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Câncer de mama após radioterapia torácica em pacientes jovens: o que o radiologista precisa saber?

Resumo

Os cânceres secundários induzidos por radiação são complicações raras da radioterapia e geralmente ocorrem na área tratada ou próximo a ela. Mulheres com menos de 30 anos de idade tratadas com radioterapia torácica têm risco significativamente aumentado de desenvolver câncer de mama ao longo da vida, em comparação com a população em geral. Para as pacientes tratadas com irradiação torácica com dose igual ou superior a 10 Gy é recomendado rastreamento anual com mamografia e ressonância magnética iniciando oito anos após o tratamento, desde que este início seja após 25 anos de idade. O tratamento do câncer de mama secundário nessa população deve ser individualizado e discutido com equipe multidisciplinar, para evitar toxicidade relacionada ao tratamento do câncer primário.

Unitermos:
Câncer de mama; Radioterapia; Mamografia; Ressonância magnética

Abstract

Radiation-induced secondary tumors constitute a rare complication of radiation therapy and typically occur in or near the irradiated area. Women who undergo thoracic radiotherapy before 30 years of age have a significantly greater lifetime risk of developing breast cancer than do those in the general population. It is recommended that a patient who has previously received thoracic radiotherapy with a radiation dose ≥ 10 Gy subsequently undergo annual screening with mammography and magnetic resonance imaging, beginning eight years after the initial treatment or when the patient has reached 25 years of age (whichever comes later). The treatment of secondary breast cancer in this population should be individualized and should be discussed with a multidisciplinary team to avoid toxicity related to the treatment of the primary cancer.

Keywords:
Breast neoplasms; Radiotherapy; Mammography; Magnetic resonance imaging

INTRODUÇÃO

Tumores radioinduzidos são eventos raros, observados em menos de 1% dos pacientes submetidos a radioterapia. O principal fator de risco para o desenvolvimento de tumores secundários relacionados à radiação é a idade em que foi realizado o tratamento do tumor primário. Crianças são três a seis vezes mais suscetíveis ao efeito carcinogênico da radiação ionizante do que os adultos. Esses tumores podem ser divididos em dois grupos: os esporádicos e os relacionados a síndromes hereditárias que aumentam o risco de câncer(11 Rubino C, Vathaire F, Shamsaldin A, et al. Radiation dose, chemotherapy, hormonal treatment and risk of second cancer after breast cancer treatment. Br J Cancer. 2003;89:840-6.,22 Cosset JM, Hetnal M, Chargari C. Second cancers after radiotherapy: update and recommandations. Radioprotection. 2018;53:101-5.). Os tumores radioinduzidos esporádicos são definidos pelos critérios de Cahan(33 Cahan WG, Woodard HQ, Higinbotham NL, et al. Sarcoma arising in irradiated bone: reporting of eleven cases. 1948. Cancer. 1998;82: 8-34.): a) o tumor secundário deve ocorrer no campo de irradiação prévia, mas não deve estar presente na imagem no início da radioterapia; b) deve haver um período de latência entre a exposição à radiação e o desenvolvimento do tumor secundário (média de 10 anos, variando de 6 meses a 20 anos); c) o tumor secundário deve ser histologicamente diferente do tumor primário; d) o paciente não deve ter nenhuma síndrome genética de predisposição ao câncer. Tumores radioinduzidos relacionados a síndromes genéticas estão relacionados principalmente a mutação patogênica do TP53, levando à síndrome de Li-Fraumeni. Esses tumores podem ter período de latência menor quando comparados aos tumores esporádicos(11 Rubino C, Vathaire F, Shamsaldin A, et al. Radiation dose, chemotherapy, hormonal treatment and risk of second cancer after breast cancer treatment. Br J Cancer. 2003;89:840-6.,22 Cosset JM, Hetnal M, Chargari C. Second cancers after radiotherapy: update and recommandations. Radioprotection. 2018;53:101-5.).

A radioterapia torácica para tratamento de cânceres primários na infância ou adolescência tem apresentado sucesso, com aumento importante da sobrevida relativa, chegando a aproximadamente 95% em 10 anos(44 Dörffel W, Riepenhausen M, Lüders H, et al. Secondary malignancies following treatment for Hodgkin’s lymphoma in childhood and adolescence. Dtsch Arztebl Int. 2015;112:320-7.). No entanto, essa terapêutica eleva o risco de câncer secundário, sendo o câncer de mama o mais frequente(44 Dörffel W, Riepenhausen M, Lüders H, et al. Secondary malignancies following treatment for Hodgkin’s lymphoma in childhood and adolescence. Dtsch Arztebl Int. 2015;112:320-7.

5 Moskowitz CS, Chou JF, Wolden SL, et al. Breast cancer after chest radiation therapy for childhood cancer. J Clin Oncol. 2014; 32:2217-23.

6 Schaapveld M, Aleman BMP, van Eggermond AM, et al. Second cancer risk up to 40 years after treatment for Hodgkin’s lymphoma. N Engl J Med. 2015;373:2499-511.

7 Lehman CD, Arao RF, Sprague BL, et al. National performance benchmarks for modern screening digital mammography: update from the Breast Cancer Surveillance Consortium. Radiology. 2017;283:49-58.

8 Bakkach J, Pellegrino B, Elghazawy H, et al. Current overview and special considerations for second breast cancer in Hodgkin lymphoma survivors. Crit Rev Oncol Hematol. 2021;157:103175.

9 Ryder-Burbidge C, Diaz RL, Barr RD, et al. The burden of late effects and related risk factors in adolescent and young adult cancer survivors: a scoping review. Cancers (Basel). 2021;13:4870.
-1010 Yeh JM, Lowry KP, Schechter CB, et al. Breast cancer screening among childhood cancer survivors treated without chest radiation: clinical benefits and cost-effectiveness. J Natl Cancer Inst. 2022;114:235-44.)
. Isso reafirma o conceito de o tecido mamário ser um dos órgãos mais radiossensíveis do corpo humano. Além disso, observa-se que o câncer secundário é a principal causa de morte nos sobreviventes do câncer primário(1111 Koo E, Henderson MA, Dwyer M, et al. Management and prevention of breast cancer after radiation to the chest for childhood, adolescent, and young adulthood malignancy. Ann Surg Oncol. 2015; 22:545-51.).

O objetivo deste trabalho é revisar os aspectos relacionados ao risco de desenvolver câncer de mama secundário em pacientes jovens submetidos a radioterapia torácica, bem como as recomendações atuais de rastreamento, as características tumorais e as peculiaridades do tratamento oncológico nessa população.

RISCO DE DESENVOLVER CÂNCER DE MAMA APÓS RADIOTERAPIA TORÁCICA

Mulheres com menos de 30 anos submetidas a radioterapia torácica têm risco até oito vezes maior de desenvolver câncer de mama durante a vida, quando comparadas à população geral(1212 De Bruin ML, Sparidans J, van’t Veer MB, et al. Breast cancer risk in female survivors of Hodgkin’s lymphoma: lower risk after smaller radiation volumes. J Clin Oncol. 2009;27:4239-46.).

Observou-se que o risco de desenvolver câncer de mama aumenta após cinco a nove anos do tratamento, com pico entre 15 e 19 anos, decaindo após este período, porém, mantendo-se elevado até 30 a 40 anos após o tratamento. Entre pacientes com 30 anos ou menos que apresentaram linfoma de Hodgkin (LH), 34% desenvolveram câncer de mama com tempo de intervalo mediano de 21 anos (10-30 anos) e idade mediana de 43 anos (34-66 anos). Já entre pacientes que apresentaram LH após os 30 anos, 19% desenvolveram câncer de mama, com tempo de intervalo mediano de 18 anos (6-29 anos) e idade mediana de 53 anos (38-79 anos)(55 Moskowitz CS, Chou JF, Wolden SL, et al. Breast cancer after chest radiation therapy for childhood cancer. J Clin Oncol. 2014; 32:2217-23.,1313 Horst KC, Fero KE, Hancock SL, et al. Breast imaging in women previously irradiated for Hodgkin lymphoma. Am J Clin Oncol. 2016;39: 114-9.).

Em coorte retrospectiva que incluiu 6.068 mulheres, com o objetivo de identificar fatores de risco para câncer de mama em mulheres sobreviventes de câncer primário na infância, Kenney et al. demonstraram que houve maior incidência em pacientes com história familiar de câncer de mama ou de tireoidopatia, ao passo que houve menor incidência em pacientes expostos a radiação na pelve(1414 Kenney LB, Yasui Y, Inskip PD, et al. Breast cancer after childhood cancer: a report from the Childhood Cancer Survivor Study. Ann Intern Med. 2004;141:590-7.). Registra-se também um risco maior em mulheres que receberam radiação em idades mais baixas e aumento cumulativo com a idade(1111 Koo E, Henderson MA, Dwyer M, et al. Management and prevention of breast cancer after radiation to the chest for childhood, adolescent, and young adulthood malignancy. Ann Surg Oncol. 2015; 22:545-51.,1212 De Bruin ML, Sparidans J, van’t Veer MB, et al. Breast cancer risk in female survivors of Hodgkin’s lymphoma: lower risk after smaller radiation volumes. J Clin Oncol. 2009;27:4239-46.,1515 Lee JS, DuBois SG, Coccia PF, et al. Increased risk of second malignant neoplasms in adolescents and young adults with cancer. Cancer. 2016;122:116-23.). Outro fator apontado para aumento de risco de câncer de mama após a radioterapia foi o uso associado de quimioterapia com antraciclina durante o tratamento do câncer primário(1616 Demoor-Goldschmidt C, de Vathaire F. Review of risk factors of secondary cancers among cancer survivors. Br J Radiol. 2019;92: 20180390.,1717 Veiga LH, Curtis RE, Morton LM, et al. Association of breast cancer risk after childhood cancer with radiation dose to the breast and anthracycline use: a report from the Childhood Cancer Survivor Study. JAMA Pediatr. 2019;173:1171-9.).

Em relação à radiação torácica prévia, o risco de câncer de mama mantém relação linear com o aumento da dose de radiação, mas com redução desse risco ao se diminuir o tecido mamário envolvido, mesmo com a dose aplicada em todo o tórax(1111 Koo E, Henderson MA, Dwyer M, et al. Management and prevention of breast cancer after radiation to the chest for childhood, adolescent, and young adulthood malignancy. Ann Surg Oncol. 2015; 22:545-51.). Além disso, a sobrevida em 5 e 10 anos mantém-se igual, independente da dose e da radiação. Moskowitz et al. reiteram que o risco se mantém elevado mesmo no tratamento com doses mais baixas (10-19 Gy), justificando o rastreamento de câncer de mama nessas pacientes, apesar de o ponto de corte estabelecido previamente para o rastreamento de câncer de mama nas mulheres com irradiação torácica prévia ser 20 Gy(55 Moskowitz CS, Chou JF, Wolden SL, et al. Breast cancer after chest radiation therapy for childhood cancer. J Clin Oncol. 2014; 32:2217-23.). Vale ressaltar que a indução de neoplasias secundárias é um evento estocástico, ou seja, o risco aumenta com a dose aplicada e o volume de tecido irradiado, porém, baixas doses e pequenos volumes não eliminam totalmente o risco. Atualmente, a radioterapia torácica nos linfomas, por exemplo, utiliza doses e volumes menores do que era padronizado anteriormente, o que pode tornar o risco de tumores radioinduzidos menor do que o observado nas séries históricas.

RECOMENDAÇÕES DE RASTREAMENTO

Por apresentarem risco aumentado de desenvolver câncer de mama antes da faixa etária usualmente indicada para rastreamento, mulheres na infância e adolescência submetidas a radioterapia torácica devem ter recomendações diferenciadas da população geral. A mamografia, método mais utilizado para o rastreamento populacional, apresenta menor sensibilidade em mulheres jovens devido ao aumento da densidade mamária nessa população. Autores demonstraram o benefício de incorporar a ressonância magnética (RM) na estratégia de rastreamento dessa população em relação ao uso da mamografia isoladamente (Tabela 1)(1818 Sung JS, Lee CH, Morris EA, et al. Screening breast MR imaging in women with a history of chest irradiation. Radiology. 2011;259:65-71.

19 Ng AK, Garber JE, Diller LR, et al. Prospective study of the efficacy of breast magnetic resonance imaging and mammographic screening in survivors of Hodgkin lymphoma. J Clin Oncol. 2013; 31:2282-8.

20 Freitas V, Scaranelo A, Menezes R, et al. Added cancer yield of breast magnetic resonance imaging screening in women with a prior history of chest radiation therapy. Cancer. 2013;119:495-503.

21 Tieu MT, Cigsar C, Ahmed S, et al. Breast cancer detection among young survivors of pediatric Hodgkin lymphoma with screening magnetic resonance imaging. Cancer. 2014;120:2507-13.
-2222 Ehrhardt MJ, Howell CR, Hale K, et al. Subsequent breast cancer in female childhood cancer survivors in the St Jude Lifetime Cohort Study (SJLIFE). J Clin Oncol. 2019;37:1647-56.)
. O Colégio Americano de Radiologia(23) e o Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, em conjunto com a Sociedade Brasileira de Mastologia e Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia(24), recomendam rastreamento com mamografia e RM anual para essas pacientes.

Tabela 1
Sensibilidade da mamografia, RM e ambos os métodos associados para diagnóstico de câncer de mama durante o rastreamento em mulheres submetidas a radioterapia torácica abaixo dos 30 anos.

Em 2019, o International Late Effects of Childhood Cancer Guideline Harmonization Group publicou recomendações atualizadas para rastreamento de câncer de mama em mulheres que realizaram tratamento de câncer na infância, adolescência ou adulto jovem. Eles recomendam rastreio anual para câncer de mama a partir dos 25 anos de idade, ou oito anos após a radioterapia (o que ocorrer depois), para pacientes tratadas antes dos 30 anos com irradiação torácica igual ou superior a 10 Gy, devendo ser mantido até, pelo menos, os 60 anos(2525 Mulder RL, Hudson MM, Bhatia S, et al. Updated breast cancer surveillance recommendations for female survivors of childhood, adolescent, and young adult cancer from the International Guideline Harmonization Group. J Clin Oncol. 2020;38:4194-207.). Recomendam, ainda, que deve ser considerado rastreamento para câncer de mama também nas pacientes que realizaram apenas radioterapia no abdome superior. Essa prática permitiria a detecção precoce da doença, melhorando o prognóstico, tendo em vista as possibilidades terapêuticas muitas vezes limitadas, pelo fato de essas mulheres já terem sido submetidas a quimioterapia e radioterapia durante o tratamento do tumor primário(2121 Tieu MT, Cigsar C, Ahmed S, et al. Breast cancer detection among young survivors of pediatric Hodgkin lymphoma with screening magnetic resonance imaging. Cancer. 2014;120:2507-13.).

Em razão da dificuldade de reunir número considerável de mulheres que se enquadrem no perfil de pesquisas que validem essas indicações de rastreamento, alguns autores desenvolveram modelos matemáticos para avaliar o benefício do rastreio precoce nas sobreviventes de LH a partir dos 25 anos(2626 Yeh JM, Lowry KP, Schechter CB, et al. Clinical benefits, harms, and cost-effectiveness of breast cancer screening for survivors of childhood cancer treated with chest radiation. Ann Intern Med. 2020;173:331-41.,2727 Hodgson DC, Cotton C, Crystal P, et al. Impact of early breast cancer screening on mortality among young survivors of childhood Hodgkin’s lymphoma. J Natl Cancer Inst. 2016;108(7).). Esses modelos demonstraram que o rastreamento precoce com mamografia e RM reduziria em até metade o risco absoluto de morte por câncer de mama nessa população. O benefício adicional da mamografia em relação à RM foi muito pequeno nesses estudos, no entanto, os modelos utilizados não consideraram o carcinoma ductal in situ (CDIS) como parte da história natural do câncer de mama, assumindo que não contribuiria para a mortalidade, o que pode interferir nos resultados do rastreamento mamográfico. Em ambos os estudos também se observou aumento de resultados falso-positivos no rastreamento, porém, com valores considerados aceitáveis.

CARACTERÍSTICAS DO CÂNCER DE MAMA RADIOINDUZIDO

As neoplasias mamárias malignas mais comuns após radioterapia torácica são o carcinoma invasivo sem outra especificação - antigo carcinoma ductal invasivo - e o CDIS. A maioria dos tumores diagnosticados nessa população tem estádio mais precoce ao diagnóstico(2828 Wong SM, Ajjamada L, Weiss AC, et al. Clinicopathologic features of breast cancers diagnosed in women treated with prior radiation therapy for Hodgkin lymphoma: results from a population-based cohort. Cancer. 2021;128:1365-72.) e tem expressão de receptores hormonais. Demoor-Goldschmidt et al. identificaram, no seu estudo, que 70% dos tumores avaliados apresentavam receptores de estrogênio e 64% apresentavam receptores de progesterona(2929 Demoor-Goldschmidt C, Supiot S, Mahé MA, et al. Clinical and histological features of second breast cancers following radiotherapy for childhood and young adult malignancy. Br J Radiol. 2018;91:20170824.). No entanto, comparado aos carcinomas mamários na população em geral, trabalhos demonstraram pior prognóstico, ao passo que os carcinomas radioinduzidos apresentaram maiores taxas de bilateralidade, alto grau, ausência de expressão de receptores hormonais e subtipo triplo-negativo(1111 Koo E, Henderson MA, Dwyer M, et al. Management and prevention of breast cancer after radiation to the chest for childhood, adolescent, and young adulthood malignancy. Ann Surg Oncol. 2015; 22:545-51.,3030 Horst KC, Hancock SL, Ognibene G, et al. Histologic subtypes of breast cancer following radiotherapy for Hodgkin lymphoma. Ann Oncol. 2014;25:848-51.). Horst et al. identificaram, no seu trabalho com pacientes com câncer de mama que foram submetidas a radioterapia torácica, que 39% apresentaram subtipo triplo-negativo, comparado a 14% das pacientes com câncer de mama esporádico(3030 Horst KC, Hancock SL, Ognibene G, et al. Histologic subtypes of breast cancer following radiotherapy for Hodgkin lymphoma. Ann Oncol. 2014;25:848-51.).

Os achados de imagem ao diagnóstico são similares ao câncer de mama na população geral, dependendo do momento do diagnóstico. Elkin et al. realizaram estudo multicêntrico em hospitais norte-americanos e demonstraram que a maioria dos tumores era diagnosticada durante o rastreamento(3131 Elkin EB, Klem ML, Gonzales AM, et al. Characteristics and outcomes of breast cancer in women with and without a history of radiation for Hodgkin’s lymphoma: a multi-institutional, matched cohort study. J Clin Oncol. 2011;29:2466-73.). Já num estudo multicêntrico francês realizado por Demoor-Goldschmidt et al., a maioria dos tumores foi diagnosticada na fase sintomática(3232 Demoor-Goldschmidt C, Supiot S, Oberlin O, et al. Clinical and diagnosis characteristics of breast cancers in women with a history of radiotherapy in the first 30 years of life: a French multicentre cohort study. Radiother Oncol. 2017;124:200-3.). Em geral, pacientes com diagnóstico em exames de rastreamento tendem a apresentar tumores menores, em estádio mais precoce (Figura 1), enquanto pacientes que têm o diagnóstico após queixa clínica tendem a apresentar tumores maiores e mais agressivos (Figura 2).

Figura 1
Paciente de 35 anos com história de radioterapia torácica prévia, realizava rastreamento com mamografia e RM. A: Mamografia apresentou mamas heterogeneamente densas, com calcificações de aspecto benigno, sem indício de nódulos (BI-RADS 2). B: RM das mamas demonstrou nódulo com margens irregulares e realce precoce na mama direita, medindo 2,5 cm (BI-RADS 4). Biópsia confirmou carcinoma invasivo sem outra especificação, subtipo luminal B, estadiamento cirúrgico pT2pN1a.

Figura 2
Paciente de 30 anos com história de radioterapia de manto para tratamento de linfoma de Hodgkin aos 11 anos de idade, que não realizava exames de rastreamento, apresentou massa palpável na mama esquerda. A: Mamografia diagnóstica apresentou massa irregular no terço posterior da junção dos quadrantes superiores da mama esquerda, medindo 6,0 cm, com distorção arquitetural e microcalcificações de permeio, associada a linfonodos axilares atípicos ipsilaterais (BI-RADS 5). B: RM das mamas confirmou massa irregular ocupando o quadrante superomedial da mama esquerda, medindo 7,8 cm. Biópsia confirmou carcinoma invasivo sem outra especificação, subtipo luminal B HER-2. PET-CT realizada para estadiamento demonstrou metástases pulmonares (estadiamento clínico T3N2M1).

A maioria dos tumores se apresenta como nódulos, que em geral são mais bem caracterizados na RM, no entanto, alguns casos podem ser identificados apenas pela mamografia, de modo que ambos os métodos devem ser avaliados em conjunto(1818 Sung JS, Lee CH, Morris EA, et al. Screening breast MR imaging in women with a history of chest irradiation. Radiology. 2011;259:65-71.

19 Ng AK, Garber JE, Diller LR, et al. Prospective study of the efficacy of breast magnetic resonance imaging and mammographic screening in survivors of Hodgkin lymphoma. J Clin Oncol. 2013; 31:2282-8.

20 Freitas V, Scaranelo A, Menezes R, et al. Added cancer yield of breast magnetic resonance imaging screening in women with a prior history of chest radiation therapy. Cancer. 2013;119:495-503.

21 Tieu MT, Cigsar C, Ahmed S, et al. Breast cancer detection among young survivors of pediatric Hodgkin lymphoma with screening magnetic resonance imaging. Cancer. 2014;120:2507-13.
-2222 Ehrhardt MJ, Howell CR, Hale K, et al. Subsequent breast cancer in female childhood cancer survivors in the St Jude Lifetime Cohort Study (SJLIFE). J Clin Oncol. 2019;37:1647-56.)
. Conforme apresentado na Tabela 1, a sensibilidade para o diagnóstico de câncer de mama é superior quando o rastreamento é feito com mamografia e RM do que quando é realizado com mamografia ou RM isoladamente. Em estudo realizado por Horst et al., cerca de 30% das neoplasias malignas eram CDIS que foram demonstrados na mamografia pela presença de calcificações, no entanto, nem todos os pacientes foram submetidos a RM(1313 Horst KC, Fero KE, Hancock SL, et al. Breast imaging in women previously irradiated for Hodgkin lymphoma. Am J Clin Oncol. 2016;39: 114-9.). No levantamento de Sung et al., 30% dos tumores malignos apresentaram-se apenas como nódulo, 30% apenas como calcificações, 20% como massa associada a calcificações e 20% como realce não massa(1818 Sung JS, Lee CH, Morris EA, et al. Screening breast MR imaging in women with a history of chest irradiation. Radiology. 2011;259:65-71.).

PECULIARIDADES DO TRATAMENTO DO CÂNCER DE MAMA RADIOINDUZIDO

A mastectomia é o tratamento cirúrgico mais empregado, principalmente porque o risco de novos tumores na mama previamente irradiada permanece ao longo dos anos e pela possível intolerância a nova radioterapia, apesar de poder ser realizada em segurança em casos selecionados(3333 Haberer S, Belin L, Le Scodan R, et al. Locoregional treatment for breast carcinoma after Hodgkin’s lymphoma: the breast conservation option. Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2012;82:e145-52.). Podem-se realizar, ainda, radioterapia intraoperatória e irradiação parcial da mama para câncer de mama secundário em estádio inicial após cirurgia conservadora. Sabe-se, porém, que a reirradiação apresenta possíveis efeitos colaterais, incluindo radionecrose, sendo recomendada a reconstrução mamária com tecido autólogo saudável e bem vascularizado, podendo-se utilizar próteses de silicone como opção em pacientes com alterações actínicas discretas(1313 Horst KC, Fero KE, Hancock SL, et al. Breast imaging in women previously irradiated for Hodgkin lymphoma. Am J Clin Oncol. 2016;39: 114-9.).

O tratamento sistêmico é semelhante ao câncer de mama primário. Deve-se atentar para a dose acumulada de antraciclina nos primeiro e segundo tratamentos, em razão do risco de cardiotoxicidade. No entanto, a depender das características biológicas do câncer de mama, pode-se também administrar quimioterapia adjuvante, inclusive com antraciclinas, mesmo em pacientes já expostos previamente a esta classe de medicamento, com boa tolerabilidade e nenhuma toxicidade cardíaca aguda(3434 Terenziani M, Massimino M, Magazzù D, et al. Management of breast cancer after Hodgkin’s lymphoma and paediatric cancer. Eur J Cancer. 2015;51:1667-74.). Nesses casos, deve-se adotar abordagem multidisciplinar para as mulheres que sobreviveram ao tumor primário e desenvolveram um câncer de mama secundário após irradiação torácica, oferecendo as mesmas chances de tratamento efetivo que são oferecidas para as mulheres com câncer de mama esporádico.

CONCLUSÕES

Os cânceres secundários radioinduzidos são complicações raras da radioterapia e geralmente ocorrem na área tratada ou próximo a esta. Mulheres tratadas com radiação torácica na infância, adolescência ou na idade adulta jovem (principalmente irradiação de tórax para tratamento de LH) têm risco aumentado de desenvolver câncer de mama durante a vida. Essas pacientes devem realizar rastreamento anual com mamografia e RM iniciando oito anos após o tratamento, desde que este início seja após 25 anos de idade. O rastreamento permite detecção precoce da doença, melhorando o prognóstico, tendo em vista as possibilidades terapêuticas muitas vezes limitadas pelo tratamento prévio.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    23 Jun 2022
  • Aceito
    22 Set 2022
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