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Reações de Diels-Alder entre compostos carbonílicos a,b-insaturados e ciclopentadieno

Diels-Alder reactions between a,b- insaturated carbonyl compounds and cyclopentadiene

Resumo

We review herewith the use of solids such as activated alumina and other modern Lewis acid catalysts, as well as the influence of different solvents, including water, on the title reactions, described in the last seven years.

Diels-Alder reaction; Lewis acid; cyclopentadiene


Diels-Alder reaction; Lewis acid; cyclopentadiene

REVISÃO

Reações de Diels-Alder entre compostos carbonílicos a,b-insaturados e ciclopentadieno

Fernanda Ferraz Camilo e Jonas Gruber

Instituto de Química - Universidade de São Paulo - CP 26077 - 05599-970 - São Paulo - SP

Recebido em 6/3/98; aceito em 30/7/98

Diels-Alder reactions between a,b-insaturated carbonyl compounds and cyclopentadiene. We review herewith the use of solids such as activated alumina and other modern Lewis acid catalysts, as well as the influence of different solvents, including water, on the title reactions, described in the last seven years.

Keywords: Diels-Alder reaction; Lewis acid; cyclopentadiene.

INTRODUÇÃO

A reação de Diels-Alder é certamente uma das reações mais estudadas em química orgânica sintética devido à facilidade com que ligações C-C e anéis de seis membros podem ser formados.

O presente artigo discute os principais resultados publicados na literatura entre 1990 e 1997, de reações de Diels-Alder entre ciclopentadieno e compostos carbonílicos a,b-insaturados aquirais, realizadas em diferentes meios reacionais e com o emprego de diversos ácidos de Lewis.

Vale ressaltar que, apesar de as reações de Diels-Alder terem sido descobertas no início deste século, essas continuam sendo extensivamente estudadas até hoje. Por exemplo, consultando um banco de dados1 disponível pela Internet, que abrange os principais periódicos de química, encontra-se mais de seis mil citações que possuem a palavra chave "Diels-Alder" em seu título ou abstract, nos últimos sete anos, o que corresponde, em média, a mais de dois artigos novos por dia!

Cabe ressaltar que apenas trabalhos originais foram considerados para a elaboração desta revisão. Porém, é importante citar algumas das várias monografias de revisão2-19 e capítulos em livros-texto20-22 de química orgânica, que tratam desse assunto tão relevante.

A presente revisão foi dividida em três partes. A primeira abrange reações de Diels-Alder realizadas em condições heterogêneas como, por exemplo, reações sobre alumina, sílica, e argila. Na segunda parte é discutido o emprego de ácidos de Lewis em condições homogêneas. Finalmente, a última parte é dedicada a efeitos de solventes com ênfase a reações de Diels-Alder em meio aquoso.

Reações de Diels-Alder em condições heterogêneas

Em 1990, Hondrogiannis et al.23 estudaram a reação de Diels-Alder entre acrilato de metila (1) e ciclopentadieno (2) sobre alumina ativada a diferentes temperaturas (Esquema 1), notando a existência de uma forte dependência da proporção endo:exo com a temperatura de ativação da alumina. Nota-se na Figura 1 que quanto maior a temperatura de ativação da alumina, maior a proporção endo:exo. Uma explicação dada para este fato é que a alumina não-ativada contém uma camada exterior de grupos hidroxila e uma camada interior de cátions alumínio. Sob aquecimento, os grupos OH adjacentes reagem para produzir água, expondo cátions alumínio na superfície, o que proporciona o caráter de ácido de Lewis à alumina.


Experimentos demonstraram que os adutos endo (3) e exo (4) epimerizam. Dois mecanismos foram propostos para o processo de epimerização: via enolato e via retro Diels-Alder. A ocorrência da epimerização via retro Diels-Alder foi confirmada quando o aduto endo (3) tratado com alumina na presença de fumarato de dimetila (5) (dienófilo mais reativo do que acrilato de metila) gerou, além dos adutos endo (3) e exo (4) esperáveis, o aduto correspondente a reação de ciclopentadieno com fumarato de dimetila (6), conforme mostrado no Esquema 2.

No ano seguinte, Bains et al.24 mostraram a dependência da diastereosseletividade endo e exo nas reações de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e maleato de dimetila (7) com a temperatura de ativação da alumina (Esquema 3), destacando que a proporção endo:exo aumentava acentuadamente com o aumento da temperatura de ativação da alumina.

Um resultado bastante interessante obtido pelos autores foi que na reação entre maleato de dimetila (7) e ciclopentadieno (2) sob alumina ativada a 700oC, além dos adutos esperados (8) e (9), o aduto (6) correspondente à reação entre ciclopentadieno (2) e fumarato de dimetila (5), isômero geométrico do maleato de dimetila foi também encontrado. Mediante este fato, os três adutos obtidos (8), (9) e (6) foram tratados, isoladamente, com alumina ativada a 700oC por 20 horas, à temperatura ambiente (Tabela 1). Cada um desses compostos gerou dois outros adutos sob essas condições, com a ordem de reatividade sendo: (8) > (9) > (6). Desse modo, os autores concluíram que os adutos (8) e (9) resultantes da reação entre maleato de dimetila e ciclopentadieno, bem como o aduto (6) da cicloadição de fumarato de dimetila, epimerizam nessas condições. Eles consideraram a ocorrência da epimerização dos adutos (8), (9) e (6) sobre alumina ativada a 700oC por três mecanismos: via enolato, retro Diels-Alder e isomerização maleato de dimetila/fumarato de dimetila. Eles concluíram que a epimerização ocorria preferencialmente via enolato ao tratarem uma mistura de norbornenos (8) e (9) sobre alumina deuterada, ativada a 700oC por 20 horas, à temperatura ambiente e obterem os adutos recuperados (8), (9) e (6) extensivamente deuterados. Análises cuidadosas de espectros de massa desses norbornenos revelaram que eles foram deuterados exclusivamente nos dois carbonos adjacentes aos grupos carbometóxi (Esquema 4).

Um fato bastante curioso é que, conforme dito anteriormente, a epimerização dos adutos obtidos entre ciclopentadieno (2) e acrilato de metila (1) ocorre via retro Diels-Alder, enquanto que com fumarato de dimetila (6) ou com maleato de dimetila (7) ocorre via enolato. A presença de um segundo grupo carbometóxi, sacador de elétrons, torna os hidrogênios em b suficientemente ácidos, facilitando a ocorrência da epimerização desses adutos (8), (9) e (6) via enolato.

Pagni et al.25, em 1993, estudaram a reação entre acrilato de metila (1) e ciclopentadieno (2) sobre aluminas de várias atividades, ressaltando que a proporção massa:massa entre os reagentes e a alumina causa mudança significativa na diastereosseletividade endo:exo da reação (Tabela 2). Os resultados apresentados na Tabela 2 mostram que quando a proporção massa:massa entre os reagentes e a alumina é inferior a 1:2,5, a razão endo:exo permanece praticamente constante, enquanto que quando a massa de reagentes torna-se inferior à massa de alumina, a razão endo:exo passa a acompanhar o aumento da proporção massa:massa.

Baseando-se no trabalho de Berson26 em que a polaridade de um solvente pode ser estimada por W, definido como log (N:X), onde N e X são as quantidades de adutos endo e exo formados na reação de ciclopentadieno (2) e acrilato de metila (1) no solvente de interesse a 20 oC, Pagni et al. estimaram este valor de W para a alumina não-ativada.

Como os dados da Tabela 2 apresentavam as reações de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e acrilato de metila (1) realizadas a 50oC, as proporções endo:exo obtidas não puderam ser utilizadas para os cálculos de W. Assim, a razão endo:exo foi redeterminada a 20oC com baixa concentração de reagentes (1:10 proporção massa:massa de reagentes:alumina) e o valor encontrado foi 0,740. Eles concluíram que alumina não-ativada era mais polar que etanol (W=0,718) e acetonitrila (W=0,692), mas menos do que água (W=0,869) e metanol (W=0,845). Não foi possível determinar W para alumina ativada, pois nesse caso a alumina tem caráter de ácido de Lewis, o que altera a proporção endo:exo, independentemente da polaridade do solvente.

Uma série de reações foi efetuada sobre alumina não-ativada e ativada a 200oC, 300oC e 400oC, em duas proporções massa:massa entre alumina e reagentes, e a 800oC, em uma única proporção. Todas as reações foram feitas a 50oC, por cinco horas, com exceção do ensaio sobre alumina ativada a 800oC, o qual foi realizado à temperatura ambiente por 24 horas. Em cada caso observou-se um comportamento geral, onde a proporção de aduto endo (3) aumentava gradualmente de alumina não-ativada para alumina ativada a 400oC. Inesperadamente, a proporção endo:exo diminuiu para 0,93 quando a reação foi feita sobre alumina ativada a 800oC. Para interpretar esse resultado, os autores analisaram a ocorrência de epimerização nas condições reacionais. Eles confirmaram a ocorrência de epimerização quando uma mistura, cuja proporção endo:exo era de 13,8:1, foi submetida à alumina ativada a 800 oC por cinco horas a 65 oC , resultando numa proporção de 0,83:1. Dois mecanismos para a ocorrência de epimerização foram considerados: via enolato e o outro via retro Diels-Alder. Novamente, o trapeamento do ciclopentadieno com um dienófilo mais reativo que o acrilato de metila (1), como fumarato de dimetila (5), durante o tratamento do aduto endo (3) sobre alumina ativada, confirmou a ocorrência de retro Diels-Alder.

Em 1995, Cativiela et al.27 estudaram a reação entre ciclopentadieno (2) e os dienófilos (Z)- e (E)-2-fenil-4-benzilideno-5(4H)-oxazolona (10) em diferentes condições reacionais (Esquema 5). O emprego desses dienófilos em reações de Diels-Alder é um tanto limitado devido à isomerização entre os isômeros Z e E na presença de ácidos de Lewis ou por aquecimento. Vale lembrar que as reações de Diels-Alder desses dienófilos são passos chaves na síntese de a-amino ácidos cíclicos.

Na Tabela 3 apresentamos os resultados mais relevantes relatados pelos autores, onde notamos que o emprego de sílica-gel tratada com TiCl4 e Et2AlCl foi eficiente apenas nas reações realizadas a baixas temperaturas e sem solventes, onde ocorre um reduzido grau de isomerização Z e E.

Na reação entre ciclopentadieno (2) e (10b), o uso de ácidos de Lewis em solução foi descartado devido à extensa conversão para o isômero mais estável Z (10a).Nesta reação o emprego de sílica-gel, alumina tratada com Et2AlCl e alumina tratada com TiCl4 não foi satisfatório devido à alta taxa de isomerização. Este inconveniente foi amenizado quando os experimentos foram realizados a baixas temperaturas, porém este procedimento também ocasionou a redução da velocidade reacional e, nesses casos, baixos níveis de conversão foram encontrados. Cloreto de zinco sobre sílica-gel, que não promoveu a reação entre ciclopentadieno (2) e (10a), foi muito eficiente na reação de (10b). Sílica-gel tratada com TiCl4 também forneceu bons resultados, suprimindo quase completamente a isomerização Z e E.

Como podemos observar, as reações realizadas na ausência de solventes forneceram melhores resultados do que aquelas realizadas na presença deles.

Quanto à diastereosseletividade endo e exo, na reação entre o dienófilo (10a) e ciclopentadieno (2), formou-se preferencialmente o aduto exo (12a) em todas as condições testadas. No caso de (10b), entretanto, esta seletividade dependeu do sólido empregado, ou seja, com sólidos pouco eficientes o aduto endo (11b) foi preferencial, enquanto que com sólidos mais eficientes, foi o produto exo (12b). Interações estéricas entre dieno e dienófilo podem explicar este comportamento. Assim, quando o grupo fenila ligado a dupla ligação está coplanar com o resto da molécula sua interação com o grupo metileno do ciclopentadieno torna a abordagem exo ao grupo fenila difícil, portanto o produto obtido terá esse grupo em posição endo nos adutos formados. A coordenação de um ácido de Lewis com o grupo carbonila não modifica a conformação de (10a), mas desvia o grupo fenila da coplanaridade em (10b). Neste caso, a influência estérica do grupo fenila torna-se particularmente importante para a parte diênica do dieno quando a abordagem ocorre endo em relação ao grupo fenila.

Muitos outros sólidos, além dos apresentados na Tabela 3, como sílica, alumina, alumina tratada com TiCl4 ou Et2AlCl, ZnCl2 suportado sobre sílica-gel, e K10-montmorilonita modificada com Ti(IV) e Cu(II) foram testados na reação entre (10a) e ciclopentadieno (2), no entanto os rendimentos obtidos ficaram abaixo de 15%.

No mesmo ano, os mesmos autores28 continuaram a relatar o emprego de inúmeros sólidos, desta vez sobre a reação entre ciclopentadieno (2 e o dienófilo N-acetil-a,b-dehidroalaninato de metila (13), (Esquema 6) e (Tabela 4). As reações realizadas na ausência de solvente forneceram porcentagens de conversão, após 24 horas, muito mais elevadas do que aquelas obtidas para reações em solução, na presença do mesmo sólido. Por exemplo, na presença de SiO2 tratada com Et2AlCl, a reação entre N-acetil-a,b-dehidroalaninato de metila (13) e ciclopentadieno (2) em tolueno a 25oC, não ocorreu após 24 horas, enquanto que a mesma reação, na ausência de solvente, resultou em 95% de conversão após o mesmo período.

Nas reações sem solvente e a 25oC, o emprego de SiO2 e Al2O3 modificadas pelo tratamento com ácidos de Lewis forneceu as maiores taxas de conversão após 24 horas, sendo os derivados de titânio mais eficientes do que os análogos de alumínio. Entre as argilas, a K10-Ti(IV), calcinada a 500oC, foi a que apresentou maior taxa de conversão. Nota-se também que não foram encontradas alterações relevantes nas proporções endo:exo com os diferentes sólidos utilizados.

McGinnis et al.29,em 1996, estudaram o emprego de uma série de boronatos de alumina e outros ácidos de Lewis na reação de acrilato de metila (1) com ciclopentadieno (2). Os resultados obtidos na presença de boronatos de alumina, cloreto e brometo de borocatecol, alumina ativada e não-ativada, tricloreto de alumínio e uma solução de perclorato de lítio em éter estão apresentados na Tabela 5.

Nota-se que os maiores rendimentos foram alcançados nas reações realizadas com solvente. Por exemplo, sobre BBr/Al2O3, um rendimento de 88% foi conseguido em tolueno após uma hora, no entanto apenas 18% foi obtido na ausência de tolueno após quatro horas. Para os três outros boronatos de alumina (BF3/Al2O3, BCl1,5/Al2O3, BI/Al2O3), não mais do que 1% de rendimento foi obtido na ausência de solvente. As reações realizadas na presença de boronatos de alumina em tolueno, com exceção da reação na presença de BF3/Al2O3, forneceram bons rendimentos.

Quanto à diastereosseletividade endo:exo, observamos que as proporções endo:exo encontradas para as reações realizadas na presença de boronatos de alumina em tolueno eram similares àquelas encontradas nas reações catalisadas por brometo e cloreto de borocatecol (ácidos de Lewis muito fortes) porém acentuadamente inferiores àquelas obtidas nas reações com cloreto de alumínio e alumina ativada a 400 oC. Assim, embora a acidez de Lewis desempenhe um papel fundamental na reação de Diels-Alder por modificar a magnitude da energia do orbital LUMO do dienófilo e, portanto, facilitar a ocorrência de reações de Diels-Alder, neste caso não existe nenhuma correlação direta entre acidez e seletividade endo:exo. Exemplificando, BBr/Al2O3 e BI/Al2O3 com Ho £ -13,2 forneceram menor diastereosseletividade endo:exo do que alumina ativada a 400 oC que possui Ho £ -8,2.

Reações de Diels-Alder em condições homogêneas

Em 1990, Rao et al.30 reportaram o uso de fermento de pão nas reações entre ciclopentadieno (2) e os dienófilos (16) e (17), Esquema 7 e Tabela 6.

Como podemos observar, na ausência do biocatalisador, a maioria das reações forneceu misturas de isômeros com predominância do aduto endo, em meio aquoso e orgânico. No entanto, nas reações entre os dienófilos (16a), (16b) e (17b) e ciclopentadieno, na presença da enzima, obtiveram-se predominantemente adutos exo (19a), (19b) e (21b), respectivamente, contrariando a regra endo de Alder. Apenas o dienófilo (17a) continuou a fornecer maior proporção de aduto endo (20a).

No ano seguinte, Dols et al.31 estudaram a reação entre 4-acetoxiciclopentenona (22) e ciclopentadieno (2), na presença de diferentes ácidos de Lewis. A subseqüente eliminação induzida por base do grupo b-acetóxi a partir dos adutos (23) ou (24) levou à triciclo enona (25), conforme Esquema 8. É interessante notar que a rota aparentemente mais direta para o produto (25) seria através da cicloadição entre ciclopentadienona e ciclopentadieno, entretanto, esta não foi a escolhida, pois o dienófilo utilizado nesse caso, ciclopentadienona, tem forte tendência a polimerizar. Assim, a 4-acetoxiciclopentenona (22) foi considerada como um possível equivalente sintético da ciclopentadienona em reações de Diels-Alder. Ácidos de Lewis foram empregados devido à baixa reatividade do dienófilo (22). Exemplificando, na presença de cloreto de alumínio, a reação ocorreu rapidamente, fornecendo diretamente o produto (25) com 61% de rendimento. Entretanto, com um ácido de Lewis mais fraco, como cloreto de zinco, obtiveram-se os adutos (23) e (24) na proporção de 3:1, os quais após o tratamento com uma solução 1 mol.L-1 de hidróxido de potássio forneceram o produto (25). A proporção maior do aduto (23) pode ser racionalizada, em termos de efeito estérico, ou seja, o estado de transição que leva ao aduto (24) apresenta maior impedimento estérico do que foi aquele encontrado em (23), Figura 2.


Outros dienos menos reativos do que o ciclopentadieno, tais como cicloexadieno e 2,3-dimetilbutadieno, foram testados, porém nessas reações houve a necessidade do emprego de altas pressões, além do uso de ácidos de Lewis.

Dois anos depois, Howarth et al.32 relataram as reações de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e crotonaldeído (26), metacroleína (27), metilvinilcetona (28) e metacrilato de metila (29) na presença de quatro compostos de enxofre (30)-(33), Esquema 9 e Tabela 7.

Os resultados da Tabela 7 mostram que os compostos (30) e (31) são bons catalisadores, fornecendo bons rendimentos e alta seletividade endo:exo, em apenas uma hora de reação, (32) e (33) têm eficiência menor. Segundo os autores, futuras investigações seriam realizadas para estabelecer em que extensão esses ácidos de Lewis poderiam ser usados em processos sintéticos e a natureza de suas interações.

No mesmo ano, Braddock et al.33 estudaram a reação entre ciclopentadieno (2) e monotionofumarato de dimetila (34) na presença de uma ampla variedade de ácidos de Lewis (Esquema 10 e Tabela 8). O interesse nessa reação é que o dienófilo em questão possui dois grupos susceptíveis a complexação por ácidos de Lewis, o grupo carbonila C=O e o grupo tiocarbonílico C=S. Nas reações onde o ácido de Lewis empregado complexar com o grupo C=O, maior proporção do aduto (36) será obtido, cujo grupo C=O encontra-se em posição endo. Entretanto, se a complexação ocorrer no grupo C=S, o produto (35) será formado preferencialmente.

Os autores observaram que sem o emprego de ácidos de Lewis, as reações entre o dienófilo (34) e ciclopentadieno forneceram proporções dos adutos (35):(36) similares, independentemente do solvente utilizado. A maior porcentagem do aduto (35) indicou que o grupo tiocarbonílico apresenta maior tendência em ocupar a posição endo do que o grupo carbonílico.

Realizando estudos de RMN 1H, os autores notaram que no espectro do composto (34) na presença de Eu(fod)3 apenas os prótons metila do grupo éster tinham seu deslocamento químico alterado. Isto indicou que o Eu(fod)3 ligava-se exclusivamente ao grupo carbonílico e portanto deveria resultar em um grande aumento na quantidade de aduto (36), e quando introduzido na reação, entretanto, o resultado não foi tão relevante, comparado às reações não-catalisadas, já que a proporção de adutos (35) e (36) sofreu apenas uma pequena alteração. Outros ácidos de Lewis duros ocasionaram uma maior alteração na proporção de adutos (35):(36), em favor do endo-éster (36). Por exemplo, o emprego de BCl3 forneceu este produto (36) quase que exclusivamente, ao mesmo tempo que causou substancial aceleração na velocidade da reação. Ácidos de Lewis moles apresentaram tendência inversa. Exemplificando, com trifluormetanossulfonato de cobre(II), obteve-se uma razão de 90:10 em favor do aduto endo-tionéster, indicando que a complexação do ácido de Lewis ocorreu preferencialmente no grupo tiocarbonílico.

Na presença de BF3·Et2O uma proporção de 94:6 foi observada a favor do endo-tionéster (35), indicando que o átomo de enxofre foi o sítio preferido da complexação do BF3 durante esta cicloadição. Esse resultado foi inesperado pois haletos de boro são considerados ácidos de Lewis duros34. Cabe ressaltar que na literatura existem inúmeros relatos contraditórios sobre a preferência da complexação do átomo de boro com o grupo carbonílico ou tiocarbonílico35.

No ano seguinte, Maruoka et al.36 elaboraram um estudo para a obtenção de seletividade exo, usando um ácido de Lewis recentemente desenvolvido. Eles estudaram as reações de Diels-Alder entre diferentes compostos carbonílicos a,b-insaturados (37) e ciclopentadieno (2) na presença de tris(2,6 difenilfenolato) de alumínio (ATPH), Esquema 11 e Tabela 9.

Estudos de RMN 1H do complexo isopropenilmetilcetona/ATPH (40), Figura 3, em solução de diclorometano a 20oC, mostraram que o ATPH protege o carbono carbonílico, ocasionando um deslocamento para campo mais alto dos prótons do dienófilo. Particularmente, os prótons dos grupos metila (CH3a e CH3d) adjacentes ao carbono carbonílico são os mais atingidos, possivelmente por causa da proximidade da nuvem eletrônica dos anéis aromáticos do catalisador (Tabela 10).


Baseando-se em dados de RMN 1H e raios-X, os autores propuseram uma conformação plausível do complexo isopropenilmetilcetona/ATPH e um possível estado de transição para a reação de Diels-Alder entre esse complexo e ciclopentadieno (2). No complexo sugerido (40), a dupla ligação C=C é estabilizada por uma interação p com um dos anéis aromáticos do ATPH o que ocasiona o posicionamento de um segundo grupo fenila numa posição tal que o ataque do ciclopentadieno por este lado torna-se difícil.

No mesmo ano, Weghe e Collin37 interessaram-se pelo emprego de diiodeto de samário, SmI2, nas reações de Diels-Alder de diferentes compostos carbonílicos a,b-insaturados com ciclopentadieno em diclorometano (Tabela 11). Como podemos notar, nas reações entre a maioria dos dienófilos (41), (28), (1) e (42) e ciclopentadieno (2), o produto endo foi sempre o isômero majoritário, exceto na reação com o dienófilo (27), onde o isômero exo apresentou-se como produto principal.

Comparado a outros derivados de lantanídeos, SmI2 apresentou uma ampla atividade. Por exemplo, cloretos de lantanídeos (III) não catalisam a reação de Diels-Alder entre ciclopentadieno e acroleína (41) ou acrilato de metila (1), e Yb(fod)3 não induz qualquer reação entre ciclopentadieno (2) e cetonas a,b-insaturadas.

Considerando as condições reacionais brandas e a pequena quantidade necessária, SmI2 é um ótimo catalisador, podendo ser empregado, com sucesso, como alternativa ao uso de Eu(fod)3 ou Yb(fod)3.

Kobayashi et al.38, em 1995, interessaram-se pela preparação de alguns amidetos metálicos e pelo emprego desses compostos na reação de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e metilvinilcetona (28) em diclorometano ou éter dietílico a 20 oC (Esquema 12). Os resultados encontrados em éter dietílico estão apresentados na Tabela 12 e em diclorometano na Tabela 13. Observando os resultados, nota-se que os amidetos metálicos foram mais efetivos do que os correspondentes cloretos e triflatos.

Em diclorometano (Tabela 13), o decréscimo da solubilidade dos amidetos de magnésio e lantânio, devido à presença de grupos perfluoroalquilsulfonila mais longos, ocasionou o decréscimo da atividade catalítica desses amidetos, em ambas as concentrações, 1 e 9 mol %, de catalisadores (kobs relativo: Mg(NTf2)2 > Mg(NTfSO2C4H9) 2> Mg(NTfSO2C8H17) 2; La(NTf2)3 > La(NTfSO2C4H9) 3> La(NTfSO2C8H17) 3). Por outro lado, em éter etílico (Tabela 12), com 1 mol % de amidetos de lantânio, a ordem da atividade catalítica foi inversa (La(NTfSO2C8H17) 3 > La(NTfSO2C4H9) 3 > La(NTf2)3), o que está de acordo com a estabilidade intrínseca dos ânions amidetos em fase gasosa.29 Entretanto, nas reações realizadas com 9 mol % de catalisador em éter etílico, a menor solubilidade de La(NTfSO2C8H17) 3 causou decréscimo da atividade catalítica em comparação ao La(NTfSO2C4H9) 3.

Nas reações entre metilvinilcetona (28) e ciclopentadieno (2) na presença de amidetos de lantânio, as velocidades reacionais aumentaram em ambos os solventes testados. Entretanto, a seletividade endo:exo não teve o mesmo comportamento nos dois solventes, aumentando em diclorometano, mas reduzindo em éter dietílico, em comparação com os resultados das reações não-catalisadas.

No ano seguinte, Yamauchi et al.40 reportaram o estudo das reações de Diels-Alder entre os dienófilos (43a)-(43c) e ciclopentadieno (2) na ausência e na presença de diversos ácidos de Lewis (Esquema 13) e (Tabela 14). Na ausência de catalisador, o dienófilo (43b) forneceu uma mistura de adutos endo e exo, sendo o aduto endo (44b) o principal. Cabe ressaltar que a diastereosseletividade endo:exo foi inversa, quando a reação foi realizada na presença de ácidos de Lewis. Nas mesmas condições reacionais, os rendimentos encontrados na presença de BF3·Et2O, foram mais baixos do que aqueles encontrados na presença de cloreto de zinco.

Na ausência de ácido de Lewis, a reação com o dienófilo (43c) apresentou diastereosseletividade inferior àquela encontrada para o dienófilo (43b), e o isômero exo (45c) foi o principal. Entretanto, na presença de ácidos de Lewis, a seletividade exo obtida foi similar à encontrada nas reações com (43b).

Dentre os quatro confôrmeros possíveis do composto (43), os autores encontraram, baseados em cálculos MNDO, a conformação mais estável (Figura 4). Para a conformação mais estável do composto (43b), os autores estimaram que o coeficiente do carbono carbonílico benzoíla era maior do que do carbono carbonílico do éster e consequentemente sua interação secundária com o dieno era mais forte e, portanto, o composto (44b) foi formado preferencialmente (Figura 5). No caso do composto (43c), entretanto, o coeficiente do carbono carbonílico acetila é maior do que o coeficiente do carbono carbonílico benzoíla e é esse que mantém uma interação secundária mais forte com o dieno, resultando no produto (45c), conforme a Figura 6.




Já, para explicar a predominância do isômero exo nas reações realizadas na presença de ácidos de Lewis, os autores recorreram a cálculos de mecânica molecular, onde estimaram a conformação mais estável do complexo dienófilo-ácido de Lewis. Esse complexo possui o anel aromático perpendicular a dupla ligação, provocando a obstrução da abordagem do ciclopentadieno por esse lado, assim nas reações entre os dienófilos (43a)-(43c) e ciclopentadieno na presença de ácidos de Lewis os produtos majoritários terão o anel aromático em posição exo (Figura 7).


Em 1996, Caulier e Reisse41 estudaram a influência do ultrassom na velocidade e diastereosseletividade da reação de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e metilvinilcetona (28), Tabela 15. Vale ressaltar que as reações foram realizadas em condições completamente homogêneas, portanto o efeito mecânico de agitação provocado pelo ultrassom não foi levado em consideração. Como podemos notar, tanto o rendimento como a proporção endo:exo das reações realizadas em solventes clorados e bromados aumentaram na presença de ultrassom, enquanto que não foram afetados em solventes não-halogenados.

Para explicar o efeito acelerador do ultrassom nas reações realizadas em solventes halogenados, os autores sugeriram que essas estavam sujeitas à catálise ácida realizada por um haleto de hidrogênio, gerado na sonólise das moléculas de solvente, seguido por abstração de um hidrogênio42. Para confirmar essa hipótese os autores decidiram realizar alguns experimentos resumidos na Tabela 16.

A pressonicação do solvente ou a solubilização de uma pequena quantidade de HCl gasoso em diclorometano na ausência de ultrassom, antes do início da reação, resultou em efeitos cinéticos e estereoquímicos similares àqueles obtidos com ultrassom em solventes halogenados, confirmando a hipótese sugerida pelos pesquisadores.

Em 1997, Garrigues et al.43 investigaram os primeiros exemplos de reações de Diels-Alder catalisadas por derivados de bismuto(III), em comparação com alguns ácidos de Lewis análogos bem conhecidos pela sua eficiente atividade catalítica. Estudando a reação entre ciclopentadieno (2) e metilvinilcetona (28), os pesquisadores relataram que, na presença de 10 mol % de Sc(OTf)3, obtiveram 96% de rendimento após 12 horas. Sob as mesmas condições, 1 mol % de Bi(OTf)3 forneceu 87% de rendimento após quatro horas, 10 mol % de BiCl3 resultaram no mesmo rendimento após apenas duas horas e a seletividade endo:exo foi um pouco mais alta (93:7 e 95:5, respectivamente) do que com Sc(OTf)3 (89:11).

Outras reações de Diels-Alder entre diferentes dienos (2,3-dimetilbutadieno e isopreno) e vários dienófilos (etilvinilcetona, acroleína (41) e metacroleína (27)) foram efetuadas na presença de derivados de bismuto(III). Frente a todos os resultados obtidos, os autores afirmaram que sais de bismuto (III) são ácidos de Lewis mais eficientes do que os análogos de Sc, Ti, Sm ou Yb por fornecerem maior rendimento e diastereosseletividade endo:exo.

Em 1997, Nie et al.44 reportaram o uso de Cu(NTf2)2 e outros amidetos metálicos na reação entre ciclopentadieno (2) e metilvinilcetona (28) em diclorometano, determinando as constantes de velocidade observadas (kobs) relativas e as proporções endo:exo, Tabela 17. Analisando os resultados, observa-se que a ordem crescente de atividade catalítica, em diclorometano, dos metais alcalinos e alcalinos terrosos é Mg2+> Ca2+> Li+. A hidratação do sal de magnésio causou redução na velocidade reacional, devido ao fato de que moléculas de água diminuíram a acidez do íon metálico.

Os amidetos de metais de transição e lantanídeos, tais como Zn(NTf2)2, La(NTf2)3 e Cu(NTf2)2 mostraram-se como ácidos de Lewis mais efetivos do que os correspondentes cloretos e triflatos, tais como ZnCl2, La(OTf)3, CuCl2, respectivamente. A maior reatividade do La(NTf2)3 comparada a do La(OTf)3 é um bom exemplo da eficiência de amidetos metálicos como ácidos de Lewis. Essa eficiência deve-se ao ânion NTf2-, fracamente coordenante, cujo centro aniônico é altamente delocalizado e estabilizado por grupos triflatos. Vale a pena ressaltar que a interação entre o cátion e o ânion emprega um papel muito importante na atividade catalítica do complexo metálico, ou seja, o íon metálico pareado com ânions não-coordenantes ou pouco-coordenantes em solventes fracamente coordenantes como diclorometano e tolueno aumentam a acidez de Lewis desses cátions.

Em contraste ao efeito catalítico do CuCl2·2H2O, a eficiência de Cu(NTf2)2 foi tão extraordinária que a reação realizada com 1 mol % de Cu(NTf2)2 seco terminou em minutos a 20oC. Segundo os pesquisadores, a investigação do mecanismo da reação catalisada por Cu(NTf2)2 está em andamento.

Gruber e Camilo45, estudaram as reações de Diels-Alder de tiocinamatos (46) e cinamatos (47) de metila p-susbtituídos com ciclopentadieno na presença de brometo de borocatecol (um equivalente), Esquema 14. Os autores obtiveram altos rendimentos para todos os tiocinamatos p-substituídos estudados, exceto p-metoxitiocinamato de metila (46d), além de total diastereosseletividade endo. No caso dos ésteres, a diastereosseletividade encontrada foi menor, identificando-se pequenas quantidades de aduto exo para os cinamatos de metila cloro-(47b), nitro-(47e) e não-substituído (47a). Exceto para p-metilcinamato de metila (47c) e p-metoxicinamato de metila (47d), todos os outros três cinamatos forneceram bons rendimentos. Cabe ressaltar que muitos outros ácidos de Lewis, tais como Ti(OBu-n)4, ZnCl2, BF3·OEt2, TiCl4, BBr3, AlCl3 foram testados, no entanto nenhum deles foi eficiente.

Segundo os autores, a baixa reatividade dos dienófilos em questão deve-se à presença do anel aromático conjugado à dupla, o qual cede elétrons a essa, tornando-a pouco susceptível ao ataque do dieno.

Para explicar a eficiência do brometo de borocatecol frente às reações testadas, os autores levantaram duas hipóteses. A primeira refere-se à forte complexação do oxigênio carbonílico com o átomo de boro do ácido de Lewis, deixando a dupla conjugada carente de elétrons e mais susceptível ao ataque do dieno e, a segunda, à estabilização do estado de transição decorrente da interação secundária entre o átomo de boro (a) do brometo de borocatecol e a dupla ligação incipiente (b) (Figura 8).


Influência de solventes sobre reações de Diels-Alder

Em 1991, Blokzijl et al.46,relataram um estudo detalhado das reações intermoleculares entre ciclopentadieno (2) e os dienófilos alquilvinilcetonas (28) e (48) e 1,4-naftoquinonas (49a)-(49c), e da reação intramolecular do ácido N-furfuril-N-metilmaleâmico (50), em meio aquoso (Esquema 15).

Os autores relataram que as constantes de velocidade de segunda-ordem obtidas para a cicloadição dos dienófilos (28) e (48) e (49a)-(49c) com ciclopentadieno (2) em água eram, respectivamente, aproximadamente 200 e 5800 vezes maiores do que em n-hexano, e a cicloadição intramolecular do substrato (50) apresentava similar aceleração. A diastereosseletividade endo:exo, em meio aquoso, foi significativamente diferente do que em solventes orgânicos convencionais, sendo o produto endo, já dominante nesses solventes, ainda mais favorecido em água. A preferência do produto endo em meio aquoso foi facilmente racionalizada, baseando-se no fato de que o complexo ativado que conduz ao aduto endo é significativamente mais compacto do que o que leva ao aduto exo e, portanto, acarreta uma contribuição entrópica favorável durante esse processo de ativação.

O empacotamento hidrofóbico entre dieno e dienófilo, que até então era freqüentemente sugerido como o principal motivo da aceleração de velocidade em reações de Diels-Alder em água, era difícil de conciliar com o aumento de velocidade, obtido na reação intramolecular de (50), que era da mesma magnitude que o encontrado em reações intermoleculares. Assim, os autores sugeriram uma outra hipótese, levando-se em conta parâmetros termodinâmicos envolvidos na reação em meio aquoso. Eles propuseram que, nas reações de Diels-Alder em meio aquoso, apesar da formação de uma cavidade em água para acomodar um soluto apolar ser um processo entrópica e entalpicamente desfavorável, a formação da camada de hidratação hidrofóbica e a redução da superfície hidrofóbica e do volume de hidratação durante o processo de ativação ocasionaria ganhos de entropia e entalpia suficientes para que o processo global fosse favorável.

Os autores anteciparam que reações orgânicas de substratos neutros acompanhadas de redução significativa de volume molecular, bem como da área superficial acessível ao solvente durante o processo de ativação, seriam consideravelmente aceleradas em meio aquoso.

Em 1992, Katagiri et al.47 realizaram inúmeras reações entre ciclopentadieno (2) e acetoximetilenomalonato de dimetila (51) em uma ampla variedade de solventes, contendo perclorato de lítio e sob alta pressão sem catalisador (Esquema 16), a fim de avaliarem o motivo pelo qual perclorato de lítio acelera consideravelmente reações de Diels-Alder (Tabela 18). Nota-se que o emprego de perclorato de lítio, independentemente do solvente ou da concentração, na maioria dos casos forneceu altos rendimentos e proporção endo:exo igual a dois. Em metanol, observou-se apreciável decréscimo do rendimento. Vale ressaltar que embora os rendimentos encontrados na presença de perclorato de lítio sejam menores do que aqueles obtidos sob alta pressão, a diastereosseletividade endo:exo é muito superior.

Levando-se em conta que os acréscimos nos rendimentos das reações realizadas na presença de perclorato de lítio independiam de sua concentração, os autores sugeriram que este sal seria eficiente não apenas em sua solução etérea 5M, onde haveria um pressão interna elevada como afirmaram Grieco et al.48

Assim, os pesquisadores, baseando-se na similaridade das proporções endo:exo obtidas para as reações realizadas na presença de tetracloreto de titânio e perclorato de lítio, sugeriram que perclorato de lítio poderia estar atuando como tetracloreto de titânio, ou seja, um ácido de Lewis bidentado (Figura 9).


Otto e Engberts,49 em 1995, investigaram a reação entre 3-(p-nitrofenil)-1-(2-piridil)-2-propeno-1-ona (52a) e ciclopentadieno (2) na presença de diferentes ácidos de Lewis em vários solventes (Esquema 17) e (Tabela 19).

Nota-se que a reação de (52a) com ciclopentadieno (2) é bastante lenta em etanol e acetonitrila, entretanto um aumento significativo na velocidade reacional foi observado em meio aquoso. A introdução de pequenas quantidades de ácidos de Lewis, particularmente cobre(II), levou a reações ainda mais rápidas. Os autores sugeriram que as reações em questão na presença de ácidos de Lewis procediam via um complexo ativado esquematicamente apresentado na Figura 10.


Comparando as constantes de velocidade de segunda-ordem obtidas para a reação de (52a) com ciclopentadieno (2) em soluções 0,010 M de nitrato de cobre(II)em etanol e água, os autores observaram que o efeito acelerador da água ainda estava presente na reação com ácido de Lewis.

Segundo os pesquisadores, resultados preliminares mostraram que a reação em questão é acelerada por outros ácidos de Lewis, como Co(NO3)2, Ni(NO3)2, Zn(NO3)2, embora sejam menos eficientes do que Cu(NO3)2. A ordem relativa da atividade catalítica dos ácidos de Lewis testados (Co2+ < Ni2+ < Cu2+ >> Zn2+) está em acordo com as constantes de estabilidade reportadas para complexos desses íons metálicos com vários agentes quelantes50.

No mesmo ano, Engberts51 apresentou um estudo abrangente sobre o efeito da água em reações de Diels-Alder, estudando várias reações sob inúmeros pontos de vista. Os principais tópicos sumarizados desse artigo estão relatados abaixo.

Inicialmente, o autor descreveu as reações entre ciclopentadieno (2) e naftoquinonas 5-substituídas, (49a), (49b) e (53a)-(53c), em meio aquoso (Esquema 18) e (Tabela 20). Observa-se um aumento de velocidade em todas as reações quando água é utilizada como solvente. Entretanto, como esse aumento foi distinto para cada grupo R, o autor afirmou que a aceleração de velocidade em água depende acentuadamente da natureza do dienófilo. Entre os álcoois empregados como solventes, nota-se que as maiores constantes de velocidades foram obtidas na presença daqueles com maior capacidade em formar ligação de hidrogênio. Entretanto, o aumento de velocidade em água, menos ácida do que o HFP, foi o mais alto entre todos os solventes testados, provavelmente devido ao seu tamanho pequeno e a disponibilidade de dois sítios doadores de hidrogênio.

Parâmetros de ativação termodinâmicos foram outro tópico estudado pelo autor. Ele os determinou para as reações entre ciclopentadieno (2) e os dienófilos (49a), (49b) e metilvinilcetona (28) em água e 1-propanol (Tabela 21). As energias de Gibbs de ativação foram 10-15 kJ·mol-1 mais favoráveis em água do que em 1-propanol e ambos, entropias e entalpias de ativação contribuíram para esta redução de , porém, geralmente, o termo entrópico contribuiu mais.

Para interpretar o efeito da água em reações de Diels-Alder, o autor decidiu estudar, baseando-se em parâmetros termodinâmicos, a reação de Diels-Alder entre ciclopentadieno (2) e etilvinilcetona (48) em 1-propanol/água sob uma ampla variedade de frações molares, obtendo resultados que são apresentados graficamente na Figura 11. Como podemos notar, o estado inicial foi fortemente desestabilizado na região rica em água (x(H2O) > 0,8), contrastando com o estado de transição, que apresentou pequenas alterações no DGq sobre toda faixa de composição do solvente. Desse modo, em meios aquosos ou altamente aquosos, o estado de transição é menos desestabilizado do que o estado inicial e, portanto, as reações são mais rápidas do que em solventes não-aquosos. Para explicar essa diferença de comportamento entre o estado de transição e o estado inicial, o autor sugeriu dois fatores: (a) ligação de hidrogênio: o estado de transição é mais polarizado do que o estado inicial, assim o grupo carbonílico polarizado no estado de transição foi melhor estabilizado por ligação de hidrogênio do que o grupo carbonílico do estado inicial; (b) interação hidrofóbica forçada: o processo de ativação da cicloadição concertada envolve uma redução da área superficial hidrofóbica, o que leva a um ganho de entropia que é expresso pelo decréscimo da energia de Gibbs.


Em 1996, Otto et al.52 estudaram as reações entre 3-fenil-1-(2-piridil)-2-propen-1-onas (52a)-(52e) e ciclopentadieno (2) em água e outros solventes orgânicos na presença de diferentes ácidos de Lewis (Esquema 19), avaliando a influência da água e dos ácidos de Lewis simultaneamente.

Inicialmente, eles verificaram o efeito de solventes na reação de (52a) com ciclopentadieno (2) (Tabela 22). Nota-se que a reação em questão é muito rápida em água e, surpreendentemente, é ainda mais rápida em 2,2,2-trifluoretanol, provavelmente devido a sua maior capacidade em formar pontes de hidrogênio.

Posteriormente, para avaliarem o efeito de solventes em reações realizadas na presença de ácidos de Lewis, os autores determinaram as constantes de velocidade da reação entre (52c) e ciclopentadieno (2) em diferentes solventes na presença de Cu2+ (Tabela 23). Observa-se um grande aumento de velocidade, independentemente dos solventes utilizados. É interessante notar que o grande efeito de solvente observado na reação não-catalisada (Tabela 22) foi reduzido na reação catalisada (Tabela 23), sugerindo que a aceleração de velocidade ocasionada pela ligação de hidrogênio feita até então pelo solvente na reação não-catalisada é, dessa vez, assumida pela complexação do ácido de Lewis com o dienófilo, formando um quelato.

As constantes de velocidade das reações catalisadas por cobre(II) entre (52a)-(52e) e ciclopentadieno (2) em quatro solventes foram determinadas para verificar a influência dos substituintes. Os pesquisadores encontraram boas correlações de Hammett com s+ em todos os quatro solventes, indicando uma interação do substituinte, através de ressonância direta, com um centro reativo positivo.

O efeito do solvente sobre a diastereosseletividade endo:exo na reação catalisada e não-catalisada por cobre(II)entre (52c) e ciclopentadieno (2) também foi estudado (Tabela 24). Na reação não-catalisada, o isômero endo foi predominante, sendo esta tendência mais pronunciada em solventes mais polares. Entretanto, nas reações catalisadas por cobre(II), a diferença entre a diastereosseletividade endo:exo nos quatro solventes foram muito menores, sugerindo que neste caso não há efeito de solvente.

Segundo os pesquisadores, o sucesso da catálise por ácidos de Lewis nas reações entre (52a)-(52e) e ciclopentadieno (2) deve-se ao caráter bidentado do dienófilo, já que compostos relacionados a ele, sem a capacidade de formar quelato com ácidos de Lewis, reagem com ciclopentadieno na presença de catalisadores a velocidades até três vezes menores.

Finalmente, em 1997, Wijnen e Engberts53 estudaram a reação de retro Diels-Alder do composto (54), a fim de avaliar qual efeito, interação hidrofóbica forçada ou ligação de hidrogênio, era o mais significativo para explicar o aumento de velocidade observado em reações de Diels-Alder realizadas em meio aquoso, esquema 20. Essa reação foi escolhida, pois a interação hidrofóbica forçada é praticamente inexistente nesse caso, pois não existe mudança significativa da área superficial acessível ao solvente durante o processo de ativação, assim apenas a capacidade de formar ligações de hidrogênio pode ser citada como causa de qualquer aumento de velocidade em meios aquosos.

Realizando inúmeros experimentos, onde compararam aumentos de velocidade observados na reação de retro Diels-Alder em questão, com aumentos observados em reações de Diels-Alder normal e intramolecular, os autores concluíram que reações de Diels-Alder realizadas em meio aquoso são afetadas por interações hidrofóbicas, entretanto, a formação de ligações de hidrogênio representa pelo menos uma contribuição igualmente importante.

CONCLUSÃO

A reação de Diels-Alder continua sendo objeto atual de estudo, buscando novos catalisadores/ativadores e meios reacionais.

Neste artigo exemplificamos esses fatos, voltando a nossa atenção para a reação de Diels-Alder entre ciclopentadieno e compostos carbonílicos a,b-insaturados.

O emprego de sólidos, como alumina, sílica-gel e outros, como meio reacionais, além de novos ácidos de Lewis, permite obter adutos em condições suaves, com alta diastereosseletividade e baixo índice de polimerização dos substratos.

Diferentes solventes, como água por exemplo, passaram a ser utilizados, oferecendo a diminuição do tempo reacional em condições brandas.

AGRADECIMENTOS

À FAPESP e ao CNPq pelas bolsas concedidas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Maio 2000
  • Data do Fascículo
    Jun 1999

Histórico

  • Aceito
    30 Jul 1998
  • Recebido
    06 Mar 1998
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