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Determinação condutométrica de captopril em formulações farmacêuticas utilizando sulfato de cobre(II) como titulante

Conductometric determination of captopril in pharmaceutical formulations using copper(II) sulphate as titrant

Resumo

A simple and rapid conductometric method for captopril determination using copper(II) sulphate solution as titrant was developed. The method was based on the chemical reaction between captopril and Cu(II) ions yielding a precipitate. The conductance of the solution was monitored as a function of the added volume of titrant. The method was applied with success for captopril determination in three pharmaceutical formulations. The relative standard deviation for six successive measurements was smaller than 0.5%. Recovery values from three samples, ranging from 97.7 to 103%, were obtained.

captopril; conductometric titration; copper (II)


captopril; conductometric titration; copper (II)

ARTIGO

Determinação condutométrica de captopril em formulações farmacêuticas utilizando sulfato de cobre(II) como titulante

Conductometric determination of captopril in pharmaceutical formulations using copper(II) sulphate as titrant

Bruna Cláudia Lourenção; Luiz Humberto Marcolino-Junior; Orlando Fatibello-Filho* * e-mail: bello@dq.ufscar.br

Departamento de Química, Universidade Federal de São Carlos, CP 676, 13560-970 São Carlos - SP, Brasil

ABSTRACT

A simple and rapid conductometric method for captopril determination using copper(II) sulphate solution as titrant was developed. The method was based on the chemical reaction between captopril and Cu(II) ions yielding a precipitate. The conductance of the solution was monitored as a function of the added volume of titrant. The method was applied with success for captopril determination in three pharmaceutical formulations. The relative standard deviation for six successive measurements was smaller than 0.5%. Recovery values from three samples, ranging from 97.7 to 103%, were obtained.

Keywords: captopril; conductometric titration; copper (II).

INTRODUÇÃO

A hipertensão arterial é, atualmente, a doença cardiovascular mais comum, sendo a principal causa de acidente vascular cerebral, podendo conduzir a uma insuficiência cardíaca congestiva, aneurisma dissecante da aorta, infarto do miocárdio e hipertrofia ventricular esquerda1,2. Em função de sua alta incidência, tornou-se muito comum na clínica médica a prescrição de um medicamento anti-hipertensivo para uso diário do paciente3.

O captopril, 1-[(2S)-3-mercapto-2- metilpropionil]-L-prolina4 (Figura 1) é um anti-hipertensivo clássico, cuja ação hipotensora se estabelece basicamente pela inibição da enzima conversora de angiotensina, levando à redução da angiotensina II, que se liga a receptores específicos na membrana celular de vários tecidos, exercendo ação fisiológica de regulação da tensão arterial e sendo um potente vasopressor3. Possui um grupo funcional (-SH) que pode agir como um inibidor de radicais livres do organismo com grande eficiência5.


Diversos métodos analíticos são descritos na literatura para a determinação quantitativa de captopril em formulações farmacêuticas. Estes procedimentos incluem: espectrofotometria6,7, cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC)8, potenciometria9,10, espectrometria de absorção atômica11, voltametria4,12-14, entre outros15-17. Muitos destes métodos não são simples para análises de rotina e requerem instrumentos de alto custo e/ou sofisticados.

O método oficial da Farmacopéia Americana18 compreende a titulação iodimétrica de captopril empregando amido como indicador. O método é baseado na mudança de cor da solução, devido à formação do complexo triodeto-amido, o que pode acarretar erros na determinação do ponto de equivalência uma vez que a observação é visual.

Na titulação condutométrica19,20 o aumento ou o decréscimo da condutância são relacionados às variações de concentração das espécies iônicas que participam da reação envolvida. Uma série de medidas da condutância, antes e depois do ponto de equivalência, assinala o ponto final da titulação como uma descontinuidade na variação da condutância.

Há apenas dois métodos condutométricos descritos na literatura21,22. Nikolic e Velasevik21 determinaram condutometricamente captopril em soluções aquosas. Inicialmente o captopril reage com excesso de solução de nitrato de prata com formação de um sal de prata de baixa solubilidade e ácido nítrico em solução (Equação 1).

Os cátions hidrônios são então determinados por titulação condutométrica, empregando-se solução padronizada de hidróxido de sódio.

Esse procedimento é relativamente moroso e de baixa exatidão, uma vez que na titulação do H3O+ formado (Equação 1) com solução de NaOH os íons hidrônio dissociados e/ou hidrogênio do grupo carboxílico (pKa1 = 3,7) do captopril poderão ser titulados parcialmente.

Outro procedimento empregando titulação condutométrica foi proposto por Mohamed e Aboulenein22 para a determinação simultânea de captopril e bendroflumetiazida em preparações farmacêuticas. Nesse procedimento esses fármacos foram solubilizados em dimetilformamida/água 1:1 v/v sendo titulados com solução aquosa de hidróxido de sódio. Apesar destes autores encontrarem recuperações de captopril no intervalo de 98,4 a 101%, a adição do titulante promove a variação da constante dielétrica da mistura de solventes, podendo assim diminuir a exatidão do procedimento.

No presente trabalho descreve-se a titulação condutométrica de captopril com solução padronizada de sulfato de cobre(II) com formação de composto insolúvel deste fármaco com cobre(II), sendo o volume equivalente do titulante (ou teor de captopril na solução do titulado) encontrado no ponto de inflexão da curva condutométrica.

PARTE EXPERIMENTAL

Material e equipamentos

Para as medidas condutométricas utilizou-se uma microbureta automática Methrom/Herisau, modelo E274, um condutivímetro Micronal, modelo B330, célula de vidro com camisa dupla para controle de temperatura e célula condutométrica Digimed DMC-010.

Para o método comparativo utilizou-se um pHmetro Orion, modelo EA 940 com um eletrodo de vidro combinado Analion, modelo V 620, com um eletrodo de referência de Ag/AgCl, contendo uma solução de KCl 3,0 mol L-1.

Soluções e reagentes

Foram utilizados captopril padrão (Sigma) e CuSO4.5H2O (Mallinckrodt).

Todos os reagentes empregados foram de grau analítico e todas as soluções foram preparadas com água desionizada obtida de um sistema Milli-Q Millipore (Bedford, MA), modelo UV Plus ultra-baixo teor de substâncias orgânicas dissolvidas.

A solução estoque de CuSO4.5H2O 3,00 x 10-2 mol L-1 foi preparada dissolvendo-se uma massa adequada deste sal em água desionizada sendo, então, padronizada por titulação complexométrica com EDTA, de acordo com procedimento proposto na literatura23. As soluções de sulfato cúprico em concentrações variando de 5,00 x 10-5 a 3,00 x 10-2 mol L-1 foram obtidas diluindo-se apropriadamente a solução estoque.

As soluções de captopril no intervalo de concentração de 5,00 x 10-5 a 3,00 x 10-2 mol L-1 foram preparadas diluindo-se uma solução estoque do fármaco 1,00 x 10-1 mol L-1.

Determinação de captopril em amostras comerciais

Amostras, na forma de comprimido, contendo captopril foram adquiridas no comércio e analisadas pelo método proposto e os resultados comparados com aqueles obtidos empregando-se um procedimento potenciométrico descrito por Ribeiro e colaboradores9.

Dez comprimidos de cada amostra foram triturados e para o preparo da solução foi utilizada uma massa equivalente a um comprimido, que foi dissolvida em 10 mL de água desionizada e titulada com solução padronizada de CuSO4.5H2O.

Procedimento comparativo

Como procedimento comparativo para validar o procedimento proposto empregou-se uma titulação potenciométrica da solução do fármaco com solução de hidróxido de sódio e um eletrodo de vidro combinado como eletrodo indicador9.

Titulação condutométrica

Alíquotas de 10 mL (soluções de referência ou de amostras) foram colocadas em uma célula de vidro com camisa dupla e tituladas com soluções de mesma concentração de sulfato de cobre, registrando-se a cada adição do titulante, em intervalos de 20 s, o valor de condutância. Esse valor deve ser corrigido em função do volume de titulante adicionado de acordo com a Equação 2, sendo: Lcorrig.a condutância corrigida, LExper. a condutância experimental, Vi o volume inicial e Va o volume adicionado.

A partir do gráfico de condutância vs. volume de solução de Cu2+, encontrou-se o volume equivalente e, assim, a concentração de captopril nas soluções tituladas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estudos preliminares

Inicialmente, avaliou-se o intervalo de tempo entre as adições do titulante a fim de se obter maior precisão nos resultados. Os tempos de 15, 20 e 30 s foram estudados utilizando-se concentração de captopril 1,47 x 10-4 mol L-1 e de sulfato de cobre 1,16 x 10-4 mol L-1. O melhor resultado foi obtido com o intervalo de tempo de 20 s entre as medidas, pois este apresentou um menor desvio padrão relativo e as curvas de titulação, uma melhor resolução.

Com o tempo estabelecido em 20 s, realizaram-se 3 titulações sucessivas de solução padrão de captopril em concentrações variando de 5,00 x 10-5 a 3,00 x 10-2 mol L-1 utilizando o titulante sulfato de cobre sempre na mesma concentração do titulado.

A Tabela 1 apresenta os resultados obtidos para cada concentração de solução padrão (de referência) de captopril, podendo ser observada uma boa concordância entre os teores de captopril determinados condutometricamente e as concentrações das soluções de referência.

Para concentrações de captopril menores de 5,00 x 10-5 mol L-1, a adição do titulante ocasionou pequenas variações de condutância. Como conseqüência, a determinação do ponto de equivalência pode ser determinada até um teor mínimo de 3,00 x 10-5 mol L-1 mas com uma exatidão menor, da ordem de 8-9%.

A Figura 2 apresenta uma curva condutométrica característica obtida para a determinação de 5 mL de captopril 1,20 x 10-3 mol L-1 utilizando solução de Cu2+ 1,16 x 10-3 mol L-1 como titulante.


A condutância medida antes da adição do titulante (volume de Cu2+ igual a zero) deve-se à dissociação do próton do grupo carboxílico e, em menor intensidade, do próton do grupo sulfidrila presente na molécula de captopril (Figura 1).

Até o ponto de equivalência, a titulação envolve a gradual substituição de dois prótons da molécula de captopril por um átomo de Cu2+ (Figura 3). Este aumento da condutância é devido à maior mobilidade do íon H3O+ em relação àquela do Cu2+, ocasionando assim uma forte inclinação da curva condutométrica (primeiro ramo da curva).


Após o ponto de equivalência, à medida que são adicionados volumes crescentes da solução do titulante, há um aumento linear da condutância em função do volume da solução de Cu2+ adicionada, devido ao aumento das concentrações desse cátion metálico e dos ânions SO42-(aq) na solução resultante. Como a soma das mobilidades desses íons é menor que aquela dos cátions H3O+ há uma diminuição da inclinação do segundo ramo da curva de titulação, sendo o ponto de equivalência determinado pelo ponto de intersecção dos dois segmentos de reta.

No estudo da repetibilidade do procedimento condutométrico, uma solução de captopril 1,20 x 10-3 mol L-1 foi titulada condutometricamente por seis vezes (n=6) com solução de Cu2+ 1,20 x 10-3 mol L-1 e o desvio padrão relativo (RSD) obtido foi menor que 0,5%.

Estudo de interferentes em potencial e teste de recuperação

O efeito de interferentes em potencial na determinação de captopril em formulações farmacêuticas foi avaliado para excipientes normalmente presentes em amostras comerciais (amido, lactose, celulose, dióxido de silício e estearato de sódio).

Nesses experimentos foram feitas comparações do volume do ponto de equivalência obtido empregando-se uma solução de referência de captopril 1,0 x 10-3 mol L-1 com o volume do ponto de equivalência obtido empregando-se a mesma solução de referência de captopril juntamente com cada um dos interferentes em potencial nas concentrações esperadas nos produtos comerciais. Não houve interferência significativa nos valores de volume de equivalência en contrados para essas substâncias estudadas. Cabe salientar que a maioria destes excipientes é insolúvel e/ou possui baixa solubilidade.

A Tabela 2 apresenta os resultados obtidos no estudo de adição e recuperação do analito em três diferentes concentrações de captopril, adicionadas a três diferentes amostras de formulações farmacêuticas. Os resultados são comparados com aqueles obtidos com as amostras não adicionadas de padrão. As recuperações de captopril variaram de 97,7 a 103%, evidenciando assim que não há interferência significativa da matriz da amostra no procedimento condutométrico proposto.

Aplicações

O método proposto foi aplicado na determinação de captopril em três diferentes formulações farmacêuticas e os resultados comparados com aqueles obtidos empregando-se um método comparativo9. A Tabela 3 apresenta os resultados obtidos nestas determinações. Como pode ser observado, o procedimento proposto possui boa precisão sendo que os valores encontrados empregando-se ambos os métodos estão em boa concordância a um nível de confiança de 95% (tcalc = 2,31 e tcrítico = 4,30).

CONCLUSÕES

O método condutométrico proposto para a determinação de captopril em produtos farmacêuticos é simples, preciso, exato, de baixo custo e não necessita de nenhum tipo de tratamento da amostra, podendo ser aplicado em laboratórios de análise de rotina.

AGRADECIMENTOS

A o apoio financeiro do CNPq, da FAPESP e CAPES, bem como à FAPESP pela bolsa de iniciação científica de B. C. Lourenção (Proc. no. 06/05693-0) e à CAPES pela bolsa de doutorado de L. H. Marcolino Jr.

Recebido em 26/4/07; aceito em 16/7/07; publicado na web em 26/2/08

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  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Set 2009
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      26 Abr 2007
    • Aceito
      16 Jul 2007
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