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Degradação de corantes reativos por processo foto-fenton envolvendo o uso de peneira molecular 4A modificada com Fe3+

Degradation of reactive dyes by photo-fenton process using Fe3+ immobilized in molecular sieve 4A

Resumo

In this work the preparation and characterization of a supported catalyst intended for degradation of reactive dyes by Fenton-like processes is described. The photocatalyst was prepared by immobilization of Fe3+ into the molecular sieve (4A type) surface and characterized by x-ray diffractometry and infrared, Mössbauer and EPR spectroscopy. The solid containing 0.94% (w/w) of ferric ions was used in degradation studies of aqueous reactive-dyes samples with really promissory results. Generally, Vis-assisted photochemical processes leads to almost total decolorization of all tested dyes at reaction times lower than 30 min. It was also observed that the iron-molecular sieve matrix can be reused.

degradation of reactive dyes; Fe3+ immobilized; Fenton-like


degradation of reactive dyes; Fe3+ immobilized; Fenton-like

ARTIGO

Degradação de corantes reativos por processo foto-fenton envolvendo o uso de peneira molecular 4A modificada com Fe3+

Degradation of reactive dyes by photo-fenton process using Fe3+ immobilized in molecular sieve 4A

Franciély IgnachewskiI; Sérgio Toshio FujiwaraI, * * e-mail: sergio.fujiwara@pq.cnpq.br ; Luiz Fernando CóticaII; Livia Melo CarneiroIII; Elias TauchertIII; Patricio Peralta-ZamoraIII

IDepartamento de Química, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Rua Camargo Varela de Sá, 3, 85040-080, Guarapuava - PR, Brasil

IIDepartamento de Física, Universidade Estadual do Centro-Oeste, Rua Camargo Varela de Sá, 3, 85040-080, Guarapuava - PR, Brasil

IIIDepartamento de Química, Universidade Federal do Paraná, CP 19081, 81531-980, Curitiba - PR, Brasil

ABSTRACT

In this work the preparation and characterization of a supported catalyst intended for degradation of reactive dyes by Fenton-like processes is described. The photocatalyst was prepared by immobilization of Fe3+ into the molecular sieve (4A type) surface and characterized by x-ray diffractometry and infrared, Mössbauer and EPR spectroscopy. The solid containing 0.94% (w/w) of ferric ions was used in degradation studies of aqueous reactive-dyes samples with really promissory results. Generally, Vis-assisted photochemical processes leads to almost total decolorization of all tested dyes at reaction times lower than 30 min. It was also observed that the iron-molecular sieve matrix can be reused.

Keywords: degradation of reactive dyes; Fe3+ immobilized; Fenton-like.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, tornou-se evidente a necessidade de se tomarem providências para o controle da emissão de resíduos, evitando que os recursos naturais como água, solo e ar se tornem ainda mais degradados. Sabe-se que as indústrias, principalmente aquelas que utilizam produtos químicos em suas atividades, são as maiores responsáveis pela geração de resíduos perigosos e o grande alvo de cobrança e fiscalização pela sociedade e pelos órgãos competentes. O aumento da atividade industrial tem gerado a preocupação quanto ao futuro e à preservação do meio ambiente, pois uma parcela importante dos poluentes orgânicos responsáveis por processos de contaminação ambiental é originada dessas atividades.1-3

O setor têxtil é atualmente responsável por grande parte da economia dos países desenvolvidos e a principal atividade econômica de alguns países emergentes. A indústria têxtil pode consumir de 25 a 250 m3 de água por tonelada de fibra processada, sendo que o consumo depende do tipo de processo, do equipamento utilizado, da qualidade do produto final e do tipo de fibra beneficiada.4

Os principais problemas ambientais relacionados com as indústrias têxteis e de tingimento devem-se à utilização de corantes reativos, principalmente os azo-corantes. Trata-se de uma numerosa família de corantes sintéticos, bastante resistentes à degradação natural e de comprovado caráter carcinogênico e mutagênico.4-7

Aproximadamente 10.000 corantes sintéticos são utilizados extensivamente como insumos industriais, principalmente nas indústrias têxtil e de tinturaria. Características como facilidade de produção, baixo custo, constância de estrutura e grande variedade de cores fazem com que a produção e utilização dos azo-corantes seja cada vez mais difundida.

Pelos motivos antes salientados, os efluentes produzidos por estas atividades industriais costumam ser fortemente coloridos e resistentes ao tratamento biológico.8

Em geral, na indústria têxtil os processos de remediação estão fundamentados na operação de sistemas físico-químicos de precipitação-coagulação, seguidos de tratamento biológico via sistema de lodos ativados. O sistema apresenta uma eficiência relativamente alta, permitindo a remoção de cerca de 80% da carga de corantes. Infelizmente, o problema relacionado com o acúmulo de lodo torna-se crítico, uma vez que o teor de corantes adsorvidos é bastante elevado, impedindo qualquer possibilidade de reaproveitamento.2,9

Em função destas limitações, existe uma necessidade imediata de desenvolvimento e utilização de processos que realmente possam degradar, ou preferencialmente mineralizar (conversão dos poluentes orgânicos em CO2, H2O e ácidos minerais) as espécies poluentes e, assim, garantir a qualidade de nossos recursos hídricos. Dentre esses processos destacam-se os processos oxidativos avançados (POAs). Estes métodos fundamentam-se na geração do radical hidroxila (•OH) que tem alto poder oxidante (Eº = 2,8 vs EPH) e pode promover a degradação de vários compostos poluentes em poucos minutos. As vantagens mais significativas deste tipo de procedimentos estão representadas pela grande eficiência na degradação de compostos orgânicos tóxicos e persistentes, sem a necessidade de recorrer à utilização de outros oxidantes químicos, mais enérgicos e com maior potencial de contaminação.2-4,9-15

Uma maneira de produzir radicais hidroxilas é partir de uma mistura de peróxido de hidrogênio e sais ferrosos (Equação 1). Usualmente esta mistura é conhecida por "Reagentes de Fenton", por ter sido Fenton quem observou esta reação pela primeira vez.

Por se tratar de um processo simples de operar, sua aplicabilidade é bastante ampla, podendo ser empregado para o tratamento de efluentes de plantas industriais do ramo têxtil, papeleiro, farmacêutico e áreas contaminadas com resíduos de combustíveis.9,16-20 Recentemente, importantes melhoras na eficiência do processo têm sido reportadas recorrendo-se à utilização de sistemas assistidos por radiação. O processo Fenton pode ser associado à irradiação UV-B (280 a 320 nm), UV-A (320 a 400 nm) e Vis (400 a 800 nm), sendo denominado sistema foto-Fenton (Equação 2). Neste processo, há regeneração da espécie Fe+2, fechando-se o ciclo catalítico com produção de dois equivalentes de radical hidroxila para cada mol de H2O2 decomposto inicialmente.4,10,12,13,21,22

Certamente, uma das principais vantagens do sistema Fenton fotoassistido está representada pela necessidade de fontes de irradiação menos energéticas. Enquanto a geração de radical hidroxila a partir de H2O2 requer energia correspondente a comprimentos de onda menores que 300 nm, o sistema Fenton pode se processar com radiação da ordem de 410 nm.

A natureza homogênea do processo e a possibilidade de desenvolver sistemas assistidos por radiação visível conferem ao sistema foto-Fenton uma elevada potencialidade de aplicação em sistemas contínuos de tratamento. Infelizmente, sérias restrições operacionais, principalmente relacionadas com a precipitação de óxidos férricos hidratados em valores de pH próximos de 4, dificultam ou até impedem o desenvolvimento de rotinas de tratamento orientadas a resíduos industriais.20-25 Para contornar este problema tem sido proposto o uso de formas imobilizadas de ferro.4,8,12,24-27

Frente ao exposto, a imobilização de íons férricos em suportes estáveis, como as peneiras moleculares, torna-se uma opção viável e interessante para o tratamento de efluentes de indústrias têxteis através de processos Fenton-like.

Peneiras moleculares são sólidos porosos, cristalinos ou não, capazes de separar moléculas de acordo com suas dimensões, ou seja, são capazes de absorver seletivamente moléculas cujo tamanho ou carga permite sua entrada nos canais.28

A estabilidade da ligação química entre os metais introduzidos e o retículo cristalino das peneiras é um dos principais entraves à aplicação de peneiras moleculares isomorficamente substituídas como catalisadores heterogêneos em fase líquida. Sheldon et al. afirmaram que existem três alternativas no problema da lixiviação dos metais substituídos em peneiras redox; cada uma com consequências específicas: o metal lixivia, mas não é ativo em solução; o metal lixivia e se torna um catalisador ativo em solução; o metal não lixivia e a catálise observada é de natureza heterogênea.29,30

PARTE EXPERIMENTAL

Reagentes

Peneira molecular tipo 4A (tamanho do poro: 4Å, composição: 1Na2O:1Al2O3:2,0 ± 0,1 SiO2: xH2O) foi proveniente da Aldrich. Os corantes, azul QR-19 (C.I. 61200, DyStar), laranja reativo 16 (C.I. 17757, Aldrich) e amarelo brilhante 3GP (C.I. 18972, Aldrich) foram utilizados em solução aquosa de 50 mg L-1. Peróxido de hidrogênio (Nuclear, 10% m/m) e FeCl3 (Merck) foram utilizados como recebidos. Outros reagentes (ácidos, bases e sais) foram de pureza analítica (PA).

Preparo do catalisador peneira/Fe

A imobilização de íons Fe+3 na peneira molecular envolveu a ativação da peneira molecular 4A à temperatura de 120 °C por 2 h. Após resfriamento a peneira ativada foi submersa em solução 0,1 mol L-1 de FeCl3, de modo a saturar a peneira molecular com o metal, durante o período de 1 h. Em seguida, o sólido foi lavado por decantação e seco à 50 °C por 24 h e finalmente calcinado por 4 h à 400 °C. O sólido obtido será designado doravante por peneira/Fe.

Caracterização das fases sólidas

A quantificação do metal presente na peneira/Fe foi realizada por espectrometria de absorção atômica, utilizando-se espectrofotômetro Varian, Spectraa 220, com lâmpada de Fe (5 mA e λ= 248,3 nm), ar/acetileno. A análise se iniciou com a abertura do material por digestão em ácido fluorídrico concentrado, a quente. A digestão foi realizada adicionando-se de tempos em tempos volumes de 200 μL de HF. A solução era mantida a 60 °C em banho-maria até o término da digestão. A solução obtida foi diluída com ácido clorídrico 0,1 mol L-1 e o pH foi acertado para 3 com hidróxido de sódio; em seguida, foi transferida para um balão volumétrico de 100 mL.

As análises por espectroscopia de ressonância paramagnética de elétrons foram realizadas em um espectrômetro Bruker ESP 300E, operando em banda X (9,5 GHz) a 293 K.

A verificação do estado de oxidação do ferro foi realizada através da espectroscopia Mösbauer. As medidas de espectroscopia Mössbauer foram realizadas em temperatura ambiente, na geometria de transmissão, em um espectrômetro Mössbauer convencional no modo de aceleração constante e utilizando uma fonte de 57Co(Rh) com uma atividade nominal de 10 mCi. Os espectros Mössbauer foram analisados através de uma rotina que utilizou linhas espectrais no formato de linhas Lorentzianas. Deste ajuste foram obtidos os parâmetros hiperfinos (deslocamento isomérico - δ e desdobramento quadrupolar - QS) e as larguras de linha a meia altura (FWHM).

Análise de área superficial BET foi utilizada para determinação da área da peneira molecular e verificação dos volumes dos poros. A área superficial da peneira molecular e da peneira/Fe foi determinada em um equipamento ASAP 2000 V3.03, empregando nitrogênio (N2) como adsorvato, sendo os dados obtidos de adsorção e dessorção analisados através do modelo BET (multipoint BET).

Processo fotoquímico

O tratamento foi realizado em reator fotoquímico convencional de bancada de 250 mL de volume útil, equipado com sistema de refrigeração por água e agitação mecânica. A radiação UV-A foi proporcionada por uma lâmpada de mercúrio de 125 W (sem o bulbo protetor), inserida na solução por meio de um bulbo de vidro pirex. Amostras de 100 mL tiveram o seu pH ajustado em valores previamente otimizados, sendo posteriormente submetidas ao processo fotoquímico na presença de quantidades predeterminadas de peróxido de hidrogênio e catalisador suportado. Alíquotas foram coletadas em intervalos regulares (10 min) e submetidas a controle analítico.

Para o estudo da reutilização da peneira/Fe foi utilizado o corante azul QR-19 como substrato modelo. O tempo de degradação adotado foi de 50 min, enquanto que o monitoramento foi realizado a cada 10 min.

Controle analítico

A absorbância foi medida em espectrofotômetro UV-Vis, Varian 3.000, segundo metodologia padrão,31 utilizando cubetas de quartzo de 1 cm de caminho óptico. Água destilada foi utilizada como referência. A descoloração dos corantes foi avaliada nos comprimentos de onda de máxima absorção apresentado pelas amostras: azul QR-19 (592 nm), amarelo brilhante (404 nm) e laranja reativo 16 (494 nm).

A demanda química de oxigênio (DQO) foi determinada de acordo com metodologia padrão,31 consistente em digestão em tubo fechado seguida de determinação espectrofotométrica. A DQO foi utilizada no estudo de monitoramento espectroscópico da degradação da mistura de corantes.

Peróxido de hidrogênio residual foi determinado espectrofotometricamente, utilizando-se metodologia fundamentada na reação com vanadato de amônio.32

Determinações de ferro (Fe2+ e Fe3+) em solução foram realizadas por espectrofotometria UV-Vis, utilizando-se metodologia fundamentada na reação de complexação entre Fe2+ e o-fenantrolina de acordo com metodologia padrão.31

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Imobilização de íons Fe3+ em peneira molecular

A peneira molecular 4A possui forma esférica com o diâmetro variando entre 1,7 e 2,4 mm e uma alta capacidade de adsorver água sem levar a um inchamento destrutivo. Essas características permitem utilizar esse material em sistemas de tratamento contínuo de resíduos aquosos, pois sua densidade faz com essa matriz permaneça na parte inferior do reator durante os processos de degradação. Outro fato relevante é a resistência mecânica da matriz frente à adsorção de água e a sistemas com agitação mecânica. Esses motivos nos levaram a escolher a peneira molecular 4A como suporte para a imobilização de íons férricos e sua aplicação na degradação de corantes reativos por processo foto-Fenton.

Utilizando-se o procedimento de imobilização antes descrito, ferro foi incorporado na peneira molecular com um rendimento de 0,94% (m/m), valor este que se mostra bastante próximo ao relatado em estudos de natureza similar.33 Embora a quantidade de ferro disponível possa parecer pequena, vários trabalhos relatam eficientes processos de degradação fundamentados em sistemas Fenton, recorrendo-se ao uso de formas imobilizadas que apresentam concentração relativa entre 0,4 e 1,78%.34,35

De acordo com os resultados obtidos na análise de área superficial BET, a incorporação de Fe3+ diminuiu a área superficial e o volume dos microporos da peneira molecular (Tabela 1), provavelmente em função do preenchimento parcial dos poros da peneira ou da modificação da sua forma, em razão de variações no parâmetro de cela unitária.36

Os espectros de EPR da peneira/Fe, obtidos antes e após a realização dos estudos de degradação, mostram-se semelhantes com sinais em g = 4,3 e 9,0 (Figura 1), característicos de complexos tetraédricos de Fe3+.33,37 A semelhança nos espectros confirma a inexistência de alterações dos íons férricos adsorvidos no catalisador após os estudos de degradação dos corantes.


Os resultados obtidos através dos ajustes dos espectros Mössbauer estão apresentados na Tabela 2, sendo que os valores obtidos para o deslocamento isomérico são relativos ao α-Fe. O espectro Mössbauer da peneira/Fe antes do estudo de degradação (Figura 1S(a), material suplementar) apresenta parâmetros hiperfinos que podem ser relacionados à presença de ferro na forma de íons Fe3+. Da mesma forma, o espectro da peneira/Fe após estudo de degradação (Figura 1S(b), material suplementar) também apresenta apenas um dubleto que é associado a íons Fe3+. De acordo com os parâmetros obtidos, o dubleto observado na peneira pode ser associado tanto a um hidróxido de ferro (Fe(OH)3),38 como a um óxido de ferro nanoestruturado.39

Otimização do processo de degradação

É de amplo conhecimento que a eficiência dos processos Fenton e foto-Fenton é dependente de algumas variáveis operacionais, dentre as que destacam o pH e a concentração de ferro e peróxido de hidrogênio.23 Por este motivo, foram realizados estudos preliminares visando a otimização destes parâmetros operacionais, utilizando-se sistemas de planejamento fatorial de experimentos. As variáveis estudadas foram: a massa da peneira/Fe, o pH do meio reacional e a concentração de peróxido de hidrogênio. O planejamento fatorial foi estudado em dois níveis, o que configura o planejamento 23 com ponto central (Tabela 3). O estudo envolveu a degradação do corante modelo (azul QR 19), a qual foi monitorada espectrofotometricamente, utilizando-se como resposta a diminuição do sinal registrado no máximo de absorção (592 nm), para um tempo de reação de 10 min.

Levando-se em consideração os efeitos de primeira ordem, é possível observar que o pH influencia de maneira decisiva a eficiência do processo de degradação, permitindo um aumento médio da ordem de 18 pontos percentuais na taxa de degradação, quando em valores próximos de 2,0. De maneira geral, admite-se que as reações Fenton são favorecidas em valores de pH entre 2 e 3, principalmente porque em valores de pH inferiores a 2 o excesso de H+ exerce um efeito sequestrante sobre o radica hidroxila, enquanto que em valores superiores a 3 a hidrólise diminui a disponibilidade de formas férricas solúveis.13 É importante salientar que não foi observada precipitação de óxidos férricos nos estudos de degradação realizados em pH 4,0. Embora menores taxas de degradação tenham sido observadas nesta condição, percebe-se que o uso de formas imobilizadas de ferro evita a ocorrência de reações de hidrólise, o que permite estender a faixa operacional de pH.

O efeito positivo da massa de catalisador e da concentração de peróxido, ambos de cerca de 6 pontos percentuais, indica um significativo favorecimento do processo de degradação quando elevadas concentrações destas espécies são utilizadas, o que, obviamente, se relaciona com a maior disponibilidade de reagentes que levam à formação de radical hidroxila.

Em função das observações anteriores, as melhores condições experimentais correspondem às do experimento 7 (Tabela 3), condição esta que permite taxas de degradação da ordem de 46%, em 10 min de tratamento. Entretanto, taxas de degradação muito próximas foram observadas nas condições do experimento 3 (aproximadamente 44%), as quais envolvem o uso de menores concentrações de H2O2 (70 mg L-1). Por este motivo, estas últimas condições foram selecionadas para a realização dos estudos subsequentes.

Estudos de degradação do corante azul QR-19

Trabalhando-se nas condições previamente otimizadas, foram realizados estudos de degradação do corante modelo, obtendo-se os resultados apresentados na Figura 2. Nesta sequência de espectros é possível observar uma rápida degradação do cromóforo, o que permite uma completa remoção da cor nos primeiros 20 min de reação.


O monitoramento de ferro solúvel total (Fe2+ e Fe3+) evidenciou a liberação de concentrações entre 0,6 e 6,0 mg L-1. Esses valores estão bem abaixo do valor permitido pelas legislações que limitam a quantidade do metal nos efluentes; segundo a Resolução do CONAMA nº 357, de 17/3/2005, o limite de ferro é de 15 mg L-1.

Em função da natureza do sistema fotoquímico empregado, a diminuição dos parâmetros monitorados pode ser o resultado de três processos concomitantes: adsorção do substrato na superfície da peneira molecular; decomposição por fotólise e decomposição pelo sistema H2O2/UV-A.

Os resultados apresentados na Figura 3 mostram que o processo de fotólise provoca certas modificações estruturais no corante, o que se manifesta como aumento no valor de absorbância. Entretanto, tais modificações são leves, envolvendo principalmente a quebra de ligações mais lábeis.4 Embora a decomposição fotoquímica do peróxido de hidrogênio, e a consequente geração de radical hidroxila, se processe com radiações da ordem de 254 nm, descolorações de até 20% podem ser induzidas pelo sistema assistido por radiação UV-A. Finalmente, o processo de adsorção foi completamente inexpressivo em relação à remoção do corante, o que certifica a vantagem de se trabalhar com o suporte proposto.


Estudo de reutilização do catalisador

Com o objetivo de avaliar, de maneira preliminar, a potencialidade do fotocatalisador em processos mais exigentes, a capacidade de reutilização do fotocatalisador foi também investigada. Utilizando-se o material no modo batelada e por tempos de 50 min, observou-se manutenção da eficiência por até três vezes. Posteriormente, observa-se fragmentação da matriz e diminuição da eficiência de degradação. Na Figura 4 observamos a eficiência da reutilização da peneira/Fe no processo de degradação do corante azul QR-19.


Após o primeiro uso, a degradação do corante é mais lenta do que na sua primeira utilização. Este fato poderia estar associado ao envenenamento do catalisador mas, como descrito acima, o processo de adsorção foi completamente inexpressivo em relação à remoção do corante. A queda de eficiência deve-se, provavelmente, à diminuição de íons Fe3+ na solução, pois observamos que no primeiro estudo, após 50 min de reação, a quantidade de ferro na fase líquida foi de 6 mg L-1, enquanto que nos demais estudos esta concentração não passava de 0,6 mg L-1.

A lixiviação do ferro para a fase líquida é comprovada pela diminuição da concentração do Fe3+ na superfície da peneira de 0,94 para 0,40% após o terceiro estudo de degradação, portanto, a atividade do catalisador pode estar associada à gradual lixiviação de ferro para a fase líquida.

Nos 2º e 3º estudos de degradação a concentração de Fe3+ foi de 0,6 mg L-1 e mesmo assim a taxa de degradação do corante manteve-se acima de 80% após 50 min de processo. Esse fato nos indica que a reação de degradação do corante também é promovida pelos íons Fe3+ imobilizados na superfície da peneira. De acordo com relatos de Noorjahan e colaboradores,23 o uso de formas imobilizadas de íon férrico permite a ocorrência de reações heterogêneas, que envolvem: adsorção do substrato na superfície da matriz; fotorredução das formas férricas a ferrosas; produção de radical hidroxila por reação entre íon ferroso e peróxido de hidrogênio e, degradação oxidativa do substrato previamente adsorvido. Em teoria, a adsorção preliminar do substrato permite significativos aumentos na eficiência do processo de degradação, em função da proximidade entre o radical hidroxila e a molécula de substrato.

Uma observação similar foi realizada por Moncayo-Lasso e colaboradores,35 estudando a degradação de hidroquinona por processos Fenton assistidos por íon férrico imobilizado em fibras de sílica. Neste caso, foi considerado que concentrações de ferro solúvel da ordem de 1 a 2 mg L-1 contribuem de maneira pouco significativa com a degradação observada, ao mesmo tempo em que as formas férricas, solubilizadas durante a produção de radical hidroxila, podem ser readsorvidas em etapas posteriores (Equações 3 e 4).

Observamos que a reutilização do catalisador diminui a velocidade de degradação do corante e, consequentemente, a eficiência do catalisador suportado, mas temos que destacar que mesmo após utilizar a peneira/Fe três vezes a taxa de degradação do corante, após 50 min, não é menor que 80%, portanto, a reutilização do catalisador mostrou-se de grande eficácia.

Degradação de mistura de corantes

Como o objetivo de avaliar a potencialidade do processo em relação à remediação de efluentes têxteis, foi realizado um estudo de degradação envolvendo uma mistura de três corantes, de uso bastante difundido em operações de tingimento de fibras têxteis.

Os resultados (Figura 5) indicam que a degradação dos grupos cromóforos é bastante acentuada nos primeiros 30 min de tratamento. Após este tempo, a cinética se torna menos favorável, certamente em função do rápido consumo de peróxido e a consequente baixa da concentração residual (Figura 6). A evolução da DQO é bastante similar, estabilizando a partir de 30 min, com uma remoção da ordem de 20%. Em situações como esta, a utilização de sistemas de múltiplas adições de peróxido eleva significativamente a eficiência do processo de remoção de DQO.



CONCLUSÕES

Neste trabalho avaliou-se a potencialidade do processo foto-Fenton frente à degradação de corantes reativos, utilizando-se Fe (III) imobilizado em peneira molecular. O suporte proposto apresentou ótimas condições para imobilização de óxido férrico, assim como para servir de fonte de ferro (III) para processos do tipo Fenton. O sistema permite uma eficiente degradação de corantes reativos em tempos de reação bastante reduzidos, o que sugere uma boa potencialidade para a eliminação de cor em resíduos têxteis. O estudo de reutilização demonstrou que o material preparado pode ser utilizado diversas vezes na degradação do corante azul QR-19 sem perder a eficiência.

MATERIAL SUPLEMENTAR

As Figuras 1S(a) e (b), estão disponíveis em http://quimicanova.sbq.org.br, na forma de arquivo PDF, com acesso livre.

AGRADECIMENTOS

Ao Prof. A. S. Mangrich pela gentil colaboração na aquisição e interpretação dos espectros de EPR. F. Ignachewski agradece à Fundação Araucária pela bolsa concedida.

Recebido em 6/10/09; aceito em 24/4/10; publicado na web em 9/8/10

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Aceito
      24 Abr 2010
    • Recebido
      06 Out 2009
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