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BIOSSORÇÃO DE Pb(II) POR CASCA DE URUCUM (Bixa orellana) EM SOLUÇÕES AQUOSAS: ESTUDO CINÉTICO, EQUILÍBRIO E TERMODINÂMICO

BIOSSORPTION OF Pb(II) BY URUCUM SHELLS (Bixa orellana) IN AQUEOUS SOLUTIONS: KINETIC, EQUILIBRIUM AND THERMODYNAMIC STUDY

Resumo

This study describes the application of new and low cost biosorbent, shells of urucum (Bixa Orellana), for removal of lead ions (Pb(II)) from water solution. The urucum shells were characterized by Fourier transform infrared spectroscopy and scanning electron microscopy techniques. Batch adsorption experiments were performed in order to evaluate the effect of pH, agitation speed, adsorbent dosage, contact time, temperature, presence of interfering ions and matrix effect on the adsorption of process. The kinetics of biosorption followed pseudo-second-order model. Langmuir and Freundlich isotherm models were applied to describe the biosorption of Pb(II) by urucum shells. The Langmuir model showed better fit and the estimated biosorption capacity was 43.6 mg g-1. The negative Gibbs free energy, ΔG°, confirms the spontaneous nature and positive value of enthalpy, ΔH°, the endothermic character of the process. Furthermore, we also performed an evaluation of matrix and others ions effect on the biosorption process.

Keywords:
urucum shells; biosorption; low cost biosorbent and lead


Keywords:
urucum shells; biosorption; low cost biosorbent and lead

INTRODUÇÃO

Atualmente, a poluição ambiental por metais potencialmente tóxicos é um dos principais problemas ambientais, principalmente devido ao crescimento tecnológico e industrial.11 Ronda, A.; Martín-Lara, M. A.; Almendros, A. I.; Pérez, A.; Blázquez, G.; J. Taiwan Inst. Chem. Eng. 2015, 54, 45. A contaminação dos recursos hídricos com estes metais pode gerar problemas graves para o meio ambiente, para a saúde e para a qualidade de vida da população.22 Moreira, S. A.; Sousa, F. W.; Oliveira, A. G.; Nascimento, R. F.; Brito, E. S.; Quim. Nova 2009, 32, 1717. O chumbo (Pb) possui ampla aplicação industrial e consequentemente, o torna um dos principais contaminantes no meio ambiente. Além disso, o Pb é um dos elementos químicos mais tóxicos para saúde humana segundo a Organização Mundial de Saúde.33 Vanz, A.; Mirlean, N.; Baisch, P.; Quim. Nova 2003, 26, 25. As indústrias automotivas, aeronáuticas, de revestimento e de aço geram grandes quantidades de efluentes contendo em sua composição metais potencialmente toxicos. Assim, novas tecnologias e processos alternativos para o tratamento de efluentes industriais têm sido desenvolvidos, visando à redução da concentração de metais no meio ambiente. Dentre estes processos, a biossorção tem sido amplamente estudada para a remoção de vários compostos, incluindo os metais, visado o tratamento de águas e efluentes.44 Ferreira, J. M.; Silva, F. L. H.; Alsina, O. L. S.; Oliveira, L. S. C.; Cavalcanti, E. B.; Gomes, W. C.; Quim. Nova 2007, 30, 1188.

5 Meneghel, A. P.; Gonçalves Jr., A. C.; Strey, L.; Rubio, F.; Schwantes, D.; Casarin, J.; Quim. Nova 2013, 36, 1104.

6 Fontana, K. B.; Chaves, E. S.; Sanchez, J. D. S; Watanabe, E. R. L. R.; Pietrobelli, J. M.T.A.; Lenzi, G.G.; Ecotox. Environm. Safe. 2016, 124, 329.
-77 Montazer-Rahmatia, M. M.; Rabbani, P.; Abdolali, A.; Keshtkar, A. R.; J. Hazard. Mater. 2011, 185, 401.

O processo de biossorção emprega como adsorvente materiais de origem natural o que o torna uma alternativa, economicamente atrativa, para tratamento de águas e efluentes. Entre as características dos processos de tratamento por biossorção estão os baixos custos operacionais, minimização do volume de lodos químicos e/ou biológicos, alta eficiência, tratamento de efluentes muito diluídos e não requer utilização de nutrientes adicionais durante o processo.88 Kratochvil, D.; Volesky, B.; Advances in the Biosorption of Heavy Metals TIBTECH. 1998, 16, 291. Entretanto, a biossorção não substitui metodologias existentes, mas pode atuar como um complemento a processos que não são completamente eficientes.

Recentemente, diferentes materiais biológicos vêm sendo testados na remoção do Pb, tais como: resíduos de poda de oliveiras,99 Blázquez, G.; Martín-Lara, M. A.; Tenorio, G.; Calero, M.; Chem. Eng. J. 2011, 168, 170. macroalgas,1010 Ibrahim, W. M.; J. Hazard. Mater. 2011, 192, 1827. casca de laranja,1111 Feng, N.; Guo, X.; Liang, S.; Zhu, Y.; Liu, J.; J. Hazard. Mater. 2011, 185, 49. bagaço de cana,1212 Martín-Lara, M. Á.; Rico, I. L. R.; Vicente, I. C. A.; García, G. B.; Hoces, M. C.; Desalination 2010, 256, 58. entre outros. Contudo, há uma busca contínua por novos biossorventes que sejam de baixo custo e eficientes para a remoção de metais. Neste contexto, a casca do urucum apresenta-se como uma excelente alternativa de biossorvente, devido ao seu baixo valor agregado. O urucum (Bixa Orellana) é uma planta tropical que apresenta alto teor de bixina, um pigmento de grande interesse industrial. A planta originaria do norte da América do Sul, atualmente é amplamente cultivada em áreas tropicais para a produção comercial do pigmento. Este pigmento natural é obtido a partir das sementes, sendo amplamente utilizado nas indústrias de corantes e aromatizantes de alimentos, além de produtos têxteis, vernizes, cosméticos, etc.1313 Zongo, S.; Kerasidou, A. P.; Sone, B. T.; Diallo, A.; Mthunzi, P.; Iliopoulos, K.; Nkosi, M.; Maaza, M.; Sahraoui. B.; Appl. Surf. Sci. 2015, 340, 72.

14 Narváez, J. A.; Canché, B. B. C.; Pérez, P. F.; Madrid, R. R.; J. Plant Physiol. 2001,158, 1471.
-1515 Hagiwara, A.; Imai, N.; Ichihara, T.; Sano, M.; Tamano, S.; Aoki, H.; Yasuhara, K.; Koda, T.; Nakamura, M.; Shirai. T.; Food Chem. Toxicol. 2003, 41, 1157.

Este trabalho tem por objetivo avaliar a viabilidade do uso da casca de urucum como biossorvente de baixo custo para a remoção dos íons Pb(II) de solução aquosa. Foram avaliados diferentes parâmetros envolvidos no processo de biossorção, bem como o efeito da presença de íons interferentes e diferentes matrizes.

PARTE EXPERIMENTAL

Instrumentação

Todas as medidas de chumbo foram realizadas em um espectrômetro de absorção atômica AAnalyst 700, (Perkin Elmer-Sciex, Thornhill, Canada) em 283.3 nm utilizando chama ar-acetileno. A casca de urucum foi seca em estufa com circulação de ar forçado (SL102, Solab). As medidas de pH foram realizadas utilizando um pHmetro (mpA-210, Aaker) e as alíquotas de biomassa medidas em balança analítica (Mark, Bel Engeneering). Os experimentos em batelada foram realizados utilizando um banho metabólico com agitação (Dubnoff SL157, Solab) e as amostras centrifugadas em centrífuga (Excelsa Baby II 206-R, Fanem). A caracterização da biomassa foi realizada em espectrômetro de infravermelho com transformada de Fourier (Varian 7000) e microscópio eletrônico de varredura (Tescan, Vega 3 LMU) equipado com detector com sistema de energia dispersiva (EDS) (Oxford, AZTec Energy X-Act).

Reagentes e soluções

Todos os reagentes utilizados foram de grau analítico. A água ultra-pura com resistividade de 18 MΩ cm, purificada em purificador (Master All 2000, Gehaka). Soluções de HNO3 0,1 mol L-1 e NaOH 0,1 mol L-1 foram utilizadas para ajuste de pH das soluções. Solução estoque de chumbo (Pb(NO3)2) (Biotec) contendo 1000 mg L-1 foi utilizada para os experimentos de biossorção. Solução estoque de chumbo de 200 mg L-1 (Specsol) foi utilizada para os padrões de calibração.

Preparação do biossorvente

Os frutos maduros de urucum foram coletados no município de Treze de Maio, SC. A casca, utilizada como biossorvente, foi adequadamente separada das sementes, lavada com água destilada e seca a 50 ºC em estufa. Após a secagem, a casca do urucum foi moída e peneirada, onde frações de 0,12 a 2,00 mm foram separadas para o teste granulométrico. A biomassa foi utilizada em todos os experimentos de biossorção sem qualquer tratamento químico ou físico adicional.

Experimentos de biossorção em batelada

Os experimentos de biossorção foram realizados em batelada utilizando Erlenmeyers de 50 mL contendo 25 mL de solução de Pb(II) 100 mg L-1. O efeito dos seguintes parâmetros no processo de biossorção foi avaliado: tamanho das partículas (frações de 1,7 - 2,0 mm, 0,34 - 0,42 mm, 0,12 - 0,18 mm), pH (1,0 - 4,5), velocidade de agitação (0 - 150 rpm), dosagem de biossorvente (0,8 - 5,0 g L-1) temperatura (20 - 40 ºC) e tempo de contato (0 - 120 min). Após a biossorção uma alíquota das amostras foram centrifugadas a 5000 rpm durante 3 min e a concentração de Pb(II) remanescente na solução foi determinada por espectrometria de absorção atômica (AAS). Todos os experimentos foram realizados em triplicata e os resultados expressos como a média dos valores. A capacidade de biossorção (qe) foi obtida de acordo com a equação:

(1) q e = V ( C i - C f ) m

onde V é o volume da solução (L), Ci e Cf as concentrações inicial e final de Pb (II) (mg L-1) na solução, respectivamente e m é a massa de biossorvente (g).

Estudo cinético

Os experimentos foram realizados utilizando 25 mL de solução 100 mg L-1de Pb (II) e 70 mg de biossorvente em pH 4,5 ± 0,1 em Erlenmeyer de 50 mL. As amostras foram colocadas em um agitador (banho metabólico com agitação) a 120 rpm com temperatura controlada. As amostras foram coletadas em diferentes tempos de contato, centrifugadas, diluídas adequadamente e a concentração remanescente de Pb(II) na solução determinada. As temperaturas avaliadas nesse estudo foram de 20, 30 e 40 (± 2) ºC.

Estudo de equilíbrio

Os experimentos de equilíbrio foram realizados variando a massa de biossorvente de 20 a 125 mg, utilizando 25 mL de solução 100 mg L-1 de Pb(II) em pH 4,5 ± 0,1 e temperatura de 30 ºC. As amostras foram agitadas a 120 rpm durante tempo de contanto de 60 minutos, centrifugadas, diluídas adequadamente e a concentração remanescente de Pb(II) na solução determinada.

Efeito de matriz

Para avaliar o efeito de matriz na biossorção do Pb(II) pela casca de urucum, três diferentes matrizes foram utilizadas: água de poço, água de rio e água de torneira (rede de abastecimento público). Neste estudo, uma concentração de 100 mg L-1de Pb(II) foi adicionada às três diferentes matrizes. Uma amostra controle contendo água ultra-pura e 100 mg L-1de Pb(II) foi também avaliada. O processo de biossorção foi realizado utilizando 25 mL das amostras contendo adição de 100 mg L-1de Pb(II) em pH 4,5 ± 0,1 e usando 70 mg de biossorvente. Os experimentos foram conduzidos a temperatura de 30 ºC, a 120 rpm durante 60 minutos. Posteriormente as amostras foram centrifugadas, diluídas adequadamente e a concentração remanescente de Pb(II) em cada matriz foi determinada.

Efeito da interferência de Cu, Zn e Ni na biossorção do Pb (II)

Estes experimentos foram realizados utilizando 25 mL de solução 100 mg L-1de Pb (II) e 70 mg de biossorvente em pH 4,5 ± 0,1. Os experimentos foram conduzidos a temperatura de 30 ºC, a 120 rpm durante 60 minutos. Para avaliar o efeito da adição de Cu, uma série de soluções contendo uma concentração fixa de 100 mg L-1 de Pb(II) e concentração de Cu variando de 0 - 100 mg L-1. O mesmo procedimento foi realizado para avaliar o efeito da adição de Zn e Ni na biossorção do Pb(II). A concentração remanescente de Pb(II) foi determinada em cada solução.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Caracterização do biossorvente

Os espectros de FTIR da casca do urucum antes e após a biossorção do Pb(II) estão apresentados na Figura 1. Os espectros mostram a presença de muitos grupos funcionais, indicando a natureza complexa do biossorvente. O espectro de FTIR antes da biossorção apresenta uma ampla banda em 3377 cm-1, indicando a presença de grupos -OH e -NH. As bandas em 2915 cm-1 e 2848 cm-1 são atribuídos ao estiramento simétrico e assimétrico dos grupos -CH2 e -CH3. Bandas intensas na região de 1636 cm-1 e 1044 cm-1 correspondem ao estiramento dos grupos C=O e C-O respectivamente. O espectro de FTIR para a casca de urucum após a biossorção dos íons Pb(II) apresentou uma forte redução na intensidade desses bandas, indicando o envolvimento desses grupos funcionais na biossorção.

Figura 1
Espectro de FTIR (a) antes e (b) após a biossorção do Pb(II)

A Figura 2 apresenta as imagens obtidas por microscopia eletrônica de varredura com detector EDS (MEV/EDS), para casca de urucum antes e após a biossorção de Pb (II). Nas imagens de MEV observa-se que a estrutura/superfície do material biossorvente apresenta-se irregular e em algumas partes é possível visualizar microfibrilas de celulose cristalina organizadas. Na análise de EDS, constatou-se que na casca de urucum antes da biossorção (Figura 2 A) o Pb (II) não foi detectado, porém após o processo de biossorção (Figura 2 B) observa-se claramente a presença de Pb (II), evidenciando assim a sorção deste elemento na casca de urucum.

Figura 2
MEV/EDS para casca de urucum, (A) antes da biossorção (B) após a biossorção de Pb(II)

Efeito da granulometria

A granulometria do biossorvente pode exercer uma influência expressiva no processo de biossorção. Neste estudo, frações granulométricas de 1,7 - 2,0 mm, 0,34 - 0,42 mm, 0,12 - 0,18 mm e também mistura com todas as frações granulométricas (partículas < 2,0 mm), foram avaliadas. Os resultados mostraram que não houve diferença significativa na capacidade de remoção do Pb(II) para nenhuma das frações analisadas, sendo a mistura granulométrica selecionada para prosseguir os experimentos.

Efeito do pH e da velocidade de agitação

O pH da solução pode ser considerado um dos parâmetros mais importantes no processo de biossorção. O efeito do pH na capacidade de biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi avaliado e os resultados estão apresentados na Figura 3A. Como pode ser observado a capacidade de biossorção aumenta com a elevação do pH de 1,0 até 3,0 e mantem-se praticamente constante até pH 4,5. Diversos estudos têm relatado o efeito negativo da remoção de metais por biossorção em baixos valores de pH. Esse comportamento pode ser devido ao fato que a alta concentração e alta mobilidade dos íons H+, levam a biossorção preferencial dos íons hidrogênios em vez dos íons metálicos. Entretanto, neste estudo em valores de pH superiores a 5,0 foi observado a precipitação de espécies de Pb(II). Assim, valor de pH de 4,5 foi selecionado para evitar a influência do processo de precipitação nos resultados de biossorção.

Figura 3
Efeito (A) do pH e (B) da velocidade de agitação na biossorção do Pb(II) pela casca de urucum. (Ci Pb(II): 100 mgL-1; biossorvente: 100 mg; 30 °C;60 min)

A velocidade de agitação é outro parâmetro que pode ter grande influência nos processos de biossorção, uma vez que pode influenciar na distribuição do soluto na solução. O efeito da velocidade de agitação na biossorção do Pb(II) foi avaliada variando a agitação de 0 a 150 rpm e os resultados estão apresentados na Figura 3B. Como pode ser observado, a capacidade de biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi favorecida com o aumento da velocidade de agitação. A velocidade de agitação de 120 rpm foi selecionada para os experimentos seguintes.

Efeito da dosagem de biossorvente

O efeito da dosagem de biossorvente na biossorção do Pb(II) está apresentado na Figura 4. Como pode ser observado, a porcentagem de remoção aumenta rapidamente com o aumento da dosagem de biossorvente até 2,8 g L-1, onde a máxima biossorção foi obtida. Após essa dosagem não houve mudança significativa na remoção do Pb(II) pela casca de urucum. O aumento na porcentagem de remoção está associado ao aumento de sítios disponíveis para a biossorção com o aumento da dosagem de biomassa. No entanto, a capacidade de biossorção de Pb(II) diminuiu com o aumento da dosagem de biossorvente. Essa diminuição pode ser atribuída ao gradiente de concentração entre o adsorvente e o adsorbato, um aumento na dosagem de biomassa resulta em uma redução da quantidade de chumbo biossorvido por unidade de massa de casca de urucum. Assim, a dosagem ótima de biossorvente selecionada para os demais experimentos foi de 2,8 g L-1.

Figura 4
Efeito da dosagem de biossorvente. (Ci Pb(II): 100 mg L-1; pH 4,5; 30 °C; 60 min; 120 rpm)

Estudo cinético

O efeito do tempo de contato em diferentes temperaturas na capacidade de biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi avaliado e os resultados estão apresentados na Figura 5. Uma alta taxa de biossorção foi observada nos minutos iniciais do processo para todas as temperaturas avaliadas, e posteriormente, a capacidade de biossorção aumenta gradualmente até alcançar o equilíbrio em 60 minutos. Um rápido processo de biossorção é uma característica importante de um biossorvente para a aplicação prática no tratamento de águas residuais. A avaliação das curvas cinéticas mostra que o processo de biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi mais rápido na temperatura mais alta avaliada (40ºC), indicando o caráter endotérmico do processo.

Figura 5
Efeito do tempo de contato na biossorção em diferentes temperaturas. (Ci Pb(II): 100 mg L-1; biossorvente: 70 mg; pH 4,5; 120 rpm)

A fim de analisar a cinética de biossorção do Pb (II) pela casca de urucum, os modelos cinéticos de pseudo-primeira ordem, pseudo-segunda ordem, Elovich e difusão intrapartícula foram aplicados (Figura 6).

Figura 6
Modelos cinéticos: (A) pseudo-primeira ordem,(B) pseudo-segunda ordem, (C) Elovich e (D) difusão intrapartícula para biossorção do Pb(II) pela casca de urucum

A forma linear do modelo de pseudo-primeira ordem pode ser definida como:1616 Ding, Y.; Jing, D.; Gong, H.; Zhou, L.; Yang. X.; Bioresour. Technol. 2012, 114, 20.

(2) l o g ( q e - q t ) = l o g ( q e ) - ( k 1 2 , 303 ) t

onde qe e qt são as quantidade sorvidas (mg g-1) no equilíbrio e no tempo t, respectivamente, e a constante de velocidade de pseudo-primeira ordem é dada por k1 (min-1).

O modelo de pseudo-segunda ordem pode ser escrito na sua forma linear de acordo com a seguinte equação:1717 Sarı, A.; Uluozlü, O., D.; Tüzen. M.; Chem. Eng. J. 2011, 167, 155.

(3) t q t = 1 k 2 q e 2 + 1 q e t

onde k2 é a constante de velocidade de pseudo-segunda ordem (g mg-1 min-1).

O modelo de Elovich pode ser representado pela equação:

(4) q t = 1 b l n ( a b ) + 1 b l n ( t )

onde os parâmetros a e b são a taxa de sorção inicial (mg g-1 min-1) e a constante de dessorção (g mg-1), respectivamente.1818 Tang, Y.; Chen, L.; Wei, X.; Yao, Q.; Li, T.; J. Hazard. Mater. 2013, 244, 603.

O modelo de difusão intrapartícula pode ser expresso pela equação:

(5) q t = k d i f t + C

onde kdif é a contante de difusão intrapartícula e C (mg g-1) é o intertercepto.1919 Akar, T.; Celik, S.; Akar, S. T.; Chem. Eng. J. 2010, 160, 466.

A Tabela 1 apresenta os parâmetros e os coeficientes de correlação (R2) para os modelos cinéticos aplicados nas diferentes temperaturas avaliadas. Como pode ser observado, os dados experimentais para a biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foram melhores descritos pelo modelo de pseudo-segunda ordem, que apresentou os maiores coeficientes de correlação (> 0.999) nas temperaturas avaliadas (Figura 6B). Além disso, os valores de qe calculado foram concordantes com os valores de qe experimental. Com o aumento da temperatura, a constante de velocidade de pseudo-segunda ordem passou de 0,95 x 10-2 para 1,83 x 10-2 g mg -1 min-1. O modelo de pseudo-segunda ordem adota que a força motriz de adsorção é a diferença entre a concentração da fase sólida, em qualquer tempo do processo, e a concentração da fase sólida no equilíbrio, sendo a taxa de adsorção global proporcional ao quadrado da força motriz.2020 Yang, X.; Al-douri, B.; J. Colloid Interf. Sci. 2005, 287, 25. Além disso, este considera que a cinética de adsorção é principalmente controlada pela difusão externa, indicando que a resistência a transferência de massa ocorre na camada externa do adsorvente.2121 Ho, Y. S.; Mckay, G.; Process Biochem. 1998, 34, 451.

Tabela 1
Parâmetros dos modelos cinéticos para biossorção do Pb(II) pela casca de urucum

O modelo cinético de Weber e Morris é geralmente utilizado para avaliar o processo de difusão intrapartícula. Como pode ser observado (Figura 6D), o plote de qt versus t para as temperaturas avaliadas apresentam-se linear no estágio inicial, mas não passam pela origem. Este comportamento indica que a difusão intrapartícula não é a etapa limitante no processo de biossorção do Pb(II) e provavelmente outros mecanismos devem estar atuando nesse processo.1919 Akar, T.; Celik, S.; Akar, S. T.; Chem. Eng. J. 2010, 160, 466.

A energia de ativação pode ser descrita como a energia cinética mínima necessária para uma reação ocorrer e fornece uma estimativa da barreira energética que o adsorbato tem que superar antes da biossorção.2222 Taşar, S.; Kaya, F.; Özer, A.; J. Environ. Chem. Eng. 2014, 2, 1018. A energia de ativação pode ser obtida por meio da constante de velocidade de pseudo-segunda ordem em diferentes temperaturas utilizando a equação de Arrhenius, a qual é definida como:

(6) l n k 2 = l n A - E a R T

onde Ea (J mol-1) é a energia de ativação, A (g mg-1 min-1) é a constante de Arrhenius, R (8,314 J mol-1 K-1) é a constante dos gases ideais, e T ( K ) é a temperatura da solução.

A energia de ativação para o processo de biossorção do íon Pb (II) foi obtido pelo plote de lnk2 versus 1 / T.

A energia de ativação pode ajudar a prever se o processo de sorção é físico ou químico. O valor da Ea encontrado nesse estudo foi de 0,35 kJ mol-1, indicando que o processo de sorção é físico, pois neste processo de sorção os valores de energia de ativação são geralmente menores que 4,2 KJ mol-1 por serem fracas as forças envolvidas no processo. Normalmente, em processos envolvendo sorção química os valores de Ea são superiores a 4,2 KJ mol-1.2323 Saini, A. S.; Melo, J. S.; Bioresour. Technol. 2013, 149, 155.

Estudo de equilíbrio

Geralmente isotermas de adsorção são aplicadas para analisar os dados experimentais de equilíbrio de biossorção. Nesse estudo os modelos de isotermas de Langmuir e Freundlich foram aplicados. O modelo de Langmuir pode ser descrito conforme a equação:2424 Ullah, I.; Nadeem, R.; Iqbal, M.; Manzoor. Q.; Ecol. Eng. 2013, 60, 99.

(7) C e q e = C e q max + 1 K L q max

onde, qmax é a capacidade máxima de biossorção (mg g-1) e KL a constante de Langmuir (L mg-1) relacionada com a energia de biossorção.

As características essenciais da isoterma de Langmuir podem ser expressas por meio de um fator de separação adimensional constante (RL), definida como:

(8) R L = 1 1 + K L C 0

O valor de RL indica se a isoterma de biossorção é favorável (0 <RL< 1), desfavorável (RL> 1), linear (RL = 1) ou irreversível (RL = 0).2525 Yao, Z. Y.; Qi, J. H.; Wang, L. H.; J. Hazard. Mater. 2010, 174, 137. O valor de RL obtido para a biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi de 2,29 x 10-3, indicando que o processo de biossorção é favorável.

O modelo de isoterma de Freundlich pode ser descrito como:2626 Sarı, A.; Tuzen, M.; Soylak, M.; J. Hazard. Mater. 2007, 144, 41.

(9) l o g q e = log ( K F ) + 1 n log C e

onde KF e n são as constantes de Freundlich que são, respectivamente, definidas como a capacidade de biossorção e intensidade de biossorção.

Os parâmetros e os respectivos coeficientes de correlação (R2) obtidos para os modelos de isotermas aplicados são apresentados na Tabela 2. Os resultados mostram que o modelo de isoterma de Langmuir apresentou o maior valor de R2, sendo o mais apropriado para descrever o equilíbrio de biossorção do Pb(II) pela casca de urucum. A isoterma de Langmuir também é o modelo mais apropriado para descrever o equilíbrio de biossorção do Pb(II) em casca de laranja1111 Feng, N.; Guo, X.; Liang, S.; Zhu, Y.; Liu, J.; J. Hazard. Mater. 2011, 185, 49., macroalga1010 Ibrahim, W. M.; J. Hazard. Mater. 2011, 192, 1827., celulas funcionalizadas.2727 Ma, X.; Cui, W.; Yang, L.; Yang, Y.; Chen, H.; Wang, K.; Bioresour. Technol. 2015, 185, 70.

Tabela 2
Parâmetros dos modelos de isotermas para biossorção do Pb(II) pela casca de urucum

A capacidade máxima de biossorção (qmax) obtida nesse estudo foi de 43,6 mg g-1. A comparação entre os valores de qmax para biossorção de Pb (II) pela casca de urucum com os da literatura (Tabela 3), mostram que a casca de urucum apresenta uma boa eficiência de sorção. Além disso, é uma biomassa de baixo custo e pode ser utilizada sem tratamento prévio, características fundamentais para escolha de um biossorvente.

Tabela 3
Comparação da capacidade máxima de biossorção do Pb(II) pela casca urucum com outros biossorventes da literatura

Efeito de matriz e interferência de íons metálicos

Durante os processos de biossorção a matriz das amostras de águas e/ou efluentes pode exercer grande influência devido à presença de compostos orgânicos e inorgânicos. O efeito da matriz e a interferência de íons metálicos foram avaliados e os resultados estão apresentados na Figura 7.

Figura 7
Efeito de matriz (A)e da interferência dos íons Cu, Zn e Ni(B) na biossorção do Pb(II) pela casca de urucum. (Ci Pb(II): 100 mg L-1; biossorvente: 70 mg; 30 °C; pH 4,5; 60 min; 120 rpm)

O efeito de matriz sobre a biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi avaliado em amostras reais de água de rio, poço e rede de abastecimento e os resultados comparados com o padrão de Pb(II) diluído em agua ultra-pura (Figura 7A). Como pode ser observado, para as matrizes avaliadas, não houve redução significativa na capacidade de biossorção de Pb(II) em relação a amostra preparada com água ultra-pura. Os efluentes industriais podem conter muitos outros cátions dentre os mais comuns estão o cobre, zinco, níquel, etc., que podem competir e interferir na biossorção do Pb(II). Os resultados obtidos para a avaliação da interferência dos íons Cu, Zn e Ni na biossorção do Pb (II) pela casca do urucum estão apresentados na Figura 7B. Como pode ser observado a capacidade de biossorção do Pb(II) foi levemente reduzida pela presença desses metais, em todas as concentrações de Cu, Zn e Ni avaliadas. Entretanto, aumentando a concentração de Cu, Zn e Ni na solução, a capacidade de biossorção do Pb(II) diminui progressivamente, mas não de forma muito expressiva.

Estudo termodinâmico

O comportamento termodinâmico da biossorção do Pb(II) pela casca de urucum foi investigado através da avalição dos parâmetros termodinâmicos. Variações da energia livre de Gibbs (ΔG°), entalpia (ΔH°) e entropia (ΔS°) foram calculadas utilizando as seguintes equações:3333 Akar, S. T.; Gorgulu, A.; Anilan, B.; Kaynak, Z.; Akar, T.; J. Hazard. Mater. 2009, 165, 126.

(10) k d = q e c e
(11) Δ G o = - R T l n k d
(12) l n k d = - Δ H o R T + Δ S o R

Os valores de ΔH° e ΔS° foram determinados pelos coeficientes angular e linear da reta de lnkd versus 1/T e os resultados estão apresentados na Tabela 4. A energia livre de Gibbs é um critério fundamental da espontaneidade do processo, sendo um processo considerado espontâneo em uma determinada temperatura quando o valor de ΔG for negativo. Os valores negativos de ΔG° obtidos nas diferentes temperaturas, Tabela 4, indicam que a biossorção do Pb(II) é um processo espontâneo. Os valores positivos de ΔH°e de ΔS° indicam que o processo é endotérmico e que a randomicidade na interface biossorvente/solução aumenta durante o processo de biossorção, respectivamente.

Tabela 4
Parâmetros termodinâmicos para biossorção do Pb (II) pela casca de urucum

CONCLUSÃO

A casca de urucum (Bixa Orellana) demonstrou ser uma excelente alternativa para biossorção de Pb(II) em soluções aquosas, principalmente devido a sua alta eficiência de remoção, baixo custo e possibilidade de utilização sem nenhum tratamento prévio. A interação entre os íons de chumbo e a casca de urucum foi comprovada pelos espectros de FTIR e MEV/EDS. A isoterma de Langmuir foi a que melhor descreveu os dados equilíbrio, sendo a capacidade de biossorção de 43,6 mg g-1 a 30 ± 2 ºC. A cinética de biossorção seguiu o modelo de pseudo-segunda-ordem. Os valores negativos de ΔG° obtidos nas diferentes temperaturas, indicam que a biossorção do Pb (II) é um processo espontâneo.

AGRADECIMENTOS

À Universidade Tecnologia Federal do Paraná, Sanepar, CNPq e Fundação Araucária.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov 2016

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2016
  • Aceito
    11 Abr 2016
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