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Solubilidade do SrO em NaCl-Kcl fundido a 727ºC

Strontium oxide solubility in mol ten NaCl-KCl at 727°C

Resumo

The solubility product value of SrO has been found to be equal to 10-4,2 (molality scale) in molten equimolar mixture of NaCl and KCl at 727ºC, using a potentiometric method involving a calcia stabilized zirconia membrane electrode. This value, which is in a logical agreement with other alkaline-earth oxide determined solubilities, is compared to those of 10-5,8, 10-3,0 and 10-3,08 (molality scale) found in the litterature 33, 22 and 5 years ago, respectively. Such discrepencies have called the attention of the authors, their possible reasons (methodology, titrating agent) are analyzed and a theoretical discussion, for considering the authors' value as more reliable, is given in this paper.

strontium oxide; stabilized zirconia; molten salts


strontium oxide; stabilized zirconia; molten salts

ARTIGO

Solubilidade do SrO em NaCl-Kcl fundido a 727ºC

Richard Louis Combes

Institut Galilée - Université de Paris - Nord - F-93430 - Villetaneuse - França

Sérgio Luiz Koeller

Departamento de Química - ICE - Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - 23851-970 - Seropédica - RJ

Recebido em 19/10/98; aceito em 26/8/99

Strontium oxide solubility in mol ten NaCl-KCl at 727ºC.The solubility product value of SrO has been found to be equal to 10-4,2 (molality scale) in molten equimolar mixture of NaCl and KCl at 727ºC, using a potentiometric method involving a calcia stabilized zirconia membrane electrode. This value, which is in a logical agreement with other alkaline-earth oxide determined solubilities, is compared to those of 10-5,8, 10-3,0 and 10-3,08 (molality scale) found in the litterature 33, 22 and 5 years ago, respectively. Such discrepencies have called the attention of the authors, their possible reasons (methodology, titrating agent) are analyzed and a theoretical discussion, for considering the authors' value as more reliable, is given in this paper.

Keywords: strontium oxide; stabilized zirconia; molten salts.

INTRODUÇÃO

Vários cloretos alcalino terrosos são utilizados em processos eletrolíticos em sais fundidos, seja pela produção do próprio metal (Ba, Sr, Ca e Mg), ou como coadjuvante para ajustar a condutividade, a densidade ou a acidez do banho (BaCl2, CaCl2). Segundo o conceito de oxoacidez desenvolvido por Lux1 e em seguida por Flood e Førland2, os óxidos alcalino terrosos MO são a base conjugada dos cátions M2+ dos respectivos cloretos dissolvidos no sal fundido, e de acordo com as equações de dissociação:

MCl2 (sólido) ® M2+ (solução) + 2Cl- (solução), (1)

M2+ (solução) + O2- (solução) ® MO (sólido), (2)

é natural que a solubilidade dos óxidos alcalino terrosos em cloretos fundidos, tenha chamado a atenção dos químicos nos últimos 40 anos3,4,5,6.

Na década de 60, Naumann e Reinhard7, usando a técnica de saturação e coleta de amostra, fizeram a determinação do produto de solubilidade do BaO, CaO e SrO. Posteriormente, no final da década de 70, Combes e colaboradores8,9 determinaram os valores dos produtos de solubilidade do CaO, do BaO e do MgO na mistura equimolar fundida de NaCl e KCl a 727oC. Esses resultados foram obtidos por titulação potenciométrica com um eletrodo de zircônia estabilizada com óxido de cálcio, empregado como indicador da concentração dos íons O2- no banho fundido, conforme demonstrado nos trabalhos anteriores de Combes e colaboradores10,11,12.

Também no final da década de 70, Delimarsky e Shapoval13 determinaram o produto de solubilidade do CaO e MgO, e mais recentemente Cherginets e Khailova14, utilizando a mesma técnica potenciométrica, determinaram os valores do produto de solubilidade de uma série de óxidos alcalino terrosos no NaCl-KCl a 700oC.

PARTE EXPERIMENTAL

Equipamento experimental utilizado

1 - Forno elétrico tipo poço com sistema de controle de aquecimento.

2 - Reator em aço inox (317 L) protegido internamente contra corrosão por uma camada de alumina, na parte superior possui um colar de circulação de água para manter a refrigeração.

3 - Cadinho de alumina de alta pureza contendo o sal fundido dentro do reator.

4 - Eletrodo referência de primeira espécie Ag/AgCl, composto de um fio de prata em contato com uma solução 0,75 mol/kg de AgCl em NaCl-KCl, contido num tubo de alumina porosa para manter o contato elétrico.

5 - Eletrodo indicador de pO2- feito com um tubo de zircônia estabilizada, contendo em seu interior um fio de níquel em contato com uma mistura de níquel e óxido de níquel em pó. Os ítens 4 e 5 estão descritos no trabalho11.

6 - Termopar protegido do sal fundido por um tubo de alumina refratária.

Todos os produtos químicos usados foram "P.A." A mistura NaCl-KCl foi preparada conforme técnicas de trabalho descritos em artigo6. Os reagentes BaO e SrCl2 foram previamente secos a vácuo a 120oC por 24 horas.

Método experimental

A determinação da constante de solubilidade (Ks) do SrO foi realizada através da reação oxoacidobásica do cátion Sr2+ com o ánion O2-, na mistura equimolar NaCl-KCl fundida a 727oC, de acordo com a seguinte reação:

Sr2+ (solução) + O2- (solução) ® SrO (precipitado), (3)

cuja expressão da constante de solubilidade é:

Ks(SrO) = [Sr2+][O2-] (4)

Na determinação do Ks do SrO utilizou-se o método da titulação potenciométrica do íon óxido (O2-), usando um eletrodo de zircônia estabilizada28,9,10,11,12, seletivo aos íons O2-. O potencial medido pelo eletrodo obedece a expressão (5) com a concentração do íon O2- expressa em molalidade. Blander15 mostrou que para frações molares menores que 0,01, pode-se descrever a atividadede dos íons O2- através da fração molar ou qualquer outra unidade de concentração. Neste trabalho adotou-se a escala molal:

E = Eo - 2,3RT/2F log [O2- ] (5)

-log[O2-] = pO2- (6)

Inicialmente, preparou-se a mistura eutética NaCl-KCl com SrCl2, previamente seco, que foi colocada em um cadinho de alumina 99,9% dentro do reator. A célula foi fechada e submetida a vácuo de 0,01 atm, durante o aquecimento, até a temperatura de 400oC. No processo de aquecimento foi utilizado um controlador de temperatura, cuja taxa foi de 120oC por hora, até alcançar a temperatura de 700oC, a partir da qual a temperatura do banho de sal fundido foi controlada com um Variac e mantida a 727±1oC.

A adição do íon O2- foi feita através de quantidades conhecidas de BaO (previamente seco em estufa a 120oC por 24 horas), que, em trabalho anterior realizado por Combes e colaboradores9, mostrou ser uma oxobase forte. Em seguida à titulação, foi adicionado BaO em excesso, até atingir o ponto de saturação do BaO, o que permitiu a calibração do eletrodo indicador, já que no ponto de saturação a constante de solubilidade é dada pela equação:

Ks(BaO) =[Ba2+][O2- ] (7)

e pela estequiometria: [Ba2+]=[O2-], então pO2- = (pKs)1/2.

Fez-se, novamente, a calibração do eletrodo para confirmar o ponto de saturação obtido e para verificar se o potencial obedeceu a expressão:

E = Eo - k log [BaO] (8)

com Eo constante, k = 2,3RT/2F » 0,099 V a 1000 K e [BaO] é a concentração expressa na unidade de molalidade.

RESULTADOS

Os valores do potencial obtidos durante a titulação do Sr2+ pelos íons O2- estão na Tabela 1 e foram relacionados com grau de avanço (a). Por definição, a é a razão entre as concentrações de BaO adicionada e de SrCl2 inicial e igual a 0,054 mol/kg.

A relação entre pO2- e a está representada na equação (13) e foi obtida a partir do balanço de massa da reação oxoacidobásica descrita na equação 3, onde:

[Sr2+] = [Sr2+]o - [SrO], (9)

[O2-] = [BaO] - [SrO], (10)

a =[BaO] / [Sr2+]o , (11)

e substituindo as equações 9, 10 e 11 na equação 4, chegando-se à seguinte expressão:

Ks = [O2-] (1-a) [Sr2+]o + [O2-]2 (12)

Resolvendo-se a equação (12) e aplicando a definição de pO2-, tem-se:

(13)

Para representar a equação (13) no diagrama de pO2- versus a atribui-se valores para Ks na equação, e desta forma obtem-se a curva que melhor descreve os pontos experimentais, conforme metodologia de trabalhos anteriores9,10 .

O valor de Ks = 6,3X10-5 representa a curva pontilhada, o que possibilitou a determinação do pKs do SrO, cujo valor encontrado foi 4,2±0,1, na escala de molalidade. A representação da curva e os valores experimentais estão na Figura 1.


O eletrodo foi padronizado com BaO, repetindo o trabalho realizado por Combes e Andrade9. Os valores do potencial do eletrodo indicador de pO2- em função do BaO adicionado (escala de molalidade), estão descritos na Tabela 1 e ilustrados na Figura 2. A reta, cujo coeficiente angular é igual a -0,1 V, representa a solubilidade do BaO e a linha horizontal corresponde à precipitação. Estes resultados confirmam os valores obtidos e demonstram a padronização do eletrodo indicador.


DISCUSSÃO

O valor do produto de solubilidade obtido neste trabalho é de 4,2 ± 0,1, na escala de molalidade, a 727 oC (1000K). Como mostrado na Tabela 2, este valor é bastante menor que 5,8, pKs obtido por Naumann e Reinhard7, os primeiros que fizeram a determinação. Os resultados obtidos por Combes e colaboradores e o encontrado neste trabalho, se comparados aos de Naumann, são menores, na mesma ordem de grandeza. Porém, tanto o resultado deste trabalho quanto o de Combes são mais confiáveis, por terem sido determinados pelo método de titulação potenciométrica no próprio sal fundido8,9.

Ao contrário, os valores encontrados por Delimarsky e Shapoval13 e mais recentemente, por Cherginets e Khailova14, são menores, apesar de determinados pela mesma técnica potenciométrica. Uma explicação para a diferença é o fato desses autores terem usado o NaOH como oxobase para a titulação, e terem considerado a mesma, como totalmente dissociada (oxobase forte).

Combes e colaboradores12 demonstraram que o íons HO- estão envolvidos no seguinte equilíbrio:

2HO- (solução) ® H2O (vapor) + O2- (solução),

que necessariamente impõe o controle de uma nova variável, a pressão de vapor da água. O valor da constante da reação acima é 10-2,6 a 727oC, na escala de molalidade12.

Para certificar a consistência do resultado deste trabalho e compará-lo ao determinado por Cherginets14, correlacionou-se os valores do produto de solubilidade obtidos pelo mesmo método contra a densidade de carga (j) de cada cátion, que pode ser calculada conhecendo-se o raio iônico dos respectivos cátions e admitindo a aproximação de Born (íon como esfera rígida), resultando:

(14)

com j = densidade de carga superficial; zi = valência do íon; eo = carga do electron (1,6 x 10-19) e ri = raio do íon.

A Figura 3 mostra a linearidade entre os cátions Mg2+, Ca2+ e Sr2+, e o mesmo não se observa no trabalho de Cherginets14. A dependência linear, isto é, a constante de proporcionalidade entre o produto de solubilidade e a densidade superficial de carga indica que as interações entre soluto e solvente são do tipo eletrostáticas. Quanto ao desvio apresentado pelo íon Ba2+, a possível explicação é o surgimento de interações não coulômbicas, possivelmente há formação de cloro-complexos16-21.


CONCLUSÃO

Quando se compara o resultado encontrado neste trabalho e os existentes na literatura7,8,9,13,14, observa-se que a técnica experimental e a substância usada como oxobase determinam a confiabilidade das medidas.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à Petromisa pelo financiamento deste trabalho.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Out 2000
  • Data do Fascículo
    Fev 2000

Histórico

  • Recebido
    19 Out 1998
  • Aceito
    26 Ago 1999
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