Acessibilidade / Reportar erro

Determinação de deoxinivalenol e zearalenona em arroz natural e parboilizado e suas frações utilizando quEChERS e HPLC/UV-FL

Determination of deoxynivalenol and zearalenone in natural and parboiled rice and their fractions using quEChERS and HPLC/UV-FL

Resumo

The QuEChERS extraction method followed by quantification using HPLC/UV-FL was evaluated for deoxynivalenol (DON) and zearalenone (ZEA) determination in natural and parboiled rice and their fractions (bran and husk). The comparison between QuEChERS and partition with acetonitrile extraction showed that the first one was better. It presented higher recovery (91% for DON, 105% for ZEA) wih precision ranging from 1.5 to 18.6%. The limits of quantification were 22.2 µg kg-1 for DON and 4.3 µg kg-1 for ZEA. DON and ZEA showed higher levels in endosperm of parboiled rice (8 e 111.7 µg kg-1, respectively) when compared to natural rice.

QuEChERS; deoxynivalenol; zearalenone


QuEChERS; deoxynivalenol; zearalenone

NOTA TÉCNICA

Determinação de deoxinivalenol e zearalenona em arroz natural e parboilizado e suas frações utilizando quEChERS e HPLC/UV-FL

Determination of deoxynivalenol and zearalenone in natural and parboiled rice and their fractions using quEChERS and HPLC/UV-FL

Renata Heidtmann-Bemvenuti* * e-mail: reheidtmann@yahoo.com.br ,I; Helen Cristina dos Santos HackbartI; Michele Moraes de SouzaI; Eliana Badiale-FurlongI; Giniani Carla DorsII; Carlos Alberto FagundesIII

IEscola de Química e Alimentos, Universidade Federal do Rio Grande, 96201-900 Rio Grande – RS, Brasil

IIInstituto Federal Catarinense Campus Concórdia, 89700-000 Concórdia – SC, Brasil

IIIInstituto Rio-Grandense do Arroz, 94930-030 Cachoeirinha – RS, Brasil

ABSTRACT

The QuEChERS extraction method followed by quantification using HPLC/UV-FL was evaluated for deoxynivalenol (DON) and zearalenone (ZEA) determination in natural and parboiled rice and their fractions (bran and husk). The comparison between QuEChERS and partition with acetonitrile extraction showed that the first one was better. It presented higher recovery (91% for DON, 105% for ZEA) wih precision ranging from 1.5 to 18.6%. The limits of quantification were 22.2 µg kg-1 for DON and 4.3 µg kg-1 for ZEA. DON and ZEA showed higher levels in endosperm of parboiled rice (8 e 111.7 µg kg-1, respectively) when compared to natural rice.

Keywords: QuEChERS; deoxynivalenol; zearalenone.

INTRODUÇÃO

As micotoxinas são metabólitos secundários produzidos por fungos toxigênicos, como algumas espécies de Fusarium, Aspergillus e Penicillium. O crescimento fúngico e produção de micotoxinas dependem de uma complexa interação de diversos fatores, como atividade de água, temperatura, oxigênio e substrato. Entre as micotoxinas, as de Fusarium, deoxinivalenol (DON) e zearalenona (ZEA) (Figura 1) são de especial importância, pois geralmente são formadas no campo, antes da colheita e sua ocorrência é difícil de ser evitada devido ao grande impacto das condições abióticas.1,2


A frequência de contaminação de cereais e seus derivados por DON e ZEA é elevada,3,4 o que tem levado à adoção de medidas para evitar danos imunológicos e neurológicos à saúde de humanos e animais de criação, através do monitoramento e controle destes compostos em diversos níveis da cadeia produtiva.5 Dentre as medidas destaca-se o estabelecimento de métodos analíticos envolvendo técnicas quantitativas para detecção de multitoxinas, com parâmetros de desempenho que garantam a confiabilidade dos resultados.6-8

O estabelecimento de procedimentos analíticos eficientes e que gerem o mínimo de resíduos para descarte vem sendo um desafio constante para analisar contaminantes.9 Atendendo a esta demanda, em trabalho prévio10 foi proposto um procedimento para extração de agrotóxicos denominado QuEChERS (Quick, Easy, Cheap, Effective, Ruged and Safe), que se caracteriza pela extração rápida, confiável, fácil, econômica, robusta e segura de analitos a partir de matrizes complexas. Este procedimento vem sendo amplamente utilizado para extração de agrotóxicos11,12 e foi adaptado para as micotoxinas ocratoxina A e citrinina em arroz e derivados,13 para aflatoxinas, ocratoxina A, citrinina, eniatina e beauvericina em ovos14 e para aflatoxinas em massa para macarrão.15 Assim, o procedimento é promissor para extração de toxinas distintas em diversas matrizes.

O arroz é um cereal de consumo frequente e produzido em muitas regiões utilizando sistema irrigado, o que propicia elevada atividade de água à planta e favorece a contaminação fúngica no campo, no entanto são escassas as informações sobre ocorrência de toxinas de Fusarium neste grão e suas frações de beneficiamento.16

A possibilidade de aplicar o método de extração QuEChERS para determinar simultaneamente DON e ZEA em arroz e seus derivados poderá contribuir com a segurança alimentar e a conservação do ambiente, visto que o método produz uma quantidade mínima de resíduos para descarte em relação aos procedimentos clássicos de extração.5

A determinação de biomassa fúngica também é uma informação importante, pois pode avaliar o risco de ocorrência de micotoxinas e de degradação da matéria-prima ou produto. No caso de contaminação de uma matriz por fungos filamentosos não é fácil fazer a determinação direta da biomassa, devido à separação ineficiente dela do substrato. A biomassa pode ser medida indiretamente pela determinação de componentes celulares como glicosamina (presente na quitina), ergosterol (presente na membrana celular), proteínas ou ácidos nucleicos e, até mesmo, atividade de enzimas exocelulares.17 A medida da glicosamina é considerada um bom indicador para estimar o desenvolvimento fúngico, uma vez que está presente nos fungos que contaminam materiais vegetais que comumente são utilizados como substratos em fermentação em estado sólido, onde o conhecimento do desenvolvimento da micota é fundamental para estabelecer rotina de monitoramento e controle nos diferentes pontos da cadeia produtiva.18-21

Os objetivos deste trabalho foram validar método para determinação de DON e ZEA em arroz (natural e parboilizado) e em seus derivados (endosperma, casca e farelo), utilizando a técnica de extração QuEChERS e análise por cromatografia líquida de alta eficiência com os detectores espectrofotométrico e por fluorescência e relacionar a produção de micotoxinas com o desenvolvimento fúngico, indicado pelos teores de glicosamina.

PARTE EXPERIMENTAL

Padrões analíticos e reagentes

Os padrões analíticos das micotoxinas DON (pureza > 98%) e ZEA (pureza > 98%) foram obtidos da Sigma-Aldrich (São Paulo, Brasil).

As fases móveis utilizadas para determinação cromatográfica (acetonitrila grau cromatográfico J. T. Baker Mallinckrodt, Phillisburg, NJ, USA e água ultrapurificada em sistema Direct-Q UV3® de resistividade 18,2 MΩ cm, Millipore, Bedford, USA) foram previamente desgaseificadas em banho ultrassônico (Ultrassonic Cleaner Unique, 1600 W) e a acetonitrila filtrada em filtro Millipore (Supelco, 58067), com poros de 0,45 µm de diâmetro.

Preparo das soluções

As soluções analíticas estoque de cada micotoxina continham 50 mg L-1 e foram preparadas pela dissolução do padrão sólido em benzeno:acetonitrila (95:5), considerando-se o grau de pureza, e estocadas a 4 ºC no caso do DON e -18 ºC da ZEA. A estimativa da concentração das soluções trabalho foi realizada em espectrofotômetro UV-Vis (modelo Cary 100-Varian) em comprimento de onda de máxima absorção de 260 e 317 nm e absortividade molar de 1410 e 6060 L mol-1 cm-1 para DON em acetato de etila e ZEA em benzeno, respectivamente.22

Instrumentação e condições cromatográficas de análise

Foi utilizado um sistema de cromatografia líquida de alta eficiência Shimadzu (Quioto, Japão) constituído por um sistema de bombas (modelo LC-AT), desgaseificador da fase móvel (modelo DGU), controlador (modelo CBM-20A), injetor manual com alça de amostragem de 20 µL (modelo 7725i) e com dois sistemas de detecção espectrofotométrico (modelo SPD-20A) e por fluorescência (modelo FL-10AXL). O controle do equipamento e aquisição dos dados foi feito pelo software LC Solution. As análises foram realizadas utilizando-se uma coluna cromatográfica C-18 Bondesil (250 x 4,6 mm, com partículas de 5 µm), mantida a temperatura ambiente. A fase utilizada foi constituída por acetonitrila:água (7:93, v/v), com eluição no modo isocrático e vazão de 0,6 mL min-1.

Preparação das amostras

As amostras de arroz (cultivar BR-IRGA 417) foram semeadas no sistema de cultivo mínimo em campos experimentais do Instituto Rio-Grandense do Arroz (IRGA), com e sem aplicação dos fungicidas trifloxistrobina, propiconazol, azoxistrobina e ciproconazol. Após a colheita, as amostras foram secas até 13% de umidade e beneficiadas na forma de arroz natural e parboilizado em engenho de provas. A parboilização foi realizada empregando uma relação massa de grãos:água de 1:1,5 a 65 ± 2 ºC durante 5 h, autoclavados a 116 ± 1 ºC com pressão de 0,6 ± 0,05 kPa por 10 min, secos a 40 ± 1 ºC até atingir 13% de umidade. Durante o beneficiamento foram separadas as frações casca, farelo e endosperma amiláceo de 6 campos experimentais (3 campos tratados com fungicidas durante o cultivo e 3 sem tratamento), que foram encaminhadas ao Laboratório de Micotoxinas e Ciência de Alimentos da Universidade Federal do Rio Grande (FURG), onde foram moídas em moinho de facas. Foram realizadas as determinações de micotoxinas e glicosamina na fração retida na peneira de 24 mesh (710 mm).

Extração das micotoxinas

A extração das micotoxinas DON e ZEA foi realizada de acordo com o procedimento de QuEChERS13 e, também, empregando o método de partição líquido-líquido com acetonitrila.5

Extração das micotoxinas com o método QuEChERS

Foram pesados 10 g de amostra em um erlenmeyer de 250 mL e adicionados 20 mL de água destilada e 20 mL de acetonitrila acidificada com 0,2 mL de ácido acético glacial. A mistura foi levada ao agitador horizontal (5 min/800 g) e após foram adicionados os sais (1,5 g de sulfato de magnésio e 0,85 g de acetato de sódio) e agitada por 5 min. O extrato foi centrifugado (10 min/1400 g) e foram adicionados sais (0,3 g de sulfato de magnésio e 0,2 g de celite) em 6 mL do sobrenadante, o qual foi agitado manualmente por 1 min. Foram coletados 3 mL do sobrenadante, que foi seco sob fluxo de nitrogênio. Para a quantificação, o resíduo seco foi ressuspenso em 1 mL da fase móvel e centrifugado a 1200 g (Eppendorf Centrifuge 5410, Hamburg, Germany).

Extração das micotoxinas com o método de partição líquido-líquido

Em erlenmeyer de 250 mL foram pesados 10 g de amostra e adicionados 100 mL de acetonitrila-água (3:1), que foram misturados em um agitador horizontal por 30 min. O extrato foi filtrado com papel filtro (Whatman Nº 1), transferido para um funil de separação e desengordurado duas vezes com 10 mL de hexano. Na fase acetonitrila-água foi adicionado 1 g de cloreto de sódio. A fase orgânica foi evaporada a 45 ºC sob pressão reduzida. O resíduo foi dissolvido com 3 mL de metanol e 27 mL de clorofórmio e centrifugado (10 min/1400 g). Foram coletados 10 mL do sobrenadante, para secagem sob fluxo de nitrogênio. Para a quantificação, o resíduo seco foi ressuspenso em 1 mL da fase móvel e centrifugado a 1200 g (Eppendorf Centrifuge 5410, Hamburg, Germany).

Validação do método

Os parâmetros de desempenho avaliados seguiram o recomendado pelos guias da International Conference on Harmonisaton (ICH), Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO),6,7,23 sendo eles:

Seletividade

A seletividade foi avaliada comparando-se o sinal gerado pela injeção da matriz isenta das micotoxinas e desta adicionada de padrão.8,23

Limite de detecção (LOD) e de quantificação (LOQ)

Para a determinação do LODi e do LOQi do instrumento foram realizadas injeções de soluções padrão em ordem decrescente de concentração (3; 2; 1; 0,1; 0,01 µg mL-1 para DON e 1; 2; 0,2; 0,04 e 0,002 µg mL-1 para ZEA) até que o sinal do pico atingisse uma altura três vezes superior ao sinal/ruído da linha de base, no tempo de retenção do composto de interesse. Para a determinação do LOQi, adotou-se 10 vezes o sinal/ruído da linha de base.7

Curva analítica e linearidade

A linearidade do instrumento e dos métodos foi avaliada pela construção de curvas analíticas através de padronização externa com soluções analíticas nas concentrações: 1; 3; 5; 8 e 10 µg mL-1 para DON e 0,2; 0,6; 0,8; 1 e 2 µg mL-1 para ZEA, preparadas a partir de soluções trabalho de 10 µg mL-1 de DON e 2 µg mL-1 de ZEA. Cada solução foi injetada três vezes e os dados de regressão linear foram obtidos com auxílio do software do equipamento.

Precisão

A precisão instrumental foi avaliada a partir de 10 injeções sucessivas de uma concentração do estudo da linearidade do instrumento,8 sendo elas: DON - 3 µg mL-1 e ZEA - 0,6 µg mL-1.

A precisão dos métodos de extração foi avaliada em termos de repetibilidade (CVr) e precisão intermediária (CVpi) após fortificação do arroz com casca moído (isento de micotoxinas) em três níveis, cada um em triplicata:8 4,5; 7,5 e 10,5 µg kg-1 para DON e 0,9; 1,5 e 2,1 µg kg-1 para ZEA. A repetibilidade (precisão intraensaio) foi avaliada de acordo com recomendações da ICH24 e ANVISA,6 realizando-se 9 injeções, sendo três níveis de concentração do padrão em triplicata. Um estudo de precisão intermediária foi adotado para melhor representar a rotina analítica,24 sendo realizada por dois analistas seguindo as mesmas recomendações adotadas para a repetibilidade.6,23 Os resultados foram expressos através da estimativa do coeficiente de variação (CV%).

Exatidão (recuperação)

A exatidão foi avaliada pela análise das mesmas amostras do estudo da precisão.6,8,23

Determinação do teor da glicosamina

Nas mesmas amostras em que foram determinadas as micotoxinas, foi realizada a determinação de glicosamina como indicativo do desenvolvimento fúngico.25

Foram adicionados 5 mL de HCl 6 M a 1 g de amostra moída e após 2 h de fervura, a amostra foi filtrada. Do filtrado, foi transferido 1 mL para balão de 25 mL, adicionando-se solução alcoólica de fenolftaleína 0,5% e neutralizando-se com solução de NaOH 3 M. Foi realizada titulação reversa com solução de KHSO4 1%, e o volume do balão aferido com água destilada. Para quantificação da glicosamina foram utilizados 3 mL do extrato e 1 mL de solução de acetil acetona em Na2CO3 0,25 M (1 mL de acetil acetona em 50 mL de solução Na2CO3 0,25 M) que foram colocados em um tubo de ensaio em banho-maria fervente por 20 min. Foram adicionados 6 mL de etanol e 1 mL de reagente Erlich (2,67 g de p-dimetilaminobenzaldeído em um volume de 30 mL de etanol:ácido clorídrico 1:1, completando-se o volume em balão de 50 mL com água destilada). Os tubos foram incubados a 65 ºC por 10 min e a absorbância lida em espectrofotômetro a 530 nm.25

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Condições cromatográficas de análise

Para escolha da composição da fase móvel foram testadas diferentes proporções de solventes, todos no modo isocrático de eluição: acetonitrila:água:metanol nas proporções 80:10:10 e 5:70:25 e acetonitrila:água 7:93. As vazões testadas foram 0,4; 0,5 e 0,6 mL min-1. Os tempos da corrida cromatográfica foram de 10, 8 e 7 min. O espectro de máxima absorção de DON na região ultravioleta foi obtido pela injeção de soluções padrão em três concentrações crescentes no comprimento de onda de 218 nm.2,26,27 Para ZEA foi utilizado detector de fluorescência empregando os comprimentos de onda de excitação e emissão de 270 e 455 nm, respectivamente.28

O tempo de retenção para DON foi de 2,5 min, para ZEA 5,5 min, sendo o tempo total de corrida de 7 min, conforme Figura 2.


As colunas de fase ligada, como é o caso da C-18 são adequadas para determinação de compostos pouco polares,29 como é o caso das micotoxinas deste estudo,2,27 o que ficou bem caracterizado pelo baixo tempo total de corrida (7 min), que permite fazer 8 corridas por hora, gerando pouco gasto de fase móvel.

Validação do método

A comparação da matriz isenta das micotoxinas e da matriz fortificada mostrou que nenhum interferente eluiu no tempo de retenção delas, demonstrando que o método de extração de micotoxinas utilizado é seletivo.

Na Tabela 1 estão apresentados os limites de detecção e quantificação do instrumento HPLV/UV-FL e dos métodos de extração de QuEChERS13 e partição líquido-líquido5 para as micotoxinas DON e ZEA.

Os limites proporcionados pelos detectores utilizados foram adequados para as determinações destas micotoxinas, pois permitiram observar os níveis estabelecidos pelos órgãos de legislação e fiscalização de diferentes países, inclusive da legislação brasileira, sem necessitar de reações de derivação dos analitos para sua quantificação.

A legislação para micotoxinas varia de acordo com o país, sendo que o nível aceitável para DON varia de 200 a 2.000 µg kg-1 para alimentos destinados ao consumo humano. No Brasil, os níveis são regulados pela Resolução RDC Nº 7 de 2011, que tem aplicação imediata para aflatoxinas M1, B1, B2, G1 e G2, ocratoxina A, deoxinivalenol, fumonisina (B1+ B2), zearalenona e patulina. As regulações para outros produtos alimentícios e em níveis inferiores terão aplicação a partir de 2012, 2014 e, finalmente, 2016.30 Para DON, a legislação brasileira prevê um limite máximo de 750 µg kg-1 e para ZEA de 200 µg kg-1 em arroz beneficiado e seus derivados, sendo que para DON já está em vigor e para ZEA entrará a partir de 2012. Na Europa, foi estabelecido 1.250 µg kg-1 como limite máximo permitido para cereais destinados ao consumo humano para DON e 100 µg kg-1 para ZEA.31

Os dados da determinação de linearidade, estabelecidos através de calibração externa em solvente, encontram-se na Tabela 2.

O modelo de regressão linear foi adequado para a determinação das micotoxinas, pois os coeficientes de correlação (r) foram maiores que 0,90, conforme recomendação do INMETRO.7 Os valores de precisão instrumental (CV%) foram 9,7% para DON e 6,4% para ZEA. A precisão dos métodos de extração, avaliada através dos estudos de repetibilidade (CVr%) e precisão intermediária (CVpi%), mostrou coeficientes de variação na faixa de 1,5-9,2 e 8,5-18,6%, respectivamente, para QuEChERS13 e de 3,2-17,6 e 6,6-20% empregando a partição para a extração.5 Os valores de CVr e CVpi estão especificados na Tabela 3.

Cabe salientar que tanto a precisão quanto a exatidão dos métodos analíticos são dependentes da matriz, da concentração do analito e da técnica analítica, sendo que a precisão aceitável varia entre 2 e 20%.8,32 Diante disso, os resultados encontrados mostraram que a extração e detecção dos analítos foram adequadas para se avaliar a ocorrência dessas micotoxinas em arroz, porém a extração por partição5 foi menos precisa que pelo procedimento QuEChERS.13

A eficiência na recuperação de DON e ZEA utilizando extração por partição5 também resultou em valores menores do que quando foram extraídas pelo método de QuEChERS13 (Figura 3).


A extração de micotoxinas por partição,5 que vem sendo rotineiramente aplicada,16,33,34 utiliza cerca de 6 vezes mais solvente que a de QuEChERS.13 Com esse último, é possível analisar até 8 amostras em 30 min contra 8 amostras em 6 h no sistema convencional, reduzindo o tempo de exposição do analista aos solventes, além de gerar menor volume de resíduos para descarte. Diante disso, e levando-se em consideração a eficiência de extração das micotoxinas, foi utilizado o procedimento QuEChERS13 para avaliar a ocorrência de DON e ZEA de amostras de arroz e derivados.

Aplicação do método

Foi aplicado o método QuEChERS13 para extração de DON e ZEA em amostras de endosperma, casca e farelo de arroz. A contaminação com micotoxinas foi menor no endosperma amiláceo do que nas demais frações do grão (Tabela 4), sendo que ZEA se apresentou em níveis mais elevados que DON.

As amostras de endosperma do arroz submetido à parboilização apresentaram níveis de contaminação mais elevados (8 µg kg-1 ± 17,1 com DON e 111,7 µg kg -1 ± 12,5 com ZEA) do que o arroz natural. A casca e farelo do arroz parboilizado apresentaram menor contaminação com micotoxinas do que o arroz natural, sugerindo que a parboilização favorece a migração de compostos para o interior do grão, resultando em menores teores nessas frações externas.

Alguns autores observaram,35 ao avaliar a migração de micotoxinas para o endosperma amiláceo durante o processo de parboilização, que havia relação entre as condições de processo (tempo de encharcamento e autoclavagem), após contaminação artificial do arroz com casca com micotoxinas. No entanto, a migração de cada tipo de micotoxina respondia de forma diferente a esses parâmetros. O mesmo pode ter ocorrido com as amostras deste trabalho, nas quais a frequência de contaminação observada foi sempre maior para ZEA que para DON.

Relação entre o teor de glicosamina e a concentração de micotoxinas em arroz e seus derivados

A aplicação de alguns fungicidas dificulta a multiplicação microbiana, porém, seleciona indivíduos que sob estresse podem manifestar seu potencial toxigênico;36 assim, as amostras das frações de arroz analisadas foram provenientes de campos cultivados com e sem aplicação de fungicidas.

Visando verificar se a produção de micotoxinas está relacionada com o desenvolvimento fúngico, foi realizada determinação de glicosamina nas mesmas amostras em que foram determinadas as micotoxinas.

Os maiores níveis de glicosamina foram encontrados no farelo (4,4 mg g-1 ± 0,8) e na casca (3,6 mg g-1 ± 0,8), seguido de menor teor no endosperma (1,8 mg g-1 ± 0,9) (Figura 2), sugerindo que a contaminação se dá nesta ordem, pois os micro-organismos e outras pragas geralmente se concentram nas frações mais externas do grão.37,38 A casca, primeira proteção do grão, pode ter sido rompida por celulases e lignases produzidas por fungos e, desta forma, alcançado o farelo, de onde os fungos retiraram nutrientes para aumento da biomassa nas frações mais internas do grão. Assim, a maior contaminação no farelo pode ser atribuída a danos na casca e à umidade durante o cultivo, uma vez que o arroz analisado foi cultivado na forma irrigada e no período de formação do grão a água de irrigação ainda não havia sido drenada (Figura 4).


As contaminações das frações do arroz com micotoxinas (DON e ZEA) e com fungos (indicada pela determinação de glicosamina) foram maiores nas frações externas do arroz (casca e farelo) e aumentadas no endosperma parboilizado.

As relações entre os teores de glicosamina e a ocorrência de micotoxinas nos derivados do arroz estão apresentada na Tabela 5.

Os resultados mostraram que a fração em que os teores de glicosamina foram mais elevados não apresentava os maiores níveis de micotoxinas.

Assim, a casca do arroz parece ser a fração mais propícia à produção de DON, e o endosperma é mais propício à de ZEA. No farelo, onde há maior disponibilidade de nutrientes para o fungo, foi observada uma maior relação glicosamina/micotoxina, sugerindo que seja a fração em que há menor produção de micotoxinas em relação ao conteúdo de glicosamina.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos permitem concluir que o método de extração (QuEChERS modificado) e quantificação (HPLC/UV-FL) empregado para determinação das micotoxinas DON e ZEA em arroz natural e parboilizado e suas frações é eficiente, rápido, preciso e exato. QuEChERS proporciona maior precisão (1,5-18,6%) e eficiência na recuperação (91% para DON e 105% para ZEA) das micotoxinas com relação aos mesmos parâmetros avaliados para a extração por partição convencional. Além disso, o procedimento QuEChERS não necessita de etapa de purificação dos extratos e diminui consideravelmente a quantidade de solventes necessários. DON e ZEA foram detectados no endosperma de amostras parboilizadas em valores superiores ao do arroz natural. Não há uma relação linear e crescente entre a multiplicação fúngica, indicada pelos teores de glicosamina, e os níveis das micotoxinas estudadas.

AGRADECIMENTOS

À CAPES, ao CNPq, ao MAPA pelo auxílio financeiro ao projeto e ao IRGA (Instituto Rio-Grandense do Arroz) pelo fornecimento das amostras de arroz que permitiram o desenvolvimento do trabalho.

Recebido em 21/10/11

Aceito em 16/1/12

Publicado na web em 30/4/12

  • 1. Döll, S.; Dänicke, S.; Prev. Vet. Med. 2011, 102, 132.
  • 2. Martins, M. L.; Martins, H. M.; Food Chem. 2002, 79, 315.
  • 3. Ibáñez-Vea, M.; Martinez, R.; González-Peñas, E.; Lizarraga, E.; Cerain, A. L.; Food Control 2011, 22, 1949.
  • 4. Llorens, A.; Mateo, R.; Hinojo M. J.; Valle-Algarra, F. M.; Jiménez, M.; Int. J. Food Microbiol. 2004, 94, 43.
  • 5. Tanaka, T.; Yoneda, A.; Inoue, S.; Sugiura, Y.; Ueno, Y.; J. Chromatogr., A 2000, 882, 23.
  • 6. Brasil, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA); Guia para Validação de Métodos Analíticos e Bioanalíticos, RE nş 889, 29/5/2003.
  • 7. Brasil, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO); Orientações sobre Validação de Métodos de Ensaios Químicos, DOQ-CGCRE-008. Revisão: 01, 2003.
  • 8. Ribani, M.; Bottoli, C. B. G.; Collins, C. H.; Jardim, I. C. S. F.; Melo, L. F. C.; Quim. Nova 2004, 27, 771.
  • 9. Mistura, C. M.; Vaniel, A. P. H.; Linck, M. R.; Revista Ciatec 2010, 2, 54.
  • 10. Anastassiades, M.; Lehotay, S.; Stajnbaher, D.; Schenck, F. J.; AOAC Int. 2003, 86, 412.
  • 11. Prestes, O. D.; Friggi, C. A.; Adaime, M. B.; Zanella, R.; Quim. Nova 2009, 32, 1620.
  • 12. Chiaradia, M. C.; Collins, C. H.; Jardim, I. C. S. F.; Quim. Nova 2008, 31, 623.
  • 13. Hackbart, H. C. S.; Prietto, L.; Primel, E. G.; Garda-Buffon, J.; Badiale-Furlong, E.; J. Braz. Chem. Soc. 2011, 23, 103.
  • 14. Frenich, A. G.; Romero-González, R.; Gómes-Pérez, M. L.; Vidal, J. L. M.; J. Chromatogr., A 2011, 1218, 4349.
  • 15. Sirhan, A. Y.; Tan, G. H.; Wong, R. C. S.; Food Control 2011, 22, 1807.
  • 16. Dors, G. C.; Bierhals, V. S.; Badiale-Furlong, E.; Ciênc. Tecnol. Aliment. 2011, 31, 172.
  • 17. Lonsane, B. K.; Ghildyal, N. P.; Budiatman, S.; Ramakrishna, S. V.; Enzyme Microb. Technol. 1985, 7, 258.
  • 18. Mitchell, D. A.; Meien, O. F. V.; Krieger, N.; Dalsenter, F. D. H.; Biochem. Eng. J. 2004, 17, 15.
  • 19. Nagel, F. J. I.; Tramper, J.; Bakker, M. S. N.; Rinzema, A.; Biotechnol. Bioeng. 2001, 72, 219.
  • 20. Scotti, C. T.; Vergoignan, C.; Feron, G.; Durand, A.; Biochem. Eng. J. 2001, 7, 1.
  • 21. Roche, N.; Venague, A.; Desgranges, C.; Durand, A.; Biotechnol. Adv. 1993, 11, 677.
  • 22. AOAC - Association Official Analytical Chemists; Official methods of analysis of AOAC international, 17th ed., AOAC: Arlington, 2000.
  • 23. International Conference on Harmonisation (ICH); Validation of Analytical Procedures: Definitions and Terminology, Q2A (CPMP/ICH/381/95), 1995.
  • 24. Sabin, G. P.; Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Santa Maria, Brasil, 2007.
  • 25. Aidoo, K. E.; Hendry, R.; Wood, B. J. B.; Appl. Microbiol. Biotechnol. 1981, 12, 6.
  • 26. Cerveró, M. C.; Castilho, M. A.; Montes, R.; Hernández, E.; Revista Iberoam. Micol 2007, 24, 52.
  • 27. Janes, W.; Scholz, W.; Schuster, M.; Mycot. Res 2000,16, 54.
  • 28. Santos, L.; Marín, S.; Sanchis, V.; Ramos, A. J.; Food Chem. 2010, 122, 826.
  • 29. Soares, L. V.; Curso Básico de Instrumentação para Analistas de Alimentos e Fármacos 1Ş ed., Manole: Barueri, 2006.
  • 30
    Brasil, Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA); RE nº 7, 2/2/2011.
  • 31. Europa, Commission Regulation (EC) nş 856/2005, 6/6/2005, Official Journal of the European Union, of 07/06/2005.
  • 32. European Commission; Method Validation and Quality Control Procedures for Pesticide Residues Analysis in Food and Feed, SANCO/3131/07, 2007.
  • 33. Berthiller, F.; Sulyok, M.; Krska, R.; Schuhmacher, R.; Int. J. Food Microbiol. 2005, 119, 33.
  • 34. Amaral, K. A. S.; Junior, M. M.; Revista Analytica 2006, 24, 60.
  • 35. Coelho, S. P.; Badiale-Furlong, E.; Almeida, T. L.; Braz. J. Food Technol 1999, 2, 39.
  • 36. Hýsek, J.; Vánová, M.; Hajlová, J.; Broová, J.; Sychrová, E.; Radová-Sypecká, Z.; íp, V.; Sýkorová, S.; Chrpová, J.; Tvaruek, L.; Plant Protect. Sci 2005, 41, 58.
  • 37. Amato, G. W.; Elias, M. C.; Parboilização do arroz, 1Ş ed., Ricardo Lenz: Porto Alegre, 2005.
  • 38. Amato, G. W.; Carvalho, J. L. V.; Silveira, S. F.; Arroz Parboilizado: Tecnologia Limpa, Produto Nobre, 1Ş ed., Ricardo Lenz: Porto Alegre, 2002.
  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      21 Out 2011
    • Aceito
      16 Jan 2012
    Sociedade Brasileira de Química Secretaria Executiva, Av. Prof. Lineu Prestes, 748 - bloco 3 - Superior, 05508-000 São Paulo SP - Brazil, C.P. 26.037 - 05599-970, Tel.: +55 11 3032.2299, Fax: +55 11 3814.3602 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: quimicanova@sbq.org.br