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Novas N-benzoiltiraminas de Swinglea glutinosa (Rutaceae)

Novels N-benzoyltyramines of Swinglea glutinosa (Rutaceae)

Resumo

Phytochemical studies of the leaves and fruits have led to the identification of the known amides (E)-N-methyl-cinnamamide, N-benzoyltyramine, N-benzoyl-O-geranyltyramine, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl)-geranyltyramine, in addition to the new N-{2-[4-(butoxyl-3-one)phenyl]ethyl}benzamide, N-{2-[4-(2,3-dihydroxy-2-methyl-butoxylanal)phenyl]ethyl}benzamide, N-{2-[4-(2,3-dihydroxy-2-methyl-butoxyloic)phenyl]ethyl}benzamide, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl-6,7-epoxy)-geranyltyramine, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl-6,7-dihydroxy)-geranyltyramine and N-benzoyl-O-(6-acetoxyl-4,7-dihydroxy)-geranyltyramine. The isolated compounds clearly point to Swinglea phytochemical affinities with other Aurantioideae species.

Swinglea glutinosa; N-benzoyltyramine; chemosystematics


Swinglea glutinosa; N-benzoyltyramine; chemosystematics

ARTIGO

Novas N-benzoiltiraminas de Swinglea glutinosa (Rutaceae)# # Artigo em homenagem ao Prof. Otto R. Gottlieb (31/8/1920-19/6/2011)

Novels N-benzoyltyramines of Swinglea glutinosa (Rutaceae)

Cristovam do Nascimento Cerqueira; Djalma A. P. dos Santos; Karla da Silva Malaquias; Murilo Marinho de Castro Lima; Maria Fátima das Graças Fernandes da Silva* * e-mail: dmfs@ufscar.br ; João Batista Fernandes; Paulo Cezar Vieira

Departamento de Química, Universidade Federal de São Carlos, CP 676, 13560-970 São Carlos - SP, Brasil

ABSTRACT

Phytochemical studies of the leaves and fruits have led to the identification of the known amides (E)-N-methyl-cinnamamide, N-benzoyltyramine, N-benzoyl-O-geranyltyramine, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl)-geranyltyramine, in addition to the new N-{2-[4-(butoxyl-3-one)phenyl]ethyl}benzamide, N-{2-[4-(2,3-dihydroxy-2-methyl-butoxylanal)phenyl]ethyl}benzamide, N-{2-[4-(2,3-dihydroxy-2-methyl-butoxyloic)phenyl]ethyl}benzamide, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl-6,7-epoxy)-geranyltyramine, N-benzoyl-O-(4-acetoxyl-6,7-dihydroxy)-geranyltyramine and N-benzoyl-O-(6-acetoxyl-4,7-dihydroxy)-geranyltyramine. The isolated compounds clearly point to Swinglea phytochemical affinities with other Aurantioideae species.

Keywords:Swinglea glutinosa;N-benzoyltyramine; chemosystematics.

INTRODUÇÃO

Swinglea glutinosa Merr., gênero monotípico, é uma planta arbustiva originária da Ásia, muito utilizada como ornamental na forma de cercas vivas e como quebra ventos em plantações.1 Como toda planta pertencente à família Rutaceae, é caracterizada por alcaloides acridônicos, cumarinas e amidas.1-3 Segundo o sistema de classificação de Engler (1931) o gênero Swinglea encontra-se classificado na subfamília Aurantioideae, tribo Citreae, subtribo, Balsamocitrinae.4 Esta subfamília é considerada de caráter natural pelos vários sistemas de classificação, ou seja, sua constituição em tribos, subtribos e gêneros não tem sido questionada.5 Um levantamento da literatura mostrou que as folhas de S. glutinosa ainda não tinham sido estudadas, assim, visando contribuir para a homogeneidade sistemática da subfamília Aurantioideae, estas foram coletadas e estudos fitoquímicos foram realizados. Este trabalho relata o primeiro estudo químico das folhas de S. glutinosa, o qual levou à identificação de cinco amidas (1-5), sendo três novas (3-5). Os frutos de S. glutinosa já foram estudados por outros grupos fora do Brasil. Contudo, no trabalho atual a análise de algumas frações por RMN 1H mostrou a presença de amidas não isoladas anteriormente, assim, estas frações foram reestudadas e levaram ao isolamento de outras cinco amidas (6-10), sendo três novas (8-10) e uma citada como natural pela primeira vez (6).

PARTE EXPERIMENTAL

Procedimentos experimentais gerais

Os espectros de RMN 1H e 13C (uni e bidimensionais) foram obtidos em espectrômetro Bruker DRX 400 MHz, utilizando-se CDCl3 e CD3OD como solventes e TMS como padrão interno. As separações cromatográficas foram realizadas em colunas utilizando-se gel de sílica 60, 70-230, 230-400 mesh e Sephadex LH-20. Separações feitas por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) foram realizadas no aparelho SCL10A vp Shimadzu, com válvula de injeção Rheodyne 7725i, bomba LC 6AD Shimadzu e detector de ultravioleta modelo SPD 10AV vp Shimadzu em dois comprimentos de onda simultaneamente, 365 e 254 nm. O modo de separação foi normal, eluição isocrática utilizando coluna propil-diol (10 µm; 30,0 x 0,78 mm) e mistura de etanol e hexano como fase móvel. As análises por cromatografia gasosa foram obtidas no aparelho Shimadzu QP 5000. O espectrômetro de massas foi operado no modo SIM (monitoramento seletivo de íons) com impacto de eletrons (70 eV). A separação cromatográfica foi realizada através de coluna ATM-5 (30 m x 0,25 mm x 0,25 µm), utilizando-se hélio como gás de arraste. O injetor foi operado a 280 ºC, no modo split, razão 1:30. A programação do forno foi a seguinte: temperatura inicial de 200 ºC (4 min), seguido de aumento de 10 ºC/min até 280 ºC (10 min). As análises por espectrometria de massas foram realizadas no equipamento Applied Bio System MS (triplo quadrupolo) equipado com fonte ESI/APCI, modelo Agilent 1200, no modo positivo de ionização. As análises por espectrometria de massas de alta resolução foram realizadas no equipamento Bruker Daltonics, Billerica, modelo UltrOTOFQ-ESI-TOF no modo positivo de ionização.

Material vegetal

As folhas e frutos de S. glutinosa foram coletadas no Instituto Agronômico de Campinas, Fazenda Santa Elisa, Campinas, SP, Brasil. A planta foi identificada pela Prof. Dra. M. I. Salgado e a exsicata da espécie encontra-se depositada no herbário do Departamento de Botânica da Universidade Federal de São Carlos (HUUFSCar) sob o número 7110.

Preparação dos extratos

As folhas secas e moídas de S. glutinosa foram submetidas à extração com etanol, sob agito contínuo com o aparelho Ika Ultra Turrax (T 25) por 5 min, 13.000 rpm e concentrados sob vácuo em rotaevaporadores a 35 ºC. O extrato etanólico obtido foi congelado em nitrogênio líquido e, em seguida, liofilizado para remoção dos traços de água, rendendo 90 g de extrato. O extrato etanólico, em seguida, foi submetido a uma partição líquido-liquido, sendo suspendido em uma solução hidroalcoólica de água destilada e metanol 25% (v/v) e vertido em funil de separação de 1 L. A partição foi realizada em ordem crescente de polaridade, utilizando hexano, acetato de etila e n-butanol, levando a três extratos após serem concentrados sob vácuo em rotaevaporadores a 35 ºC.

Os frutos frescos de S. glutinosa foram cortados em pedaços pequenos e submetidos à maceração com metanol, à temperatura ambiente, por 3 dias. Após este período o solvente foi concentrado sob vácuo em rotaevaporador a 35 ºC, obtendo-se 27,9 g de extrato. Análise deste extrato em cromatoplacas de sílica gel (CCD) mostrou resolução diferente em diclorometano e acetato de etila. Com isto, este foi submetido a uma partição líquido-liquido como acima, utilizando diclorometano e acetato de etila, levando a dois extratos após serem concentrados sob vácuo em rotaevaporadores a 35 ºC. A análise destes por RMN 1H (200 MHz) mostrou que eram similares quanto aos compostos de interesse quimiossistemático, sendo reunidos em um único, o qual foi estudado posteriormente.

Isolamento dos constituintes químicos de S. glutinosa

Inicialmente, a fração hexânica (5,0 g) obtida das folhas foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: hexano 100%, hexano/diclorometano 50%, diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 50%, acetato de etila 100%, acetato de etila/acetona 50%, acetona 100%, metanol 100%, obtendo-se 17 frações. A fração 11 (597,0 mg) foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 0 - 100%, acetato de etila/acetona 0 - 100%, acetona/metanol 0 - 100%, obtendo-se a substância 3 (23,3 mg).

A fração 8 (334,0 mg) foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 0 - 100%, acetato de etila/acetona 0 - 100%, acetona/metanol 0 - 100%, fornecendo outras subfrações. A subfração 8-2 foi purificada em CLAE, coluna Propil-diol, vazão de 2,5 mL min-1, injeção de 200 µL, concentração de 20 mg mL-1, sistema isocrático de eluição: hexano/etanol 9:1 (v/v), obtendo-se a substância 2 (3,6 mg).

A fração 3 (126,0 mg) foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 0 - 100%, acetato de etila/acetona 0 - 100%, acetona/metanol 0 - 100%, obtendo-se a friedelina (7,3 mg).

A fração 4 (305,7 mg) foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 0 - 100%, acetato de etila/acetona 0 - 100%, acetona/metanol 0 - 100%, obtendo-se o 3a-hidroxiglutin-5-eno (56,1 mg).

A fração 6 (2,122 g) foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 45,0 x 4,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: hexano/diclorometano 0 - 100%, diclorometano/acetato de etila 0 - 100%, acetato de etila/acetona 0 - 100%, acetona/metanol 0 - 100%, obtendo-se a mistura dos esteroides sitosterol e estigmasterol (identificados por CG-EM) e mais 8 subfrações. A subfração 6-3 (151,3 mg) foi fracionada em coluna cromatográfica, usando Sephadex LH-20, e eluída em sistema isocrático com metanol 100%, obtendo-se mais três subfrações. A subfração 6-3-3 (3,7 mg) foi purificada em CLAE, usando coluna Propil-diol, vazão de 2,5 mL min-1, injeção de 200 µL, concentração de 6,3 mg mL-1, sistema isocrático de eluição: hexano/etanol 9:1 (v/v), obtendo-se a substância 1 (1,6 mg) e 5-hidroxi-7-metoxiflavanona (pinostrobina) (1,7 mg).

O extrato acetato de etila mostrou perfil químico em RMN 1H muito similar ao hexânico e, por isto, não foi trabalhado. O extrato n-butanol mostrou a presença de açúcares, os quais não eram de interesse quimiossistemático, assim este também não foi estudado.

Inicialmente a fração diclorometano/acetato de etila obtida (42 g) dos frutos foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 50,0 x 5,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: hexano 100%, hexano/diclorometano 50%, diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 50%, acetato de etila 100%, acetato de etila/metanol 50%, metanol 100%, obtendo-se 9 frações.

A fração 2 foi submetida à cromatografia por adsorção em coluna de vidro (f x h = 3 x 45 cm), utilizando como fase estacionária gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema isocrático hexano/diclorometano 4:1, que levou a 2 subfrações obtidas após reunião daquelas que mostraram Rf similares em cromatoplacas de sílica gel (CCD). A subfração 2-1 foi recromatografada como acima, usando-se hexano/acetona 3:1, fornecendo a substância 6 (12 mg). A subfração 2-2 foi novamente submetida à cromatografia como acima e posteriormente via CLAE semipreparativa. Foi utilizada uma coluna C-18 Phenomenex® Luna (250 x 4,6 mm d.i.; 10 µm) e eluição com MeOH/CH2Cl2 (7:3), fornecendo as substâncias 7 (8 mg) e 8 (5,9 mg). A fração 3 foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 50,0 x 5,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: hexano 100%, hexano/diclorometano 50%, diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 50%, acetato de etila 100%, acetato de etila/metanol 50%, metanol 100%, obtendo-se 3 subfrações. A subfração 3-2 foi submetida à cromatografia via CLAE semipreparativa, utilizando-se uma coluna C-18 Phenomenex® Luna (250 x 4,6 mm d.i.; 10 µm) e eluição com CH2Cl2, fornecendo as substâncias 9 (13 mg) e 10 (9,2 mg). A fração 4 foi submetida à cromatografia em coluna (h x Φ = 50,0 x 5,0 cm) de gel de sílica (230-400 mesh) e eluída em sistema gradiente de polaridade: diclorometano 100%, diclorometano/acetato de etila 50%, acetato de etila 100%, acetato de etila/metanol 50%, metanol 100%, obtendo-se a substância 2 (5 mg).

Os extratos estudados apresentaram melhores resoluções, nos diferentes tipos de cromatografia citados acima, quando foi utilizado o eluente diclorometano. Contudo, os autores atualmente evitam o uso deste solvente devido aos seus problemas à saúde humana e ao meio ambiente.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

O estudo fitoquímico dos extratos das folhas de S. glutinosa levou ao isolamento do flavonoide 5-hidroxi-7-metoxiflavanona (pinostrobina), dos triterpenos 3α-hidróxi-glutin-5-eno e friedelina e das amidas (E)-N-metil-cinamamida [(E)-N-metil-fenilacrilamida] (1) e N-benzoiltiramina (2), os quais são conhecidos na literatura.2,6-9 Uma interessante benzoiltiramina inédita, contendo um nor-preniloxil substituinte, também foi obtida neste estudo (3) (Figura 1).


A substância 1 foi isolada como um sólido branco amorfo e no espectro de RMN 1H foram observados dois sinais em δ 7,36 (3H, m) e 7,54 (2H, dd, J = 8,4 e 2,0 Hz), típicos de sistema aromático monossubstituído com livre rotação, sendo estes sinais referentes aos 2H-meta, H-para e 2H-orto, respectivamente. Além desses sinais, foi observada a presença de dois dubletos em δ 7,51 (1H, d, J = 16,0 Hz) e 6,57 (1H, d, J = 16,0 Hz), referentes a hidrogênios olefínicos em relação trans. O sinal em δ 7,51 sugeriu uma ligação dupla conjugada à carboxila, característica de derivados do ácido cinâmico, permitindo atribuir os sinais acima: δ 7,36 (H-6,7,8), 7,54 (H-5,9), 7,51 (H-3) e 6,57 (H-2). Constatou-se também um sinal em δ 2,84 (3H, s) referente a uma metila ligada a heteroátomo. Dados de EM forneceram o pico do pseudoíon molecular m/z de 162 [M+1]+, compatível com a fórmula molecular C10H11NO, permitindo a identificação da amida (E)-N-metil-cinamamida (1). Esta amida foi isolada anteriormente nas folhas de Clausena lansium.8

A substância 2 foi isolada como um sólido branco amorfo e no espectro de RMN 1H foram observados dois dubletos integrando para dois hidrogênios cada em δ 7,10 (2H, d, J = 8,5 Hz) e 6,60 (2H, d, J = 8,5 Hz), com acoplamento orto característicos de anel aromático para-dissubstituído, e foram atribuídos aos H-2/6 e H-3/5, respectivamente. Os sinais em δ 7,68 (2H, d, J = 6,8 Hz), 7,48 (1H, m) e 7,40 (2H, d, J = 7,4 Hz) sugeriram a presença de um segundo anel aromático, porém, monossubstituído, permitindo atribuir estes sinais, respectivamente, aos H-2'/6', H-4' e H-3'/5'. O espectro de RMN 1H ainda mostrou um tripleto, integrando para dois hidrogênios em δ 2,87 (2H, t, J = 6,8 Hz), e um quadrupleto integrando para dois hidrogênios, em δ 3,69 (2H, q, J = 6,8 Hz). O espectro de massas obtido por CG-EM mostrou o pico do íon molecular m/z 241 (Figura 2) e os fragmentos em m/z 134 (C8H8NO), e 105 (C7H5O), sugerindo a presença de uma unidade benzamida e permitindo propor a fórmula molecular C15H15NO2. O espectro de RMN 1H também mostrou dois singletos largos em δ 6,10 (1H, sl) e 5,00 (1H, sl), os quais foram atribuídos a N-H e O-H, respectivamente, permitindo posicionar esta hidroxila em um anel fenila. Na posição para a esta hidroxila foi posicionado um grupo etila, ao qual foram associados os sinais em δ 2,87 e 3,69 discutidos acima. Assim, a substância 2 foi definida como a N-benzoiltiramina (2), a qual foi isolada anteriormente dos frutos de Limonia acidissima.2,9


A substância 3 foi isolada como um sólido branco amorfo e nos espectros de RMN 1H e 13C mostrou um padrão de sinais semelhantes à amida 2, sugerindo tratar-se de um derivado com o núcleo N-benzoiltiramida. Entretanto, o espectro de RMN 1H (Tabela 1) também mostrou dois tripletos em δ 4,22 (t, J = 6,3 Hz) e 2,91 (t, J = 6,3 Hz), os quais acoplavam entre si e no HSQC correlacionaram com os sinais em δ 62,9 e 42,6, respectivamente. No experimento de HMBC o sinal em δ 4,22 mostrou correlação com o sinal em δ 157,2. Este sinal δ 157,2 foi atribuído ao C-1 do núcleo N-benzoiltiramina, indicando um grupo etoxila nesta posição. No espectro de RMN 1H foi observado um singleto típico de metila em δ 2,24 (3H, s). No experimento de HMBC este sinal de metila e os dois referentes a dois metilenos em δ 4,22 e 2,91 mostraram correlação com um sinal em δ 206,4 característico de carbonila, sugerindo como substituinte em C-1 um grupo butoxil-3-ona. A análise da substância 3 em CG-EM mostrou o pico do íon molecular em m/z 311 e fragmentos em m/z 296 indicando perda de metila, m/z 268, o qual sugere perda de MeCO, e outro em m/z 240, o qual indica perda da cadeia (C4H7O; m/z 311-71) ligada ao oxigênio de C-1 (Figura 2), confirmando o substituinte em C-1 como o grupo butoxil-3-ona. O seu espectro de massas de alta resolução forneceu o pseudoíon molecular [M + H]+ 312,1593, calculado para C19H21NO3. Portanto, a substância 3 pode ser definida como N-{2-[4-(butoxil-3-ona)fenil]etil}benzamida, a qual segundo levantamento na literatura é inédita.

Biogeneticamente, a substância 3 pode ser formada a partir da 2 O-prenilada, com posterior formação de epóxido entre C-2'' e C-3'', e abertura deste levando ao diol. A metila da unidade prenila poderia ter sido oxidada a aldeído e, posteriormente, a ácido carboxílico e, em seguida, sofrer uma eliminação descarboxilativa com simultânea eliminação de água (Figura 3).


Considerando esta possibilidade, os intermediários aldeído e ácido carboxílico poderiam estar presentes nos extratos das folhas estudados. Na tentativa de reforçar esta proposta, estes intermediários foram avaliados usando-se a cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas no modo de análise por monitoramento seletivo de íons (CG/EM-MSI). Foram utilizadas as amidas 2 e 3 como padrão de fragmentação, as quais levaram aos íons m/z 77, 105, 120, 134, 254, 311, os quais caracterizam bem o esqueleto N-benzoiltiramina e o substituinte preniloxil em C-1 (Figura 2). Para a detecção dos possíveis intermediários foram analisadas as frações anterior (FH-10) e posterior (F-12) àquela (F-11) de onde foi isolado a amida 3. A fração hexânica (FH-10) não havia sido estudada por conter pequena quantidade em massa. Contudo, em análise por CG/EM-MSI mostrou a presença dos íons selecionados em um dos seus picos cromatográficos, o qual levou a um EM (Figura 7S, material suplementar) cujos fragmentos (Figura 2) permitiram propor a estrutura da amida N-{2-[4-(2,3-di-hidroxi-2-metil-butoxilanal)fenil]etil}benzamida (4). O íon molecular m/z 357 confirmou a massa esperada para a amida 4 e o fragmento m/z 356 [M-1] reforçou a presença da função aldeído na cadeia lateral, pois em substâncias com esta função é comum perder hidrogênio radicalar, resultando em um fragmento [M-1].


A fração FH-12 também não havia sido estudada por conter pequena quantidade em massa, contudo, em análise por CG/EM-MSI mostrou a presença dos íons selecionados em um dos seus picos cromatográficos, o qual levou a um EM (Figura 8S, material suplementar) cujos fragmentos (Figura 2) permitiram propor a estrutura da amida N-{2-[4-(2,3-di-hidroxi-2-metil-butoxiloico)fenil]etil}benzamida (5). O íon molecular m/z 373 (Figura 2) confirmou a massa esperada para a amida 5 e o pico m/z 90, formado através de um rearranjo McLafferty, forneceu a base para se propor a presença da amida 5 com a carboxila na cadeia lateral.


O estudo fitoquímico dos extratos dos frutos de S. glutinosa levou ao isolamento da amida N-benzoiltiramina (2) e mais cinco (6-10) derivados de 2 com substituintes geraniloxilas em C-1 (Figura 1). O composto 6 mostrou dados espectrais de RMN 1H e 13C similares à substância 2 e mais três singletos em δ 1,72, 1,67 e 1,60 referentes a metilas vinílicas, dois multipletos característicos de hidrogênios olefínicos em δ 5,48 e 5,09, um multipleto integrando para quatro hidrogênios em δ 2,09 e um dubleto em δ 4,52 (2H, d, J = 6,5 Hz). No experimento de HMBC o sinal em δH 4,52, atribuído aos 2H-1'', mostrou correlação com os sinais de 13C em δC 157,6; 119,5 e 123,8, atribuídos ao C-1, C-2'' e C-3'', respectivamente. O sinal de metila em δH 1,67, atribuído a 3''-Me, estava correlacionado com os sinais em δC 119,5 e 123,8, atribuídos aos C-2'' e C-3'', respectivamente. O HMBC também mostrou correlações de dois sinais de metila em δH 1,67 e 1,60, atribuídos às 7''-Me e Me-8'', com os sinais em δc 141,2 e 131,4, atribuídos aos C-6'' e C-7'', respectivamente. Estas correlações permitiram atribuir estes sinais a um grupo O-geranila ligado em C-1. O derivado 6 foi definido como a amida N-benzoil-O-geraniltiramina, a qual foi citada na literatura como tendo sido preparada a partir de 2,10 portanto esta é a primeira vez que esta substância é citada como natural.

A substância 7 mostrou dados espectrais de RMN 1H e 13C similares à substância 6 e mais um singleto intenso em δ 2,03, característico de metila de um grupo acetila, e um tripleto em δ 5,13 (J = 6,9 Hz) referente a um hidrogênio acetilcarbinólico. As correlações observadas no HMBC permitiram posicionar a acetoxila no grupo geranila em C-4'' (δH 5,13, H-4'' → δC 122,8, C-2'', 137,4 C-3'' e 118,8, C-6''). Assim, esta amida foi identificada como N-benzoil-O-(4-acetoxil)-geraniltiramina, isolada anteriormente também dos frutos desta mesma espécie.10

Os outros três derivados (8-10) apresentaram dados espectrais muito semelhantes às amidas epóxido-acidissiminol e di-hidroxi-acidissiminol, isoladas anteriormente dos frutos de Limonia acidissima.9 A substância 8 mostrou dados espectrais de RMN 1H e 13C similares aos da amida epóxido-acidissiminol, porém o sinal do hidrogênio carbinólico se encontrava desblindado em δ 5,36 (t, J = 6,4 Hz), sugerindo a presença de um grupo acetila, o qual foi confirmado analisando-se o sinal de um singleto intenso em δ 2,06 (3H) e de uma carboxila no espectro de RMN 13C (δ 169,8). O HMBC mostrou o sinal desblindado em δ 5,36, atribuído ao H-4'', correlacionado aos sinais em δC 122,7; 136,7 e 60,4, atribuídos aos C-2'', C-3'' e C-6'', respectivamente, permitindo identificar a substância 8 como N-benzoil-O-(4-acetoxil-6,7-epóxi)-geraniltiramina.

A substância 9 mostrou o sinal de um dos hidrogênios carbinólicos desblindado em δ 5,44 (d, J = 10,1 Hz), sugerindo a presença de um grupo acetoxila. Este sinal, atribuído ao H-4'', no HMBC estava correlacionado aos sinais em δC 122,2; 138,1 e 171,3, atribuídos aos C-2'', C-3'' e a uma carboxila, respectivamente. Estas correlações mostraram a presença de uma acetoxila, permitiu posicioná-la em C-4'' e, assim, identificar a substância 9 como N-benzoil-O-(4-acetoxil-6,7-di-hidroxi)-geraniltiramina.

A substância 10 mostrou características espectrais similares às de 9, contudo, nos experimentos de HMBC o sinal de hidrogênio carbinólico desblindado em δ 4,99 estava correlacionado com os sinais em δC 71,8 (carbono quaternário, sem correlação no HSQC) e 171,8, enquanto o mais blindado em δH 3,97 se correlacionava com os sinais em δC 120,4 e 141,6, atribuídos aos C-2'' e C-3'', respectivamente. Estas correlações permitiram posicionar a hidroxila em C-4'' e a acetoxila em C-6'', definindo a substância 10 como N-benzoil-O-(6-acetoxil-4,7-diidroxi)-geraniltiramina.

As amidas 7-10 foram obtidas do extrato metanólico dos frutos após partição com acetato de etila, levando à incerteza se elas seriam naturais ou produtos de reação com o solvente durante o processo de partição. Mesmo considerando que a reação de O-acetilação tenha sido eficiente, traços dos compostos com a hidroxila correspondente livre teriam sido isolados. Assim, as amidas 8-10 são inéditas e acredita-se serem naturais.

A co-ocorrência de N-benzoiltiraminas em Swinglea e Limonia (sin. Feronia) mostra a afinidade química entre estes gêneros e confirma a homogeneidade sistemática da subfamília Aurantioideae, pois ambos pertencem a esta subfamília e à mesma tribo Balsamocitrinae. Swinglea também mostra afinidade química com Clausena lansium, gênero da mesma subfamília, mas de outra tribo, Clauseninae, pois ambos compartilham a amida (E)-N-metil-cinamamida (1).8 A literatura cita a presença de vários alcaloides acridônicos em Swinglea,11,12 os quais também são encontrados em gêneros de Aurantioideae, ou seja, concordando com a homogeneidade da subfamília.

MATERIAL SUPLEMENTAR

Os espectros de RMN 1H e 13C, experimentos de HSQC e HMBC e EM para a substância 3, e EM para 4 e 5 encontram-se disponíveis em http://quimicanova.sbq.br, em arquivos PDF, com acesso livre.

AGRADECIMENTOS

À CAPES, CNPq (INCT, 573742/2008-1) e FAPESP (INCT, 08/57859-5) pelas bolsas e apoios financeiros concedidos.

Recebido em 30/4/12; aceito em 17/9/12; publicado na web em 26/10/12

Material Suplementar

Figura 1S - Clique para ampliar


Figura 2S - Clique para ampliar


Figura 3S - Clique para ampliar


Figura 4S - Clique para ampliar


Figura 5S - Clique para ampliar


Figura 6S - Clique para ampliar


Figura 7S - Clique para ampliar

Figura 8S - Clique para ampliar

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    Artigo em homenagem ao Prof. Otto R. Gottlieb (31/8/1920-19/6/2011)
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    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      30 Abr 2012
    • Aceito
      17 Set 2012
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