Acessibilidade / Reportar erro

Aumento da resolução de espectros de RMN 13C de ácidos húmicos em solução através do tratamento prévio com KCl 0,03 mol L-1

Increase resolution of solution 13C NMR spectra of humic acids by previous treatment with 0,03 mol L-1 KCl

Resumo

High levels of Fe and Mn present in some soils and compost organic matter decrease the resolution of 13C NMR spectra of humic substances. Addition of KCl up to a concentration of 0,03 mol L-1 to humic substances extracts followed by centrifugation is an efficient method of eliminating clays and minerals containing high levels of paramagnetic metals such as Fe and Mn thus increasing the resolution of 13C NMR spectra.

humic acids; humic substances; 13C NMR


humic acids; humic substances; 13C NMR

NOTA TÉCNICA

Aumento da resolução de espectros de RMN 13C de ácidos húmicos em solução através do tratamento prévio com KCl 0,03 mol L-1

Luciano Pasqualoto Canellas, Fernando Guridi e Gabriel de A. Santos

Departamento de Solos, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 23890-000 Seropédica - RJ

Victor Marcos Rumjanek

Departamento de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 23890-000 Seropédica - RJ

Raimundo Braz-Filho

Setor de Química dos Produtos Naturais, LCQUI-CCT, Universidade Estadual do Norte Fluminense, 28015-620 Campos - RJ

Recebido em 7/10/99; aceito em 28/2/00

Increase resolution of solution 13C NMR spectra of humic acids by previous treatment with 0,03 mol L-1 KCl. High levels of Fe and Mn present in some soils and compost organic matter decrease the resolution of 13C NMR spectra of humic substances. Addition of KCl up to a concentration of 0,03 mol L-1 to humic substances extracts followed by centrifugation is an efficient method of eliminating clays and minerals containing high levels of paramagnetic metals such as Fe and Mn thus increasing the resolution of 13C NMR spectra.

Keywords: humic acids; humic substances; 13C NMR.

INTRODUÇÃO

Um dos fatores que permitem diferenciar um solo de um sedimento é o seu maior conteúdo de matéria orgânica1. A matéria orgânica do solo é uma mistura de compostos orgânicos provenientes de plantas, animais e microrganismos, física e quimicamente heterogênea e em diferentes estágios de decomposição2. Os ácidos húmicos (AH) representam uma importante fração da matéria orgânica e são definidos pela solubilidade em meio aquoso básico e precipitação em meio aquoso ácido (pH 2 ou menor). Os AH formam uma mistura heterogênea de moléculas orgânicas unidas entre si principalmente por interações hidrofóbicas3. Esta mistura heterogênea aparece como componente importante da fertilidade dos solos, envolvendo-se na capacidade de troca de cátions, na acidez e na estrutura4, além de complexar metais pesados em solução5. Estudos sobre a estrutura química dos ácidos húmicos são antigos6 e nos últimos anos a RMN 13C permitiu avanços consideráveis na compreensão da estrutura7,8 e de características físico-químicas9,10. Ocorre, no entanto, que amostras de AH obtidas principalmente de solos e compostos orgânicos de zonas tropicais com predomínio de minerais de argila do tipo 1:1 apresentam considerável teor de Fe, o que reduz significativamente a resolução dos espectros de RMN 13C devido, principalmente, ao aumento do relaxamento transversal induzido pelo efeito de paramagnetismo. O procedimento utilizado comumente para o isolamento dos AH pode não ser adequado para tais amostras já que o meio fortemente ácido usado degrada os minerais de Fe aumentando sua concentração na solução de AH.

Este trabalho descreve um procedimento simples para melhorar a resolução de espectro de RMN 13C de AH extraídos de resíduos orgânicos de origem urbana.

MATERIAIS E MÉTODOS

Os AH foram extraídos de material produzido pela Companhia de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (COMLURB) a partir de resíduos orgânicos provenientes da coleta domiciliar de lixo na usina de compostagem de Jacarepaguá. As substâncias húmicas foram isoladas usando uma solução aquosa de NaOH 0,5 mol L-1, na razão 1:10 (v:v) sob atmosfera inerte de N2. Este procedimento de extração é recomendado como padrão pela International Humic Substances Society (IHSS)11 e apresenta melhor rendimento de extração do que o uso de NaOH 0,1 mol L-1 e de Na4P2O7 0,1 mol L-1 12. O extrato contendo as substâncias húmicas (ácidos fúlvicos + ácidos húmicos) foi separado em duas partes. Antes da separação dos ácidos húmicos através da acidificação até pH 1,0 com HCl 6 mol L-1, uma das partes foi submetida à adição de KCl sólido (P.A. Merck) até a concentração de 0,03 mol L-1, agitou-se vigorosamente, deixou-se em repouso por uma hora e centrifugou-se a 2000 g por 20 minutos, descartando-se o resíduo depositado no fundo do tubo. A suspensão obtida foi acidificada após o repouso de oito horas e centrifugada novamente a 2000g por 20 minutos, descartando-se o sobrenadante. A redissolução do material sólido e precipitação foi repetida três vezes. Em seguida, adicionou-se 200 mL de uma solução aquosa diluída de HF e HCl, preparada com 5 mL de HCl concentrado e 5 mL de HF concentrado e o volume de solução completado para 1 L com água deionizada, e agitou-se a amostra por 8 horas. Os AH foram novamente precipitados por centrifugação e lavados com água até teste negativo com AgNO3. Procedeu-se à diálise contra água deionizada em membranas com retenção máxima de 14 kD (Thomas Scientific Inc. USA). Finalmente, os AH foram secos por liofilização. Os AH da outra metade do extrato foram isolados através do mesmo procedimento sem a adição de KCl.

Os espectros das amostras de AH isoladas pelos dois procedimentos foram obtidos num aparelho Bruker AC-200 (50,30 MHz para 13C) usando-se 150 mg de AH dissolvidos em 1 mL de NaOH 0,5 mol L-1 (9:1 H2O:D2O), utilizando a seqüência INVGATE.AU (desacoplamento inverso), com pulso de 90o, tempo de aquisição de 0.2 s, tempo de espera da reciclagem do sinal de 0.8 s, 16K de tamanho e cerca de 200 000 transientes por amostra. Os espectros foram obtidos à temperatura ambiente e os deslocamentos químicos registrados dc (ppm) a partir do deslocamento químico do tetrametilsilano (TMS) usado como referência externa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os espectros de AH normalmente se apresentam com pouca resolução quando comparados com espectros de moléculas orgânicas mais simples. Mesmo assim, tais espectros fornecem informações para o reconhecimento de unidades estruturais13 e estudos da dinâmica evolutiva dos AH nos solos14.

Os espectros de RMN 13C dos AH extraídos de resíduos orgânicos sólidos de origem urbana com e sem a adição de KCl estão apresentados na Figura 1. A adição de KCl aumentou significativamente a resolução em todas as regiões do espectro. Na região de absorção de átomos de carbono sp3 inseridos em cadeias carbônicas aparece o sinal mais intenso em dc 31,5 que pode ser atribuído a grupamentos CH2 em cadeias longas15 e em dc 15,1 característico de metilas em posição terminal nos AH16. Os sinais em dc 36,5, 44,0, 51,5 e 54,5 podem ser atribuídos a carbonos sp3 e ligados a nitrogênio de aminoácidos17 e em dc 57,0 a grupamentos OCH313. O sinal em dc 70,2 pode também ser correlacionado com átomos de carbono sp3 nitrogenado de aminoácidos18. A presença de átomo de carbono sp3 ligado a dois átomos de oxigênio (acetal ou cetal) encontrados em carboidratos (e. g.), pode ser sugerido pelo sinal em dc 99,012. O sinal em dc 130 pode ser atribuído a carbonos sp2 aromáticos pouco substituídos19. A região entre dc 160 e 185 registra sinais que podem ser atribuídos a carbonos sp2 de grupos carboxílicos20.


Os resultados obtidos permitem deduzir que o tratamento prévio da solução de substâncias húmicas com KCl 0,03 mol L-1 é útil na floculação de minerais de argila que contém ferro, alumínio e manganês, diminuindo o efeito de paramagnetismo com aumento na resolução dos espectros em solução.

  • 1. Kononova, M. M.; Materia Orgánica del suelo; Oikos-tau; Barcelona, 1982; p 111.
  • 2. Santos, G. de A.; Camargo, F. A. O.; In: Fundamentos da Matéria Orgânica; Santos, G. de A.; Camargo, F. A.O.; Eds.; Genesis; Porto Alegre, 1999; p 27.
  • 3. Conte, P.; Piccolo, A.; Environ. Sci. & Techn 1999, 33, 1682.
  • 4. Canellas, L. P.; Sobrinho, N. M.; Santos, G. de A.; In: Fundamentos da Matéria Orgânica do Solo; Santos, G. de A.; Camargo, F. A. O., Eds. Genesis; Porto Alegre, 1999; p 69.
  • 5. Canellas, L. P.; Santos, G. de A.; Sobrinho, N. M. A.; Moraes, A. A.; Rumjanek, V. M.; Cięncia Rural. 1999, 29, 21.
  • 6. Stevenson, J. F.; Humus chemistry; Wiley; New York, 1994; p 285.
  • 7. Schnitzer, M.; Schulten, H. žR.; Soil Sci 1997, 162, 115.
  • 8. Steelink, C.; Wershaw, R. L.; Thorn, K. A.; Wilson, M. A.; In Humic Substances II; Hayes, M. H. B., MacCarty, P.; Malcolm, R.; Swift, R. S.; Eds. Willey; New York, 1989; p 281.
  • 9. Dick, D. P.; Burba, P; Herzog, H.; J. Braz. Chem. Soc. 1999, 10, 140.
  • 10. Dick, D. P.; Burba, P.; J. Braz. Chem. Soc 1999, 10, 146.
  • 11. Calderoni, G.; Schnitzer, M.; Geochim. Cosmochim. Acta, 1984, 48, 2045.
  • 12. Schnitzer, M.; In Methods of Soil Analysis. Part 2. Chemical and Biological Properties; Page, L. A.; Miller, R. H.; Keeney, D. R.; Eds. American Society of Agronomy; Madison, 1982; p 581.
  • 13. Canellas, L. P.; Tese de Doutorado, I. A., UFRRJ, Seropédica 1999.
  • 14. Zech, W.; Senesi, N.; Guggenberger, G.; Kaiser, K.; Lehmann, J.; Miano, T.; Miltner, A.; Schroth, G.; Geoderma 1997, 79, 117.
  • 15. Preston, C. M.; Soil Sci. 1996, 161, 144.
  • 16. Gerasimowicz, W. V.; Byler, D. M.; Soil Sci. 1985,139, 270.
  • 17. Wilson, M. A.; NMR techniques and applications in geochemistry and soil chemistry Pergamon Press; Oxford, 1987; p 182.
  • 18. Dinel, H.; Schintzer, M.; Schulten, H. žR.; Soil Sci. 1998, 163, 665.
  • 19. Schnitzer, M.; Preston, C. M.; Soil Sci. Soc. Am. J. 1986, 50, 326.
  • 20. Celli, L., Schnitzer, M., Nčgre, M.; Soil Sci. 1997, 162, 189.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Ago 2001
  • Data do Fascículo
    Fev 2001
Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: quimicanova@sbq.org.br