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Efeito da ativação mecânica de uma formulação de talco/caulim/alumina sobre o mecanismo e a cinética de formação de cordierita

Effect of the mechanical activation of a talc/kaolin/alumina mixture on the mechanism and kinetics of cordierite formation

Resumo

In this study, the influence of mechanical activation by intensive ball milling of a stoichiometric mixture of talc, kaolin, and alumina on the mechanism and kinetics of cordierite (2MgO·2Al2O3·5SiO2) formation was evaluated. The raw materials were characterized by chemical analysis, X-ray diffraction (XRD), laser diffraction, and helium pycnometry. The kinetics and mechanism of cordierite formation were studied by XRD, differential thermal analysis, and dilatometry in order to describe the phase formation as a function of temperature (1000-1400 ºC), time of thermochemical treatment (0-4 h), and grinding time of the mixture (0-45 min). Finally, the optimal conditions of the thermochemical treatment that ensured the formation of cordierite were determined: milling time of 45 min and thermal treatment at 1280 ºC for 1 h.

mechanical activation; cordierite; high energy milling


mechanical activation; cordierite; high energy milling

ARTIGO

Efeito da ativação mecânica de uma formulação de talco/caulim/alumina sobre o mecanismo e a cinética de formação de cordierita

Effect of the mechanical activation of a talc/kaolin/alumina mixture on the mechanism and kinetics of cordierite formation

João Batista Rodrigues NetoI; Dachamir HotzaII,* * e-mail: dhotza@gmail.com ; Rodrigo MorenoIII

IUniversidade Federal de Santa Catarina, Campus Araranguá, 88900-000 Araranguá - SC, Brasil

IIDepartamento de Engenharia Química, Universidade Federal de Santa Catarina, 88040-970 Florianópolis - SC, Brasil

IIIInstituto de Cerámica y Vidrio (ICV/CSIC), c/ Kelsen, 5, 28049, Madri, Espanha

ABSTRACT

In this study, the influence of mechanical activation by intensive ball milling of a stoichiometric mixture of talc, kaolin, and alumina on the mechanism and kinetics of cordierite (2MgO·2Al2O3·5SiO2) formation was evaluated. The raw materials were characterized by chemical analysis, X-ray diffraction (XRD), laser diffraction, and helium pycnometry. The kinetics and mechanism of cordierite formation were studied by XRD, differential thermal analysis, and dilatometry in order to describe the phase formation as a function of temperature (1000-1400 ºC), time of thermochemical treatment (0-4 h), and grinding time of the mixture (0-45 min). Finally, the optimal conditions of the thermochemical treatment that ensured the formation of cordierite were determined: milling time of 45 min and thermal treatment at 1280 ºC for 1 h.

Keywords: mechanical activation; cordierite; high energy milling.

INTRODUÇÃO

A cordierita (2MgO·2Al2O3·5SiO2) é uma fase cerâmica do sistema MgO-Al2O3-SiO2, empregada em uma série de aplicações, em temperaturas moderadas, que exigem materiais com baixo coeficiente de dilatação térmica e elevada resistência ao choque térmico. Além disso, a cordierita se caracteriza por apresentar uma pequena constante dielétrica e elevada estabilidade química. Materiais a base de cordierita são utilizados na produção de componentes para suporte de catalisadores, filtros, placas para circuitos integrados, refratários de fornos e isolantes térmicos.1-5

O método mais comum para a síntese da fase cordierita envolve a reação no estado sólido, à alta temperatura, de misturas de componentes puros e/ou de minerais naturais. As substâncias puras mais comumente empregadas são MgO, Al2O3, SiO2, MgCO3, Mg(OH)2. Vários trabalhos na literatura descrevem a obtenção de cordierita por meio da utilização de minerais como talco e sepiolita como fontes de MgO; argilas, caulins, diatomitas, feldspatos, quartzo e cinzas volantes como fontes de Al2O3 e SiO2. 6-10

Aza e Monteros11 propuseram que a formação da cordierita (2MgO·2Al2O3·5SiO2) ocorre mediante duas etapas bem definidas. Primeiramente, a cordierita começa a formar-se a 1100 ºC por meio de uma reação no estado sólido, conforme Equação 1, entre mulita (3Al2O3·2SiO2), enstatita (MgO·SiO2) e cristobalita (SiO2). A reação apresenta um ápice em sua cinética a 1275 ºC.

Em uma segunda etapa, à medida que a temperatura se eleva, a cordierita previamente formada reage, por um mecanismo de fusão diferencial, com a enstatita e a cristobalita, formando um líquido em torno de 1330 a 1355 ºC. Essa reação depende dos teores de óxidos de metais alcalinos contaminantes das matérias-primas. O líquido formado tem a composição do eutético cordierita-enstatita-sílica. Com o aumento da temperatura, o líquido começa a reagir com a mulita remanescente alterando sua composição para aquela típica da cordierita. A temperatura de máxima cinética desta reação de formação de cordierita é de ~1357 ºC.

A cinética das reações no estado sólido é dependente da distribuição de tamanho de partículas dos seus reagentes. Um dos problemas derivados da utilização de matérias-primas naturais em reações para formação de cordierita é a presença de partículas grosseiras que são limitantes de sua reatividade. Vários estudos têm sido feitos no sentido de determinar o efeito de alguns processos de moagem de argilominerais, caulim e talco,7-9,12-15 sobre suas estruturas cristalinas e sua reatividade. Tais estudos concluem que os processos de moagem de alta energia, geralmente a seco, produzem efeitos físico-químicos intensos nos argilominerais, incluindo a completa amorfização de sua estrutura cristalina lamelar e uma extrema redução de tamanho de suas partículas. Por consequência, a moagem aumenta substancialmente a reatividade dos pós cerâmicos por aumentar suas áreas superficiais específicas, além de reduzir as temperaturas necessárias à sua sinterização.

Para sintetizar a fase cordierita via reação no estado sólido usualmente são empregados tratamentos térmicos entre 1250 e 1350 ºC. Outra opção utilizada no sentido de aumentar a reatividade de formulações para obtenção de cordierita é o emprego de alguns aditivos que reduzem sua temperatura de síntese. Entretanto, esses aditivos reduzem a temperatura de trabalho da cordierita produzida. O efeito combinado da moagem e dos aditivos torna possível um decréscimo da temperatura de síntese na ordem de 300 ºC.

Em trabalhos anteriores,8,9 foram publicados resultados relativos à otimização do comportamento reológico de suspensões de caulim, talco e alumina para o posterior processamento coloidal de componentes de cordierita, densos ou porosos. Além disso, foi avaliada também a influência do processo de moagem de alta energia sobre o comportamento reológico de tais suspensões, bem como as alterações microestruturais produzidas, tanto do ponto de vista da porosidade quanto das fases formadas durante sinterização.

O objetivo deste trabalho é avaliar o efeito do processo de moagem intensiva de uma suspensão concentrada de talco, caulim e alumina, dando enfoque sobre a cinética e os mecanismos de formação de cordierita quando comparado aos resultados obtidos com as mesmas matérias-primas utilizadas in natura.

PARTE EXPERIMENTAL

A cordierita é constituída por 13,8% de MgO, 34,9% de Al2O3 e 51,4% de SiO2, em massa. As matérias primas empregadas neste trabalho foram: caulim e talco (ambos fornecidos por Colorminas, Brasil) e alumina (uma mistura de 85% em massa de 1000SG, como alumina fina, e 15% em massa de CL3000FG, como alumina grosseira, ambas fornecidas por Alcoa, EUA). Para se obter uma formulação estequiométrica da fase cordierita os componentes foram misturados nas proporções em massa de 40,0% caulim, 43,8% talco e 16,2% alumina. As matérias-primas foram caracterizadas por meio de análise granulométrica (Mastersizer S, Malvern, Inglaterra) e de medidas de densidade em picnômetro de He (Accupyc 1330, Micromeritics, EUA). As análises químicas foram obtidas por meio de fluorescência de raios X (Philips PW 2400, Holanda). Algumas propriedades físicas e a composição química das matérias-primas são apresentadas na Tabela 1.

Seguindo os critérios estabelecidos em um trabalho prévio,8 foram preparadas suspensões aquosas com a formulação das matérias-primas. As condições ótimas de dispersão foram estabelecidas para uma concentração de sólidos de 40% em volume, 1,5% (em relação aos sólidos) de defloculante de base poliacrílica (Dolapix PCN, Zschimmer-Schwarz, Alemanha) e para um valor de pH = 11, ajustado com solução de KOH (concentração 5 N). As suspensões foram homogeneizadas em um agitador a hélice por 15 min e em seguida em um agitador de alto cisalhamento (Silverson L2R, Inglaterra) por 3 min.

As suspensões foram submetidas a moagens utilizando-se um moinho de bolas planetário de alta velocidade, com jarro de porcelana e bolas de alumina. Os tempos de moagem foram de 15, 30 e 45 min e ao final de cada ensaio o pH das suspensões foi ajustado novamente para 11.9 Após cada moagem, os pós foram caracterizados por meio de análise granulométrica por difração laser (Mastersizer S. Malvern, Inglaterra).

Para os ensaios de tratamentos térmicos para obtenção de cordierita foram preparados corpos de prova utilizando a suspensão sem moagem, como também cada uma das suspensões de cada um dos testes de moagem (15, 30 e 45 min). Os corpos de prova foram conformados pelo processo de colagem de barbotina utilizando um molde de gesso cilíndrico (10 mm de diâmetro). Os tratamentos térmicos para síntese/sinterização dos compactados foram realizados em temperaturas entre 1000 e 1400 ºC com tempos de tratamento de zero (quenching) a 4 h e com taxa de aquecimento de 30 ºC/min.

Foram realizados ensaios dinâmicos de sinterização, utilizando um dilatômetro diferencial (Setsys 16/18, Setaram, França), com uma taxa de aquecimento de 10 ºC/min até 1400 ºC. O processo de evolução das fases formadas durante o aquecimento da formulação foi estudado com auxílio da técnica de análise térmica diferencial (ATD, Netzsch STA 409, Alemanha). Os ensaios de análise térmica foram realizados nas mesmas condições daquele de dilatometria. Ensaios de difratometria de raios X (D5000, Siemens, Alemanha) foram empregados para determinar as fases presentes na formulação e em amostras obtidas de cada um dos tratamentos térmicos realizados. Todas as amostras para os ensaios de difratometria foram preparadas via moagem em almofariz de ágata.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análises de difratometria de raios X obtidas das formulações in natura e daquela moída por 45 min em moinho de bolas planetário demonstraram que o processo de moagem não produziu nenhuma alteração aparente sobre a estrutura cristalina dos minerais. Ambos os difratogramas confirmam a presença das fases argilominerais caulim e talco, além da alumina-α. Ressalta-se a presença do mineral acessório quartzo-α, que é típica em matérias primas de origem natural.

A Figura 1 mostra o efeito do tempo de moagem sobre as distribuições granulométricas da formulação moída em moinho planetário de alta energia. Pode-se observar que já nos primeiros 15 min a moagem foi muito efetiva, pois produziu uma grande redução do tamanho das partículas mais grosseiras dos componentes da formulação (entre 5 e 70 mm). A partir dos 45 min de moagem, nota-se que o aumento do tempo não produziria ganhos significativos de redução de tamanho de partículas. A formulação antes da moagem apresentou uma distribuição com partículas com até 100 mm e um diâmetro médio de ~5,5 mm. Ao final dos 45 min de moagem, a formulação passou a ter partículas com diâmetros inferiores a 56 mm e com um diâmetro médio da ordem de 4 mm.


Os resultados dos ensaios de ATD (sem moagem e com 45 min de moagem) e dilatometria (45 min de moagem) da formulação são apresentados na Figura 2. Comparando as curvas de ATD, observa-se que as mesmas são praticamente coincidentes até a temperatura de 1200 ºC. Ambas mostram um pico endotérmico amplo entre 200 e 300 ºC, referente à perda de água estrutural dos aluminossilicatos, um pico endotérmico intenso em torno de 550 ºC devido à desidroxilação do caulim e outro menos intenso a 885 ºC referente à desidroxilação do talco, que promove a formação de enstatita (MgO·SiO2). Observa-se um pico exotérmico intenso a 1000 ºC que indica a transformação da estrutura não-cristalina da caulinita em pré-mulita. A partir de 1200 ºC pode-se observar que o processo de moagem produziu uma alteração importante nos resultados de ATD.


Na Figura 3 mostra-se um detalhe dos resultados de ATD e dilatometria para temperaturas entre 1180 e 1380 ºC. Observando os resultados da formulação sem moagem, na Figura 3, constata-se a presença de 3 picos exotérmicos a 1230, 1305 e 1335 ºC. Segundo a literatura,11 pode-se afirmar que o primeiro pico é característico da formação da mulita e que os dois seguintes indicam a formação da cordierita. No caso da formulação moída, o pico referente à formação de mulita mostra-se mais intenso e antecipado de 3 ºC daquele obtido para a condição sem moagem. As alterações mais pronunciadas ocorrem a partir desta transformação. O pico endotérmico a 1280 ºC observado na formulação sem moagem desaparece para o caso da formulação moída, indicando que o processo de formação de fase líquida após a cristalização da mulita é substituído pelo início imediato da reação de formação de cordierita. No caso da formulação moída, nota-se um efeito exotérmico de 1275 a 1280 ºC, ou seja, pode-se afirmar que o processo de moagem antecipou o início da formação da cordierita em aproximadamente 30 ºC e que este acontece em um único evento.


Os resultados de dilatometria da amostra moída por 45 min, Figuras 2 e 3, mostram-se muito coerentes com aqueles de sua análise térmica. Constata-se que todas as transformações que envolvem perda de hidroxilas são confirmadas pelas retrações dilatométricas observadas nos mesmos intervalos de temperatura obtidos na análise térmica. O início do pico endotérmico intenso mostrado nos resultados de ATD a 1100 ºC coincide com o início do processo de sinterização apontado na dilatometria. Tal efeito é típico de sinterização com fase líquida transiente. A Figura 3 mostra ainda que a maior taxa de sinterização é observada a 1190 ºC e que a densificação é interrompida a 1280 ºC, justamente na temperatura em torno da máxima taxa de formação da cordierita.

Na Figura 4 são apresentados os resultados obtidos a partir dos ensaios de difratometria de raios X realizados nas amostras, da formulação in natura, tratadas termicamente. Nela estão colocadas as variações de intensidade dos picos de difração tomados como característicos das diferentes fases obtidas em função das temperaturas de tratamento térmico realizados com corpos de prova da formulação que não sofreram o processo de moagem. Ressalta-se que os picos selecionados para identificação das várias fases, por problemas de sobreposição dos mesmos em algumas fases, não são aqueles mais intensos de cada uma delas: cordierita-α (2MgO·2Al2O3·5SiO2), 3,00 Å; quartzo-α (SiO2), 4,25 Å; cristobalita (SiO2), 3,14 Å; safirina (4MgO·5Al2O3.2SiO2), 2,01 Å; espinélio (MgO·Al2O3), 2,44 Å; mulita (3Al2O3·2SiO2), 1,60 Å; alumina-α (Al2O3), 2,08 Å. Portanto, os resultados apresentados são qualitativos, indicando a evolução das fases no material em função da temperatura. Nota-se que a 1250 ºC a amostra é composta basicamente por sílica (nas formas alotrópicas quartzo-α e cristobalita), safirina, espinélio, mulita, alumina não-reagida e pouca cordierita. Confirmando os resultados de ATD, observa-se que a cordierita-α só aparece de forma majoritária para os tratamentos acima de 1300 ºC. Analisando os resultados de ATD (Figura 2) e de DRX pode-se concluir que as fases reagentes oriundas das matérias-primas para temperaturas superiores a 1230 ºC são enstatita proveniente do talco, mulita cristalizada a partir da pré-mulita do caulim, sílica e alumina. Um dos mecanismos de formação de cordierita-α a baixa temperatura (1275 ºC) envolve a reação entre estas fases. Os resultados da Figura 4 mostram que estes reagentes não reagem completamente já que se observa a presença de quartzo-α, cristobalita e alumina-α até 1400 ºC. Outro fato a se ressaltar é o de que existem reações concorrentes à formação de cordierita-α, coerentes com o diagrama de equilíbrio MgO-Al2O3-SiO2, pois a safirina e o espinélio permanecem na composição do material em toda a gama de tratamentos. A partir dos resultados apresentados, pode-se propor que inicialmente (1250 ºC) a enstatita e a mulita reagem preferencialmente com a alumina-α extremamente fina (D50 = 0,6 mm) utilizada como matéria prima formando fases mais ricas em Al2O3 e MgO, como a safirina e o espinélio.


A Equação 2 apresenta uma proposta da reação concorrente à formação de cordierita-α, em baixas temperaturas (até 1250 ºC), que aconteceria no caso da formulação em estudo. Nesta reação, a mulita proveniente do caulim, juntamente com a enstatita formada a partir do talco, reage preferencialmente com a alumina-α, formando como produtos de reação a safirina, o espinélio e a cristobalita (forma alotrópica da sílica estável a altas temperaturas).

O fator preponderante que facilitaria a formação destas fases ricas em Al2O3 (safirina e espinélio) é a existência de partículas grosseiras de quartzo-α contaminando as matérias-primas (talco e caulim), como comprovam as análises granulométricas da Figura 1. Partículas grosseiras dificultam a formação de fases mais ricas em SiO2 como a cordierita-α e, como mostra a Figura 4, nota-se a presença significativa de sílica (quartzo-α e cristobalita) em todo o intervalo de temperaturas de tratamento da formulação sem moagem.

Em temperaturas mais elevadas (1300 a 1350 ºC), a cordierita-α passa a ser a fase prioritária da reação comprovando os resultados de ATD (Figura 3). Nesse ponto, a reação da enstatita com mulita e sílica passa a ser a majoritária em detrimento da formação de safirina e espinélio. Pode-se notar na Figura 4 que o crescimento da intensidade do pico de cordierita-α está associado à diminuição das intensidades dos picos de safirina e espinélio, bem com o do quartzo-α e da cristobalita. A redução da intensidade do pico de cordierita-α a 1400 ºC pode vir a confirmar a formação de uma fase líquida eutética a 1355 ºC com a composição do eutético de enstatita-silica-cordierita, que quando formada consome uma parcela da cordierita-α anteriormente produzida. Observando os resultados de ATD para a formulação sem moagem (Figura 3), nota-se a presença de um pico endotérmico a 1360 ºC que deve estar associado à formação dessa fase líquida.

A Figura 5 mostra os resultados obtidos a partir dos ensaios de difratometria de raios X realizados nas amostras tratadas termicamente para o caso da formulação moída por 45 min. Os resultados demonstram o efeito que o processo de moagem produziu sobre a cinética e o mecanismo de formação da cordierita-α. Comparando as Figuras 4 e 5 pode-se observar que a redução do tamanho das partículas mais grosseiras da formulação fez acelerar a cinética de formação de cordierita-α, pois, no caso da formulação moída, já se nota a presença da fase a 1200 ºC. Além disso, a cordierita-α já é a fase majoritária a 1280 ºC, enquanto que para o caso da formulação sem moagem isso só ocorria a 1300 ºC. Estes resultados estão de acordo com aqueles obtidos nos ensaios de análise térmica (Figura 3). Nota-se também que a intensidade máxima do pico de cordierita-α é atingida a 1280 ºC, enquanto que para a formulação in natura isso só ocorria a 1350 ºC. A partir de 1280 ºC, ao contrário do caso onde não foi feita a moagem, a mulita, a enstatita, a sílica e a alumina-α reagentes são consumidas para a formação preferencial de cordierita-α. O pequeno aumento de intensidade do pico de cordierita-α a 1350 ºC pode vir a confirmar plenamente o mecanismo de formação desta fase a alta temperatura proposto por Aza e Monteros.11 Diferentemente do caso da formulação sem moagem, o resultado de análise térmica da formulação moída (Figura 3) mostra um pico endotérmico a 1330 ºC, enquanto no primeiro caso este pico aparecia a 1360 ºC. Segundo a referida literatura, tal efeito (citado 1330 ºC) é devido à formação de uma fase líquida com a composição do eutético cordierita-enstatita-sílica. Segundo o mecanismo proposto, esta fase líquida reage com a mulita remanescente, a 1357 ºC, formando cordierita-µ. Como pode ser observado nos resultados de ATD, existe um pico exotérmico em torno de 1360 ºC que confirma a tese sugerida.


Resultados não apresentados, relativos à influência do tempo na temperatura de tratamento sobre a evolução das fases formadas a 1280 ºC a partir da formulação moída por 45 min, demonstraram que para tempos de tratamento superiores a 1 h, não são observadas alterações significativas na composição de fases presentes nas amostras. Os resultados observados para o caso do quenching (aquecimento a 1280 ºC, seguido de resfriamento rápido à temperatura ambiente) mostram já a presença de cordierita-α coexistindo com os produtos ricos em MgO e Al2O3 (safirina e espinélio) e com os reagentes (quartzo-α, alumina-α e mulita) da reação de formação de cordierita-α. O difratograma de raios X para a amostra de "quenching" a 1280 ºC mostra ainda que além dos reagentes citados anteriormente, nota-se a presença de enstatita na composição da amostra. Logo, durante a primeira hora de reação o espinélio, a safirina e a enstatita reagem com o quartzo-α e a alumina-α formando finalmente a cordierita-α.

A Figura 6 apresenta os difratogramas de raios X de amostras da formulação moída tratadas termicamente, por 1 h, para temperaturas inferiores à máxima cinética de formação da cordierita (1000, 1200 e 1250 ºC). O difratograma da amostra tratada a 1000ºC ratifica os resultados de ATD (Figura 2), já que é observada a presença de enstatita na amostra na temperatura de pico de formação do composto. Além disso, nota-se que a amostra ainda apresenta quartzo-α e alumina-α e que já se inicia, nesta temperatura, a formação de mulita. Quanto ao mecanismo de reação proposto anteriormente (Equação 2), os dados da Figura 6 só vem a corroborar com o exposto. Mais uma vez, nota-se que, a 1200 ºC, a reação concorrente de formação de fases ricas em Al2O3 e MgO é a preferencial. Observa-se na Figura 5 que as fases majoritárias a 1200 ºC são espinélio e safirina, além da cristobalita, que são os produtos da reação proposta. Os resultados da Figura 6 confirmam que a reação prioritária nesses níveis de temperatura tem validade. O difratograma para 1200 ºC indica que as fases presentes são: sílica (quartzo-α e cristobalita); alumina-α; mulita; safirina; espinélio; e uma pequena quantidade de cordierita-α. Esses resultados demonstram que o mecanismo da reação proposto segue uma sequência onde a enstatita formada a temperaturas mais baixas reage preferencialmente com a mulita formada a 1200 ºC e com a alumina produzindo safirina, espinélio e cristobalita. Nessa temperatura, observa-se uma redução significativa na intensidade dos picos de alumina-α que está sendo consumida na reação e desaparecem também os picos de enstatita que é também outro reagente. Outro indicativo importante da validade da reação proposta é o aparecimento do pico muito intenso de cristobalita. A Equação 2 evidencia que para cada mol formado de safirina e de espinélio formam-se 5 moles de SiO2. Por fim, como os resultados de distribuição de tamanha de partículas (Figura 1) propõem que a moagem produziu uma redução no tamanho das partículas de quartzo-α da formulação, pode-se observar que já a 1250 ºC a reação de formação da fase rica em SiO2, ou seja, cordierita-α (Equação 1) é mais representativa, apesar de se observar ainda teores significativos de safirina, espinélio, cristobalita e pequena quantidade de mulita.


CONCLUSÕES

O processo de ativação mecânica de matérias primas utilizadas no trabalho, apesar de não produzir modificações na estrutura cristalina dos minerais, atuou de forma significativa na alteração da cinética e do mecanismo de formação da fase cordierita-α. A redução do tamanho das partículas dos reagentes produzida pela moagem de alta energia, principalmente do quartzo-α contaminante, antecipou a temperatura de início da formação de cordierita-α em até 30 ºC (de 1305 ºC para 1275 a 1280 ºC). Além disso, a temperatura de máxima taxa de produção de cordierita-α foi reduzida em ~70 ºC (de 1350 ºC para 1280 ºC). O tempo de tratamento termoquímico demonstrou pouca influência sobre a cinética de formação das fases produzidas pela reação das matérias primas, e para tempos de tratamento superiores a 1 h, não foram observadas alterações substanciais na composição das fases presentes.

O mecanismo de formação de cordierita-α quando se utiliza caulim, talco e alumina como reagentes depende, além da temperatura de tratamento, também da distribuição de tamanho de partículas das matérias primas empregadas. Quando as matérias-primas naturais (talco e caulim) foram empregadas in natura, a reação de obtenção de cordierita-α, por meio da reação entre enstatita, mulita e quartzo, é dificultada pela presença de partículas grosseiras de SiO2 como reagente. Neste caso, a reação só passa a ser majoritária a temperatura de tratamento da ordem de 1300 ºC.

A opção do emprego de alumina-α fina (D50 = 0,6 mm) na formulação dos reagentes possibilitou a proposta da hipótese de uma reação concorrente à formação de cordierita-α que se mostrou prioritária em tratamentos termoquímicos realizados a baixa temperatura (1200 a 1250 ºC). Nesta reação, a enstatita formada a partir do talco, a temperaturas da ordem de 885 ºC reage preferencialmente com a mulita proveniente do caulim (1200 ºC) e com a alumina produzindo fases ricas em Al2O3 (safirina e espinélio) e cristobalita. No caso da formulação que sofreu o processo de ativação mecânica, a reação de formação de cordierita-α já é significativa a 1250 ºC, impedindo que o mecanismo de formação caminhe na direção da geração de fases ricas em Al2O3 (safirina e espinélio).

AGRADECIMENTOS

O presente trabalho foi realizado com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico/Brasil (CNPq) e do Ministério da Educação e Ciência/Espanha (MEC, Projeto MAT2003-00836). Os autores agradecem a Empresa Colorminas Colorifício e Mineração pela doação das matérias primas utilizadas no trabalho.

Recebido em 05/03/2013; aceito em 02/10/2013; publicado na web em 01/11/2013

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  • *
    e-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Abr 2014
    • Data do Fascículo
      Abr 2014

    Histórico

    • Aceito
      02 Out 2013
    • Recebido
      05 Mar 2013
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