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O coulômetro de sódio: um experimento interessante de eletroquímica

The sodium coulometer: an interesting electrochemistry experiment

Resumo

The diffusion of sodium through glass, the basis of a sodium coulometer, was revised and modified for the application to present-day light bulbs. Low pressure inert gas-filled incandescent lamps are useless to attain satisfactory results. The inclusion of a 450 V power supply in series with the electrolysis cell provided sufficient potential to overcome the effect of the inert gas molecules inside the bulb.

sodium coulometer; sodium diffusion; diffusion through glass


sodium coulometer; sodium diffusion; diffusion through glass

EDUCAÇÃO

O coulômetro de sódio - um experimento interessante de eletroquímica1 1 * e-mail: bona@iq.ufrj.br Oferecido, in memoriam, ao Prof. Augusto Araújo Lopes Zamith, eminente Professor de Físico-Química do Instituto de Química da UFRJ, que foi o primeiro a chamar minha atenção para este tópico.

The sodium coulometer - an interesting electrochemistry experiment.

José Alberto P. Bonapace

Departamento de Química Inorgânica, Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, CP 68563, 21945-970 Rio de Janeiro - RJ

ABSTRACT

The diffusion of sodium through glass, the basis of a sodium coulometer, was revised and modified for the application to present-day light bulbs. Low pressure inert gas-filled incandescent lamps are useless to attain satisfactory results. The inclusion of a 450 V power supply in series with the electrolysis cell provided sufficient potential to overcome the effect of the inert gas molecules inside the bulb.

Keywords: sodium coulometer; sodium diffusion; diffusion through glass.

Coulômetros são instrumentos de construção clássica, capazes de medir a quantidade de carga elétrica que circula em um circuito elétrico. A determinação pode ser feita pela medida da diferença de massa em um dos seus eletrodos, ou pela titulação de espécies oxidadas ou reduzidas que surgem durante o experimento. Este equipamento permite demonstrar elegantemente as Leis de Faraday, realizar uma determinação precisa de massas atômicas e estabelecer correlações entre a carga do elétron, o número de Avogadro e a constante de Faraday. Modernamente, existem versões sofisticadas desse instrumento, totalmente eletrônicas1, que são de grande valia para estudos competitivos dentro da área de eletroquímica.

Pouco após o início do uso generalizado de lâmpadas elétricas, foi proposta uma modalidade diferente de coulômetro. Para tal, realizava-se a deposição eletrolítica de sódio metálico dentro do bulbo de uma lâmpada, sem romper o vidro. A pesagem da lâmpada antes e após o experimento, permitia determinar a quantidade de sódio formado depois de um certo tempo de eletrólise. O experimento, em sua forma original, pode ser descrito como a seguir2-5 e visualizado na Figura 1.


Uma lâmpada incandescente de alto vácuo tem seu bulbo de vidro parcialmente imerso em nitrato de sódio fundido. O filamento da lâmpada é aceso de maneira usual. Um miliamperímetro é intercalado entre um dos pólos da lâmpada e um eletrodo, que funciona como condutor para os elétrons, também imerso no banho salino. Observa-se uma indicação de corrente no miliamperímetro e após certo tempo de eletrólise, o aparecimento de um depósito brilhante de sódio metálico, na parte do vidro que estiver mais fria.

Podemos explicar as observações feitas da seguinte maneira: o nitrato de sódio fundido é um eletrólito forte, dissociado em íons sódio e nitrato. O vidro da lâmpada, do tipo cal-soda, tem um teor elevado de íons sódio (12 a 17%, Tabela 1), e esses íons têm no vidro uma mobilidade muito boa. O eletrodo, imerso no sal fundido, encontra-se em uma referência positiva em relação ao potencial elétrico presente no meio do filamento. Conseqüentemente, os íons sódio do sal migram pelo vidro para o interior do bulbo da lâmpada, sendo neutralizados pelos elétrons de origem termoiônica, emitidos pelo filamento. O sódio elementar, então formado, destila conforme o gradiente de temperatura existente dentro do bulbo e se deposita em regiões que estejam mais frias. É citado2 que as lâmpadas que contenham um gás inerte a baixa pressão não são satisfatórias para esse experimento. A seção de choque das moléculas de gás inibe a mobilidade de partículas dentro do bulbo. Por isso, todas as tentativas feitas para reproduzir o experimento original em nosso laboratório fracassaram, pois as lâmpadas elétricas fabricadas hoje em dia, sempre possuem uma atmosfera interna de gás inerte a baixa pressão para evitar o superaquecimento do filamento, o que se reflete no aumento da vida útil da lâmpada. Numa tentativa para provocar o aparecimento de uma corrente, intercalamos, em série, no circuito lâmpada eletrodo, uma fonte de corrente contínua de 450 V. Surpreendentemente, foi possível controlar uma corrente entre 10 e 20 mA e após uma eletrólise de 3 h observou-se o aparecimento de um depósito brilhante de sódio metálico, na região mais fria dentro da lâmpada.

Na Figura 2, temos uma representação simplificada do procedimento experimental utilizado, que deve ser cuidadosamente reproduzido, considerando-se todas as observações a seguir.


Para evitar a falha prematura do filamento, este foi operado com 100 V ao invés dos 127 V usuais, obtidos a partir de um autotransformador ajustável. A fonte de 450 V funciona com os seus dois terminais flutuantes em relação à terra. Para eliminar problemas com fugas elétricas, esta fonte deve ser alimentada através de um transformador de isolamento 1:1. Como eletrodo condutor usou-se um fio de platina com 4 cm de comprimento e 0,5 mm de espessura. Eletrodos de grafita2 e mesmo o de ferro3,4, citado como mais duradouro, degradam, quando em contato com a fase salina. Um fator importante é o condicionamento prévio do vidro da lâmpada antes de imergi-lo no sal fundido. Sujeiras e impressões digitais, na superfície do vidro, são removidas pela lavagem com uma solução de detergente neutro, seguida de uma lavagem com água deionizada. Deixa-se a água escorrer e a lâmpada seca por sí só em atmosfera livre de poeira. Deve-se evitar o contato dos dedos com o vidro, manipulando-se a lâmpada por sua base metálica. Para enroscar a lâmpada em seu soquete, utiliza-se papel especial para limpar lentes ou um papel que não solte fibras. Nitrato de sódio, de grau analítico, é aquecido, a cerca de 350 ºC, em uma cápsula de porcelana. Lembre-se que nitratos são oxidantes enérgicos e devem ser aquecidos sempre em ausência de matéria orgânica. O experimento deve ser montado em uma capela, utilizando-se materiais elétricos e suportes mecânicos da melhor qualidade disponível. A lâmpada deve ser acesa por alguns minutos e o bulbo quente então é imerso no sal fundido, minimizando assim um choque térmico no vidro. A Figura 3 mostra uma foto do experimento conduzido de acordo com a descrição aqui feita.


Podemos observar que essa experiência demonstra uma série de conceitos físico-químicos importantes, como: a) a eletrólise em sais fundidos; b) a difusão de íons no vidro (analogia com os erros devidos ao sódio, em um eletrodo de vidro para a determinação de pH) e c) a emissão termoiônica por um filamento aquecido. Por um lado estético, temos uma bela visão do metal sódio brilhante, por estar dentro de uma atmosfera inerte. O fato de recolhermos o sódio sem romper o bulbo da lâmpada também leva a questionamentos interessantes.

6. http://custom-glass.com/making8.html, acessada em Junho 2003.

8. http://www.britglass.co.uk/aboutglass/types.htm#1, acessada em Junho 2003.

Recebido em 9/6/03; aceito em 13/10/03; publicado na web em 27/05/04

  • 1. Pela, C . A.; Bruçó, J. L.; Stradiotto, N. R.; Quim. Nova 1989, 12, 94.
  • 2. Kalachnikov, C.; Eletricité, Editions MIR: Moscou, 1977, p. 473-474.
  • 3. Alpern, D. K.; J. Chem. Educ 1957, 34, 289.
  • 4. Alyea, H. N.; Dutton, F. B.; Tested Demonstrations in Chemistry from the Journal of Chemical Education 1965, 214.
  • 5. Shakhashiri. B. Z.; Chemical Demonstrations: A Handbook for Teachers of Chemistry, University of Wisconsin Press, Madison, 1992, vol. 4, Experiment 11:30: Electrodeposition of Sodium Through Glass, http://scifun.chem.wisc.edu/dembkord.html, acessada em Junho 2003.
  • 7. Catálogo de Vidros, Vidro #008, General Electric do Brasil, 1970.
  • 1
    * e-mail:
    Oferecido,
    in memoriam, ao Prof. Augusto Araújo Lopes Zamith, eminente Professor de Físico-Química do Instituto de Química da UFRJ, que foi o primeiro a chamar minha atenção para este tópico.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Ago 2004

    Histórico

    • Aceito
      13 Out 2003
    • Recebido
      09 Jun 2003
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