Acessibilidade / Reportar erro

Propriedades espectroscópicas e parâmetros ópticos-eletrônicos dos complexos Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd e Er)

Spectroscopic properties and electronic-optic parameters of complexes Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd and Er)

Resumo

Complexes with the composition Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd and Er) were synthesized and characterized by infrared and visible absorption spectra (solid state and solution). The results of the absorption spectra in the solid state suggest that metal-ligand bonds are essentially electrostatic in all complexes. The absorption spectra of the nitrate salt solution presented smaller values of the oscillator strength when compared to the spectra of the complexes in the same solvent.

spectroscopic properties; neodymium; erbium


spectroscopic properties; neodymium; erbium

ARTIGO

Propriedades espectroscópicas e parâmetros ópticos-eletrônicos dos complexos Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd e Er)

Spectroscopic properties and electronic-optic parameters of complexes Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd and Er)

Anne M. Garrido Pedrosa; Patrícia M. Pimentel; Mary K. S. Batista; Francisco J. S. Lima* * e-mail: limafjs@yahoo.com ; Dulce M. A. Melo

Departamento de Química, Centro de Ciências Exatas e da Terra, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, CP 1662, 59078-970 Natal-RN

ABSTRACT

Complexes with the composition Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd and Er) were synthesized and characterized by infrared and visible absorption spectra (solid state and solution). The results of the absorption spectra in the solid state suggest that metal-ligand bonds are essentially electrostatic in all complexes. The absorption spectra of the nitrate salt solution presented smaller values of the oscillator strength when compared to the spectra of the complexes in the same solvent.

Keywords: spectroscopic properties; neodymium; erbium.

INTRODUÇÃO

O estudo das propriedades espectroscópicas e a avaliação dos parâmetros opticos-eletrônicos de complexos contendo íons lantanídeos tem sido largamente investigado na literatura1-9 devido às diversas possibilidades de aplicações, como por exemplo em lasers 10, sensores luminescentes para espécies químicas11, dosímetros UV12, etc. O estudo da polarizabilidade eletrônica pode ser aplicado no acompanhamento dos estudos eletrônicos dos estados intermediários de transição, em processos fotoquímicos e em reações químicas fotocatalisadas de interesse na obtenção de substâncias estereoseletivas13. Um estudo detalhado dos mecanismos de excitação de moléculas pode ser útil no acompanhamento dos fenômenos de obtenção e controle de espécies no estado do complexo ativado, através da avaliação da deformação da nuvem eletrônica das espécies opticamente ativas5-7.

Átomos e moléculas ao serem submetidos a um campo elétrico adquirem um momento de dipolo induzido, deslocando as densidades de cargas positivas e negativas modificando, assim, a sua distribuição eletrônica relativa à posição do núcleo e, conseqüentemente, distorcendo sua geometria molecular. A polarizabilidade avalia a facilidade que uma molécula tem em mudar sua configuração ao interagir com a radiação eletromagnética, podendo ser avaliada pela razão entre o momento de dipolo induzido, µ, e o campo responsável pelo momento, eO, de forma que14-15:

onde:

a = polarizabilidade, µok = momento de dipolo elétrico induzido do sistema, eok = campo elétrico aplicado

A polarizabilidade total de um sistema é dada pelo somatório das polarizabilidades:

i) atômica (soma vetorial da contribuição dos elétrons em um átomo) ou molecular (soma vetorial da contribuição de todos os elétrons dos átomos em uma molécula);

ii) eletrônica (distorção da nuvem ocasionada por elétrons fotoativados) e

iii) de orientação (dependência da distorção da nuvem eletrônica com a temperatura, na presença de um campo elétrico).

É possível avaliar as polarizabilidades eletrônicas, usando a definição da força do oscilador de uma transição dipolo elétrico para o elétron oscilando em fase com a radiação incidente, a partir da expressão:

onde:

Me e e são a massa do elétron e a carga, respectivamente; Pok a força do oscilador; nok a freqüência do baricentro da transição; n a freqüência da radiação incidente e n' a freqüência associada à contribuição de forças dissipativas com a porção não elétrica da matéria.

O presente trabalho tem como objetivo fazer um estudo das propriedades espectroscópicas e parâmetros ópticos-eletrônicos dos complexos Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd e Er; DTPO = 2,2'-Ditiobis(piridina-N-oxido)). Para este propósito, alguns complexos contendo cério, neodímio, európio, samário e érbio foram previamente sintetizados e caracterizados por análise elementar, titulação complexométrica com EDTA, espectroscopia de absorção na região do infravermelho, espectroscopia de emissão na região do visível para o complexo de európio e análise térmica16. Para avaliação dos parâmetros ópticos-eletrônicos foram obtidos espectros de absorção em solução aquosa dos complexos de neodímio e érbio.

PARTE EXPERIMENTAL

Os complexos foram preparados pela reação entre os nitratos hidratados de lantanídeos com DTPO em etanol na razão molar de 1:216.

Os espectros de absorção na região do infravermelho dos complexos dispersos em KBr foram registrados em espectrofotômetro da Midac Corporation modelo Prospect-R. Os espectros eletrônicos de absorção na região do visível para o composto de neodímio e érbio no estado sólido foram registrados à temperatura ambiente em espectrofotômetro Zeiss DMR - 10. As amostras foram preparadas em uma suspensão de silicone em cubetas de quartzo de 0,5 mm de caminho óptico.

As avaliações das polarizabilidades foram determinadas a partir dos espectros eletrônicos de absorção dos complexos na região do visível em solução aquosa, obtidos em especfotômetro UV-VIS Hitachi U-2000, usando célula de quartzo com 1,0 cm de caminho óptico a 25 oC. As polarizabilidades eletrônicas foram calculadas através do programa POLAZ-F7,17-18. As transições estudadas foram 2G7/2, 4G5/2¬ 4I9/2 para o neodímio e 2H5/2¬ 4I15/2 para o érbio.

A necessidade de uma comparação dos resultados espectroscópicos no estado sólido e em solução é essencial para melhor abordagem do conhecimento do sistema nos dois ambientes. As propriedades espectroscópicas de complexos de coordenação contendo metais de transição f, obtidas em solução de alguns solventes específicos, podem ser usadas para estender suas conclusões para o estado sólido. No entanto, em solução aquosa não é possível fazer uma extensão das conclusões para o estado sólido devido aos efeitos de hidrólise e ionização total ou parcial, porém, foi o solvente no qual os complexos do presente estudo se apresentaram solúveis. Além disso, a medida dos coeficientes de absortividades molares é mais precisa em solução, onde existe melhor avaliação para a concentração do material óptico e menor perda por dispersão de radiação, especialmente no tocante ao cálculo das polarizabilidades eletrônicas.

RESULTADOS E CONCLUSÕES

Os resultados analíticos16 indicam que os complexos apresentam a seguinte composição: Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Ln = Nd e Er; DTPO = 2,2'-Ditiobis(piridina-N-oxido)). De acordo com testes qualitativos de solubilidade dos complexos, pode-se observar que esses eram pouco solúveis em metanol, etanol, acetonitrila e acetona, mas mostraram boa solubilidade em água.

Nos espectros de absorção na região do infravermelho dos complexos foram identificadas seis bandas para o ânion nitrato. Isso evidencia que a simetria D3h do íon nitrato livre foi baixada para C2v ou Cs. Aplicando-se o critério (n2+n3), (n2+n5) e (n1/n4) e comparando-se com os dados da literatura19,20 é possível concluir a existência de nitratos bidentados. De acordo com os espectros de absorção na região do infravermelho, o DTPO coordena-se ao metal por meio do oxigênio do grupo NO. Isso foi evidenciado pelo deslocamento do estiramento NO para regiões de menor energia (~1210 cm-1) em relação ao ligante livre (~1248 cm-1). A presença de uma banda fraca de absorção a 1248 cm-1 nesses espectros sugere que apenas um grupo NO do ligante interage com o metal ou ainda, que um dos dois ligantes esteja fora da esfera de coordenação. Comparando-se esses resultados com os da literatura21,22 é possível sugerir que os dois DTPO estejam coordenados monodentados ao metal (Tabela 1).

Os espectros de absorção para os complexos de neodímio e érbio no estado sólido podem ser vistos na Figura 1. Os resultados dos parâmetros espectroscópicos para os complexos de neodímio e érbio no estado sólido são mostrados na Tabela 2. Os baricentros foram calculados a partir da transição 2G7/2, 4G5/2¬ 4I9/2 do complexo de neodímio e 2H5/2¬ 4I15/2 do complexo de érbio, possibilitando o cálculo dos parâmetros que se seguem: parâmetro nefelauxético (b)23; fator de covalência (b1/2)24 e parâmetro de Sinha (d)4. Esses valores sugerem que a interação entre os íons Ln3+ e os ligantes é de caráter essencialmente eletrostático, fato que pode ser explicado pela pequena participação dos orbitais 4f na ligação; e que o caráter covalente aumenta do complexo de neodímio para o de érbio, no caso do estado sólido.


A Figura 2 mostra os espectros de absorção na região do visível em solução aquosa do Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O e Ln(NO3)3.6H2O (Ln = Nd e Er). Os espectros dos Ln(NO3)3.6H2O apresentaram valores um pouco menores de força do oscilador em relação aos espectros dos Ln(NO3)3.2DTPO.4H2O (Tabela 3). A força do oscilador quantifica a intensidade das bandas correspondente às transições 2G7/2, 4G5/2¬ 4I9/2 (Nd) e 2H5/2¬ 4I15/2 (Er), retratando as variações sofridas pelo ambiente químico. Os espectros dos sais e dos complexos apresentaram pequenas variações nas intensidades das bandas hipersensitivas, indicando que a substituição parcial das moléculas de água do sal pelas moléculas do DTPO não provocou perturbação tão considerável no ambiente químico dos Ln3+, uma vez que os deslocamentos das freqüências e as intensidades observadas são de magnitudes apresentadas pelos espectros das espécies iônicas padrão4-7, 23,24, com parâmetro de Sinha menor que 1,5%.


Os resultados dos parâmetros espectroscópicos dos sais e complexos em solução aquosa (Tabela 3) revelam um forte caráter eletrostático na interação dos íons Ln3+ e os ligantes no complexo4-7, 23-24 e um caráter covalente um pouco maior, porém ainda muito fraco, para os sais.

A polarizabilidade relaciona simultaneamente a força do oscilador e a freqüência associada à respectiva transição e pode ser avaliada a partir dos dados espectroscópicos. As Figuras 3 e 4 mostram comparativamente os gráficos das polarizabilidades dos sais e dos complexos de neodímio e érbio em solução, respectivamente. De acordo com os valores das polarizabilidades dos sais e dos complexos contidos na Tabela 4, é possível observar que há um ligeiro aumento na deformação da nuvem do íon Nd3+ no complexo, em relação ao sal hidratado. Este fato pode ser notado ao se comparar as polarizabilidades estáticas (aest), dinâmicas em fase máxima (amax) e mínima (amin) e as polarizabilidades fora de fase máxima (a') dos sais com as dos respectivos complexos. Este efeito certamente é provocado pelo aumento relativo de intensidade causada pelo campo ligante do DTPO quando comparado com a água. O mesmo comportamento repete-se para o complexo de érbio, que apresenta a mesma estequiometria do complexo de neodímio e, portanto, se encontra sob o mesmo efeito de campo. Em solução, a mesma tendência do aumento dos parâmetros ópticos de ligação (d e b1/2) no sentido do neodímio para o érbio que é observado para o estado sólido, foi também verificada, sendo maiores para os compostos de érbio. Possivelmente este comportamento se deve ao aumento do potencial iônico ao longo da série, o que pode ocasionar maior sobreposição orbital. Isto nos leva a acreditar que, nestes sistemas, apenas o aumento da covalência não implica necessariamente em aumento de polarizabilidade nos íons (Tabela 4). Percebe-se, principalmente, que é fundamental que a região espectral do elétron óptico proporcione um efeito de probabilidade de transição interessante. Podemos concluir que, para os complexos em solução aquosa, o DTPO possui pouca interação com os níveis de energia do metal (um pouco maior do que a interação das moléculas de água), e não modifica tanto as propriedades eletrônicas fundamentais (formas de linha, intensidades das transições e deslocamentos de freqüências), relativas aos padrões aquosos dos íons Nd3+ e Er3+ podendo, em alguns casos específicos, substituir o material hexaidratado em alguns sistemas necessariamente hidrofóbicos, como por exemplo, nos dispositivos eletrônicos de conversão de radiação onde, na maioria dos casos descritos na literatura, a presença de moléculas de água em certos materiais ocasiona diminuição na taxa de absorção de fótons ou supressão na intensidade emissiva e, conseqüentemente, perda de eficiência quântica do material.



Recebido em 6/1/03; aceito em 12/12/03

  • 1. Vicentini, G.; Zinner, L. B.; Zukerman-Schpector, J.; Zinner, K.; Coord. Chem. Rev. 2000, 196, 353.
  • 2. Sá, G. F. de; Malta, O. L.; Mello Donegá, C. de; Simas, A. M.; Longo, R. L.; Santa-Cruz, P. A.; Silva Jr, E. F. da; Coord. Chem. Rev. 2000, 196, 165.
  • 3. Saez-Puche, R; Caro, P.; Rare Earths, Editorial Complutense: Madrid, 1998, p. 317-331.
  • 4. Sinha, S. P.; Spectrochim. Acta 1966, 22, 57.
  • 5. Iftikhar, K.; Inog. Chim. Acta 1987, 129, 261.
  • 6. Karraker, D. G.; Inorg. Chem. 1968, 7, 473.
  • 7. Vicentini, G.; Lima, F. J. S.; An. Assoc. Bras. Quim. 1995, 44, 41.
  • 8. Garrido Pedrosa, A. M.; Pimentel, P. M.; Lima, F. J. S.; Silva, A. G.; Melo, D. M. A.; An. Assoc. Bras. Quim. 2001, 50, 29.
  • 9. Lima, F. J. S.; Silva, A. G.; Assis, E. F.; An. Assoc. Bras. Quim. 1998, 47, 164.
  • 10. Ronda, C. R.; J. Alloys Compd. 1995, 225, 534.
  • 11. Parker, D.; Kanthi-Senanayake, P.; Williams, J. A. G.; J. Chem. Soc., Perkin Trans. 2 1998, 10, 2129.
  • 12. Gameiro, C. G.; Silva Jr., E. F. da; Alves. Jr., S.; Sá, G. F. de; Santa-Cruz, P. A.; Mater. Sci. Forum 1999, 315, 249.
  • 13. Kondo, T.; Akazone, M.; Watanabe, Y.; J. Chem. Soc., Chem. Commun. 1991, 757
  • 14. Berry, R. S.; Rice, S. A.; Ross, J.; Physical Chemistry, John Wiley & Sons: New York, 1980.
  • 15. Pitzer, X. S.; Quantum Chemistry, Academic Press Prentice-Hall, 1965.
  • 16. Garrido Pedrosa, A. M.; Marinho, E. P.; Zinner, K.; Vicentini, G.; Zinner, L. B.; An. Assoc. Bras. Quim 2002, 51, 45.
  • 17. Curtis, N. F.; Curtis, J. M.; Inorg. Chem. 1965, 4, 804.
  • 18. Lever, A. B. P.; Mantovani, E.; Ramaswamy, B. S.; Can. J. Chem 1971, 49, 957.
  • 19. Vicentini, G.; Fentanes, O. J.; An. Acad. Bras. Ciênc. 1979, 51, 451.
  • 20. Forsberg, J. H.; Coord. Chem. Rev. 1973, 10, 195.
  • 21. Marinho, E. P.; Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil, 2000.
  • 22. Marinho, E. P.; Sousa, W. S. C.; Araújo Melo, D. M.; Zinner, L. B.; Zinner, K.; Mercuri, L. P.; Vicentini, G.; Thermochim. Acta 2000, 344, 67.
  • 23. Carnal, W. T.; Fields, P. F.; Wybourne, B. G.; J. Chem. Phys. 1965, 42, 3797.
  • 24. Henrie, D. E.; Choppin, G. R.; J. Chem. Phys. 1968, 40, 477.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jul 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2004

    Histórico

    • Aceito
      12 Dez 2003
    • Recebido
      06 Jan 2003
    Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br