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Desempenho físico-químico e mecânico de concreto de cimento Portland com borracha de estireno-butadieno reciclada de pneus

Physicochemical and mechanical performance of portland cement concrete with recycled styrene-butadiene tyre-rubber waste

Resumo

Physicochemical and mechanical techniques were carried out to characterize three concrete tyre-rubber waste dosages such as 5, 10 and 15%, w/w. The elastomeric material was identified as styrene-butadiene rubber (SBR). It was observed that the growing SBR content in the mixture decreased the concrete performance. The best results were presented by 5% w/w tyre-rubber waste concrete sample. This composition was tested at Mourão hydroelectric powerplant spillway as repairing material.

SBR; tyre-rubber waste; concrete


SBR; tyre-rubber waste; concrete

ARTIGO

Desempenho físico-químico e mecânico de concreto de cimento Portland com borracha de estireno-butadieno reciclada de pneus

Physicochemical and mechanical performance of portland cement concrete with recycled styrene-butadiene tyre-rubber waste

Camila FreitasI; José Carlos Alves GalvãoI; Kleber Franke PortellaII,* * e-mail: portella@lactec.org.br ; Alex JoukoskiII; Carlos Vicente Gomes FilhoIII; Elizeu Santos FerreiraIV

IDepartamento de Engenharia, Universidade Federal do Paraná, CP 19011, 81531-990 Curitiba - PR, Brasil

IIDepartamento de Tecnologia em Materiais, Instituto de Tecnologia para o Desenvolvimento, CP 19067, 81531-980 Curitiba - PR, Brasil

IIIInstituto de Engenharia do Paraná, R. Emiliano Perneta, 174, 80010-050 Curitiba - PR, Brasil

IVDepartamento de Manutenção da Geração, Companhia Paranaense de Energia, R. José Izidoro Biazetto, 158, 81200-240 Curitiba - PR, Brasil

ABSTRACT

Physicochemical and mechanical techniques were carried out to characterize three concrete tyre-rubber waste dosages such as 5, 10 and 15%, w/w. The elastomeric material was identified as styrene-butadiene rubber (SBR). It was observed that the growing SBR content in the mixture decreased the concrete performance. The best results were presented by 5% w/w tyre-rubber waste concrete sample. This composition was tested at Mourão hydroelectric powerplant spillway as repairing material.

Keywords: SBR; tyre-rubber waste; concrete.

INTRODUÇÃO

As estruturas de concreto devem ser projetadas para operar dentro da vida útil da obra e das especificações de serviço, devendo resistir aos mecanismos de desgaste aos quais estão sujeitas. Em grandes empreendimentos, principalmente, é proeminente e necessário o acompanhamento do seu desempenho e das condições de serviço, a fim de se evitar possíveis danos catastróficos, vindo a comprometer sua segurança e operacionalidade.1

Existem obras que estão sujeitas a ações agressivas constantes e, por este motivo, devem ser previstos reparos ao longo de sua vida útil. Como exemplos têm-se as barragens construídas para o aproveitamento hidroelétrico, consumo de água e controle de cheias. Nestes casos, o concreto utilizado está sujeito ao intemperismo natural e ao desgaste superficial, devido à ação química e física da água do reservatório e de outros materiais sólidos arrastados por esta. As principais causas de desgastes superficiais são a cavitação, a abrasão-erosão e os ataques químicos.

A cavitação é normalmente corrigida com alterações de projeto; a abrasão e a erosão são decorrentes tanto da fricção ou atrito de elementos transportados pela água quanto do seu contato em fluxo, devendo o concreto superficial ter características especiais para reduzir o desgaste resultante. Os ataques químicos são causados pela água com alta ou baixa dureza e com a presença ou ausência de constituintes químicos alcalinos e ácidos nela dissolvidos. Assim, praticamente, todo o tipo de água em contato constante ou mesmo sob ciclos de secagem e molhagem intercalados pode ocasionar danos. Nestes exemplos, o poder de dissolução pela água e de reação dos constituintes da pasta de cimento ampliam os defeitos estruturais. A corrosão dos metais da armadura provocada pelo abaixamento localizado do pH do concreto até próximo ou igual a 8,3 é um caso comum originado, principalmente, pelo processo de carbonatação do hidróxido de cálcio ou portlandita presente, a partir do ácido carbônico dissolvido.1,2

A dissolução com lixiviação do íon cálcio por outros constituintes da água favorece a diminuição da resistência mecânica do concreto, sendo, normalmente, oriunda da ação dos ácidos orgânicos (húmico, cítrico, fórmico, entre outros) e inorgânicos, destacando-se os ácidos sulfúrico, nítrico e clorídrico. Outros danos gerados a pequenas profundidades das superfícies hidráulicas e ao longo do tempo são as fissuras. Estas podem ser resultantes de expansões químicas causadas pelos álcalis sódio e potássio. Também, por ataque de sulfato e carbonatação, são obtidos produtos de reação, tais como a etringita (3CaO.Al2O3.3CaSO4.32H2O ou na química do cimento ) e a taumasita, com composição química Ca3Si(OH)6(SO4)(CO3).12H2O ou , respectivamente.2

Conhecendo-se a origem do defeito, podem-se especificar materiais de reparo (MR) para as superfícies desgastadas, de forma que sejam adequados à sua característica, bem como às condições operacionais especificadas em projeto.

A utilização de um MR deve ser direcionada para possuir melhores qualidades que o concreto original,1 ter custo baixo, boa aderência e baixa permeabilidade para diminuir a ação dos agentes agressivos externos. Deve ser verificada, também, a compatibilidade entre este e o concreto existente. Se os dois sistemas possuem características muito diferentes o MR ou a estrutura circundante fica sujeito a novos danos. Uma dosagem de concreto convencional de mesma formulação daquele utilizado na obra é o mais compatível. No entanto, seu uso como MR pode ser equivocado, uma vez que já esteve suscetível aos agentes agressivos.3

O uso de materiais recicláveis em estruturas civis não poderá ter, somente, uma característica ambiental, pelo fato de poder antecipar seu descarte se não forem atendidos os preceitos tecnológicos da obra, com melhoria de qualidade e desempenho.4

O emprego de concreto com adição de borracha (CAB) é um caso típico de compósito com desempenho melhorado em algumas das propriedades originais, tal como no aumento da capacidade de deformação sem o aparecimento de fissuras. Porém, vem sendo percebida uma diminuição real na resistência mecânica à compressão.4,5

Não há um consenso de que as resistências à abrasão de concretos e argamassas sejam ampliadas com a adição de borracha, demonstrando ter desempenho aproximadamente igual ou menor que em dosagens similares de concreto convencional.3-5

A utilização de CAB é também importante do ponto de vista ecológico. O crescimento do descarte de pneus usados vem levando ao limite a capacidade dos aterros sanitários das metrópoles. Há mais de 100 milhões de pneus inservíveis em depósitos oficiais e clandestinos no Brasil. Em 2005, em São Paulo, a quantidade de pneus se aproximou de 3% do lixo urbano.6

A reutilização do pneu inservível pelos processos atuais de fabricação é impraticável economicamente, em virtude das ligações cruzadas provenientes do processo de vulcanização da borracha. Existem alguns métodos de desvulcanização, porém, não são totalmente eficientes por gerarem uma borracha cara e com uso limitado.3,7 Alguns setores industriais absorvem parte dos pneus inservíveis, como é o caso das cimenteiras, que os utilizam como combustível em alto-fornos.7

O tempo de degradação dos pneus, ao redor dos 150 anos, também dificulta sua estocagem; por isso, há uma resolução nacional designando aos fabricantes e importadores a responsabilidade pela sua destinação final.8 A reciclagem, por meio da recapagem ou da remoldagem, aumenta a sua vida útil em cerca de 40% e diminui o consumo de matéria-prima e de energia. No entanto, este processo gera como resíduo as raspas de borracha. Estas vêm sendo aproveitadas como matéria-prima para várias indústrias paralelas, incluindo a indústria da construção civil, objeto desta pesquisa. Para tanto, considerou-se como estudo de caso a aplicação deste resíduo industrial como MR da superfície do vertedouro da Usina Hidroelétrica Mourão (UHE Mourão).

PARTE EXPERIMENTAL

Caracterização dos insumos 9,10

O aglomerante utilizado foi o cimento Portland composto com adição de pozolana, classe 32, denominado CPII-Z 32. Este material foi caracterizado quanto a sua composição química e resistência mecânica com o tempo. Também, foram caracterizados a distribuição granulométrica, o tempo de pega, a expansibilidade a quente, a massa específica e o índice de finura, todos segundo recomendações de normas.

Como agregado miúdo, foi utilizada areia natural média lavada, sendo testada com o objetivo de verificar e qualificar os materiais de origem, o teor de impurezas e de possibilitar as correções de dosagem.

Pedra brita com dimensão máxima característica de 19 mm foi adicionada como agregado graúdo, sendo caracterizada previamente por técnicas físico-químicas. Também foi realizada a análise petrográfica para a determinação da sua microestrutura e rocha de origem.

Para propiciar melhor trabalhabilidade ao CAB foi utilizado um aditivo de origem comercial que é plastificante polifuncional e redutor de água, à base de sais sulfonados. Este aditivo não foi caracterizado em laboratório.

Foram utilizadas raspas de borracha vulcanizada provenientes da indústria de remoldagem de pneus como material substituto ao agregado miúdo. A sua caracterização foi feita por espectrofotometria de infravermelho com transformada de Fourier (FTIR), com o material pulverizado e prensado em pastilhas de KBr, análise no modo de transmitância, em números de onda compreendidos entre 500 e 5000 cm-1, resolução de 4 cm-1 e 21 varreduras/min.

A borracha utilizada não passou por nenhum tipo de tratamento anterior à sua incorporação no concreto. Esta opção foi considerada com base em estudos que propuseram minimizar os custos e simplificar os métodos, já que não foi constatada melhoria na resistência mecânica do CAB, a não ser com o uso de aditivos tipo vinílico, acrílico e de estireno-butadieno.10 Mesmo assim, foi identificada pouca evolução no desempenho quanto à aderência entre o MR e o concreto-referência ou convencional, CR.

Água potável foi utilizada para o amassamento da mistura.

Dosagens dos concretos

Foram dosados os traços do CR e dos concretos com adição de 5% em peso (p/p), CAB 5; 10% (p/p), CAB 10; e 15% (p/p) de borracha, CAB 15. A incorporação da borracha se deu em relação ao peso do agregado miúdo do CR, e em substituição parcial ao mesmo. A partir destas dosagens foram fabricados os corpos-de-prova (CPs) para os ensaios de resistência ao arrancamento e da resistência à abrasão pelo método submerso e para a caracterização física e mecânica aos 28 dias de cura em câmara úmida.

A consistência dos concretos, expressa pela medida do abatimento de tronco de cone, foi deixada livre, de forma a ser um dos parâmetros variáveis a ser avaliado em função do teor de partículas de borracha.

Os traços dos concretos produzidos encontram-se listados na Tabela 1.

Propriedades dos concretos no estado fresco 11

A principal propriedade considerada foi a consistência, haja vista que o aumento da incorporação de borracha foi baseado na trabalhabilidade do concreto. O método utilizado foi o de abatimento de tronco de cone.

A massa unitária, de cada dosagem do concreto, foi determinada consecutivamente depois do preenchimento completo de um recipiente de volume conhecido e normalizado.

O teor de ar incorporado foi medido conforme a ABNT NBR NM 47.11

Foram moldados CPs cilíndricos de 100 x 200 mm para a medida da resistência à compressão aos 28 dias e das propriedades físicas do concreto (índice de vazios, absorção e massa específica). Os CPs foram desmoldados após 5 dias de cura ambiente.

Propriedades dos concretos no estado endurecido 12

As resistências à abrasão submersa e de aderência à tração são características importantes das superfícies hidráulicas. A destruição da estrutura do concreto se processa ou pelo rompimento dos grãos dos agregados ou pelo seu arrancamento.1

Para a caracterização da resistência à abrasão pelo método submerso e da resistência de aderência, foram utilizados CPs cilíndricos de 300 x 100 mm. Os moldes foram preenchidos por completo usando-se o CR. O seu adensamento foi realizado por vibração de imersão. Após o acabamento superficial e antes do fim de pega, foram feitas 3 cavidades cilíndricas nos CPs com diâmetros e profundidades médios de 50 mm. Estes vazios foram preenchidos com CAB e o próprio CR depois da cura úmida do CP.

Para melhor caracterizar o desgaste superficial foram avaliadas as profundidades dos CPs, com paquímetro, a cada cm2 de área correspondente. Os resultados foram apresentados em forma gráfica tridimensional. Também foi verificada a perda de massa resultante.

Os CPs de resistência ao arrancamento tiveram seus vazios preenchidos com apenas um tipo de MR. O adensamento foi realizado com o auxílio de haste metálica e mesa vibratória. Os CPs com vazios superficiais e um exemplo preenchido podem ser vistos na Figura 1.


Foi determinada a resistência à compressão axial simples em CPs cilíndricos, aos 3, 7, 28 e 90 dias, conforme ABNT NBR 5739/94.12 A realização dos ensaios nas diversas idades permitiu o acompanhamento da evolução das resistências com o avanço do tempo de cura.

Para a determinação das resistências à tração na flexão e por compressão diametral, aos 28 dias, foram utilizados os procedimentos da ABNT NBR 7222/94 e da NBR 12142/92, respectivamente.12

O módulo de deformação estático tangente inicial foi obtido segundo a ABNT NBR 8522/84, aos 28 dias.12

Para o ensaio de resistência de aderência entre o CR e os CABs foram utilizados CPs semelhantes aos do ensaio de abrasão. Para este estudo cada CP possuiu 2 traços em análise, sendo um o de CR e, o outro, um dos traços de CAB. A metodologia foi implementada com adaptações na velocidade de carregamento, no tipo de placa colada na superfície do CP e na sua fixação na máquina de ensaio.10 Foram coladas placas metálicas de 50 mm de diâmetro sobre o MR para acoplar o CP ao dispositivo de ensaio. Neste caso, foi empregada resina epóxi bi-componente com resistência estimada de 60 MPa, aos 3 dias. A velocidade de ensaio utilizada foi de 1 mm/min.

Para a determinação do índice de vazios, massa específica e da absorção de água foram moldados 3 CPs cilíndricos nas dimensões de 100 x 200 mm, sendo testados após 28 dias de cura em câmara úmida.12

A micrografia da superfície de fratura do concreto foi obtida por microscopia eletrônica de varredura (MEV) após metalização com ouro, via vaporização catódica ao vácuo. Este teste foi realizado após 28 dias de cura, em equipamento Philips modelo XL 30. Análises químicas elementares semi-quantitativas foram feitas com a microssonda analítica de raios X (espectroscopia de energia dispersiva, EDS) acoplada ao equipamento.

Estudo de caso: UHE Mourão

Antes da aplicação dos MRs em campo, foram extraídos testemunhos para a avaliação das patologias existentes. A análise foi efetuada por MEV e EDS.

Após, foram recortadas e escarificadas áreas da superfície do vertedouro a uma profundidade média de 50 mm e com dimensões aproximadas de 750 mm de lado. Para a aplicação dos MRs foi usada resina epóxi bi-componente como ponte de aderência.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Patologias do concreto da UHE Mourão

A análise micrográfica por MEV da superfície de fratura dos CPs da UHE Mourão demonstrou a presença de cristais de etringita e gel de CaO.SiO2.H2O (CSH), conforme visualizado na Figura 2. A análise por EDS da região do cristal revelou uma composição química elementar semiquantitativa, em porcentagem em peso de 62,6% de O; 7,1% de Al; 8,4% de S; 21,4% de Ca; e 0,5% de C. Estes valores e seu respectivo espectro estão em concordância com o encontrado na literatura e, também, com a da composição estequiométrica da etringita pura, que é de 63,8% para O; 4,3% para Al; 7,7% para S e 19,1% para Ca. 12


Caracterização dos insumos

A composição química do cimento Portland, com exceção do teor de equivalente alcalino, cerca de 30% acima do especificado (dado pela relação Na2Oeq= (Na2O + 0,658 K2O)),2 ficou dentro das recomendações de norma.11 Com este teor, tem-se a possibilidade da ocorrência de reações expansivas com agregados reativos.2

Os testes químicos e petrográficos realizados no agregado miúdo demonstraram que o mesmo é composto, basicamente, de quartzo tensionado, que é uma fase mineralógica reconhecidamente reativa.13 Os resultados obtidos nos ensaios físicos encontraram-se dentro do recomendado, inclusive o da distribuição granulométrica.12

A análise petrográfica do agregado graúdo mostrou que o material é formado por riolito originado de rocha ígnea constituída por uma matriz de quartzo-feldspato de granulação fina com fenocristais de feldspato potássico e quartzo. A textura é fanerítica inequigranular portifírica e de estrutura maciça.

As reatividades potenciais de ambos os agregados foram inócuas com o cimento utilizado, apesar de ter sido identificado um teor não recomendado de álcalis no mesmo. Pode-se inferir que este resultado positivo, pela redução da possibilidade de haver reações químicas expansivas, seja conseqüente do teor de pozolana presente no CPII-Z 32, entre 6 e 14%.9

A composição preponderante do resíduo de borracha vulcanizada de pneu foi caracterizada, por intermédio do banco de dados da Bomen (Sadtler, digital libraries, 95-0867), como sendo de borracha de estireno-butadieno (SBR). Seu espectro obtido por FTIR é similar ao do padrão de referência tipo Kraton D-2102.

A distribuição granulométrica apresentada pela borracha está dentro dos limites recomendados para o agregado miúdo natural, conforme pode ser visualizado na Figura 3.12


Dosagens dos concretos

Quanto aos traços estudados, os resultados apresentados na Tabela 1 demonstraram que houve uma redução gradual na quantidade de agregado miúdo natural (areia), chegando a perto de 15% em peso (p/p) com o aumento do teor de borracha até o CAB 15.

Neste caso, foram constatadas as seguintes possibilidades: redução direta do impacto ambiental, por meio da retirada dos pneus inservíveis dispostos inadequadamente; imobilização dos resíduos de borracha em obras que têm vida útil estimada superior a 50 anos, tais como as barragens das usinas hidroelétricas e, preservação indireta do meio ambiente, pela diminuição do volume de extração de areia natural, processo que causa grandes prejuízos à fauna e flora locais.

Propriedades dos concretos no estado fresco

Os resultados demonstraram haver perdas graduais na trabalhabilidade com o CAB, partindo de 190 mm no CR; 120 mm no CAB 5; 23 mm no CAB 10; passando a uma consistência seca e de baixa coesão de 10 mm para o CAB 15. Tais resultados podem ser produtos do tipo, forma e quantidade de fibras de borracha adicionadas, necessitando aumentos na relação água/cimento para a manutenção do valor considerado padrão. A massa unitária variou de 2307 kg/m3 para o CR para 2157 kg/m3 para o CAB 15, representando uma diminuição total em torno de 7%. O ar aprisionado aumentou neste intervalo de dosagem, em média, 152%, respectivamente. Lopes et al.15 verificaram o aumento de 227% do ar aprisionado pela adição de 5% de borracha em substituição à areia, em massa.

Propriedades dos concretos no estado endurecido

A resistência à compressão axial simples dos concretos estudados encontra-se apresentada na Figura 4, em função do teor de borracha adicionada.


A perda de resistência pode estar atribuída ao menor módulo de deformação elástico das partículas de borracha e à menor resistência destas em relação à pasta de cimento e aos agregados. Como a borracha tem maior capacidade de deformação, sua capacidade de resistir aos esforços aplicados fica limitada pela rigidez da matriz de concreto. As partículas de borracha funcionam como vazios no interior da massa de concreto.1,15 Também pode estar relacionada a outros fatores, como o aumento do teor de ar aprisionado. Quanto maior o teor de ar aprisionado maior a porosidade e menor a sua resistência.1 A perda média resultante para o CAB 15 foi de 48,3%. Este percentual foi similar ao encontrado na literatura para o CAB 5, confeccionado com borracha na forma de grânulos arredondados.15 As fibras de borracha apresentaram melhor comportamento mecânico que os grânulos arredondados.

A resistência à tração na flexão diminuiu cerca de 30% até o CAB 15, sendo atribuída às diferenças entre os materiais poliméricos e cerâmicos. Neste caso, consideram-se os polímeros como defeitos internos à matriz de concreto. Tal redução pode estar também relacionada ao aumento do teor de ar no concreto. As perdas de resistência à tração por compressão diametral para os CABs 5 e 10, em relação ao CR, foram de 10,5 e 21%, respectivamente. Para o CAB 15 a perda resultante foi de 19,3%. Na Tabela 2, estão mostrados os valores correspondentes.

Foi observada a redução das fissurações em função do aumento do teor de borracha na mistura, sendo necessária a aplicação de um esforço extra para a separação total das faces rompidas. As fibras de borracha mantiveram as duas interfaces unidas, tal como descrito na literatura.5,16,17 Atribui-se tal efeito ao menor módulo de elasticidade da borracha e à sua possibilidade de atuar como ponte de transferência de tensões, iniciando pelo mecanismo elástico seguido pelo de atrito, após fissuração.18

O módulo de deformação estático tangente inicial de um concreto depende das características da pasta, dos agregados, das características da zona de interface pasta-agregado e da idade do concreto.1 No CAB 5, o módulo baixou 17% em relação ao CR. Para o CAB 15 esta redução foi de 30%, com um valor final de 23,3 ± 1,0 GPa.

Os resultados do teste de resistência à abrasão pelo método submerso indicaram desgastes da ordem de 8,6 mm para o CR; 8,3 mm para o CAB 5; 6,2 mm para o CAB 10 e 3,7 mm para o CAB 15, respectivamente.

No CR ocorreu o desgaste da pasta até a superfície da brita, sendo que alguns agregados foram arrancados. Na região preenchida com CAB este desgaste não foi tão intenso. A argamassa permaneceu envolvendo parte da superfície do agregado graúdo após o ensaio.

O CAB 15 apresentou o menor desgaste resultante entre os 4 traços presentes. Pode-se inferir que tal desempenho tenha sido conseqüente do próprio teor de borracha na mistura, uma vez que foi observada melhoria de desempenho deste parâmetro com o aumento da concentração da mesma nas dosagens. Na Figura 5, está mostrada a imagem da superfície de um dos CPs resultantes do ensaio.


Os valores médios da resistência de aderência pelo método de tração na superfície entre o CR e o CAB foram de, aproximadamente: 4,5 MPa no CR; 4,9 MPa no CAB 5; 1,3 MPa no CAB 10 e 1,9 MPa, no CAB 15. Mesmo com a redução obtida, pode-se considerar que tais valores corroboraram com um MR de boa compatibilidade com o CR.3

Quanto ao teor de absorção de água por imersão, após saturação e fervura dos CPs, verificou-se a diminuição dos valores com o aumento do teor de resíduo. Os resultados verificados para o CR, CAB 5, CAB 10 e CAB 15 foram de 5,1; 4,2; 3,8 e 3,4%, respectivamente. Com isso, todos os traços estudados apresentaram resultados inferiores ao limite máximo recomendado em norma para concretos estruturais, que é de 6%.11

As micrografias, obtidas por MEV, das superfícies de fratura de CPs com CAB mostraram quantidades crescentes de poros com o aumento do teor de borracha na mistura, o que confirma o índice de ar incorporado medido no concreto fresco. Na Figura 6, podem ser observados poros espalhados aleatoriamente e fibras de borracha (indicadas por setas) que podem ter sido arrancadas ou rompidas na superfície de fratura do CAB 15.


Propriedades dos MRs aplicados

As patologias indicaram a necessidade de um maior rigor na escarificação e limpeza do local, bem como a aplicação da ponte de aderência à base de resina epóxi anterior à aplicação dos MRs. Esta, além de ter bom desempenho mecânico pode criar uma interface capaz de diminuir tanto a permeabilidade quanto os efeitos da reatividade química observada no local abaixo do MR, aumentando sua vida útil.

Para a aplicação em campo foi considerado o CAB 5 como o de melhor desempenho. Esta dosagem foi facilmente moldada mesmo na superfície inclinada da superfície do vertedouro da UHE Mourão. O acabamento foi bem sucedido e sem problemas operacionais. O seu desempenho em campo vem sendo monitorado em função do tempo.

CONCLUSÕES

A adição do resíduo de borracha em substituição à massa de areia no concreto fresco diminuiu a trabalhabilidade do concreto resultante, tendo sido atribuído tal fator à borracha na forma de fibras e quantidades adicionadas. Também, foram observados redução na massa unitária e aumento no teor de ar aprisionado.

Ocorreram perdas na resistência mecânica à compressão de até 48,3% para o CAB 15, cujo valor médio resultante foi de 16,9 ± 1,1 MPa. Para o uso em superfície hidráulica de barragem foi considerado o CAB 5, com 22,1 ± 0,6 MPa.

O resultado da resistência à tração na flexão diminuiu cerca de 30% até o CAB 15, trazendo, como vantagem, uma redução na fissuração resultante com necessidade de aplicação de um esforço extra para a sua ruptura total. As fibras de borracha mantiveram as duas interfaces unidas após a ruptura.

Os desgastes abrasivos, medidos nos sistemas com CAB, ficaram menores que o do próprio CR. Pode-se inferir que a adição da borracha trouxe melhoria no desempenho final do concreto, sendo recomendado para uso como MR em superfícies hidráulicas.

Os valores médios da resistência de aderência reduziram de 4,5 MPa no CR para 1,9 MPa com o CAB 15. Mesmo assim, tais valores indicaram a boa compatibilidade entre o MR e o CR.5 O valor médio obtido para o CAB 5 foi de 4,84 MPa, portanto, superior ao do próprio CR.

O uso do CAB 5 pode trazer como vantagens adicionais, as reduções: do impacto ambiental, pela retirada dos pneus inservíveis depositados no meio ambiente e pela sua imobilização direta a tempos superiores a 50 anos (expectativa de vida útil de barragens); da emissão de até 100 kg de CO2.m-3 de concreto, ao meio ambiente14 e, do consumo dos agregados graúdos e miúdos, cuja extração é grande causadora de impactos ambientais.

AGRADECIMENTOS

À CAPES, pelas bolsas de Mestrado e Doutorado; à UFPR/PIPE; ao CNPq, pelos subsídios da Lei 8010/90, L.I. 06/1020664-5 e pelas bolsas PIBITI; à COPEL, ao LACTEC e à ANEEL, pelo suporte financeiro e infra-estrutura.

REFERÊNCIAS

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Recebido em 23/4/08; aceito em 13/10/08; publicado na web em 26/1/09

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      13 Out 2008
    • Recebido
      23 Abr 2008
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