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Moléculas em três dimensões: um estereoscópio para computador

Molecules in three dimensions: a stereoscope for the personal computer

Resumo

In this paper we describe how to make a very simple stereoscope for observation of molecular models produced by several recent computer programmes. With this instrument, constructed essentially with four mirrors, the chemist can visualize molecular models in three dimensions directly from the personal computer monitor screen.

stereoscope; molecular models; three dimensions


stereoscope; molecular models; three dimensions

NOTA TÉCNICA

MOLÉCULAS EM TRÊS DIMENSÕES: UM ESTEREOSCÓPIO PARA COMPUTADOR

Mauricio Gomes Constantino*, Gil Valdo José da Silva e Marcelo Miguel Martins Pelisson

Departamento de Química - Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo - Avenida Bandeirantes, 3900 - 14040-901 - Ribeirão Preto - SP

Recebido em 31/3/97; aceito em 18/6/97

MOLECULES IN THREE DIMENSIONS: A STEREOSCOPE FOR THE PERSONAL COMPUTER. In this paper we describe how to make a very simple stereoscope for observation of molecular models produced by several recent computer programmes. With this instrument, constructed essentially with four mirrors, the chemist can visualize molecular models in three dimensions directly from the personal computer monitor screen.

Keywords: stereoscope; molecular models; three dimensions.

INTRODUÇÃO

Representações planas de moléculas que são, na realidade, tridimensionais sempre foi uma severa limitação para o desenvolvimento da compreensão que o químico precisa ter sobre a estrutura molecular. Existem hoje em uso pelos químicos vários programas de computador (PCModel, HyperChem, etc.) que são capazes de apresentar projeções estereoscópicas na tela do monitor, permitindo ainda que as "moléculas" assim apresentadas possam ser giradas em todas as direções. Tais projeções, no entanto, são inúteis se o observador não dispuser de um estereoscópio, um aparelho que permite ver cada uma das duas imagens apresentadas com o olho correspondente, dando a impressão de que os dois olhos vêm a mesma figura, agora em três dimensões.

Descrevemos neste trabalho um estereoscópio extremamente simples que pode ser construído em qualquer oficina minimamente equipada e que fornece imagens tridimensionais de qualidade muito boa; o resultado chega a ser surpreendente quando se considera a simplicidade do aparelho.

CONSTRUÇÃO

a. Preparação das peças

O aparelho é feito de alumínio, madeira, papel cartão preto e espelhos, medindo depois de pronto 18 cm x 5 cm x 3,5 cm, aproximadamente. Para fixar as peças no lugar usa-se cola branca e dez parafusos para madeira.

Na oficina mecânica cortam-se dois pedaços de chapa de alumínio medindo 18 cm x 5 cm; é conveniente que uma das chapas seja espessa (3 mm), para constituir a base em que serão montados os espelhos (peça A); a outra é apenas uma tampa e pode ser de chapa mais fina (2 mm) (peça B). Em cada uma das peças devem ser feitos apenas quatro furos, nas posições indicadas na figura 1, devidamente escariados para embutir as cabeças dos parafusos que as prenderão.


Uma terceira peça de chapa de alumínio, medindo 18 cm x 3,5 cm, receberá dois furos para parafusos (também escariados) e dois furos de 1,0 cm de diâmetro, distantes 6,6 cm um do outro, para os olhos do observador (peça C).

Na marcenaria prepara-se um sarrafo de 3,0 cm de largura por 1,0 cm de espessura, de madeira bem seca para não empenar; é importante que o sarrafo seja preparado com desempenadeira e plaina de boa qualidade e em bom estado, para que seus ângulos retos tenham boa precisão.

O sarrafo deve ser cortado em 6 peças (3 pares de peças) como mostrado na figura 2 (peças D, D',E, E', F, F'). Os ângulos de 45 dessas peças devem, como os ângulos retos, ser cortados com a maior precisão possível.


Cortam-se (ou encomendam-se a um vidraceiro) de um espelho comum quatro peças iguais medindo 4,0 cm x 2,8 cm, como mostrado na figura 3.


b. Montagem

A montagem se inicia marcando o centro do comprimento da peça A e traçando duas linhas formando ângulo de 45 com a borda (ou com a linha central), como mostrado na figura 4; usando cola branca (tipo Tenaz, Cascolar, etc.) colam-se as duas peças D e D' acompanhando as linhas traçadas, como mostrado na figura 5.1. Em seguida cola-se papel cartão preto nas faces hachuradas (figura 5.2)(o papel preto é para diminuir a reflexão e melhorar a qualidade da imagem).




As peças F e F' são fixadas na posição (figura 6) com parafusos; pode-se usar cola além dos parafusos, pois não será mais necessário retirar F e F' da placa inferior (no entanto, não deverá ser usada cola na parte superior, peça B). Em seguida cola-se em cada uma das peças F e F' uma tira de papel cartão preto medindo 1,3 x 3,0 cm, como visto na figura 6.


Cola-se um espelho na face maior de cada uma das peças E e E', sempre com cola branca, e os outros dois espelhos são colados nas peças D e D', já montadas, a uma distância de 1,9 cm da borda frontal (figura 7).


A montagem das peças E e E' (já com os espelhos colados) é a parte mais delicada, pois precisa ser efetuada realizando simultaneamente o alinhamento óptico do aparelho para que as imagens fiquem bem posicionadas.

ALINHAMENTO

Para que a imagem final tenha a aparência desejada de um objeto em três dimensões que possa ser observado sem desconforto do observador, é preciso que os espelhos sejam posicionados com muita exatidão no lugar correto. A melhor maneira de determinar a posição exata em que devem ficar os espelhos é variar sua posição enquanto se observa o que ocorre com a imagem. Com alguma prática, é possível fazer isso apenas com o aparelho em construção e uma imagem estereoscópica na tela do monitor do computador; mas é preciso realmente ter prática, pois nessas circunstâncias as imagens são muito confusas e difíceis de compreender.

Tudo se torna muito mais simples se for construído e utilizado um tubo duplo, de papel cartão preto, conforme instruções a seguir.

São necessárias duas folhas de papel cartão: no verso de cada uma faz-se um desenho como o da figura 8. Essas medidas são para um monitor de 14 ou 15 polegadas, tipos muito comuns entre os químicos, em cuja tela a imagem estereoscópica é composta de duas áreas quadradas, cada uma com lado de 14 cm. Após recortar, dobrar e colar, cada folha de papel cartão dará origem a um tubo de secção quadrada (na base maior) ou retangular (em qualquer outro ponto). Colocado na frente do monitor, um desses tubos permite que se observe uma das imagens sem ver a outra, e por isso é que facilita o alinhamento. Os dois tubos devem ser colados um ao outro pela face mais estreita, resultando em objeto como mostrado na figura 9. Devido a suas dimensões um pouco avantajadas, esse tubo duplo é muito frágil e flexível. Se o leitor julgar conveniente, pode reforçá-lo consideravelmente colando pequenas cantoneiras feitas com o próprio papel cartão, como sugerido na figura 9, mas isso não é realmente necessário.



Com suportes adequados posicionam-se o tubo e o aparelho a ser alinhado na frente do monitor como mostrado na figura 10.1. Com o monitor ligado e apresentando na tela uma imagem estereoscópica, inicia-se o processo de alinhamento.



Olhando por cima do aparelho, mas por dentro do tubo, é possível ver as duas imagens na tela do monitor, uma com cada olho; cada imagem aparece para o observador como independente uma da outra. A função do estereoscópio é produzir duas imagens refletidas de tal forma que a da direita pareça ter se movido para a esquerda, e a da esquerda pareça ter se deslocado para a direita, ocorrendo perfeita superposição das duas imagens no centro do campo; o observador terá então a impressão de estar vendo uma só imagem, e terá a nítida sensação de que está olhando para um objeto tridimensional.

As peças E e E' (já com os espelhos nelas colados) são colocadas em seu lugar aproximado, com a aresta aguda da peça tocando a borda do cartão da peça F (ou F') e formando com esta um ângulo aproximado de 45 (veja-se figura 11).


Observa-se agora a imagem do monitor através dos espelhos com um olho só de cada vez,1 e ajusta-se o ângulo entre a peça E e a peça F, movendo E lateralmente, para que a imagem fique centralizada (a imagem vista através dos espelhos deve ficar no meio entre as duas imagens da tela do monitor, que podem ser vistas olhando por cima do aparelho). Na figura 11 está representada a movimentação da peça E e a correspondente movimentação da imagem. Essa movimentação deve ser feita girando a peça E em torno de sua aresta aguda, que deve ser mantida sempre tocando a borda do cartão da peça F. A movimentação deve ser, também, muito pequena; o ângulo final entre E e F deve ser de aproximadamente 46,5, segundo cálculos teóricos; a diferença de apenas 1,5 (entre 46,5 e 45) corresponde a uma diferença na posição da imagem de cerca de 7 cm.

Após ajustar a posição lateral da imagem para cada olho separadamente, observa-se alternadamente com o olho esquerdo e com o direito, para certificar-se de que as duas imagens estão na mesma posição e para verificar se estão na mesma altura. Se as imagens estiverem em alturas diferentes, isso se deve a um pequeno defeito na base de apoio das peças E e/ou E' (essas peças não estão perfeitamente na posição vertical, como deveriam)2, que deve ser corrigido lixando essas bases com lixa n 150. Para determinar onde e como lixar procede-se da seguinte forma: observando com um olho de cada vez, compara-se a altura da imagem vista através dos espelhos com a altura da imagem na tela do monitor (vista por cima do aparelho, mas por dentro do tubo); se as imagens não estiverem na mesma altura, move-se a peça E tombando-a para frente e para trás para verificar qual o movimento que leva as imagens para a mesma altura, e quanto é necessário lixar do lado correspondente. Lixando um pouco e experimentando novamente, e repetindo essas operações conforme necessário, consegue-se um perfeito alinhamento em poucos minutos de trabalho.

Neste ponto já é possível ver a imagem em três dimensões, olhando-se com os dois olhos simultaneamente. As peças E e E' são então coladas em seu lugar, uma de cada vez, repetindo-se as operações de alinhamento antes da cola secar.

Quando a cola estiver bem seca, o aparelho já pode ser considerado em condições de uso; pode-se já parafusar a tampa e usar assim mesmo, mas os olhos do observador vêm, nessas circunstâncias, uma parte considerável do ambiente existente na lateral das imagens, o que distrai a atenção e incomoda. Para eliminar esse problema podem-se adicionar pequenas máscaras de papel cartão como descrito a seguir.

Recortam-se, de papel cartão preto, quatro peças com as medidas mostradas na figura 12.1; a mesma figura mostra como dobrar as peças, que são depois coladas em seus lugares como mostrado na figura 12.2. Naturalmente, a face preta do papel cartão deve ficar voltada para os olhos do observador.



Resta apenas fechar o aparelho. Cola-se papel cartão preto na face interna da tampa (peça B) e parafusa-se no lugar. Coloca-se então a peça C (se esta já não foi colocada) e o estereoscópio está pronto para ser usado. O tubo duplo da figura 9 pode ser descartado, pois não será mais necessário.

Para usar, basta colocar o estereoscópio na frente dos olhos, na posição normal de observação da tela do monitor; chegando um pouco para a frente e para trás encontra-se a posição ideal para observar a imagem tridimensional.

O protótipo foi testado por mais de 20 pessoas, sendo que apenas uma não conseguiu ver a imagem tridimensional. Esse protótipo encontra-se em uso em nosso laboratório e está à disposição de qualquer interessado que queira nos honrar com sua visita.

Quaisquer informações adicionais podem ser solicitadas pelo correio ou por telefone (016 - 6023747) ou pelo correio eletrônico (mgconsta@usp.br).

AGRADECIMENTO

Os autores agradecem ao Prof. Dr. Timothy J. Brocksom por suas valiosas sugestões.

NOTAS

1. Se o leitor tiver dificuldade de saber como posicionar os olhos, pode já fixar a peça C em seu lugar (figura 10.2).

2. Pode ser, evidentemente, que o verdadeiro defeito esteja nas peças D e/ou D', mas como estas já estão coladas, corrige-se pelas peças E e/ou E'.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Dez 2003
  • Data do Fascículo
    Jun 1998

Histórico

  • Aceito
    18 Jun 1997
  • Recebido
    31 Mar 1997
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