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A química da família bombacaceae

The chemistry of the bombacaceae family

Resumo

The Bombacaceae family consists of 28 genera and 200 species. This work reviews all the chemical studies carried out on the members of this family, and shows that only ten genera were investigated. From this review it can be seen that no particular class of chemical metabolites is ubiquitous in this family.

Bombacaceae; chemical constituents


Bombacaceae; chemical constituents

REVISÃO

A química da família bombacaceae# # Este trabalho faz parte da tese de doutoramento (Departamento de Química, UFMG) do primeiro autor.

The chemistry of the bombacaceae family

Vanderlúcia F. PaulaI; Luiz C. A. BarbosaI,* ; Antônio J. DemunerI; Dorila Piló-VelosoII

IDepartamento de Química - Universidade Federal de Viçosa - 36571-000 - Viçosa - MG

IIDepartamento de Química - Universidade Federal de Minas Gerais - 31270-901 - Belo Horizonte - MG

SUMMARY

The Bombacaceae family consists of 28 genera and 200 species. This work reviews all the chemical studies carried out on the members of this family, and shows that only ten genera were investigated. From this review it can be seen that no particular class of chemical metabolites is ubiquitous in this family.

Keywords: Bombacaceae; chemical constituents.

INTRODUÇÃO

Segundo Cronquist1 a família Bombacaceae pertence à Ordem Malvales, à Sub-Classe Dillenidae e à Classe Magnoliopsida (Angiospermae). É uma pequena família de plantas arbóreas, de exclusiva distribuição tropical, que compreende cerca de vinte e oito gêneros e duzentas espécies2. Ao lado dos dez gêneros descritos na tabela 1, citam-se: Aguiaria, Bernoullia, Catostemma, Cavanillesia, Coelostegia, Cullenia, Eriotheca, Gyranthera, Huberodendron, Kostermansia, Neesia, Neobuchia, Phagmotheca, Rhodognaphalon, Rhodognaphalopsis, Scleronema, Septotheca e Spirotheca. Dentre as espécies, somente Bombacopsis glabra, Ceiba pentandra, Chorisia speciosa, Eriotheca candolleana, E. gracilipes, E.pubescem, Ochroma lagopus, Pachira aquatica e Pseudobombax grandiflorum são nativas do Brasil3.

Apesar da importância econômica de algumas espécies, tais como aquelas dos gêneros Ochroma, Ceiba e Durio, pouco é conhecido sobre a fitoquímica de membros desta família4,5,6. Dos vinte e oito gêneros, apenas dez são registrados na literatura com algum tipo de estudo químico (Tabela 1).

Neste trabalho é apresentada uma revisão de todos os estudos químicos realizados em espécies da família Bombacaceae, sem entrar em detalhes sobre as técnicas de isolamento e identificação de cada substância, uma vez que estas são bem discutidas na literatura pesquisada.

CONSTITUINTES QUÍMICOS

O isolamento da maioria dos constituintes químicos de plantas da família Bombacaceae relatadas na literatura foi feito empregando-se métodos cromatográficos clássicos e recristalizações. A elucidação estrutural foi efetuada por análise de dados espectroscópicos nas regiões do ultravioleta, do infravermelho, de ressonância magnética nuclear de hidrogênio e de carbono-13 incluindo técnicas uni- e bidimensional e por espectrometria de massas. Os constituintes voláteis e alguns pigmentos florais foram identificados, respectivamente, por cromatografia em fase gasosa acoplada à espectrometria de massas7,8 e por cromatografia em papel6.

Cerca de 170 substâncias, listadas na tabela 1, foram identificadas de espécies desta família, sendo oitenta e três constituintes voláteis de uma única espécie (Durio zibethinus)7,8. As estruturas das substâncias mais complexas são apresentadas na figura 1.


Uma análise dos constituintes voláteis do fruto de Durio zibethinus foi realizada por Baldry e colaboradores7, revelando a presença de mais de vinte compostos, incluindo diferentes ésteres, tioésteres e tióis. Dentre os constituintes foram caracterizados metanotiol, etanotiol, propanotiol, dimetiltioéter, dietiltioéter, sulfeto de hidrogênio, dissulfeto de dietila, metanol, etanol, propan-1-ol, 3-metilbutan-1-ol, acetaldeído, propionaldeído, acetato de metila, acetato de etila, propionato de metila, propionato de propila, isobutirato de etila, butirato de etila, a-metilbutirato de metila, a-metilbutirato de etila, a-metilbutirato de propila, isovalerato de etila, metacrilato de etila e etilbenzeno.

Em outro estudo deste mesmo fruto, realizado por Wong e Tie8, sessenta e três constituintes voláteis foram identificados, compreendendo trinta ésteres, dezesseis compostos contendo enxofre, cinco cetonas, oito alcanos e quatro outros. Entre estes, foram identificados voláteis não muito comuns em plantas, tais como cis- e trans-3,5-dimetil-1,2,4-tritiolano e S-alquil-ésteres de ácidos alquiltiocarboxílicos.

Uma importante consideração também deve ser feita sobre os primeiros estudos químicos da casca da raiz de Salmalia malabaricum, onde foram propostas as presenças das naftoquinonas 42 e 439 e do naftol 4610 (Figura 1). Estas estruturas foram posteriormente, revisadas por Bell e colaboradores11, em estudos comparativos entre os gêneros Gossypium (família Malvaceae) e Bombax (ou Salmalia), sugerindo que fossem substituídas por 44, 45 e 47 (Tabela 1 e Figura 1), respectivamente, pois estas explicariam melhor os dados espectroscópicos obtidos.

IMPORTÂNCIA ECONÔMICA E ETNOFARMACOLÓGICA DE ALGUMAS ESPÉCIES ESTUDADAS

O gênero Adansonia, comumente conhecido como "baobab" compreende oito espécies15,30, das quais seis são endêmicas de Madagascar (A. fony, A. za, A. madagascariensis, A. suarezensis e A.perrieri), uma da África (A. digitata) e uma da Austrália (A. gregorii)15. Dentre estas espécies, a mais estudada tem sido A. digitata, possivelmente em decorrência de seu uso na medicina tradicional como antipirético, adstringente na diarréia ou disenteria, e como substituta da cinchona em várias preparações medicinais13,30. Além disso, suas atividades anti-inflamatória, analgésica e antipirética foram comprovadas por Ramadan e colaboradores30.

Ceiba pentandra Gaertner [sin. Bombax pentandrum L.] é uma árvore encontrada em todas regiões mais quentes, ocidentais e meridionais da Índia16, bem como em todo trópico americano31. É usada como diurético16, sendo o chá de suas cascas usado para fortalecer os cabelos, após repetidos banhos. Esse mesmo chá é fornecido às vacas, após o parto, para expulsão da placenta31.

Comercialmente a lã sedosa que envolve sua semente, conhecida como "kapok", é de grande importância, sendo usada como matéria-prima para fabricação de colchões, travesseiros, almofadas, etc31.

Ao gênero Chorisia pertence algumas espécies, dentre elas C. speciosa, conhecida no Brasil como paineira, cuja principal importância está também na utilização de sua lã31.

Durio zibethinus Murr. é uma árvore frutífera, conhecida popularmente como "durião da Ásia"2. Seu fruto é comestível e bastante comercializado, podendo medir até 30 cm de diâmetro e pesar até 7 kg31. A sua polpa é muito saborosa, o que justifica ser considerado o fruto mais apreciado do Oriente e o "melhor do mundo"32, porém possui um desagradável odor aliáceo predominante ou de cebolas podres. Suas sementes são igualmente comestíveis e sobretudo consideradas como afrodisíacas32.

Ao gênero Ochroma pertence uma única espécie, denominada O. lagopus Swartz33, a qual apresenta a menor densidade conhecida para madeiras34, com massa específica 0,12 g cm-3. É muito utilizada na indústria aeronáutica, na fabricação de barcos, de jangadas e como substituta da cortiça. É conhecida como balsa ou pau de balsa35. Suas cascas são utilizadas com fins medicinais. Nas Guianas e na Amazônia são tidas como eméticas35 e seus chás também são fornecidos às vacas, após o parto, para expulsão da placenta31. Suas flores são responsáveis por grande mortalidade de insetos, principalmente abelhas, na região de Viçosa - MG18,19 e no Estado de São Paulo36.

As flores de Quararibeafunebris, fortemente odoríferas, são usadas desde o período pré-Colombiano como um aditivo às bebidas de chocolate. Na medicina folclórica a planta é conhecida como "flor de cocoa", sendo usada para controlar temores psicopáticos, regular menstruação e como remédio para tosse5,23,24. Existe ainda alguma evidência de que as flores podem ser alucinógenas23.

No gênero Salmalia a única espécie estudada foi Salmalia malabaricum [sin. Salmalia malabarica, Bombax malabaricum], uma planta bastante utilizada em preparações medicinais indígenas27. As raízes desta planta possuem ação estimulante, sendo utilizadas como ingrediente essencial em preparados afrodisíacos, administrados em casos de impotência26.

CONCLUSÃO

De acordo com esta revisão, verifica-se que as substâncias mais significativas isoladas a partir de plantas da família Bombacaceae são alcalóides, naftalenos oxidados, cumarinas, lignanas e ácidos graxos com anel ciclopropeno (Figura 1 e Tabela 1). Verifica-se ainda que poucas de suas espécies foram quimicamente estudadas.

Dos dados disponíveis na literatura, pode-se observar que aparentemente não existe qualquer relação entre os gêneros estudados, do ponto de vista de seus micro-constituintes químicos. Entretanto, isso não implica, necessariamente, em questionamento sobre a classificação botânica das espécies desta família. Esta relação também não pode ser observada entre espécies de um mesmo gênero, principalmente porque, na maioria deles, somente uma espécie foi estudada.

AGRADECIMENTOS

Os autores expressam seus agradecimentos ao CNPq, CAPES e FAPEMIG pela concessão de bolsas de Pós-graduação (VFP) e de Pesquisa (LCAB e DPV) e pelo auxílio financeiro.

Recebido em 2/8/96; aceito em 9/6/97

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  • #
    Este trabalho faz parte da tese de doutoramento (Departamento de Química, UFMG) do primeiro autor.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Dez 1997

    Histórico

    • Aceito
      09 Jun 1997
    • Recebido
      02 Ago 1996
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