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Manifestações de imagem da doença de von Hippel-Lindau: um guia ilustrado das manifestações abdominais

Resumo

A doença de von Hippel-Lindau (VHL) é uma desordem autossômica dominante monogênica com mutações na linha germinativa do antioncogene VHL, no braço curto do cromossomo três (3p25-26). Afeta 1:36.000-50.000 indivíduos, com penetrância superior a 90% aos 65 anos de idade. Embora tenha início e apresentação variáveis, com pleiotropismo mesmo entre membros da mesma família que partilham uma mutação específica, usualmente manifesta-se de início em adultos jovens e predispõe ao desenvolvimento de tumores benignos e malignos no sistema nervoso central (SNC) e órgãos viscerais. Clinicamente, o diagnóstico pode ser realizado em uma das seguintes circunstâncias: a) em pacientes com história familiar de doença de VHL e pelo menos um dos tumores característicos relacionados à síndrome (como hemangioblastomas retinianos ou do SNC, carcinoma de células renais de células claras, tumores neuroendócrinos pancreáticos e tumores do saco endolinfático); b) dois ou mais hemangioblastomas do SNC; c) um hemangioblastoma retiniano ou do SNC mais pelo menos um tumor característico visceral relacionado à síndrome, excluindo-se cistos renais e epididimários. Nesse contexto, a imagem ocupa importante papel no diagnóstico e acompanhamento desses pacientes. Este ensaio iconográfico apresenta imagens características de manifestações abdominais de tumores relacionados à doença de VHL que todos os radiologistas devem conhecer.

Unitermos:
Doença de von Hippel-Lindau/diagnóstico por imagem; Carcinoma de células renais; Neoplasias pancreáticas; Feocromocitoma

Abstract

Von Hippel-Lindau (VHL) disease is a monogenic autosomal dominant disorder with germline mutations of the VHL anti-oncogene on the short arm of chromosome 3 (3p25-26). It affects 1:36,000-50,000 individuals, with a penetrance greater than 90% at 65 years of age. Although of variable onset and presentation, with pleiotropism even among members of the same family who share a specific mutation, VHL disease usually manifests initially in young adults. It predisposes to the development of benign and malignant tumors of the central nervous system (CNS) and visceral organs. The clinical diagnosis of VHL disease can be made in the following circumstances: a) in patients with a family history of the disease and at least one of the tumors characteristic of it (e.g., retinal or CNS hemangioblastomas, clear cell renal cell carcinoma, pancreatic neuroendocrine tumors, and endolymphatic sac tumors); b) in patients with two or more CNS hemangioblastomas; c) or in patients with a retinal or CNS hemangioblastoma plus at least one visceral tumor characteristic of the disease, excluding renal and epididymal cysts. Imaging plays an important role in the diagnosis and follow-up of patients with VHL disease. This pictorial essay presents characteristic images of abdominal manifestations of VHL disease-related tumors that all radiologists should be aware of.

Keywords:
von Hippel-Lindau disease/diagnostic imaging; Carcinoma; renal cell; Pancreatic neoplasms; Pheochromocytoma

INTRODUÇÂO

A síndrome de von Hippel-Lindau (VHL) é uma desordem de neoplasias hereditárias múltiplas, na qual os pacientes apresentam predisposição para o desenvolvimento de cistos e tumores benignos e malignos hipervascularizados síncronos ou metácronos do sistema nervoso central (SNC) e/ou órgãos viscerais(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.). O nome da síndrome refere-seao Dr. Eugene von Hippel (médico alemão patologista e oftalmologista, que descreveu em 1904, detalhadamente, uma rara doença chamada “angiomatose retiniana”) e ao Dr. Arvid Vilhelm Lindau (médico sueco neuropatologista e bacteriologista, cuja tese de doutorado em 1926 estudou a associação de hemangioblastomas cerebelares com angiomas retinianos, bem como lesões renais, pancreáticas e epididimárias, que formaria a base de grande parte do estudo moderno da síndrome de VHL). A síndrome de VHL, cujo gene responsável pela doença foi identificado em 1993, é a principal causa de carcinomas de células renais (CCRs) e feocromocitomas (FEOs) hereditários(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.). Pode ser clinicamente dividida em tipo I (ausência de FEO) e tipo II (presença de FEO), sendo o tipo I o mais frequente. Neste ensaio iconográfico iremos focar nas manifestações abdominais por imagem da síndrome de VHL.

MANIFESTAÇÕES RENAIS

Cistos renais multicêntricos e CCRs do subtipo histológico células claras podem estar presentes em mais de dois terços dos pacientes com síndrome de VHL(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.). CCRs na síndrome de VHL tendem a se desenvolver em faixa etária mais precoce (35-40 anos) em comparação aos CCRs esporádicos (55-60 anos) e são frequentemente bilaterais e multicêntricos(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,22 Schwingel R, Duarte SBL, Oshima MM, et al. Which is your diagnosis? Radiol Bras. 2015;48(2):xi-xiii.). As lesões císticas podem ser uma combinação de cistos simples, cistos complexos atípicos e/ou CCRs císticos(22 Schwingel R, Duarte SBL, Oshima MM, et al. Which is your diagnosis? Radiol Bras. 2015;48(2):xi-xiii.).

Todas as lesões renais nos pacientes com síndrome de VHL, incluindo cistos simples, devem seguir vigilância por imagem pelo potencial de malignidade. Não há correlação entre o tamanho e o potencial de malignidade. O crescimento e a transformação cística para sólida (septos, componentes sólidos, impregnação) devem ser cuidadosamente avaliados e sugerem progressão tumoral. Tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM) são frequentemente utilizadas para melhor avaliação de lesões renais suspeitas para CCRs, bem como no estadiamento.

Na TC, os CCRs tendem a ser heterogêneos ou com intensa impregnação precoce de contraste e a apresentar washout progressivo. A RM tem papel importante na identificação do pseudorrealce detectado na TC. Pseudorrealce refere-se ao aumento artefatual igual ou superior a 10 UH da atenuação de lesões císticas renais simples na fase nefrográfica da TC. Aumento inferior a 10 UH é considerado dentro dos limites, não sendo considerado realce. O pseudorrealce pode ocorrer por variações técnicas (por exemplo: maior número de detectores) e anatômicas (tamanho menor da lesão, localização mais central no rim, parte do cisto aferida, estruturas adjacentes renais e extrarrenais)(33 Tappouni R, Kissane J, Sarwani N, et al. Pseudoenhancement of renal cysts: influence of lesion size, lesion location, slice thickness, and number of MDCT detectors. AJR Am J Roentgenol. 2012;198: 133-7.).

Na RM, embora em geral a identificação visual do realce intralesional possa ser suficiente para sua caracterização, a aferição de pelo menos 15% de acréscimo de intensidade de sinal em relação à fase T1 pré-contraste pode ser considerada sugestivo de lesão suspeita para CCRs. Mesmo lesões císticas simples podem apresentar aumento de intensidade de sinal em até 5% após injeção do meio de contraste, provavelmente decorrente de artefatos de movimento ou volume parcial(33 Tappouni R, Kissane J, Sarwani N, et al. Pseudoenhancement of renal cysts: influence of lesion size, lesion location, slice thickness, and number of MDCT detectors. AJR Am J Roentgenol. 2012;198: 133-7.). O termo “células claras” refere-se ao acúmulo de glicogênio e gordura microscopicamente. Esta gordura microscópica na RM pode promover queda de sinal em T1 fora de fase (Figura 1).

Figura 1
RM axial, sequências ponderadas em T2 (A), T1 fase corticomedular (B), T1 GE em fase (C) e fora de fase (D) demonstrando múltiplos cistos pancreáticos em ambos os rins (setas pretas), alguns com componente hemático/hiperproteico e nódulos sólidos hipervascularizados e heterogêneos (setas brancas contínuas), com iso/hipersinal em T2. No nódulo do rim esquerdo nota-se queda de sinal nas sequências fora de fase (seta branca tracejada), traduzindo a presença de gordura microscópica. O conjunto dos achados é característico de CCRs de células claras em paciente com síndrome de VHL.

Em razão do seu potencial de metástases, o CCR é a principal causa de morte associada à síndrome de VHL, sendo o objetivo da vigilância por imagem e da terapêutica de eliminar tais lesões antes do acometimento secundário. O CCR acomete, por metástase, fígado, pulmões, ossos, pâncreas, SNC e epidídimo (fazendo o diferencial com tumores característicos da síndrome de VHL, como tumores endócrinos pancreáticos, hemangioblastomas do SNC e cistoadenomas do epidídimo).

MANIFESTAÇÕES PANCREÁTICAS

Pacientes com síndrome de VHL podem desenvolver cistos pancreáticos (42%), cistoadenomas serosos (11%) e tumores neuroendócrinos pancreáticos (15%)(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,22 Schwingel R, Duarte SBL, Oshima MM, et al. Which is your diagnosis? Radiol Bras. 2015;48(2):xi-xiii.,44 Gläsker S, Vergauwen E, Koch CA, et al. Von Hippel-Lindau dis-ease: current challenges and future prospects. Onco Targets Ther. 2020;13:5669-90.).

Os cistos pancreáticos são usualmente múltiplos e aparecem como lesões hipoatenuantes sem impregnação pelo meio de contraste (Figuras 1 e 2). Os cistoadenomas serosos manifestam-se como massas císticas septadas e multilobuladas. São lesões epiteliais benignas que formam cistos (seis ou mais) medindo até 2,0 cm cada, em geral menores que 1,0 cm. As paredes e septos são finos, de espessura menor que 2 mm, com impregnação pelo meio de contraste. Na RM, possuem alto sinal em T2 e conteúdo geralmente hipointenso em T1, mas podem ser hiperintensos se houver sangramento intracístico. A cicatriz central fibrótica, quando presente, apresenta hipossinal em T1 e T2 e impregnação tardia. Apesar de patognomônica, a cicatriz central com ou sem calcificação é vista em apenas 20-30% dos casos e menos frequente ainda nas lesões menores. Na ausência da cicatriz, a combinação de imagem com aspecto microcístico e de impregnação vascular sugere o diagnóstico. Cistoadenomas serosos não possuem comunicação com o ducto pancreático (Figura 3).

Figura 2
RM, axial T2 (A) e sequência colangiográfica 3D (B) em paciente com síndrome de VHL mostrando parênquima pancreático substituído por inúmeros cistos esparsos difusamente (setas pretas) e múltiplos cistos renais, alguns simples e outros com conteúdo hemorrágico/hiperproteico (setas brancas). Os cistos pancreáticos podem ser a única manifestação da doença; se forem muito numerosos, os pacientes com síndrome de VHL podem vir a desenvolver diabetes, e se volumosos, podem vir a obstruir o ducto pancreático. Achado adicional: cálculos na vesícula biliar (A).

Figura 3
Neoplasia microcística do pâncreas (cistoadenoma seroso). RM, imagens axiais ponderadas em T2 (A) e colangio-RM (B) mostrando lesão multicística composta por microcistos agrupados (aspecto “em favo de mel”), com cicatriz fibrótica (hipossinal em T2) e de contornos lobulados, sem componentes sólidos ou comunicação ductal (setas brancas contínuas). Não há dilatação do ducto pancreático principal (seta branca tracejada).

Tumores neuroendócrinos pancreáticos desenvolvem- se em 9-17% dos pacientes com síndrome de VHL. Em comparação com a apresentação esporádica, manifestam- se em idade mais precoce (média de 35 anos × 58 anos) e são comumente multifocais, com maior ocorrência na porção cefálica e processo uncinado. Embora a maioria seja tumores não funcionantes (98% na síndrome de VHL × 70% na ocorrência esporádica), pode haver dor abdominal, perda de peso, icterícia, pancreatite e, eventualmente, sangramento gastrointestinal(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,44 Gläsker S, Vergauwen E, Koch CA, et al. Von Hippel-Lindau dis-ease: current challenges and future prospects. Onco Targets Ther. 2020;13:5669-90.). A apresentação clinicolaboratorial dos tumores funcionantes varia conforme o polipeptídio produzido. Tumores neuroendócrinos pancreáticos são usualmente hipoatenuantes ou isoatenuantes na TC sem contraste. Mais comumente, na TC e na RM apresentam intensa impregnação arterial precoce (homogêneos, anelares ou heterogêneos) e muitas vezes impregnação idêntica ao restante do pâncreas nas demais fases do exame, o que exige rigor do radiologista na adoção de protocolo específico para o diagnóstico. Não possuem relação direta com o sistema ductal. Na maioria dos pacientes com síndrome de VHL, o diagnóstico de tumor neuroendócrino pancreático é frequentemente realizado apenas por imagem(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,44 Gläsker S, Vergauwen E, Koch CA, et al. Von Hippel-Lindau dis-ease: current challenges and future prospects. Onco Targets Ther. 2020;13:5669-90.) (Figura 4).

Figura 4
TC, axial, fases arterial (A) e nefrográfica (B), e RM, imagens ponderadas em T2 (C) e T1 fase arterial após contraste (D) mostrando pâncreas de dimensões aumentadas à custa de múltiplas lesões císticas de paredes delgadas (setas brancas contínuas) que substituem o parênquima pancreático, em paciente com síndrome de VHL. Nota-se lesão sólida bem definida e hipervascularizada no processo uncinado pancreático (setas brancas tracejadas), que pode ser difícil de ser caracterizada nas demais fases do exame tomográfico caso não seja realizada a fase arterial. Na RM, além da hipervascularização arterial, a caracterização pode ser realizada também com o hipossinal em T2 e ausência de comunicação ductal.

OUTRAS MANIFESTAÇÕES

FEOs e paragangliomas

Em razão de a produção de catecolaminas (adrenalina, noradrenalina e dopamina) dos FEOs e paragangliomas (PGs) ser muito oscilante, a apresentação clínica pode variar desde pacientes assintomáticos até casos de morte súbita. Podem se apresentar com a tríade cefaleia, diaforese e taquicardia associada a hipertensão arterial. Pacientes normotensos e assintomáticos correspondem a 5-15%. O diagnóstico inclui a evidência da produção de catecolaminas e seus metabólitos, sendo as metanefrinas na urina e no plasma métodos iniciais de diagnóstico, com a avaliação plasmática fracionada mais específica para os casos hereditários. Na síndrome de VHL, a produção é majoritariamente de noradrenalina(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,44 Gläsker S, Vergauwen E, Koch CA, et al. Von Hippel-Lindau dis-ease: current challenges and future prospects. Onco Targets Ther. 2020;13:5669-90.). Ocasionalmente, podem causar síndromes paraneoplásicas (mais comumente síndrome de Cushing por produção ectópica de hormônio adrenocorticotrófico). FEOs podem ser observados em 25-30% dos casos de síndrome de VHL, enquanto PGs podem ser vistos em 15% dos casos de síndrome de VHL ao longo da cadeia simpática no abdome, tórax e cabeça e pescoço(55 Choi YA, Kim CK, Park BK, et al. Evaluation of adrenal metastases from renal cell carcinoma and hepatocellular carcinoma: use of delayed contrast-enhanced CT. Radiology. 2013;266:514-20.,66 Aufforth RD, Ramakant P, Sadowski SM, et al. Pheochromocytoma screening initiation and frequency in von Hippel-Lindau syndrome. J Clin Endocrinol Metab. 2015;100:4498-504.).

Assim como sua apresentação clínica, sua manifestação por imagem é variada. As lesões são sólidas e heterogêneas em sua maioria, mas podem apresentar áreas císticas. Tipicamente, apresentam-se com avidez pelo meio de contraste, configurando uma lesão hipervascular principalmente nos componentes sólidos(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.,22 Schwingel R, Duarte SBL, Oshima MM, et al. Which is your diagnosis? Radiol Bras. 2015;48(2):xi-xiii.). Um cuidado que se deve atentar é que o washout absoluto ou relativo dos FEOs na TC pode se sobrepor com um adenoma ou uma lesão maligna; sendo assim, a TC contrastada pode não necessariamente auxiliar neste diagnóstico(77 Blake MA, Kalra MK, Maher MM, et al. Pheochromocytoma: an imaging chameleon. Radiographics. 2004;24 Suppl 1:S87-99.,88 Schieda N, Alrashed A, Flood TA, et al. Comparison of quantita-tive MRI and CT washout analysis for differentiation of adrenal pheochromocytoma from adrenal adenoma. AJR Am J Roentgenol. 2016;206:1141-8.). Na RM, o alto sinal dos FEOs em T2 é uma característica útil para o diagnóstico, configurando o chamado light bulb, entretanto, este achado está presente em 11-65% dos casos, já que há parcela de lesão mista com componente cístico entremeado(99 Jacques AET, Sahdev A, Sandrasagara M, et al. Adrenal phaeo-chromocytoma: correlation of MRI appearances with histology and function. Eur Radiol. 2008;18:2885-92.) (Figura 5). Nas ponderações em T1 costumam ser isointensos, podendo haver hipersinal em T1 se houver hemorragia. Embora raramente, pode ocorrer gordura intracelular na lesão, e nesses casos há perda da intensidade de sinal em T1 fora de fase, como nos adenomas. Em razão do importante espectro de apresentação nos exames de imagem, os FEOs e os PGs frequentemente precisam ser avaliados por estudos funcionais para maior acurácia diagnóstica e na pesquisa de doença extra-adrenal ou metastática(1010 Prasad V, Tiling N, Denecke T, et al. Potential role of (68)Ga-DOTATOC PET/CT in screening for pancreatic neuroendocrine tumour in patients with von Hippel-Lindau disease. Eur J Nucl Med Mol Imaging. 2016;43:2014-20.) (Figura 6).

Figura 5
TC, axial, fase arterial (A) mostrando lesões com intensa impregnação heterogênea em ambas as adrenais (setas pretas) em paciente com níveis de metanefrinas plasmáticas fracionadas elevados, compatíveis com FEOs. Em outro paciente com síndrome de VHL, RM, T2 SPIR (B) e sequências axiais T1 GRE em fase (C) e fora de fase (D) mostrando lesão na adrenal esquerda com alto sinal em T2 (seta branca contínua) e ausência de perda de sinal nas sequências fora de fase (setas brancas tracejadas), achados típicos de FEO. Como consequência dos diferentes graus de degeneração patológica, os FEOs podem apresentar amplo espectro de apresentação por imagem (conhecidos entre os radiologistas como “tumores camaleão”).

Figura 6
Paraganglioma. TC (A) e RM (B,C) mostrando lesão sólida expansiva retroperitoneal para-aórtica direita. A lesão apresentava-se hipervascularizada na TC, fase arterial (seta branca em A) e mostrava-se com alto sinal na RM em T2, sem focos de gordura microscópica ou macroscópica, com restrição à difusão das moléculas de água (restrição nas setas pretas em B e C). PET/CT com gálio-68 dotatato (D) mostrou intensa avidez do radiotraçador pela lesão (seta tracejada).

Comparativamente aos FEOs, os PGs simpáticos apresentam maior risco de metastatização(1111 Turchini J, Cheung VKY, Tischler AS, et al. Pathology and genetics of phaeochromocytoma and paraganglioma. Histopathology. 2018;72: 97-105.). Após doença metastática, há casos com diferentes evoluções (sobrevida de 2 a 4 anos até 20 anos ou mais). Perante tais diferenças prognósticas na doença metastática e a imprevisibilidade temporal de seu aparecimento, importa reforçar o acompanhamento prolongado desses pacientes.

Cistoadenomas papilares epididimários bilaterais devem levantar forte suspeição para a síndrome de VHL, uma vez que 60% desses tumores bilaterais ocorrem nesses pacientes. Geralmente medem até 4,0 cm e na ultrassonografia variam de massas císticas com conteúdo hipoecogênico até massas predominantemente sólidas, geralmente com fluxo aumentado ao estudo Doppler. Podem ocorrer ductos deferentes testiculares dilatados. Raramente se manifestam no ligamento largo do útero e mesossalpinge(11 Ganeshan D, Menias CO, Pickhardt PJ, et al. Tumors in von Hip-pel-Lindau syndrome: from head to toe-comprehensive state-ofthe-art review. Radiographics. 2018;38:849-66.).

CONCLUSÃO

O conhecimento dos principais achados de imagem da síndrome de VHL pode alertar o radiologista em sua atuação prática para estabelecer associações nos casos em que o conjunto dos achados sugere a síndrome, podendo configurar como diagnóstico inicial de casos previamente desconhecidos, com destaque para a menor faixa etária de aparecimento de muitas das lesões. Além do diagnóstico inicial, a imagem abdominal adequada ocupa papel eminente no rastreamento/detecção precoce e seguimento das lesões (algumas de maior risco que outras), havendo esquemas propostos de acompanhamento(1212 Mourão JLV, Borella LFM, Duarte JA, et al. Imaging manifestations of von Hippel-Lindau disease: an illustrated guide focusing on the central nervous system. Radiol Bras. 2022;55:188-92.

13 VHL Alliance. The VHL handbook: What you need to know about VHL. Boston, MA: VHL Alliance. Independently published; 2020.
-1414 Poulsen MML, Budtz-Jørgensen E, Bisgaard ML. Surveillance in von Hippel-Lindau disease (vHL). Clin Genet. 2010;77:49-59.)
. Tais contribuições junto aos grupos e equipes médicas multidisciplinares buscam uma melhor assistência a estes pacientes, podendo contribuir para a qualidade de vida e potencial redução de sua morbimortalidade.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Jul 2021
  • Aceito
    07 Out 2021
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