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Branqueamento de polpa celulósica kraft de eucalipto com peróxido ácido ativado por molibdênio

Kraft pulp bleaching with molybdenum activated acid peroxide (P Mo stage)

Resumo

Optimum conditions to run the P Mo stage for bleaching eucalyptus kraft pulp were 90 ºC, pH 3.5, 2 h, 0.1 kg/t Mo and 5 kg/t H2O2. The P Mo stage efficiency increased with decreasing pH (1.5-5.5) and increasing temperature (75-90 ºC), time (2-4 h), and hydrogen peroxide (3-10 kg/t) and molybdenum concentration (0.1-0.4 kg/t). The implementation of the P Mo stage, as replacement for the A stage, decreased total active chlorine demand of the OAZDP sequence by 6 kg/t to reach 90% ISO, both in laboratory and mill scale. Such practice resulted in decreased bleaching chemical costs to produce fully bleached pulp of 90% ISO.

hydrogen peroxide; molybdenum; pulp bleaching


hydrogen peroxide; molybdenum; pulp bleaching

ARTIGO

Branqueamento de polpa celulósica kraft de eucalipto com peróxido ácido ativado por molibdênio

Kraft pulp bleaching with molybdenum activated acid peroxide (PMo stage)

Marcos Sousa RabeloI,* * e-mail: msrabelo2003@yahoo.com.br ; Vanessa Lopes SilvaII; Denise Pires de BarrosII; Jorge Luiz ColodetteII; Vera Maria SaconIII; Marcelo Rodrigues da SilvaIII

IDepartamento Regional da Bahia, Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial, 42700-000 Lauro de Freitas - BA, Brasil

IIDepartamento de Engenharia Florestal, Universidade Federal de Viçosa, Av. PH Rolfs, s/n, 36570-000 Viçosa - MG, Brasil

IIIVotorantim Celulose e Papel, Rodovia General Euryale Jesus Zerbini, km 84, 12340-010 Jacareí - SP, Brasil

ABSTRACT

Optimum conditions to run the PMo stage for bleaching eucalyptus kraft pulp were 90 ºC, pH 3.5, 2 h, 0.1 kg/t Mo and 5 kg/t H2O2. The PMo stage efficiency increased with decreasing pH (1.5-5.5) and increasing temperature (75-90 ºC), time (2-4 h), and hydrogen peroxide (3-10 kg/t) and molybdenum concentration (0.1-0.4 kg/t). The implementation of the PMo stage, as replacement for the A stage, decreased total active chlorine demand of the OAZDP sequence by 6 kg/t to reach 90% ISO, both in laboratory and mill scale. Such practice resulted in decreased bleaching chemical costs to produce fully bleached pulp of 90% ISO.

Keywords: hydrogen peroxide; molybdenum; pulp bleaching.

INTRODUÇÃO

A utilização do estágio de peróxido ácido catalisado com molibdênio (PMo) para branqueamento de polpa celulósica foi primeiramente investigada por Eckert.1 Sundman2 estudou vários compostos-modelo de lignina, tendo avaliado o comportamento da lignina residual do processo kraft frente ao peróxido de hidrogênio catalisado por tungstênio ou molibdênio. Concluiu-se que o molibdato de sódio apresenta reatividade superior à do molibdato de tungstênio e que modelos de lignina contendo grupos hidroxila fenólicos livres são mais reativos que modelos tendo as hidroxilas eterificadas. O peróxido catalisado por molibdênio mostrou-se efetivo para oxidar grupos fenólicos nas posições orto e para.

A deslignificação é atribuída à capacidade do molibdato de formar com o peróxido de hidrogênio, em condições ácidas, um complexo diperóxi-molibdênio que é altamente reativo (Figura 1).


As reações do complexo diperóxi-molibdênio com a polpa celulósica apresentam um ataque preferencial aos ácidos hexenurônicos (HexA's). O ácido hexenurônico é o produto da desmetoxilação do ácido 4-O-metil-glucourônico presente nas xilanas da madeira, durante a polpação Kraft. Os HexA's são considerados os principais responsáveis pelo amarelecimento de polpas celulósicas. O tratamento da polpa celulósica com o complexo diperóxi-molibdênio remove também as ligninas que não são removidas durante o estágio preliminar de deslignificação com oxigênio, como por exemplo, as ligninas do tipo bifenilas.1,3

A reação do complexo formado com os HexA's ocorre, primeiramente, pela formação do epóxido com a ligação dupla desses ácidos e, subseqüentemente, pela decomposição do complexo, dando origem ao ácido fórmico.

O estágio PMo apresenta também como vantagem, principalmente em relação ao estágio ácido tradicional, uma mínima formação de ácido oxálico, o qual pode ocasionar incrustações na planta de branqueamento. O ácido oxálico é produzido através da hidrólise ácida, que ocorre quando se utilizam estágio ácido, ozônio e dióxido de cloro para remover os HexA's.4

O estágio PMo apresenta como vantagens em relação ao estágio ácido a maior taxa de deslignificação da polpa (redução do número kappa) e ganhos significativos na alvura da polpa (grau de alvejamento da polpa), o que está relacionado diretamente ao ataque significativo aos ácidos hexenurônicos, que ocasiona incremento ao número kappa e reversão de alvura.5-7

Em relação ao destino do molibdênio, foi observado por Suess et al. 8 que a maior porção do molibdênio está presente no filtrado ácido na forma de ânion molibdato (96,5 ± 4,5%), explicado pela alta solubilidade do molibdato sob condições ácidas. Estudos realizados por Hämäläinen et al.3 indicaram que a quantidade é suficientemente baixa e não ocasiona danos significativos ao sistema de tratamento de efluentes. Por outro lado, também não mostrou efeito no sistema de recuperação química, uma vez que a quantidade de molibdênio aplicada no estágio é baixa (níveis catalíticos), além de que parte do filtrado deste estágio pode ser reutilizada no próprio estágio, com a finalidade de repor a perda do molibdênio.

O estágio de peróxido catalisado com molibdênio apresenta grandes benefícios para seqüências ECF-light (Elemental Chlorine Free). Tais tecnologias são baseadas, fortemente, no uso de oxidantes derivados do ar, tais como oxigênio, ozônio, peróxido de hidrogênio e perácidos. O branqueamento de polpa por esses reagentes é de amplo conhecimento da ciência, porém, nem sempre é possível alcançar resultados satisfatórios de custo operacional e qualidade do produto, utilizando-os no branqueamento, sem a presença do dióxido de cloro, mesmo que em quantidades diminutas.9 Nessa tecnologia, a carga de dióxido de cloro é limitada a 2-3 kg/t de polpa.

O objetivo deste trabalho foi avaliar o estágio de peróxido ácido, catalisado com molibdênio, em uma seqüência branqueamento ECF-light, para branqueamento de polpa celulósica kraft de eucalipto, em escala laboratorial e industrial.

PARTE EXPERIMENTAL

Para realização da etapa de otimização, foi utilizada polpa celulósica de eucalipto deslignificada com oxigênio (Estágio O), cujos parâmetros de caracterização são mostrados na Tabela 1.

Para realização da otimização do estágio PMo em laboratório, foram avaliados a variação da carga de molibdênio aplicada, temperatura de reação, tempo de reação e carga de peróxido de hidrogênio, cujos valores aplicados para cada parâmetros estão na Tabela 2.

Após a otimização do estágio PMo, foi avaliada sua utilização em teste industrial em substituição ao estágio ácido da seqüência AZDP onde, A = estágio de hidrólise ácida (H2SO4); Z = estágio de ozonólise (O3); D = estágio de dioxidação (ClO2); P = estágio de peroxidação (H2O2). A implementação do estágio PMo em lugar do estágio A, durante o teste industrial, necessitou de poucas modificações do processo original, uma vez que as principais condições dos dois estágios são semelhantes, havendo necessidade de apenas dois pontos adicionais de carga de reagentes: um para o peróxido e outro para o molibdênio.

As condições utilizadas durante o branqueamento da polpa celulósica com o estágio PMo na aplicação no teste industrial estão demonstradas na Tabela 3.

Para avaliação da qualidade da polpa celulósica branqueada, foram realizados testes morfológicos, físicos e ópticos e aplicados quatro níveis de refino: de 0, 750, 1500 e 3000 revoluções, realizados no moinho PFI.

As análises para caracterização da polpa celulósica, dos licores e dos testes de classificação da polpa celulósica branqueada foram realizadas segundo normas padrões da Tappi, Scan, Standard Methods e normas internas. Todas as análises foram efetuadas em duplicatas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Otimização do estágio PMo

Observa-se, na Figura 2, que a eficiência da deslignificação aumentou de forma proporcional em relação à elevação da temperatura, tempo e dosagem de molibdênio. O teor de HexA's também diminuiu à medida que estes parâmetros aumentaram (Figura 3).



Os resultados da Figura 4 indicam que a maior parte da redução do número kappa (grau de deslignificação da polpa celulósica) está relacionada ao ataque do PMo aos HexA's da polpa celulósica, ocorrendo também alguma remoção de lignina neste estágio - cerca de 2 unidades de kappa. Deve-se notar que o aumento do tempo de reação favorece a remoção dos HexA's, sendo o teor de lignina mantido praticamente constante no período de 2-4 h.


Em relação à viscosidade (grau médio de polimerização da polpa) foi observado um comportamento inversamente proporcional à eficiência de deslignificação e remoção de HexA's. Em comparação ao estágio ácido, observa-se que o estágio PMo resultou em polpa celulósica de menor viscosidade, mas esta perda ficou abaixo de 100 dm3/kg no pior cenário. Observou-se também que cargas de Mo superiores a 100 ppm não afetaram a viscosidade.

Em relação ao ganho de alvura (grau de alvejamento da polpa celulósica) comparando-se com o estágio ácido, observa-se, na Figura 5, que o estágio PMo produziu alvuras mais altas, fato explicado pela remoção de 2,2-2,3 unidades de kappa devidas à lignina.


Conforme os resultados apresentados nas figuras anteriores, as melhores condições para operar o estágio PMo são as seguintes: temperatura de 90 ºC, tempo de 2 h e carga de molibdênio de 0,1 kg/t. A partir deste ponto, foram estudadas a variação do pH (1,5 a 5,5) e da carga de peróxido (3-10 kg/t).

Em relação à variação do pH, observa-se, na Tabela 4, que os parâmetros estudados para controle de qualidade do estágio pioram à medida que se aumenta o pH acima de 3,5. Foi considerado, portanto, o pH de 3,5 como a melhor opção para utilização durante o estágio.

Na Tabela 5, observa-se o comportamento do estágio PMo em relação à variação da carga de H2O2. Foi obtida maior eficiência do estágio à medida que se aumentou a carga, ou seja, maior formação da espécie ativa, o complexo diperóxi-molibdênio. Porém, considerou-se ótima a carga de 5 kg/t de H2O2, tendo em vista que a redução do kappa e do teor de HexA's foi pouco significativa, enquanto a perda de viscosidade foi substancial, para dosagens de peróxido acima deste valor.

Teste industrial com o estágio PMo

A segunda parte deste artigo é referente ao teste industrial em que se aplicou o estágio PMo em substituição ao estágio A da seqüência de branqueamento OAZDP, em uma unidade industrial com produção média diária de 1.200 t. Foi observada, durante este teste, redução acentuada do número kappa em todos os estágios. No estágio PMo apresentou uma redução no Δ kappa de 5,2, cerca de 1,9 superior à referência (estágio A). A taxa média de deslignificação do estágio de PMo foi de 42%, correspondendo a 15% a mais em relação à referência, enquanto o estágio de ozonólise não sofreu qualquer variação em sua eficiência.

No teste industrial foi observado que o estágio PMo (156 dm3/kg) apresentou uma perda de viscosidade ligeiramente superior à observada no estágio A (125 dm3/kg), porém, a seletividade do estágio PMo (3,4) foi superior à da referência (2,6), ou seja, este estágio apresentou uma melhor relação Δ kappa/Δ viscosidade. Observou-se, também, durante o teste, que a viscosidade final da polpa celulósica branqueada com estágio PMo, após o estágio final de peroxidação, foi de 770 dm3/kg, próxima à viscosidade obtida com a seqüência referência (760 dm3/kg), cujos valores estão dentro da especificação de qualidade da polpa celulósica branqueada destinada ao mercado.

Um fator interessante observado durante o teste está relacionado com o consumo de cloro ativo durante o branqueamento. O consumo total de cloro ativo para o branqueamento da polpa celulósica até a alvura de 90% ISO foi de 60,2 e 53,8 kg/t, para as seqüências OAZDP e OPMoZDP, respectivamente, indicando uma economia de 6,4 kg/t de cloro ativo. Esta economia derivou do menor consumo de ClO2 (2,6 kg/t de cloro ativo) no estágio D e de H2O2 no estágio P (3,6 kg/t de cloro ativo). Esta redução está relacionada à maior redução do número kappa ocorrida no estágio de PMo em relação ao estágio A. Houve também uma economia de 2,8 kg/t de NaOH. A redução do consumo de soda durante o período do teste está relacionada ao menor consumo total de cloro ativo utilizado no branqueamento com a seqüência OPMoZDP.

Em razão do menor consumo de cloro ativo, a seqüência OPMoZDP apresentou custo operacional menor que o da referência. Considerando-se o preço de mercado dos reagentes aplicados no branqueamento, o custo do branqueamento para a seqüência OPMo ZDP foi R$ 2,13/t de polpa celulósica, menor que o da referência, gerando uma economia anual de cerca de R$ 900.000,00 para uma fábrica operando com 1200 t/dia, durante 352 dias/ano. Para este cálculo, não foram levados em conta os custos de energia e de vapor que seriam similares para o processo PMo e de referência, já que as condições de tempo, temperatura e consistência (peso seco em relação ao peso úmido da polpa multiplicado por 100) dos dois estágios foram iguais.

CONCLUSÕES

As condições ótimas de operação do branqueamento com peróxido ácido catalisado com molibdênio (estágio PMo) foram: 90 ºC, pH 3,5, 2 h e dosagens de H2O2 e Mo de 5 e 0,1 kg/t, respectivamente.

O estágio PMo apresentou maior taxa de deslignificação comparado com o estágio ácido convencional e a viscosidade da polpa celulósica tratada com o estágio PMo foi inferior à da tratada com o estágio A (referência), porém, a viscosidade final da polpa celulósica branqueada pela seqüência OPMoZDP foi similar à da OAZDP (referência).

No teste industrial, o consumo de cloro ativo total e o custo relativo de branqueamento foram inferiores para a seqüência contendo estágio PMo, em relação à referência. Conclui-se, portanto, que o estágio PMo é viável para branquear polpa celulósica kraft de eucalipto, uma vez que reduz a demanda de cloro ativo e o custo relativo do branqueamento, sem causar danos à qualidade do produto.

Recebido em 11/9/07; aceito em 11/12/08; publicado na web em 7/5/09

  • 1. Eckert, R. C.; Canadian Patent 1,129,161, 1982
  • 2. Sundman, G. I. J.; Ph. D. Thesis, SUNY College of Environmental Science and Forestry, United State of America, 1988.
  • 3. Hämäläinen H.; Parén, A.; Jäkära, J.; Fant, T.; Proceedings 12th International Symposium on Wood and Pulping Chemistry, Madison, USA, 2003.
  • 4. Begnor-Gidnert, E.; Tomani, P. E.; Dahlman, O.; Nord. Pulp Pap. Res. J 1998, 13, 310.
  • 5. Kubelka, V.; Francis, R. C.; Dence, C. W.; J. Pulp Pap. Sci. 1992, 18, J108.
  • 6. Mounteer, A. H.; Colodette, J. L.; Campos, A. S.; Gomide, J. L.; Proceedings 1991 International Pulp Bleaching Conference, Stockholm, Sweden, 1991.
  • 7. Kang, G. J.; Ni, Y.; van Heiningen, A. R. P.; Proceedings 1998International Pulp Bleaching Conference, Helsinki, Finland, 1998.
  • 8. Suess, H. U.; Schmidt, K.; Del Grosso, M.; Appita J. 2004, 57, 361.
  • 9. Colodette, J. L.; Mounteer, A. H.; Gomes, C. M.; Rabelo, M. S.; Proceedings 2005 Tappi Engineering, Pulping and Environmental Conference, Pennsylvania, USA, 2005.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Jul 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      11 Dez 2008
    • Recebido
      11 Set 2007
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