Acessibilidade / Reportar erro

Remoção de compostos orgânicos em água empregando carvão ativado impregnado com óxido de ferro: ação combinada de adsorção e oxidação em presença de H2O2

Removal of organic compounds from water by activated carbon impregnated with iron oxide: combined action of adsorption and oxidation in the presence of H2O2

Resumo

In this work, composites based on activated carbon/iron oxide (AC/Fe) were prepared in two different proportions (AC/Fe 5/1 and 1/1) and evaluated in the removal of the organic dye methylene blue (MB). Physical-chemical properties of the composites were determined by X-ray diffraction (XRD), adsorption/dessorption of N2 isotherm, temperature programmed reduction (TPR) and scanning electron microscopy (SEM). Results showed that goethite (α- FeOOH), with nanometer particle size, was formed over carbon surface for both composites. These materials showed high efficiency to remove MB from solution by combined adsorption and oxidation process. The AC/Fe 1/1 showed to be more active in (MB) oxidation then AC/Fe 5/1.

oxidation; adsorption; iron oxide


oxidation; adsorption; iron oxide

ARTIGO

Remoção de compostos orgânicos em água empregando carvão ativado impregnado com óxido de ferro: ação combinada de adsorção e oxidação em presença de H2O2

Removal of organic compounds from water by activated carbon impregnated with iron oxide: combined action of adsorption and oxidation in the presence of H2O2

Cínthia S. Castro* * e-mail: cicastro14@yahoo.com.br ; Mário C. Guerreiro; Luiz C. A. Oliveira; Maraísa Gonçalves

Departamento de Química, Universidade Federal de Lavras, CP 3037, 37200-000 Lavras - MG, Brasil

ABSTRACT

In this work, composites based on activated carbon/iron oxide (AC/Fe) were prepared in two different proportions (AC/Fe 5/1 and 1/1) and evaluated in the removal of the organic dye methylene blue (MB). Physical-chemical properties of the composites were determined by X-ray diffraction (XRD), adsorption/dessorption of N2 isotherm, temperature programmed reduction (TPR) and scanning electron microscopy (SEM). Results showed that goethite (α- FeOOH), with nanometer particle size, was formed over carbon surface for both composites. These materials showed high efficiency to remove MB from solution by combined adsorption and oxidation process. The AC/Fe 1/1 showed to be more active in (MB) oxidation then AC/Fe 5/1.

Keywords: oxidation; adsorption; iron oxide.

INTRODUÇÃO

Dentre os materiais mais empregados na remoção de poluentes do meio aquoso destaca-se o carvão ativado que apresenta excelentes características adsorventes, sendo usado em uma grande variedade de processos, tais como filtração, purificação, desodorização e separação.1,2 Dependendo da natureza química de superfície, os carvões ativados podem ainda agir diretamente como catalisadores em diferentes reações químicas.3 Além disso, têm sido bastante utilizados como suportes catalíticos, pois apresentam diversas características desejáveis, como alta estabilidade sob condições de reação, propriedades mecânicas adequadas e alta área superficial, mantendo a fase ativa catalítica em um estado altamente disperso. Carvões ativados provenientes de diferentes fontes têm sido estudados como catalisadores em reações envolvendo a oxidação de compostos orgânicos em água após serem impregnados com diferentes óxidos metálicos.4,7

Os óxidos de ferro são compostos muito abundantes na crosta terrestre e de baixo custo além de serem facilmente sintetizados em laboratório.8 Devido ao comportamento químico redox e sua baixa toxicidade, o ferro tem sido extensamente utilizado em aplicações tecnológicas, sendo empregado em diversos processos industriais.9

Dessa forma, materiais compósitos baseados em carvão ativado/óxido de ferro podem apresentar grande avanço tecnológico uma vez que combinariam as propriedades de adsorção dos carvões ativados com a capacidade oxidativa dos óxidos dispersos em sua superfície.

Nesse contexto, o presente trabalho apresenta o preparo e uso de compósitos baseados em carvão ativado e óxidos de ferro altamente dispersos na remoção do corante orgânico azul de metileno em água. Testes de adsorção e oxidação na presença do agente oxidante H2O2 foram realizados visando a maximização da remoção do poluente modelo azul de metileno (AM). A formação de possíveis intermediários de reação foi monitorada por espectrometria de massas com injeção via electrospray (ESI-MS).

PARTE EXPERIMENTAL

Preparo dos compósitos de carvão ativado/óxido de ferro (CA/Fe)

Os compósitos de CA/Fe foram preparados através da precipitação dos óxidos de ferro formados pelo gotejamento de NaOH (5 mol L-1) em uma suspensão aquosa contendo carvão ativado comercial (Dinâmica), FeCl3 (28 mmol) e FeSO4 (14 mmol) a 70 °C.10 Os materiais foram preparados nas proporções de 1/1 e 5/1 de carvão ativado/óxido de ferro (m/m). Após a precipitação dos óxidos formados, o material foi filtrado e lavado com água destilada até pH neutro. Os compósitos foram secos em estufa a 60 °C por 24 h.

Caracterização dos materiais

A análise do teor de ferro presente nos compósitos foi feita por espectrofotometria de absorção atômica (AA). Para isso, 100 mg das amostras em triplicata foram digeridas em 40 mL de HCl a quente por 1 h. Após a digestão, a solução foi filtrada e transferida para um balão volumétrico de 250 mL. O teor de ferro presente foi analisado por AA em um equipamento SpectrAA 110 Varian.

Os compósitos sintetizados foram também caracterizados por difratometria de raios-X (DRX), utilizando um difratômetro da Rigaku com variação angular de 20-80° (2θ), radiação de CoKα (λ=1,78897 Å) e velocidade de exposição 1°2θ min-1. A análise morfológica dos materiais foi realizada através de microscopia eletrônica de varredura (MEV). Para obtenção das micrografias, as amostras foram montadas em suporte stubs, com fita de carbono dupla face e colocadas sobre uma película de papel alumínio. Em seguida, as amostras foram cobertas com ouro em evaporador Balzers SCD 050 e observadas em microscópio eletrônico de varredura Leo Evo 40XVP. Foram também realizadas análises de adsorção/dessorção física de N2 a 77 K em um aparelho Autosorb-1, sendo que a área superficial específica foi calculada pelo método BET e distribuição de poros por DFT. A técnica de redução à temperatura programada (TPR) foi utilizada na investigação das fases de ferro formadas utilizando um aparelho Chembet-3000 (Quantchrome) sob fluxo de 20 mL min-1 (mistura de 5% de H2 em N2), corrente de 150 mA e atenuação 16.

A estabilidade dos catalisadores preparados foi estudada através de testes de lixiviação de ferro segundo metodologia proposta por Sheldon et al..11 Em um experimento típico, 10 mg dos compósitos CA/Fe 1/1 e CA/Fe 5/1 foram colocados em 10 mL de água destilada sob agitação por 24 h. Em seguida, essa solução foi filtrada e centrifugada a 8.311 x g por 20 min e o sobrenadante foi utilizado para preparar 10 mL de uma solução de AM 50 mg L-1. À solução do corante foi acrescentado 0,1 mL de H2O2 (50% v/v; 0,09 mol L-1) e, após 240 min de reação, a concentração de AM foi determinada por espectrometria de UV/visível (Shimadzu) em 665 nm.

Testes de remoção do azul de metileno (AM)

Adsorção de AM

Os testes de adsorção foram feitos em batelada à temperatura de 25 ± 1 °C. Soluções aquosas de AM (10 mL) foram preparadas em diferentes concentrações (5, 10, 25, 50, 75 e 100 mg L-1) e adicionadas em frascos contendo 10 mg dos compósitos. Os frascos foram mantidos sob agitação constante por 24 h e, após este período, as soluções foram centrifugadas e a concentração de AM medida por espectrometria de UV/visível (Shimadzu) em 665 nm. A quantidade de corante adsorvida pelo sólido, qe (mg g-1), foi calculada empregando-se a Equação 1:

onde C0 e Ce são as concentrações iniciais e de equilíbrio do corante na fase líquida, respectivamente (mg L-1), V o volume de solução (L) e W a massa de sólido (g).

Testes catalíticos

Decomposição de H2O2

Foram realizados testes de decomposição de peróxido de hidrogênio (H2O2) com os compósitos de CA/Fe e o carvão ativado comercial utilizando-se 10 mg dos materiais, 5 mL de água destilada e 2 mL de H2O2 (50% v/v), sob agitação constante. As leituras de evolução de O2 foram realizadas em intervalos de 1 min de reação, por meio de um sistema volumétrico de captura de gás com equalizador de pressão.

Degradação de AM

Esses materiais foram também testados na degradação do corante AM utilizando-se 9,9 mL de solução aquosa de AM na concentração de 10 mg L-1, 10 mg dos compósitos e 0,1 mL de H2O2 (50% v/v). Alíquotas foram retiradas nos tempos de 30, 60, 120, 180 e 240 min de reação e o monitoramento da degradação foi feito por espectrofotometria de UV - Vis em 665 nm. A fim de verificar a formação de possíveis intermediários de degradação de AM a reação foi também monitorada por espectrometria de massas (ESI - MS) após 120 min de reação. As amostras foram inseridas no aparelho por infusão com um fluxo de 5 μL min-1 e controle de carga no quadropolo (ICC) ajustado para 30.000. A temperatura do gás de secagem foi 325 °C e fluxo de 5 L min-1, pressão no nebulizador de 10 psi e potencial de extração de íons de -3500 V.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização dos compósitos

A investigação do teor de ferro presente nos catalisadores preparados mostrou que o compósito sintetizado na proporção de 1/1 de carvão ativado/óxido de ferro em massa (CA/Fe 1/1) possui, aproximadamente, 33% de ferro total enquanto o compósito preparado na proporção de 5/1 (CA/Fe 5/1) possui em torno de 9% de ferro. Para a identificação das fases de ferro efetivamente formadas na superfície do carvão ativado foram realizadas análises de difratometria de raios-X (DRX). Pela análise dos difratogramas observou-se a formação da fase goethita (α-FeOOH) presente nos compósitos CA/Fe 1/1 e 5/1. A goethita foi evidenciada pelos sinais característicos em 2θ = 24,5, 38,5, 42,7 e 62,7°,8 ressaltando que outras fases de óxidos de ferro não foram observadas. Através dos difratogramas de raios-X foi possível determinar ainda o tamanho de partícula empregando-se a Equação de Scherrer (Equação 2):12

em que d é o diâmetro médio das partículas; k é a constante de proporcionalidade que depende da forma das partículas, assumida como sendo esférica (0,9); λ é o comprimento de onda da radiação do Cu (1,5406 Å) e β é a largura à meia altura do pico.

Os materiais apresentaram partículas de óxido de ferro com dimensões nanométricas, sendo 25 e 47 nm para o CA/Fe 5/1 e 1/1, respectivamente. É importante ressaltar que óxidos altamente dispersos apresentando pequeno tamanho de partículas, como apresentados pelos materiais nesse trabalho podem maximizar a remoção de poluentes devido a uma maior reatividade do óxido, além de não comprometerem a estrutura porosa do suporte.5

A Figura 1 apresenta a caracterização textural do carvão ativado e dos compósitos com diferentes proporções de óxido de ferro. A área superficial específica e a distribuição de poros dos materiais foram determinadas através da adsorção/dessorção de N2.


A partir das isotermas apresentadas na Figura 1, foram determinados os valores de área BET, sendo os valores encontrados de 666, 568 e 426 m2 g-1 para o carvão ativado, compósitos CA/Fe 5/1 e CA/Fe 1/1, respectivamente. Pode-se observar que a impregnação de uma elevada quantidade de óxido de ferro, como no caso do compósito CA/Fe 1/1 causa uma diminuição de área superficial específica de apenas 36%, o que sugere um baixo comprometimento dos microporos presentes no carvão ativado empregado como suporte dos compósitos. De fato, analisando o gráfico da distribuição de poros dos materiais, apresentado na Figura 1S (Material Suplementar), observa-se que o compósito CA/Fe 5/1 apresenta um perfil bastante semelhante ao carvão ativado com ligeira diminuição de N2 adsorvido. O carvão ativado apresentou um volume total de poros de 0,27 cm3 g-1, ao passo que, para o CA/Fe 5/1 foi de 0,24 cm3 g-1. O compósito com maior teor de óxido de ferro (CA/Fe 1/1) mostrou apenas um deslocamento no diâmetro de poros para valores menores (aproximadamente 10,5 Å) e uma brusca diminuição em poros abaixo de 8 Å, os chamados ultramicroporos, apresentando um volume total de poros de 0,19 cm3 g-1.

A morfologia dos compósitos foi estudada por microscopia eletrônica de varredura (MEV) e as micrografias são apresentadas na Figura 2. As micrografias apresentadas são referentes ao suporte do compósito (carvão ativado), Figura 2a e 2b, e aos compósitos CA/Fe 5/1 (Figura 2c) e CA/Fe 1/1 (Figura 2d). Pode-se observar a alteração da morfologia dos materiais após o preparo dos compósitos com diferentes proporções de óxido de ferro. As micrografias sugerem que a deposição dos óxidos de ferro recobre parcialmente a superfície do carvão ativado, sendo esse efeito mais pronunciado no compósito com relação 1/1 (Figura 2d), devido ao maior teor de óxido de ferro. Esses resultados, além de sugerirem a formação dos compósitos, corroboram os dados de análise de área superficial e distribuição de poros mostrados na Figura 1, uma vez que a diminuição nos valores de área está relacionada ao recobrimento parcial dos poros do carvão ativado.



O compósito contendo maior teor de óxido de ferro disperso, CA/Fe 1/1, foi caracterizado por redução à temperatura programada (RTP) a fim de se observar a reatividade do óxido frente à reação com H2. O perfil RTP pode ainda apresentar evidências das fases de ferro presentes. O perfil de redução apresentado na Figura 3 apresenta três picos de redução de óxidos de ferro: o primeiro pico centrado em 543 ºC é relatado na literatura como a redução parcial de óxidos de ferro (III). O segundo pico corresponde provavelmente à formação de FeO pela redução da magnetita (Fe3O4) formada anteriormente. Finalmente, o pico próximo a 900 ºC seria devido à redução total do óxido disperso na superfície do carvão com formação de ferro metálico.5 É interessante observar que trabalhos na literatura científica em que o mesmo procedimento de síntese foi empregado para a obtenção do óxido de ferro puro, ou seja, sem a presença do carvão ativado, os picos de redução foram obtidos em temperaturas ligeiramente menores.13 Isso sugere uma interação do óxido com o suporte, típico de formação de materiais compósitos, como mostraram também as micrografias. Ressaltamos que o carvão ativado não apresentou perfil de redução perceptível e o compósito com menor teor de ferro (CA/Fe 5/1) apresentou-se bastante semelhante ao mostrado na Figura 3, apenas com intensidades menores.


A estabilidade dos compósitos preparados, CA/Fe 1/1 e CA/Fe 5/1, foi investigada através de testes de lixiviação de ferro. Os resultados mostraram a ocorrência de um sistema heterogêneo, no qual o catalisador e o corante estão em fases distintas. Não houve remoção de AM após a separação de ambos os catalisadores da solução.

Remoção do corante azul de metileno (AM)

Testes de adsorção de AM

Diversos trabalhos empregam moléculas modelo como, por exemplo, o corante orgânico azul de metileno, na caracterização de superfícies de carvões preparados a partir de rejeitos agroindustriais.14,15 Testes de adsorção de azul de metileno são apresentados na Figura 4. A capacidade máxima de adsorção para o CA/Fe 5/1 foi de aproximadamente 40 mgAM g-1compósito, ao passo que para o CA/Fe 1/1, foi de aproximadamente 24 mgAM g 1compósito. Os compósitos sofreram uma gradativa diminuição na capacidade de adsorção do corante azul de metileno, possivelmente devido à ocupação de parte dos poros do carvão ativado pela deposição de óxido de ferro. De fato, o carvão ativado empregado no preparo dos compósitos apresentou uma capacidade máxima de adsorção de cerca de 82 mg AM g -1 carvão mostrando a ocorrência de uma diminuição na capacidade remoção via adsorção pelos compósitos.


Degradação de AM na presença de H2O2

A remoção do corante AM foi testada também na presença do agente oxidante peróxido de hidrogênio. As reações foram monitoradas por espectroscopia na região do UV-visível. É importante ressaltar que, experimentos realizados apenas com H2O2, sem os catalisadores, mostraram que esse sistema não é ativo na remoção do corante. Os resultados obtidos nos testes utilizando o carvão comercial e os compósitos CA/Fe 5/1 e CA/Fe 1/1 são apresentados na Figura 5.


A cinética de remoção do corante AM na presença de H2O2 apresentou uma capacidade de remoção, após 240 min de reação, de aproximadamente 43% para o carvão ativado comercial. Já para os compósitos CA/Fe 1/1 e CA/Fe 5/1, observou-se uma maior remoção de, aproximadamente, 60 e 90%, respectivamente. A maior eficiência do compósito contendo menor teor de óxido de ferro (CA/Fe 5/1) pode ser devida ao processo de adsorção, visto que esse compósito apresenta maior quantidade relativa de material carbonáceo. Além disso, a maior dispersão do óxido de ferro no compósito CA/Fe 5/1 quando comparado ao CA/Fe 1/1 pode também influenciar na capacidade de remoção, uma vez que a reação de ativação de H2O2 para a geração de espécies oxidantes seria mais eficiente. Trabalhos recentes relatam16 que espécies de Fe3+ podem decompor o H2O2 gerando radicais oxidantes, tais como, •OH e •OOH, de acordo com as Equações 3 e 4.

Uma forte evidência da ocorrência de processos de oxidação combinados a efeitos adsortivos pode ser obtida através de análises de formação de intermediários de reação por espectroscopia de massas com injeção via electrospray (ESI-MS). No material suplementar (Figura 2S) estão apresentados estudos ESI-MS para o carvão ativado comercial. Observa-se que a remoção de AM na presença desse material ocorre principalmente através de processos adsortivos, com pequena redução na intensidade do sinal m/z = 284 referente ao AM. Poucos sinais de baixa intensidade relativos a produtos de degradação de AM (m/z = 270 e 300) foram identificados, mostrando a baixa eficiência do carvão ativado puro na degradação de AM. Estudos ESI-MS para os compósitos em presença de H2O2 após 120 min de reação são apresentados na Figura 6a.


O compósito CA/Fe 5/1 apresentou uma intensa remoção do AM visto pela diminuição do sinal m/z = 284 referente ao corante. Esse resultado corrobora os dados apresentados pelo estudo de descoloração (mais de 90% de remoção) monitorada por espectroscopia Uv-Vis e mostrada na Figura 5. No entanto, a técnica ESI-MS permitiu a identificação de intermediários de reação com sinais m/z = 300 e 147. Esses resultados mostram claramente que o processo de remoção na presença desse material não ocorre apenas por adsorção. Em um processo adsortivo típico, deveria ser observada apenas a diminuição do sinal do corante sem a presença de sinais de intermediários.

O corante AM é uma molécula intensamente utilizada como "modelo" em diversos estudos de adsorção17,18 e também de oxidação.19,20 Trabalhos realizados em nosso grupo de pesquisa21,22 sobre a investigação do mecanismo de degradação de AM, sedimentados por cálculos teóricos realizados para a identificação de intermediários da oxidação de azul de metileno, apontam o sinal m/z = 300 como referente à hidroxilação da molécula. A presença desse intermediário nos testes de ESI-MS sugere a formação de radicais hidroxilas pela reação de H2O2 com o óxido de ferro do compósito, como mostrado nas Equações 3 e 4. É interessante observar, ainda, que o compósito CA/Fe 1/1 apresentou uma remoção mais intensa do corante e formação de maior número de intermediários de reação. Esse resultado mostra que a maior remoção apresentada inicialmente pelo CA/Fe 5/1 (Figura 5) ocorre provavelmente pela combinação dos processos de adsorção e oxidação. O maior conteúdo de ferro no compósito CA/Fe 1/1, ainda que tenha menor área superficial específica, provoca reações mais efetivas com o agente oxidante H2O2 levando à formação de radicais oxidantes mais abundantemente. Uma proposta da formação dos intermediários, incluindo a ruptura do anel pelo aparecimento do sinal m/z = 147, é apresentada na Figura 6b.

Os resultados apresentados por espectroscopia Uv-Vis e ESI-MS para os compósitos de CA/Fe sugerem que a remoção do corante AM deve ocorrer por processos combinados de adsorção e oxidação pela reação de H2O2 com o óxido de ferro do compósito. Diversos trabalhos na literatura propõem mecanismos de remoção de compostos orgânicos através de processos combinados de adsorção e oxidação, bem como a interdependência desses processos e a atividade catalítica.23,24 A combinação de adsorção e catálise heterogênea em um único processo tem sido considerada como uma interessante alternativa para o tratamento de água contaminada.25

A remoção de AM na presença do compósito com menor teor de ferro, CA/Fe 5/1, apresenta remoção principalmente via adsorção, devido à pequena quantidade de intermediários formados. Por outro lado, o compósito CA/Fe 1/1 apresenta elevada capacidade de remoção do composto orgânico envolvendo a oxidação, devido ao elevado teor de ferro na superfície do compósito.

É possível que os processos ocorram simultaneamente, de acordo com o esquema mostrado na Figura 3S (material suplementar). Nesse mecanismo, os radicais •OH formados pela reação do ferro com o H2O2 poderiam oxidar tanto as moléculas dissolvidas no meio aquoso quanto as adsorvidas na superfície dos catalisadores, conforme proposto na literatura.26


Na tentativa de se comprovar a capacidade dos compósitos em decompor H2O2 com a possível formação de radicais oxidantes foram realizados experimentos de decomposição do peróxido de hidrogênio observando-se o volume de O2 formado, de acordo com a Equação 5:

Os resultados estão apresentados na Figura 4S (material suplementar). Observa-se que o carvão ativado comercial puro é capaz de decompor H2O2. Essa propriedade dos carvões ativados de decompor peróxido de hidrogênio já é bastante conhecida.3,27 Isso é possível devido à presença de sítios vacantes e grupos oxigenados reativos formados durante o processo de produção dos carvões. Entretanto, verifica-se que a impregnação com ferro em ambos os compósitos aumentou significantemente a capacidade de decomposição de H2O2. O compósito de CA/Fe 1/1 apresentou maior capacidade de decomposição de H2O2, o que explicaria a maior capacidade de remoção do corante via processo oxidativo, como descrito pela análise via ESI-MS. A análise dos dados cinéticos apresentados na Figura 4S sugere que a decomposição do peróxido de hidrogênio segue, no início da reação, uma dependência de pseudoprimeira ordem com relação à concentração de H2O2, Vdecomp. = Vdecomp. = kdecomp.[H2O2]. Os valores das constantes de velocidade encontrados foram de 3,9 E-4 mol L-1 min-1 para o carvão ativado comercial, 7,0 e 8,8 E-4 mol L-1 min-1 para os compósitos CA/Fe 5/1 e CA/Fe 1/1, respectivamente. Deve ser mencionado ainda, que estudos recentes de nosso grupo de pesquisa mostraram que o óxido de ferro puro, sintetizado na ausência de carvão, não apresenta atividade significante na decomposição de H2O2.22

CONCLUSÃO

Os compósitos preparados no presente trabalho apresentaram elevada capacidade de remoção do corante orgânico azul de metileno do meio aquoso. O processo de remoção ocorre através da ação combinada dos processos de adsorção e oxidação em um sistema heterogêneo. A oxidação do corante empregando o agente oxidante H2O2 ocorre devido à formação de radicais oxidantes (•OH) pela reação do H2O2 com o óxido de ferro presente nos compósitos. A formação de intermediários de reação acompanhada por ESI-MS comprova a presença dos radicais formados. Análises por DRX e RTP mostraram a presença de goethita como fase de ferro formada. A deposição desse óxido na superfície do carvão ativado, apesar de ter causado uma redução na área superficial específica dos compósitos, mostrou-se imprescindível para a oxidação do AM, maximizando a remoção do corante AM em solução pela ação combinada dos processos de adsorção e oxidação. O compósito CA/Fe 5/1 mostrou elevada capacidade de remoção de AM, entretanto, análises ESI-MS mostraram que o compósito com maior teor de ferro, CA/Fe 1/1, apresentou maior capacidade de oxidação de AM, levando à formação de grande número de intermediários.

MATERIAL SUPLEMENTAR

No material suplementar, disponível gratuitamente em http://quimicanova.sbq.org.br, estão apresentados os resultados da distribuição de poros para os materiais, bem como o monitoramento da oxidação do corante AM através da espectrometria de massas, usando carvão ativado comercial e H2O2. Além disso, é mostrado um esquema proposto para o mecanismo de remoção de AM, combinando os processos de adsorção e oxidação e os resultados da decomposição de H2O2 na presença do carvão ativado comercial e dos compósitos de CA/Fe 1/1 e CA/Fe 5/1.

AGRADECIMENTOS

Ao CAPQ, FAPEMIG, CNPq e à CAPES pelo suporte financeiro e realização das análises.

Recebido em 30/9/08; aceito em 21/1/09; publicado na web em 14/7/09

MATERIAL SUPLEMENTAR


Figura 3S-Clique aqui para ampliar


  • 1. Haimour, N. M.; Emeish, S.; Waste Management 2006, 26, 651.
  • 2. Boonamnuayvitaya, V.; Chaiyan, C.; Tanthapanichakoon, W.; J. Chem. Eng. Jpn 2004, 37, 1504.
  • 3. Oliveira, L. C. A.; Neres, C.; Lago, R. M.; Maria I. Y.; Carbon 2004, 42, 2279.
  • 4. Rodriguez-Reinoso F.; Carbon 1998, 36, 159.
  • 5. Oliveira, L. C. A.; Lago, R. M.; Fabris, J. D.; Sapag, K.; Carbon 2002, 40, 2177.
  • 6. Youji, L.; Xiaodong, L.; Junwen, L.; Jing, Y.; Catal. Commun. 2005, 6, 650.
  • 7. Pil, K.; Heesoo, K.; Ji, B. J.; Wooyoung, K.; In, K. S.; Jongheop, Y.; J. Power Sources 2005, 145, 139.
  • 8. Cornell, R. M.; Schwertmann, ??; The Iron Oxides, 3rd ed., Weinheim-VHC: New York, 2003.
  • 9. Oliveira, L. C. A.; Silva, C. N.; Yoshida, M. I. E; Lago, R. M.; Carbon 2005, 42, 2279.
  • 10. Oliveira, L. C. A.; Rios, R. V. R. A.; Fabris, J. D.; Sapag, K.; Garg, V. K.; Lago, R. M.; Appl. Clay Sci. 2003, 22, 169.
  • 11. Sheldon, R. A.; Wallau, M.; Arends, I. W. C. E.; Schuchardt, U.; Acc. Chem. Res. 1998, 31, 485.
  • 12. Cullity, B. D.; Elements of X-Ray Diffraction, Addison- Wesley Publishing Co., 1980.
  • 13. Ferraz, W.; Guimarães, I. R.; Oliveira, L. C. A.; Guerreiro, M. C.; Guarieiro, A. L. N.; Carvalho, K. T.; J. Mol. Catal. A: Chem. 2007, 278, 145.
  • 14. Tan, I. A. W.; Ahmad, A. L.; Hameed, B. H.; Desalination 2008, 225, 13.
  • 15. Guerreiro, M. C.; Gonçalves, M.; Bianchi, M. L.; Oliveira, L. C. A.; Pereira, Inácio, E.; Dallago, R.; Ciência e Agrotecnologia 2007, 31, 1386.
  • 16. Oliveira, L. C. A.; Celi, R.; Rios, R. V. A.; Lago, R. M.; Fabris, J. D.; Ardisson, J. D.; J. Hazard. Mater. 2006, 129, 171.
  • 17. Karagöz, S.; Tay, T.; Ucar, S.; Erdem, M.; Bioresour. Technol. 2008, 99, 6214.
  • 18. Bestani, B.; Benderdouche, N.; Benstaali, B.; Belhakem, M.; Addou, A.; Bioresour. Technol. 2008, 99, 8441.
  • 19. Moura, F. C. C.; Araújo, M. H.; Costa, R. C. C.; Fabris, J. D.; Ardisson, J. D.; Macedo, W. A. A.; Lago, R. M.; Chemosphere 2005, 60, 1118.
  • 20. Yu, Z.; Chuang, S. S. C. ; Appl. Catal., B 2008, 83, 277.
  • 21. Oliveira, L. C. A.; Ramalho, T. C.; Gonçalves, M.; Carvalho, K. T.; Nazzarro, M.; Sapag, K.; Chem. Phys. Lett. 2007, 446, 133.
  • 22. Oliveira, L. C. A.; Gonçalves, M.; Guerreiro, M. C.; Ramalho, T. C.; Fabris, J. D.; Pereira, M. C.; Sapag, K.; Appl. Catal., A 2007, 316, 117.
  • 23. Besov, A. S.; Vorontsov, A. V. ; Catal. Commun. 2008, 9, 2598.
  • 24. Palominos, R. A.; Mora, A.; Mondaca, M. A.; Pérez-Moya, M.; Mansilla, H. D.
  • 25. Huang, H.; Lu, M.; Chen, J.; Lee, C. ; Chem. 2003, 51, 935.
  • 26. Kim, T.; Lee, M.; Shim, W.; Lee, J.; Kim, T.; Lee, D.; Moon, H.; J. Mater. Sci. 2008, 43, 6486.
  • 27. Georgi, A.; Kopinke, F.; Appl. Catal., B 2005, 58, 9.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Set 2009
    • Data do Fascículo
      2009

    Histórico

    • Aceito
      21 Jan 2009
    • Recebido
      30 Set 2008
    Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br