Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação da porosidade de microcápsulas contendo proteína bioativa por porosimetria de mercúrio e adsorção de nitrogênio

Evaluation of porosity of microcapsules containing biocative protein by mercury porosimetry and nitrogen adsorption

Resumo

Microcapsules containing lactoferrin were produced by spray drying using dextrin:octenylsuccinate starch, as wall materials. Porosity characteristics of spray-dried microcapsules were investigated by mercury intrusion porosimetry and nitrogen adsorption. The outer and inner structures of microcapsules were studied by Scanning Electron Microscopy and sizes were determined by Laser Diffraction. Results indicate that all microcapsules presents adsorption isotherm of type II and that micropores on the microcapsules surface will be very few or none. Our results show that microstructure, surface area and size of microcapsules are affected by dextrin: octenylsuccinate starch proportion. Pore characteristics for various microcapsules are found to be different.

porosity; microcapsules; spray drying


porosity; microcapsules; spray drying

ARTIGO

Avaliação da porosidade de microcápsulas contendo proteína bioativa por porosimetria de mercúrio e adsorção de nitrogênio

Evaluation of porosity of microcapsules containing biocative protein by mercury porosimetry and nitrogen adsorption

Luciana Helena Maia PorteI,* * e-mail: lhmaia@ufrrj.br ; Maria Helena Miguez Rocha LeãoII; Alexandre PorteIII

IInstituto Multidisciplinar, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rua Governador Roberto da Silveira, s/n, 26020-740 Nova Iguaçu - RJ, Brasil

IIDepartamento de Engenharia Bioquímica, Escola de Química, Universidade Federal do Rio de Janeiro, 21949-900 Rio de Janeiro - RJ, Brasil

IIIDepartamento de Tecnologia de Alimentos, Escola de Nutrição, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rua Dr. Xavier Sigaud, 290, 22290-180 Rio de Janeiro - RJ, Brasil

ABSTRACT

Microcapsules containing lactoferrin were produced by spray drying using dextrin:octenylsuccinate starch, as wall materials. Porosity characteristics of spray-dried microcapsules were investigated by mercury intrusion porosimetry and nitrogen adsorption. The outer and inner structures of microcapsules were studied by Scanning Electron Microscopy and sizes were determined by Laser Diffraction. Results indicate that all microcapsules presents adsorption isotherm of type II and that micropores on the microcapsules surface will be very few or none. Our results show that microstructure, surface area and size of microcapsules are affected by dextrin: octenylsuccinate starch proportion. Pore characteristics for various microcapsules are found to be different.

Keywords: porosity; microcapsules; spray drying.

INTRODUÇÃO

Tem surgido um crescente interesse em relação às atividades fisiológicas e biológicas de algumas frações proteicas presentes no soro de leite como, por exemplo, a proteção da flora intestinal contra bactérias enteropatogênicas, proteção do organismo contra íons metálicos livres, transporte fisiológico de ferro e imunorregulação, desempenhadas ou propiciadas pela lactoferrina. Considerando as propriedades únicas que esta proteína pode conferir a determinados alimentos e a demanda atual por sistemas antimicrobianos e funcionais naturais, percebe-se a aplicação potencial da lactoferrina encapsulada na indústria de alimentos, permitindo futuramente a abertura de um novo mercado para a utilização desta proteína em alimentos industrializados.

A técnica de spray drying é potencialmente adequada para encapsulação de peptídeos e proteínas por ser uma operação contínua relativamente simples e de menor custo. Contudo, durante o processo de secagem podem ocorrer diferentes graus de colapso, que determinarão a estrutura do produto final.1

A encapsulação é o processo pelo qual um material ou mistura de materiais chamados de núcleo ou material ativo são revestidos com ou contidos dentro de um outro material ou sistema, chamado de material de parede ou encapsulante.2

Para microencapsulação por spray drying, a escolha do material de parede é crítica, pois irá influenciar a estabilidade da dispersão antes da secagem e as propriedades das microcápsulas após a secagem. Os materiais encapsulantes usados consistem de uma grande variedade de polímeros formadores de filme como gomas, carboidratos, celuloses, lipídeos, proteínas e materiais inorgânicos, sendo a escolha destes dependente, dentre outros fatores, das características do núcleo.3

O amido modificado octenilsuccinato possui atividade superficial, sendo capaz de reduzir a tensão superficial de uma solução, podendo ser utilizado como um emulsificante.4,5

Durante a produção das microcápsulas, devido à alta temperatura de secagem podem ocorrer alterações na estrutura secundária da proteína utilizada como núcleo. Desta forma, a escolha do material de parede é fundamental para a eficiência da encapsulação de proteínas. A utilização de materiais de parede com propriedades de superfície,6 como o amido octenilsuccinato é desejável, uma vez que este tende a se acumular na interface ar/água das gotículas de solução formadas, reduzindo o acúmulo da proteína na superfície da microcápsula, preservando assim sua estrutura e atividade biológica.

Muitos materiais em pó contêm um determinado volume de espaço vazio que é distribuído na forma de poros, cavidades e rachaduras de várias formas e tamanhos. A soma total destes volumes vazios é chamada de porosidade. De acordo com a sua origem e estrutura os poros podem ser classificados em poros interparticulares e intraparticulares.

Poros interparticulares são espaços existentes entre as partículas. Partículas primárias se unem para formar partículas secundárias, dependendo da sua composição química, forma e tamanho. Existem dois tipos de união de partículas primárias: a agregação (fraca união) e a aglomeração (forte união).7 Já porosidade intraparticular compreende poros abertos e fechados presentes em um material. Poro aberto é uma cavidade ou canal que se comunica com a superfície da partícula. Poros fechados estão dentro do material e não têm comunicação com a superfície externa.8

A porosidade de um material determina propriedades físico-químicas importantes como propriedades de adsorção, resistência mecânica, característica de dissolução, molhabilidade e propriedades de transporte, como condutividade térmica.9

Os principais parâmetros que descrevem a superfície de um sólido são área superficial específica, volume total do poro, diâmetro médio do poro e distribuição do volume do poro em relação ao diâmetro do poro.10

O conhecimento do tamanho dos poros, da distribuição dos tamanhos de poros e da área superficial específica de vários alimentos é de suma importância para o controle de qualidade e desenvolvimento de novos produtos como ingredientes para sopas desidratadas, bolos, entre outros, uma vez que estes parâmetros afetam propriedades como capacidade e taxa de reidratação e estabilidade à oxidação destes produtos.1

A área superficial e a porosidade dos pós dependem dos parâmetros de processamento. Devido ao impacto importante da porosidade nas propriedades dos produtos, uma caracterização precisa da porosidade e da estrutura dos poros é de fundamental importância. Várias técnicas têm sido utilizadas para caracterização da porosidade de alimentos como picnometria em microcápsulas,11 porosimetria de mercúrio em grãos de café,12 chocolate,13 amidos,14 vegetais e frutas,1 por adsorção de nitrogênio em trigo e frações do grão15 e amido.16

Desta forma, o presente estudo utilizou as técnicas de porosimetria de mercúrio e de adsorção de nitrogênio para caracterizar a porosidade das microcápsulas contendo lactoferrina, produzidas por spray drying. O conhecimento da estrutura porosa destas microcápsulas pode permitir a modelagem do processo de transferência de massa, em futuros estudos para incorporação destas em sistemas alimentares.

PARTE EXPERIMENTAL

Para obtenção das microcápsulas foi utilizada como núcleo a proteína lactoferrina bovina (bLF) purificada do soro de leite, adquirida da Biopole S.A./NV e como materiais de parede, dextrina (Nadex 772®) e amido octenilsuccinato ou amido OSA (Capsul®) doados pela National Starch and Chemical Company.

Preparo das suspensões

Foram preparados 400 mL de suspensão, contendo 120 g de sólidos (30% p/v), sendo 24 g deste teor de sólidos correspondentes ao núcleo e 96 g, ao material de parede.

Os materiais de parede (somente dextrina, somente amido OSA ou combinações de ambos em diferentes proporções - Tabela 1), foram dispersos em 300 mL de água deionizada a 80 ºC, os 100 mL restantes de água foram utilizados para solubilizar a bLF. Após o resfriamento da suspensão contendo o material de parede, a solução de bLF foi incorporada e homogeneizada lentamente.

Foram elaboradas 5 formulações, variando-se o tipo e a concentração do material de parede. A Tabela 1 apresenta as quantidades de bLF e de materiais de parede utilizados para obtenção das suspensões, que após secagem deram origem às microcápsulas correspondentes.

Produção das microcápsulas

As microcápsulas foram produzidas a partir da secagem das suspensões, descritas na Tabela 1, em spray dryer Mini Büchi 190 (Büchi Laboratoriums Technik AG) com as seguintes condições de operação: bico atomizador de 0,3 mm, vazão de alimentação de 18 mL min-1, temperatura de entrada e saída igual a 180 e 90 ºC, respectivamente.

Caracterização das microcápsulas

Análise da morfologia externa das microcápsulas

As amostras foram depositadas em fita adesiva de carbono dupla face, fixada na superfície dos suportes de MEV e, em seguida, recobertas com uma fina camada de ouro em um metalizador Balzers, Union FL 9496 e analisadas em microscópio eletrônico de varredura JEOL JSM 5310, a 20 kV.17 As imagens foram digitalizadas diretamente do microscópio e micrografias representativas foram selecionadas.

Análise da morfologia interna das microcápsulas

Para análise da estrutura interna, as microcápsulas foram embebidas em adesivo à base de cianoacrilato (Loctite® SuperBonder, Henkel Ltda, Germany). Após polimerização, os blocos polimerizados foram cortados com uma lâmina de aço e os fragmentos depositados sobre os stubs de MEV e a análise procedida conforme descrito para a análise da morfologia externa.

Análise da distribuição do tamanho das microcápsulas

Mediu-se em um granulômetro Cilas 1064, a distribuição do tamanho de partícula das amostras em uma suspensão líquida. Alguns miligramas de amostra foram suspensos em 400 mL de isopropanol. Cada suspensão foi submetida à sonicação (55 KHz) e a uma lenta agitação contínua, para evitar a agregação das microcápsulas. A intensidade do espalhamento de luz foi medida para calcular o diâmetro e o span da distribuição das partículas. O span foi definido como (d90- d10/d50), onde d10, d50 e d90 são os diâmetros em 10, 50 e 90% de volumes cumulativos, respectivamente.18 As análises foram realizadas em triplicata.

Análise da porosidade das microcápsulas por adsorção de nitrogênio (N2)

A área superficial específica, o volume e o diâmetro de poros foram determinados em um analisador de área superficial Quantachrome Nova 1200 (Quantachrome Corp.), através do método de adsorção de nitrogênio.16 As microcápsulas foram pesadas (aproximadamente 1 g) em porta-amostra do analisador, purgadas e então analisadas. A análise consiste em determinar a isoterma de adsorção, através da quantificação de nitrogênio adsorvido na superfície das amostras (n) sob diferentes pressões, no ponto de ebulição do nitrogênio, usando a equação de BET. Os parâmetros foram calculados pelo software do equipamento. As análises foram realizadas em triplicata.

Análise da porosidade das microcápsulas por porosimetria de mercúrio (Hg)

A porosimetria de intrusão de mercúrio foi realizada utilizando um porosímetro Quantachrome Autoscan 33 (Quantachrome Corp.). Aproximadamente 0,5 g de amostra foram pesadas, colocadas num dilatômetro e degaseificadas sob vácuo. O dilatômetro foi preenchido com mercúrio e transferido para o porosímetro, onde ocorreu o aumento gradativo da pressão e a intrusão do mercúrio nas amostras. O volume de intrusão foi registrado e os valores de pressão foram convertidos em valores de diâmetro de poros equivalentes, baseado na equação de Washburn. Os parâmetros foram calculados pelo software do equipamento.9 As análises foram realizadas em triplicata.

Análise estatística

Para a análise estatística dos resultados, utilizou-se o delineamento inteiramente casualizado (DIC), onde foram feitas análises de variância, com posterior comparação entre as médias pelo teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Microestrutura externa das microcápsulas

As microcápsulas produzidas foram esféricas; essa estrutura foi afetada pelo tipo de carboidrato, bem como pela proporção de dextrina:amido OSA utilizada. A estrutura da microcápsula contendo somente dextrina como material de parede (CAP 0) apresentou irregularidades (depressões) na superfície. Estas depressões são atribuídas ao enrugamento sofrido pelas partículas durante a secagem e resfriamento do spray drying.19,20

A indicação da capacidade encapsulante de um polímero é dada pelo grau de integridade e porosidade das microcápsulas formadas pela sua utilização como material de parede.19 Embora a microcápsula CAP 0 tenha apresentado depressões superficiais, não foi verificada a ocorrência de microfissuras e rachaduras em sua superfície.

Verifica-se através da análise das micrografias, que a mistura de biopolímeros utilizada como material de parede teve influência na topografia e morfologia externa das microcápsulas. Todas as microcápsulas produzidas apresentaram depressões superficiais, que tenderam a diminuir com o aumento da proporção de amido OSA na mistura de material de parede (Figura 1). Os resultados encontrados sugerem que a extensão de depressões superficiais foi inversamente relacionada à proporção de amido OSA presente na parede das microcápsulas. Acredita-se que este comportamento observado seja resultante do efeito do amido OSA nas propriedades mecânicas da parede das microcápsulas durante o processo de spray drying, pois devido à presença de grupos octenilsuccinatos em sua estrutura, possivelmente, ocorreu uma menor formação de pontes de hidrogênio entre as cadeias de amido em solução, formando um filme mais flexível, permitindo com isso uma expansão da microcápsula antes da sua solidificação e, consequentemente, um alisamento da superfície.


Uma alta elasticidade da matriz pode permitir a expansão da gotícula durante o processo de secagem, antes da formação de uma crosta seca e da solidificação da mesma.16

As microcápsulas CAP 75 e CAP 100 (Figura 1) apresentaram forma esférica e uma superfície mais lisa e uniforme. Foi observada nestas amostras, também, uma ocorrência menor de coalescência e aglomeração. Estes resultados foram obtidos, provavelmente, pela alta concentração de amido OSA adicionada na formulação, devido à ação deste como plasticizante, preservando o sistema de hidratação e reduzindo o enrugamento/murchamento das microcápsulas durante a secagem.

Foi verificada a existência de algumas microcápsulas CAP 50 e CAP 100 contendo poro aberto (Figura 2), ou seja, com comunicação entre o centro e a superfície da partícula, o que é desfavorável para a eficácia da proteção do núcleo. Com a finalidade de verificar a porosidade das microcápsulas produzidas foram realizadas análises de porosimetria de mercúrio e de adsorção de nitrogênio.


Microestrutura interna das microcápsulas

A Figura 2 apresenta as estruturas internas de microcápsulas esférica lisa e com depressões, respectivamente. Verifica-se que no centro das microcápsulas existe um espaço vazio (void), que ocupa um grande volume na microcápsula, indicando que estas microcápsulas são do tipo matriz. As microcápsulas com depressões apresentam um espaço vazio central menor e uma parede mais espessa que os existentes nas microcápsulas esféricas. Esta característica é muito importante para a cinética de liberação da lactoferrina destas microcápsulas, uma vez que a espessura da parede das microcápsulas afeta o tempo de difusão de moléculas de água da superfície para o centro e, consequentemente, afeta a velocidade de liberação da proteína das microcápsulas.

Nas análises de microscopia, não se verificou a presença de poros ou fissuras na superfície interna das microcápsulas produzidas.

Distribuição do tamanho das microcápsulas

A Tabela 2 apresenta a distribuição do tamanho das microcápsulas produzidas CAP 0 a CAP 100. Analisando-a constata-se que o tamanho das microcápsulas foi afetado pela proporção de dextrina:amido OSA utilizada. Os resultados indicam que as microcápsulas contendo 100% (CAP 100) e 75% (CAP 75) de amido OSA como material de parede foram as maiores microcápsulas produzidas, apresentando diâmetros médios iguais a 9,60 e 8,69 mm, respectivamente. Este resultado se deve, provavelmente, à ocorrência de uma maior expansão destas microcápsulas durante a secagem, devido à maior flexibilidade do filme formado pelo amido OSA.

A adição de 25% (CAP 25) e 50% (CAP 50) de amido OSA como material de parede resultou numa diminuição significativa do diâmetro das microcápsulas com relação à microcápsula contendo somente dextrina como material de parede (CAP 0).

As microcápsulas contendo 50% de amido OSA:50% de dextrina como material de parede (CAP 50) apresentaram o menor diâmetro (6,81 mm) dentre as microcápsulas produzidas.

Todas as microcápsulas produzidas apresentaram um grande intervalo de distribuição (span), indicando a heterogeneidade do processo de produção por spray drying.

A determinação do tamanho das partículas pode ser uma consideração importante para alguns tipos de materiais, particularmente se estes são termossensíveis, pois partículas pequenas apresentam um maior coeficiente de transferência de massa e calor e um menor caminho difusional interno se comparadas a partículas grandes. Consequentemente, estas partículas apresentam inicialmente um menor teor de umidade e secam mais rápido, estando assim mais passíveis de sofrerem degradação térmica.22

O tamanho da partícula e a distribuição do tamanho das partículas influenciam nas propriedades de fluxo de um pó. Os pós podem apresentar três tipos de comportamento de fluxo: fluidez livre, semilivre e coesa. Os fatores que influenciam a fluidez de um pó são tamanho da partícula, distribuição do tamanho de partícula, morfologia da partícula, teor de umidade e natureza higroscópica do material. Entretanto, a principal consideração é o grau de aglomeração das partículas.22

Partículas pequenas aderem-se muito mais fortemente entre si do que partículas grandes, então pós finos apresentam uma maior tendência à aglomeração. A fluidez de um pó aumenta com o aumento do tamanho da partícula. Comportamento similar é observado para propriedades como dispersibilidade e molhabilidade dos pós.23

Desta maneira, sugere-se que as microcápsulas CAP 100 e CAP 75 devido aos seus tamanhos se constituem nas microcápsulas com melhores propriedades de fluxo para serem utilizadas na indústria de alimentos. Contudo, a escolha da microcápsula a ser empregada dependerá da finalidade desejada.

Pela análise microscópica foi verificada pouca ou nenhuma aglomeração para a microcápsula CAP 100, enquanto as microcápsulas CAP 0 e CAP 50 apresentavam maior número de aglomerados. Por outro lado, as microcápsulas CAP 25 e CAP 75 apresentaram características de aglomeração intermediária. Entretanto, nenhuma das microcápsulas produzidas exibiu aglomeração como uma "massa", característica de pós coesos.

Estes resultados podem ser atribuídos a uma combinação de fatores que incluem tamanho e morfologia das partículas. As microcápsulas CAP 100 apresentaram pouca aglomeração por terem partículas grandes e esféricas, enquanto nas microcápsulas CAP 50 um maior número de aglomerados foi verificado devido a seu menor tamanho. Já para as microcápsulas CAP 0, a aglomeração pode ser atribuída a sua estrutura superficial irregular devido à presença das depressões.

Foram verificadas em um estudo correlações entre morfologia e propriedades de fluxo de pós, via ligação por acoplamento mecânico. Em pós com fluidez livre, as partículas precisam ser esféricas, sem aspereza superficial, ter partículas grandes e ser livres de umidade e não estático; enquanto que em pós com fluidez semilivre e coesa, as partículas são menos esféricas e com irregularidades superficiais.22

Porosidade das microcápsulas

A Figura 3 apresenta a curva de intrusão de mercúrio em função do tamanho do poro para a microcápsula CAP 0. As curvas de intrusão para as outras microcápsulas estudadas CAP 25 a CAP 100 apresentaram padrão similar ao da CAP 0.


Verifica-se pela Figura 3 que, inicialmente, ocorreu um aumento intenso no volume de mercúrio intrudado e, posteriormente, uma região de intrusão constante. A intrusão inicial verificada nas amostras estudadas ocorreu em pressões muito baixas, devido à penetração do mercúrio em espaços interparticulares da amostra. Segundo Lowell e Shields,10 este comportamento é característico de amostras em pó e depende do tamanho, da forma e da geometria do empacotamento das partículas. Poderá existir espaço vazio interparticulares de várias dimensões, que serão progressivamente preenchidos com o aumento da pressão. Estes resultados foram semelhantes aos encontrados para atum desidratado24 e para materiais amiláceos.14

O volume médio de mercúrio intrudado nas microcápsulas foi de 0,7351 cm3 g-1 para CAP 0; 0,8921 cm3 g-1 para CAP 25; 0,8039 cm3 g-1 para CAP 50; 0,7837 cm3 g-1 para CAP 75 e 0,6389 cm3 g-1 para CAP 100.

A Figura 4 apresenta a plotagem da derivada das curvas cumulativa, dV/dP, versus o diâmetro dos poros das microcápsulas CAP 50, que foi similar ao padrão das demais microcápsulas produzidas.


A função dV/dP é muito utilizada para determinação do diâmetro em que ocorre a penetração do volume máximo de mercúrio.10 Além disso, de acordo com Rahman, Al-Amri e Al-Bulushi,24 esta função é muito importante na caracterização de poros, já que esta é utilizada nas análises de distribuição de tamanho de poros Dv(d), Ds(d) e fração de número de poros.

Analisando o perfil apresentado pelas microcápsulas ilustrado pela Figura 4, verifica-se a presença de poros com diâmetros predominantes de 1-8 µm, indicados pela apresentação de um pico largo nesta faixa de diâmetro dos poros.

A quantificação da distribuição do tamanho do poro pode ser conseguida através da distribuição de volume Dv(d) em função do diâmetro, que apresenta a mudança no volume de mercúrio intrudado por unidade de intervalo do diâmetro do poro.

Através da distribuição de volume Dv(d) em função do diâmetro para as microcápsulas CAP 0, verificou-se a seguinte distribuição do tamanho de poro: picos na região de 9-0,5; de 0,18-0,016 e 0,01 µm. A contribuição de poros maiores que 0,5 µm foi de 99,06% do total de poros. O restante da porosidade (0,94%) foi devido à contribuição dos poros com diâmetro entre 0,18-0,01 µm.

Para as microcápsulas CAP 25, verificaram-se poros na região de 8,5-0,54 e de 0,1-0,026 µm. Do total de poros, 99% foram correspondentes a poros maiores que 0,5 µm e apenas 1% correspondeu a poros menores que 0,09 µm e maiores que 0,025 µm.

Foram encontrados poros na região de 8,5-0,6 µm, que representaram 98,43% do total de poros, e na região de 0,09-0,014 µm, correspondentes a 1,57% do total de poros presentes nas microcápsulas CAP 50.

Para as microcápsulas CAP 75 foram verificados que 98,7% do total de poros apresentaram diâmetros que variaram de 8,5-0,34 µm. Poros com diâmetros de 0,25-0,03 µm corresponderam a 1,23% do total de poros e foram verificados poros com 0,02 e 0,01 µm, cuja contribuição foi de 0,03 e 0,04%, respectivamente.

Para as microcápsulas CAP 100, a contribuição de 97,7% do total de poros foi correspondente a poros de 7-0,5 µm e 2,3% corresponderam a poros com diâmetros de 0,2-0,02 µm.

Com exceção das microcápsulas CAP 100, cujos poros com diâmetro de 7 µm corresponderam a 2% do total de poros, para as demais microcápsulas produzidas - CAP 0 a CAP 75 - a contribuição de poros com diâmetros médios de 8 µm foi de aproximadamente 0,2%. Acredita-se que estes poros possam corresponder aos espaços existentes entre aglomerados de microcápsulas formados. Karathanos e Saravacos14 verificaram a existência de poros de 6-8 µm em materiais amiláceos estudados, que foram atribuídos aos espaços existentes entre as partículas de amido.

A porosidade de um pó consiste de poros presentes nas partículas e de espaços entre as partículas.8

Poros com diâmetros de aproximadamente 1-3 µm foram predominantes em todas as microcápsulas produzidas. Sugere-se que estes poros possam corresponder a espaços vazios existentes entre as microcápsulas.

Segundo Karathanos e Saravacos,14 poros pequenos encontrados em materiais amiláceos correspondem aos poros presentes na estrutura do grânulo. Desta maneira, sugere-se que os poros pequenos encontrados correspondam a poros presentes na estrutura das microcápsulas. Contudo, o número de poros pequenos nas microcápsulas produzidas foi bastante reduzido (1-2%). Estes resultados concordam com os resultados de microestrutura verificados por microscopia eletrônica de varredura (Figura 1).

A partir destes resultados, conclui-se que todas as microcápsulas produzidas (CAP 0 a CAP 100) apresentaram predominantemente macroporos (> 50 nm) interparticulares.

A área superficial específica cumulativa encontrada para as microcápsulas CAP 0, CAP 25, CAP 50, CAP 75 e CAP 100 foi de 1,55; 2,05; 2,82; 1,78 e 1,38 m2 g-1, respectivamente. Estes valores são considerados relativamente baixos quando comparados à área superficial específica de alguns materiais inorgânicos, como catalisadores. Contudo, são valores da mesma ordem de magnitude que os encontrados para outros alimentos medidos por porosimetria de mercúrio.1,14,25

Os baixos valores de área superficial encontrados para as microcápsulas produzidas podem ser atribuídos à presença de poucos poros pequenos e predominância de macroporos, uma vez que, segundo Karathanos e Saravacos,14 pequenos poros são responsáveis por altos valores de área superficial específica. A contribuição de poros grandes (macroporos) não é muito significante na determinação da área superficial específica.

Informações sobre a porosidade e a distribuição do tamanho do poro podem ser de extrema importância para predizer as propriedades de transporte e cinética de reidratação de vários alimentos.26

A estrutura do poro além de ser avaliada por porosimetria de mercúrio também pode ser analisada por adsorção de nitrogênio, que permite a determinação de microporos (< 3 nm) não inclusos na faixa de determinação da porosimetria de mercúrio (3 nm a 14 µm). Entretanto, os resultados dos dois métodos podem ser comparados.27

A Tabela 3 apresenta os valores de área superficial, volume de poros e diâmetro médio dos poros das microcápsulas produzidas (CAP 0 a CAP 100), obtidos das isotermas de adsorção de nitrogênio.

Analisando a área superficial das microcápsulas, verifica-se que os valores obtidos por adsorção de nitrogênio (SBET) foram semelhantes aos obtidos por porosimetria de mercúrio, exceto para a microcápsula CAP 0, cuja área superficial (SBET) foi 44% maior que a obtida por porosimetria de mercúrio.

Segundo Dees e Polderman,28 existe uma correlação ruim entre as áreas superficiais obtidas por estes métodos, quando as amostras apresentam uma pequena área superficial. Westermarck8 verificou maiores valores de área superficial por porosimetria de mercúrio do que por adsorção de nitrogênio.

Quando a área superficial medida por adsorção de nitrogênio é maior que a medida por porosimetria, indica a existência de poros menores do que aqueles acessados pelo mercúrio na pressão máxima. Outro fator, que pode levar à obtenção de área superficial maior por adsorção de nitrogênio do que por porosimetria de mercúrio, é a presença de desigualdades na superfície da partícula. Essas desigualdades serão medidas por adsorção de nitrogênio e não irão alterar a área superficial obtida por porosimetria, visto que esta é calculada a partir do volume do poro.10

Desta maneira, sugere-se que a presença de depressões na superfície das microcápsulas (Figura 1) tenha contribuído para os valores de área superficial obtidos por adsorção de nitrogênio, principalmente para a microcápsula CAP 0 que apresentou maior prevalência de depressões superficiais.

Os maiores valores de área superficial específica (Tabela 3) foram verificados para as microcápsulas CAP 50 e CAP 0, respectivamente. As microcápsulas CAP 25 e CAP 75 apresentaram áreas superficiais iguais, que foram maiores que a área superficial da microcápsula CAP 100, a microcápsula com menor área superficial.

Juszczak, Fortuna e Wodnicka16 relataram que valores altos de área superficial específica indicam a presença de poros pequenos, e que a área superficial específica é inversamente proporcional ao diâmetro médio do poro.

No presente estudo sugere-se que a área superficial específica foi afetada principalmente pelo tamanho das microcápsulas (Tabela 2), onde menores áreas superficiais foram obtidas para microcápsulas maiores e vice-versa.

O volume de poros (Tabela 3) obtido por adsorção de nitrogênio foi marcadamente menor que o obtido por porosimetria de mercúrio. Comportamento semelhante foi verificado por Westermarck3 para manitol e celulose microcristalina.

Este resultado pode ser explicado pela determinação de poros grandes por porosimetria de mercúrio, que estão excluídos da faixa de detecção por adsorção de nitrogênio, afetando principalmente a medida de volume.

O volume do poro medido por porosimetria de mercúrio é maior que o determinado por adsorção de nitrogênio, quando a amostra possui poros maiores que 0,3 µm, pois a porosimetria de mercúrio determina também os espaços existentes entre as partículas.29

Os resultados encontrados para volume de poros endossam a teoria anteriormente proposta de que os macroporos (8-0,5 µm) verificados por porosimetria de mercúrio correspondem a espaços existentes entre as partículas e entre aglomerados de partículas formados.

Quando os valores de volume dos poros obtidos pelos dois métodos são discordantes, o valor da área superficial precisa ser similar.29

Os valores médios dos diâmetros de poros determinados por adsorção de nitrogênio estão apresentados na Tabela 3.

Analisando os valores encontrados constata-se que todas as microcápsulas produzidas apresentaram poros com diâmetros entre 41-56 nm, sendo o maior valor verificado para a CAP 50 e o menor para a CAP 100.

As isotermas de adsorção de nitrogênio foram similares para todas as microcápsulas. A forma da curva obtida é característica de isoterma do tipo II.7 Este tipo de isoterma indica a ocorrência de processo de adsorção multicamadas, sugerindo a existência de superfícies não porosas ou macroporosas, estando em concordância com o resultado verificado.

Amidos de milho, aveia, trigo, arroz, triticale e cevada, estudados por Juszczack, Fortuna e Wodnicka,16 também apresentaram isoterma tipo II.

CONCLUSÕES

Através da utilização das técnicas de porosimetria de mercúrio e de adsorção de nitrogênio, verificou-se que as microcápsulas produzidas não foram microporosas, apresentando predominantemente macroporos interparticulares. Devido à presença destes macroporos, todas as microcápsulas produzidas apresentaram baixos valores de área superficial (1,38 a 2,82 m2 g-1). Os valores da área superficial das microcápsulas obtidos por adsorção de nitrogênio (SBET) foram semelhantes aos obtidos por porosimetria de mercúrio, exceto para a microcápsula CAP 0, provavelmente devido a esta apresentar maior prevalência de depressões superficiais.

As isotermas de adsorção de nitrogênio foram similares para todas as microcápsulas, sendo as mesmas do tipo II, que indica a ocorrência de processo de adsorção multicamadas, sugerindo a existência de superfícies não porosas ou macroporosas.

As microcápsulas produzidas foram esféricas, do tipo matriz e apresentaram depressões superficiais, que tenderam a diminuir com o aumento da proporção de amido OSA na parede das microcápsulas. A presença de maiores quantidades de amido OSA nas formulações, resultou na formação de microcápsulas com maiores tamanhos médios.

AGRADECIMENTOS

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa concedida e à National Starch and Chemical Company pelo fornecimento da dextrina e do amido octenilsuccinato.

Recebido em 2/3/11; aceito em 27/4/11; publicado na web em 14/6/11

  • 1. Karathanos, V. T.; Kanellopoulos, N. K.; Belessiotis, V. G.; J. Food Eng 1996,29,167.
  • 2. Beirão-da-Costa, S.; Duarte, C.; Moldão-Martins, M.; Beirão-da-Costa, M. L.; J. Food Eng 2011,104,36.
  • 3. Gharsallaoui, A.; Roudaut, G.; Chambin, O.; Voilley, A.; Saurel, R.; Food Res. Int. 2007,40,1107.
  • 4. Baydoun, L.; Furrer, P.; Gurny, R.; Müller-Goymann, C. C.; Eur. J. Pharm. Biopharm. 2004,58,169.
  • 5. Tesh, S.; Gerhards, C. H.; Schubert, H.; J. Food Eng. 2002,54,167.
  • 6. Prochaska, K.; Patrycja Kedziora, P.; Thanh, J. L.; Lewandowicz, G.; Colloids Surf., B 2007,60,187.
  • 7. Kaneko, K.; J. Membr. Sci 1994,96,59.
  • 8. Westermarck, S.; Academic dissertation, University of Helsinki, Finland, 2000.
  • 9. Schoonman, A.; Mayor, G.; Dillmann, M. L.; Bisperink, C.; Ubbink, J.; Food Res. Int. 2001,34,913.
  • 10. Lowell, S.; Shields, J. E.; Powder surface area and porosity, 2nd ed., Chapman & Hall: New York, 1984.
  • 11. Moreau, D. L.; Rosenberg, M.; J. Food Sci 1998,63,819.
  • 12. Schenker, S.; Handschin, S.; Frey, B.; Escher, F.; J. Food Sci 2000,65,452.
  • 13. Loisel, C.; Lecq, G.; Ponchel, G.; Keller, G.; Ollivon, M.; J. Food Sci 1997,62,781.
  • 14. Karathanos, V. T.; Saravacos, G. D.; J. Food Eng. 1993,18,259.
  • 15. Chesson, A.; Gardner, P. T.; Wood, T. J.; J. Sci. Food Agric. 1997,75,289.
  • 16. Juszczak, L.; Fortuna, T.; Wodnicka, K.; J. Food Eng. 2002,54,103.
  • 17. Rosenberg, M.; Kopelman, I. J.; Talmon, Y.; J. Agric. Food Chem. 1990,38,1288.
  • 18. Maa, Y. F. M.; Nguyen, P. A. T.; Hsu, S. W.; J. Pharm. Sci. 1998,87,152.
  • 19. Rosenberg, M.; Kopelman, I. J.; Talmon, Y.; J. Food Sci. 1985,50,139.
  • 20. Rosenberg, M.; Young, S. L.; Food Struct. 1993,12,31.
  • 21. Sheu, T. Y.; Rosenberg, M.; J. Food Sci. 1998,63,491.
  • 22. Walton, D. E.; Mumford, C. J.; Trans IchemE. 1999,77,21.
  • 23. Schulbert, H.; J. Food Eng. 1987,6,1.
  • 24. Rahman, M. S.; Al-Amri, O. S.; Al-Bulushi, I. M.; J. Food Eng 2002,53,301.
  • 25. Farkas, B. E.; Sing, R. P.; J. Food Sci. 1992,56,611.
  • 26. Mcdonald, K.; Sun, D. W.; J. Food Process Eng. 2001,24,381.
  • 27. Allen, T.; Particle size measurement, 5th ed., Chapman & Hall: New York, 1997.
  • 28. Dees, P. J.; Polderman, J.; Powder Technol. 1981,29,187.
  • 29. Webb, P. A.; Orr, C.; Analytical methods in fine particle technology, Micrometrics Instrument Corportation: Norcross, 1997.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Nov 2011
    • Data do Fascículo
      Set 2011

    Histórico

    • Recebido
      02 Mar 2011
    • Aceito
      27 Abr 2011
    Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br