na faixa etária mais jovem (quarta década) e ruptura de aneurisma aórtico, terapia anticoagulante para doença arteriosclerótica e tromboembolismo na faixa etária mais avançada (sétima década)(3). A hemorragia aguda é vista como uma lesão espontaneamente hiperatenuante. Níveis líquido-líquido podem existir devido ao efeito hematócrito. É importante lembrar que os hematomas crônicos são de difícil diferenciação dos abscessos e tumores, sendo a aspiração percutânea útil nessa diferenciação.

A partir do caso apresentado, observase o papel fundamental da TC em determinar o acometimento lesional do compartimento iliopsoas. Por um lado, nota-se a dificuldade em determinar quais os achados radiológicos sugestivos para cada doença nessa topografia, sendo que, em grande número de casos, esses sinais são insuficientes para determinar sua etiologia. Por outro lado, quando associados aos dados clínicos, a acurácia diagnóstica aumenta significativamente. Nossa paciente foi submetida a laparotomia com biópsia da massa retroperitoneal mostrada, de resultado compatível com carcinoma escamoso infiltrante pobremente diferenciado e extensas áreas de necrose. Daí a importância desse relato, no qual a história pregressa de carcinoma de células escamosas invasor do colo uterino, associada aos achados de imagem, podem favorecer o diagnóstico de lesão metastática para o músculo iliopsoas.

Trabalho realizado no Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás (UFG), Goiânia, GO, Brasil.

  • 1. Muttarak M, Peh WCG. CT of unusual iliopsoas compartment lesions. Radiographics. 2000;20: S53-66.
  • 2. Leão ARS, Amaral RPG, Abud TG, et al. Patologias do compartimento iliopsoas: avaliação radiológica. Radiol Bras. 2007;40:267-72.
  • 3. Lenchik L, Dovgan DJ, Kier R. CT of the iliopsoas compartment: value in differentiating tumor, abscess, and hematoma. AJR Am J Roentgenol. 1994;162:83-6.
  • Endereço para correspondência:

    Dr. Pedro José de Santana Júnior
    Rua T-36, nº 3485, ap. 104, Edifício Solar dos Tocantins, Setor Bueno
    Goiânia, GO, Brasil, 74223-050
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Ago 2011
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