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Estudo por espectroscopia no infravermelho da interação metal-suporte em Pt/TiO2. A influência da adsorção de hidrogênio

An infrared spectroscopy study of metal-support interaction on Pt/TiO2. The influence of hydrogen adsorption

Resumo

The influence of the presence of hydrogen on Pt/TiO2 catalysts submitted to reduction treatment has been studied by FT-IR at room temperature. After submitting to LTR treatment, the hydrogen spillover has been detected and the presence of hydrogen at the bulk is shown to produce a strong absorption in the infrared spectral region. After HTR treatment, the hydrogen is strongly chemissorbed.

SMSI; metal-support; hydrogen spillover


SMSI; metal-support; hydrogen spillover

ARTIGO

Estudo por espectroscopia no infravermelho da interação metal-suporte em Pt/TiO2. A influência da adsorção de hidrogênio

Edilson V. Benvenutti* * LSS - Laboratório de Superfícies Sólidas; e-mail: edilson@iq.ufrgs.br

Instituto de Química - UFRGS - CP 15003 - 91501-970 - Porto Alegre - RS

Celso U. Davanzo

Instituto de Química - UNICAMP - CP 6154 - 13081-970 - Campinas - SP

Recebido em 16/7/98; aceito em 21/1/99

An infrared spectroscopy study of metal-support interaction on Pt/TiO2 . The influence of hydrogen adsorption. The influence of the presence of hydrogen on Pt/TiO

2 catalysts submitted to reduction treatment has been studied by FT-IR at room temperature. After submitting to LTR treatment, the hydrogen spillover has been detected and the presence of hydrogen at the bulk is shown to produce a strong absorption in the infrared spectral region. After HTR treatment, the hydrogen is strongly chemissorbed.

Keywords: SMSI; metal-support; hydrogen spillover.

INTRODUÇÃO

Muitos trabalhos já relataram que metais do grupo VIII dispersos em suportes redutíveis, quando submetidos a redução a alta temperatura (HTR - High Temperature of Reduction), mostram diminuição na sua capacidade de adsorção de hidrogênio e de monóxido de carbono1-6, além de marcantes alterações na sua atividade catalítica e seletividade nas reações de hidrogenação6-10. Esta mudança de comportamento químico em função do tratamento térmico redutivo tem sido atribuída a forte interação entre o metal disperso e o suporte (SMSI - Strong Metal Support Interactions)1-4, 7, 11-18.

O mecanismo SMSI tem sido muito discutido nas últimas duas décadas. A diminuição na capacidade de adsorção de hidrogênio e monóxido de carbono tem sido atribuída principalmente a efeitos morfológicos4,17,19-22, onde o óxido metálico redutível, semelhante a titânia, após submetido a redução HTR sofre uma expansão do seu retículo cristalino devido a diminuição da atração eletrostática no cristal iônico, visto que a titânia parcialmente reduzida, forma espécies do tipo TiO2-x. Esta expansão resulta no encapsulamento do metal disperso que muitas vezes é interpretada como migração da espécie TiO2-x para a superfície do metal disperso20-22. O efeito SMSI também tem sido atribuído ao mecanismo eletrônico, onde admite-se a transferência de carga do suporte para o metal disperso, elevando assim sua densidade eletrônica no subnível d17-19,22.

Neste trabalho, usando-se a técnica de espectroscopia no infravermelho, verificou-se a presença de hidrogênio no bulk (interior do sólido) do catalisador Pt/TiO2, submetido a tratamento HTR e também após submetê-lo ao tratamento redutivo a baixa temperatura (LTR - Low Temperature of Reduction). Admite-se que a migração do hidrogênio da superfície do sólido para o bulk ocorra através do mecanismo spillover, onde o hidrogênio molecular é dissociado na superfície da platina, resultando em dispersão de hidrogênio atômico, inicialmente na superfície e posteriormente, com o aumento da pressão, no interior do sólido.

A diminuição na capacidade de adsorção de hidrogênio, já observada anteriormente para o catalisador Pt/TiO2, após ter sido submetido a tratamento HTR1-6, é discutida considerando-se a saturação do sólido com hidrogênio que produz defeitos eletrônicos em sua estrutura e não a efeitos morfológicos.

EXPERIMENTAL

Síntese of Pt/TiO21

Uma solução (0,75 mL) de H2PtCl6.6H2O (160 mg) foi pingada sob agitação constante sobre 3 g de TiO2 (anatase) (P25 Degussa) com tamanho de partícula entre 15 e 40 nm e área superficial de 50 m2 g-1 (BET). O sólido permaneceu sob agitação por 2 h. O material resultante foi secado a 110oC por 16 horas.

Tratamento Térmico Redutivo

Foram preparados discos de 50 mg do catalisador Pt/TiO2 com 5 cm2 de área. Os discos foram aquecidos a 200oC sob vácuo (10-5 torr) durante 1 h e submetidos a 200 torr de oxigênio durante 1 hora a 200oC. O oxigênio foi eliminado degaseificando o sistema (10-5 torr) durante 1 h a 300oC. Após, os materiais foram submetidos a 200 torr de hidrogênio a 200oC (LTR) ou 500oC (HTR) e finalmente degaseificados à temperatura de 300oC durante 1 h sob vácuo (10-5 torr).

Análise no Infravermelho

Os discos de Pt/TiO2 foram analisados na região do infravermelho in situ após serem submetidos aos tratamentos LTR ou HTR. O equipamento usado foi um Bomem FT-IR, modelo MB-102. Os espectros foram obtidos com resolução de 4 cm-1, com 256 varreduras para os discos submetidos ao tratamento LTR e 1024 varreduras para os submetidos ao tratamento HTR.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Tratamento LTR

Os espectros no infravermelho do material Pt/TiO2, reduzido em LTR e submetido a hidrogênio à temperatura ambiente, são apresentados na Figura 1. Pode-se observar que o hidrogênio produz uma drástica diminuição na transmitância ao infravermelho no espectro do Pt/TiO2. Cinco torr de hidrogênio reduz a transmitância do disco em 50% do valor original, e este efeito é intensificado com o aumento da pressão de hidrogênio. Este comportamento não foi observado no espectro da titânia não suportada com platina, nas mesmas condições. A presença de platina na superfície é condição para que ocorra o efeito de absorção no infravermelho.


Na região de estiramento OH, dos espectros da Figura 1, verifica-se um aumento na área da banda TiO-H (ca. 3660 cm-1) após o contato com hidrogênio à temperatura ambiente (Figura 2). O aumento no número de grupos TiOH (Figura 2, espectro b e c em relação ao espectro a) pode ser interpretado somente considerando-se a dissociação do hidrogênio na platina seguido da sua migração para o suporte. O mecanismo spillover para o hidrogênio já foi muito discutido anteriormente6,23,24. A presença de hidrogênio no bulk como hidreto de titânio e Ti—H—Pt,25 deve ser responsável pela forte absorção no infravermelho devido a defeitos eletrônicos na sua natureza cristalina. Efeito semelhante foi observado para o ZnO26, sendo interpretado como alterações eletrônicas na estrutura do sólido semicondutor, envolvendo vibrações reticulares, efeitos de espalhamento, contribuições plasmônicas e defeitos êxcitons. O redutível suporte TiO2 apresenta defeito de Schottky e semicondutividade do tipo-n27, portanto seu comportamento pode ser comparado com o do ZnO.


A transmitância original do espectro, obtida antes do contato com hidrogênio, pode ser reproduzida após aquecimento do sólido a 300oC sob vácuo (10-5 torr) durante 1 h. Nestas condições o hidrogênio deve ser completamente dessorvido.

Tratamento HTR

O espectro do catalisador Pt/TiO2 reduzido em HTR é mostrado na Figura 3. Comparado com o espectro obtido para o catalisador reduzido em LTR (Espectro a da Figura 1), a transmitância do material sofreu um grande decréscimo (ca. 250 vezes). Esta forte absorção pode ser interpretada baseando-se no efeito similar discutido para tratamento LTR, seguido da quimissorção de hidrogênio à temperatura ambiente. Contudo, após tratamento HTR, este efeito é mais pronunciado do que o observado após LTR. Após redução HTR, o tratamento térmico sob vácuo não restabelece a transmitância original, como observado para o catalisador submetido a hidrogênio após redução LTR. As características originais do espectro são restabelecidas apenas após a oxidação (300 torr de oxigênio) a 300oC durante 1 h. A saturação do bulk com hidrogênio, produzida pelo tratamento HTR, e a dificuldade na dessorção do hidrogênio, podem ser responsáveis pela menor capacidade de adsorção de hidrogênio após redução HTR, já relatada1-6.


A migração do hidrogênio para o bulk é mais efetiva após o catalisador ter sido reduzido sob HTR, visto que após este tratamento, o sólido apresentou absorção na região do infravermelho muito mais pronunciada que aquela observada para o catalisador reduzido sob tratamento LTR e submetido a diferentes pressões de hidrogênio à temperatura ambiente. A área sob a banda TiO-H do espectro da Figura 3, que foi obtido após o tratamento HTR, é de 51 cm-1 x Abs. Este valor de área corresponde a ca. 13 vezes o encontrado para a área sob a mesma banda no espectro c da Figura 2, obtido após o catalisador ter sido reduzido em LTR e submetido a 200 torr de hidrogênio à temperatura ambiente (ca. 4 cm-1 x Abs). Este resultado somente pode ser interpretado admitindo-se que após o tratamento HTR a concentração de hidrogênio dissociado no suporte ou na interface metal-suporte é maior do que após o tratamento LTR.

Muitos trabalhos tem apresentado evidências de que a diminuição na capacidade de adsorver hidrogênio no catalisador Pt/TiO2 após tratamento HTR é devida a efeitos morfológicos1,3,19,20. Entretanto, Tauster et al.28 já mencionou a possibilidade de que hidrogênio fortemente adsorvido em Pt/TiO2 não poderia ser removido simplesmente com vácuo. Nossos resultados representam evidências de hidrogênio fortemente quimissorvido6.

CONCLUSÕES

O hidrogênio dissociado à temperatura ambiente na superfície da platina do catalisador Pt/TiO2, submetido a tratamento LTR, migra para o suporte TiO2. A presença do hidrogênio disperso no interior do sólido resulta em forte absorção no infravermelho, sendo que esta absorção é sensível a pressão de hidrogênio.

Durante o tratamento HTR, a migração do hidrogênio dissociado da superfície para o bulk é mais pronunciada, sendo que o hidrogênio quimissorvido nesta circunstância é mais fortemente ligado ao sólido do que após o tratamento LTR. Portanto, a baixa capacidade de adsorver hidrogênio após HTR, já relatada anteriormente, pode ser devida não apenas a efeitos morfológicos, mas também às alterações eletrônicas na estrutura cristalina do sólido produzidas pela presença do hidrogênio fortemente adsorvido.

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  • *
    LSS - Laboratório de Superfícies Sólidas; e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Fev 2000
    • Data do Fascículo
      Set 1999

    Histórico

    • Recebido
      16 Jul 1998
    • Aceito
      21 Jan 1999
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