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Progresso da brusone nas folhas e características agronômicas nas gerações avançadas de somaclones aromáticos da cultivar de arroz IAC 47

Progress of leaf blast and other agronomic characteristics in advanced generations of aromatic somaclones of rice cultivar IAC 47

Resumos

Foram conduzidos experimentos de campo por três anos utilizando somaclones da cultivar de arroz (Oriza sativa) de terras altas IAC 47. A variação para resistência à brusone e para outras características agronômicas foram avaliadas nas gerações avançadas de R5, R6 e R7. O progresso lento da brusone foi medido baseado na área sob a curva de progresso de doença (ASCPD) e taxa aparente de infecção (r). As correlações nas gerações R6 e R7 em relação a ASCPD e r foram positivas e altamente significantes. Os somaclones também mostraram dois tipos distintos de plantas, um com folha ereta verde escura e outro com folha decumbente verde-amarela, arquiteturas diferentes do tipo de planta da cultivar IAC 47, a qual é caracterizada por folha decumbente verde-palha. Todos os somaclones exibiram característica aromática do grão. Os somaclones mostraram também variação para tipo de grão, altura, duração do ciclo, peso de grãos de 100 panículas e produtividade. Foram identificados dois somaclones SCIA02 e SCIA06 que mostraram progresso lento de doença, precocidade e alto potencial de produtividade, comparados à cultivar parental IAC 47, além de possuir característica aromática e tipo de planta com folha ereta verde-escura. Estes somaclones podem ser utilizados como novas fontes de resistência à brusone no melhoramento de arroz de sequeiro.

cultura de tecidos; epidemiologia; Oryza sativa; Pyricularia grisea


Field trials were conducted over three seasons with somaclones derived from the upland rice (Oriza sativa) cultivar IAC 47. Variation for rice blast resistance and other agronomic traits were assessed in the advanced generations of R5, R6, and R7. The slow blasting resistance was evaluated based on the area under disease progress curve (AUDPC) and apparent infection rate (r). The correlations between R6 and R7 generations in relation to AUDPC as well as r were positive and highly significant. Somaclones also showed two distinct plant types, one with erect bright green leaves and other with droopy yellow green leaves different from the plant type of cultivar IAC 47 which is characterized by droopy pale green leaves. All somaclones exhibited aromatic grain characteristic. Somaclones also showed variation in grain type, height, growth duration, panicle grain weight and grain yield. Two somaclones SCIA02 and SCIA06 were identified that showed slow blasting resistance, early growth duration, and high yield potential compared to the parent cultivar IAC 47 besides the aromatic grain characteristic and plant type with erect bright green leaves. They can be used as new blast resistant sources for upland rice improvement.


PROGRESSO DA BRUSONE NAS FOLHAS E CARACTERÍSTICAS AGRONÔMICAS NAS GERAÇÕES AVANÇADAS DE SOMACLONES AROMÁTICOS DA CULTIVAR DE ARROZ IAC 47

LEILA G. ARAÚJO & ANNE S. PRABHU

Embrapa Arroz e Feijão, Cx. Postal 179, CEP 75375-000, Santo Antônio de Goiás, GO, fax: (062) 833-2100, e-mail: leilag@cnpaf.embrapa.br, prabhu@cnpaf.embrapa.br

(Aceito para publicação em 15/05/2001)

Autor para correspondência: Leila G. Araújo

RESUMO

Foram conduzidos experimentos de campo por três anos utilizando somaclones da cultivar de arroz (Oriza sativa) de terras altas IAC 47. A variação para resistência à brusone e para outras características agronômicas foram avaliadas nas gerações avançadas de R5, R6 e R7. O progresso lento da brusone foi medido baseado na área sob a curva de progresso de doença (ASCPD) e taxa aparente de infecção (r). As correlações nas gerações R6 e R7 em relação a ASCPD e r foram positivas e altamente significantes. Os somaclones também mostraram dois tipos distintos de plantas, um com folha ereta verde escura e outro com folha decumbente verde-amarela, arquiteturas diferentes do tipo de planta da cultivar IAC 47, a qual é caracterizada por folha decumbente verde-palha. Todos os somaclones exibiram característica aromática do grão. Os somaclones mostraram também variação para tipo de grão, altura, duração do ciclo, peso de grãos de 100 panículas e produtividade. Foram identificados dois somaclones SCIA02 e SCIA06 que mostraram progresso lento de doença, precocidade e alto potencial de produtividade, comparados à cultivar parental IAC 47, além de possuir característica aromática e tipo de planta com folha ereta verde-escura. Estes somaclones podem ser utilizados como novas fontes de resistência à brusone no melhoramento de arroz de sequeiro.

Palavras-chave: cultura de tecidos, epidemiologia, Oryza sativa, Pyricularia grisea.

ABSTRACT

Progress of leaf blast and other agronomic characteristics in advanced generations of aromatic somaclones of rice cultivar IAC 47

Field trials were conducted over three seasons with somaclones derived from the upland rice (Oriza sativa) cultivar IAC 47. Variation for rice blast resistance and other agronomic traits were assessed in the advanced generations of R5, R6, and R7. The slow blasting resistance was evaluated based on the area under disease progress curve (AUDPC) and apparent infection rate (r). The correlations between R6 and R7 generations in relation to AUDPC as well as r were positive and highly significant. Somaclones also showed two distinct plant types, one with erect bright green leaves and other with droopy yellow green leaves different from the plant type of cultivar IAC 47 which is characterized by droopy pale green leaves. All somaclones exhibited aromatic grain characteristic. Somaclones also showed variation in grain type, height, growth duration, panicle grain weight and grain yield. Two somaclones SCIA02 and SCIA06 were identified that showed slow blasting resistance, early growth duration, and high yield potential compared to the parent cultivar IAC 47 besides the aromatic grain characteristic and plant type with erect bright green leaves. They can be used as new blast resistant sources for upland rice improvement.

INTRODUÇÃO

A brusone, cujo agente causal é o fungo Pyricularia grisea (Cook) Sacc., constitui-se em uma das doenças mais destrutivas em arroz (Oriza sativa L.) de terras altas no Brasil. A brusone nas folhas durante a fase vegetativa causa redução na estatura da planta, no número de perfilhos, no número de grãos por panícula e no peso de grãos, além dos efeitos indiretos na produtividade causados pela redução na taxa de fotossíntese e respiração (Bastiaans et al., 1994).

O principal componente no manejo da brusone é a resistência genética, para alcançar os objetivos de uma agricultura sustentável e evitar a dependência de produtos químicos no seu controle. A cultivar IAC 47 foi a mais plantada no Brasil desde seu lançamento em 1973, devido a sua tolerância à deficiência hídrica e adaptação às condições de solo de cerrado. Um dos fatores limitantes a sua produtividade foi a alta suscetibilidade à brusone, necessitando melhoramento para incorporação da resistência à P. grisea. Os métodos convencionais através de cruzamentos desta cultivar com doadores de resistência à P. grisea, normalmente de arroz irrigado, resultam na maioria dos casos, em características não desejáveis como mancha de grãos (Prabhu & Ferreira, 1989).

A variação somaclonal foi proposta como método de aumentar a variação genética para resistência às doenças e outras características agronômicas no melhoramento das cultivares adaptadas às condições locais (Duval et al., 1998). Algumas características morfológicas e agronômicas como coloração da arista do grão e apículo, altura, perfilhamento, tipo de planta, floração, peso de grãos e rendimento, obtidas por variação somaclonal, demonstraram ser herdáveis em arroz. A maioria das características são controladas por um ou poucos genes (Mandal & Bandyopadhyay, 1996). Muitas características quantitativas como tolerância à salinidade, toxidez de alumínio e tolerância à herbicida têm base celular (Mandal et al., 1999).

Somaclones com diferentes graus de resistência à brusone foram obtidos a partir de cultivares suscetíveis de arroz (Chauhan et al., 1996). No Brasil foram obtidos somaclones da cultivar de arroz Araguaia com resistência vertical e parcial à brusone e planta tipo leque (Araújo et al., 2000). Foram obtidos, também, resultados promissores com o desenvolvimento de somaclones da cultivar de arroz IAC 47 que apresentaram diversos graus de resistência parcial à brusone nas gerações iniciais (Araújo et al., 1997). Entretanto, em alguns casos, as características desejáveis não expressam estabilidade nas gerações subseqüentes e, freqüentemente, a maioria dos variantes fenotípicos são deletérios (Zheng et al., 1989).

O presente trabalho objetivou estudar o grau de resistência à brusone e algumas características agronômicas nas gerações avançadas de somaclones da cultivar de arroz IAC 47.

MATERIAL E MÉTODOS

O procedimento de desenvolvimento de somaclones consistiu na indução de calos e regeneração de plantas a partir de panículas imaturas da cultivar de arroz IAC 47, seleção de plantas resistentes nas gerações R2 e R3, avanço da geração R4, reavaliação da resistência à brusone e de outras características agronômicas nas gerações R5, R6 e R7. A nomenclatura proposta por Yurkova et al. (1982) foi utilizada, sendo R1 regenerante primário, R2, R3, R4, R5 e R6, a primeira, segunda, terceira, quarta e quinta progênies autofecundadas.

A geração R4 foi avançada através da multiplicação das sementes coletadas de plantas individuais da geração R3. As sementes provenientes de cada planta foram semeadas em uma linha de 2 m, em Junho de 1995 e irrigadas por inundação. Procedeu-se a colheita massal de 20 plantas R4 de cada somaclone, totalizando 41 somaclones.

Na geração R5 foi realizado um experimento de campo em condições de terras altas na safra 1995/96 com 17 somaclones e a cultivar IAC 47, em um latossolo Vermelho-Amarelo Distrófico. O delineamento experimental foi o de blocos completos casualizados com três repetições. O solo foi adubado com 300 kg/ha da fórmula 4-30-16, 25 kg/ha de N, na forma de sulfato de amônio e 5 kg/ha de Zn, na forma de sulfato de zinco, no sulco, por ocasião do plantio. Utilizou-se o espaçamento de 0,3 m e uma densidade de semeadura de 80 sementes/m. Cada parcela constituiu-se de cinco linhas de 4 m, com área total de 6 m2. Trinta dias antes do plantio do experimento, uma bordadura com três linhas de uma mistura das cultivares suscetíveis IAC 47, IAC 25, IAC 165 e IRAT 112 em proporções iguais, foi semeada perpendicular às linhas das parcelas. A brusone nas folhas foi avaliada com base no número de lesões esporulativas por folha e severidade. Para a determinação do número de lesões esporulativas foram utilizados os perfilhos principais de dez plantas tomados ao acaso em três linhas centrais, 40 dias após o plantio. A severidade, expressa em porcentagem de área foliar afetada, foi determinada em três folhas superiores completamente abertas, dos perfilhos principais de dez plantas, em três linhas centrais da parcela, 49 dias após o plantio. Utilizou-se uma escala de dez graus (0; 0,5; 1,0; 2,0; 4,0; 8,0; 16,0; 32,0; 64,0; 82,0% de área foliar afetada) de acordo com Notteghem (1981). A severidade da brusone, também foi avaliada em 100 panículas, em três linhas centrais, dez dias antes da colheita, utilizando uma escala de cinco graus (0, 5, 25, 50, 75 e 100% de espiguetas infetadas por panícula). Avaliou-se também o peso dos grãos de 100 panículas coletadas nas três linhas centrais. A semente R5 dos demais somaclones foi multiplicada em vasos, em casa de vegetação.

Em R6 foram realizados dois experimentos de campo, um deles com 41 somaclones e o outro com 17, na safra 1996/97. No primeiro foi utilizado o delineamento de blocos ao acaso com três repetições e as parcelas consistiram de uma linha de 2 m, espaçadas de 0,35 m. A adubação foi a mesma usada para geração R5. Avaliou-se a incidência da brusone nas folhas em cinco plantas de cada parcela tomadas ao acaso, 30 dias após o plantio. A incidência, em porcentagem, foi calculada com base na relação entre o número de folhas infetadas e o total de folhas. Para análise de variância os dados da incidência foram transformados em arco seno onde x é a porcentagem de folhas infetadas. Avaliou-se também a severidade da brusone nas folhas utilizando a mesma escala da geração R5. Foram realizadas seis observações seriais em intervalos de três a quatro dias para se plotar a curva de progresso de doença. A área sob a curva de progresso da doença (ASCPD) nas folhas foi calculada para cada genótipo de acordo com Shaner & Finney (1977). Para a análise de variância os dados de ASCPD foram transformados utilizando log10. A taxa de aumento da brusone com o tempo, ou taxa aparente de infecçãom (r), foi calculada pelo método de regressão linear, após a transformação das proporções da brusone para loge[y/(1-y)], segundo Vanderplank (1963). O coeficiente de determinação foi usado para testar a significância das regressões lineares. As significâncias de r de cada somaclone e da cultivar IAC 47 foram testadas através do teste t, de acordo com Snedecor & Cochran (1978). Foi feita a análise de regressão e correlação entre a incidência, r e ASCPD. Foram avaliadas também algumas características agronômicas, incluindo a altura da planta, o comprimento da panícula, a porcentagem de grãos cheios, o tipo de planta, a duração do ciclo, o tipo de grão e o aroma. A altura foi medida em uma planta ao acaso. O comprimento da panícula e a porcentagem de grãos cheios foram baseados em uma amostra ao acaso de três panículas. O potencial de produção dos somaclones foi medido com base no peso de grãos de 100 panículas. Foi realizada a análise de variância para altura, comprimento da panícula, porcentagem de grãos cheios e peso de grãos de 100 panículas. O tipo de grão foi avaliado com base em uma escala de quatro graus (T0 = grão igual a cultivar IAC 47, com apículo preto e sem arista; T1 = grão com arista vermelha; T2 = grão com apículo branco e sem arista; T3 = grão com arista preta). O teste do aroma foi realizado no emborrachamento utilizando 2 g da penúltima folha. O método consiste na imersão de 2 g de folha picada em 10 ml de solução de KOH a 1,7% em tubos de ensaio por 10 min a uma temperatura de 30 ºC (Sood & Siddiq, 1978). Os somaclones foram classificados como aromáticos com base no aroma emitido no tubo, através do cheiro.

No segundo experimento da geração R6 foi utilizado o delineamento de blocos completos cazualizados com três repetições e as parcelas consistiram de cinco linhas de 4 m espaçadas de 0,35 m. Foram avaliados o número de grãos totais por panícula, degranação, severidade da brusone nas panículas e produtividade. O número de grãos totais foi medido em uma amostra de oito panículas. Para a leitura de degranação utilizou-se cinco panículas e fez-se a leitura com base em uma escala de três graus (1 = poucos grãos removidos das panículas; 2 = 25-50% de grãos removidos e 3 = mais que 50% de grãos removidos). A produtividade, ajustada para 13% de umidade, baseou-se na área útil de 2,62 m2.

Na geração R7 realizaram-se dois experimentos de campo, um com 41 somaclones e outro com 17 na safra 1997/98. No primeiro utilizou-se o mesmo delineamento experimental e adubação da geração R6, mas as parcelas consistiram de quatro linhas de 2 m, espaçadas de 0,35 m. A ASCPD e r foram avaliadas da mesma maneira que em R6. Fez-se a análise de regressão e correlação dos valores de ASCPD entre somaclones das gerações R6 e R7, bem como de r. Avaliou-se também o tipo de planta, duração do ciclo, tipo de grão e aroma. O segundo experimento de campo foi semelhante ao realizado em R7, mas a parcela consistiu de quatro linhas de 5 m de comprimento. Avaliou-se o peso de grãos de 100 panículas e a produtividade em uma área útil de 3,2 m2.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As diferenças entre os somaclones em relação ao número de lesões por folha e a severidade na fase vegetativa foram significativas (Tabela 1). Dos 17 somaclones avaliados, SCIA14, SCIA01 e SCIA02 diferiram significativamente da cultivar IAC 47. Somente SCIA14 diferiu significativamente da cultivar IAC 47 quanto à brusone nas panículas. Os somaclones SCIA14, SCIA01 e SCIA02, que apresentaram maior grau de resistência à brusone nas folhas, não diferiram da cultivar IAC 47 quanto ao peso de grãos de 100 panículas (Tabela 1). Estes resultados indicaram variação entre os somaclones para resistência à brusone e peso de grãos de 100 panículas nas linhas R5 homozigotas (Tabela 1). Com base nestes resultados o trabalho foi ampliado utilizando 41 somaclones R5 multiplicados e colhidos em casa de vegetação para os estudos subseqüentes.

A incidência da brusone nas folhas, expressa pela porcentagem de folhas com lesões esporulativas, variou de 17,7 a 57,8% entre os somaclones, não diferindo da cultivar IAC 47. Considerando a área sob a curva de progresso dos somaclones R6, sete apresentaram valores significativamente menores do que a cultivar IAC 47. Entre 41 somaclones, 21 e seis apresentaram valores de r menores e maiores em relação à cultivar IAC 47, respectivamente (Tabela 2). A relação entre incidência e ASCPD não foi linear, pois a ASCPD aumentou de maneira logarítmica com o aumento da porcentagem da incidência da brusone nas folhas (Figura 1A). Entretanto, a relação entre r e ASCPD foi linear e positiva (Figura 1B), sendo a correlação significativa (R2 = 0,96). Segundo o progresso da brusone nas folhas nos somaclones SCIA06 e SCIA02 e na cultivar IAC 47 (Figura 2), os valores de r dos somaclones SCIA02 (0,005) e SCIA06 (0,0016) foram menores que o da cultivar IAC 47 (0,013) indicando progresso lento da brusone nas condições de campo na geração R6.




O termo progresso lento da brusone foi utilizado como sinônimo de resistência de campo para descrever a capacidade do arroz em reduzir a velocidade de desenvolvimento da brusone sem nenhuma conotação genética (Ahn, 1981). A taxa aparente de infecção tem sido um parâmetro indicado para comparar as cultivares quanto ao grau de resistência horizontal (Vanderplank, 1963). A taxa varia não somente com a resistência, mas também com o estágio de desenvolvimento da cultivar e localidade (Prabhu & Bedendo, 1991). Prabhu et al. (1996) ainda mostraram que é necessário utilizar mais que um critério para identificar genótipos caracterizados por progresso lento da brusone. A correlação entre ASCPD e r indica a precisão e consistência dos dados.

A altura foi significativamente menor para SCIA01, SCIA04, SCIA24, SCIA39 e SCIA41 e maior para SCIA17, SCIA19, SCIA25, e SCIA32 comparados à cultivar IAC 47 (Tabela 3). Os somaclones não diferiram da cultivar IAC 47 quanto ao comprimento de panícula, porcentagem de grãos cheios e peso de grãos por 100 panículas, entretanto, apresentaram dois tipos de plantas distintos, um com folha ereta verde-escura (EVE) e outro com folha decumbente verde-amarelo (DVA). Os dois tipos de plantas foram diferentes da cultivar IAC 47 que apresentou folha decumbente verde-palha (DVP). Diversos genes marcadores afetando características morfológicas como coloração de algum órgão da planta vêm sendo identificados no germoplasma, devido a ocorrência de variação na natureza ou através de tratamentos mutagênicos. Os genes para coloração de folha verde-escura e verde-amarela pertencem aos grupos de ligações 3 e 10, respectivamente (Khush & Kinoshita, 1991). As variações dos somaclones para dois tipos distintos de plantas, diferentes da cultivar original IAC 47, podem ser consideradas como mutações genéticas e herdáveis como as que têm sido registradas em diversas culturas, inclusive arroz (Fukui, 1983, Cai et al., 1990). Comparados à cultivar IAC 47, todos os somaclones apresentaram ciclo precoce nas condições de campo, em Goiânia. Entre 41 somaclones, 15 e 26 apresentaram ciclos com duração de 120 e 110 dias, contra 130 dias da cultivar IAC 47. Quatro mutações para florescimento precoce foram obtidas em 12 progênies de arroz regeneradas a partir de calos de sementes (Fukui, 1983). Os somaclones apresentaram variação para três tipos diferentes de grãos, além do mesmo tipo de grão da cultivar IAC 47. Entre 41 somaclones, 22 apresentaram tipo de grão igual ao da cultivar IAC 47, dois mostraram o grão com arista vermelha, 14 apresentaram o grão com apículo branco e sem arista, e três mostraram o grão com arista preta. O estudo realizado com quatro cultivares de arroz com diferentes tipos de grãos mostraram que o comprimento e peso de grãos de somaclones foi reduzido comparado com os parentais (Zheng et al., 1989). Todos os somaclones apresentaram característica aromática nos testes realizados com a penúltima folha enquanto a cultivar IAC 47 não apresentou aroma. A mutação para esta característica derivada de uma cultivar não aromática é rara e inédita.

A severidade da brusone nas panículas dos 17 somaclones R6 variou de 24,7 a 74,5% (Tabela 4). Seis somaclones apresentaram significativamente maior severidade, enquanto os demais não diferiram da cultivar IAC 47. A correlação entre a brusone nas panículas nas gerações R5 e R6 foi positiva e significativa (r = 0,58; P £ 0.05). Os somaclones não diferiram da cultivar IAC 47 quanto ao número de grãos totais por panícula, enquanto apresentaram diferenças na degranação. Entre 17 somaclones oito apresentaram degranação menor do que a cultivar IAC 47, indicando a superioridade dos mesmos. Os 17 somaclones apresentaram diferenças significativas em produtividade. Com exceção do somaclone SCIA02 que não diferiu da cultivar IAC 47 todos os outros foram inferiores (Tabela 4). O experimento foi prejudicado devido a ocorrência de veranico no florescimento.

Na geração R7 os somaclones apresentaram diferenças significativas tanto para ASCPD como para taxa aparente de infecção (Tabela 2). Entre 41 somaclones, quatro e dois apresentaram ASCPD significativamente menor e maior, do que a cultivar IAC47, respectivamente. Levando em consideração a taxa aparente de infecção, 20 somaclones apresentaram valores de r menores e quatro maiores do que a cultivar IAC 47. As correlações dos valores de ASCPD entre somaclones das gerações R6 e R7 (r = 0,69; P £ 0.01) e com relação à taxa aparente de infecção (r = 0,60; P £ 0.01) foram significativas. Estes resultados indicaram a estabilidade quanto ao grau de resistência da brusone nas folhas nas duas gerações.

O experimento de campo, realizado para verificar o potencial de produtividade de 13 somaclones R7 mostrou diferenças significativas no peso de grãos de 100 panículas e produtividade (Tabela 4). Com exceção de um, os somaclones não diferiram da cultivar IAC 47 quanto ao peso de grãos por 100 panículas. A produtividade do SCIA02 (1774 kg/ha) foi superior a da cultivar IAC 47 com 1072 kg/ha. O mesmo somaclone sobressaiu-se nas gerações R6 e R7.

Os dois somaclones SCIA02 e SCIA06 apresentaram progresso lento da brusone nas folhas, precocidade com duração do ciclo de 110 dias, alta produtividade quando comparados à cultivar IAC 47, além de tipo de planta com folha ereta verde e aroma. Estes somaclones têm grande valor para utilização como doadores de resistência visando melhoramento de arroz de terras altas. Os mesmos somaclones apresentaram maior grau de resistência parcial sensu Parlevliet & Omeren (1975), nos testes realizados na geração R4 com uma raça virulenta em condições controladas de casa de vegetação (Araújo et al., 1997).

Observou-se variação para algumas características agronômicas importantes, além da brusone, nos somaclones derivados da cultivar IAC 47, confirmando diversos outros relatos em arroz (Fukui, 1983; Mandal et al., 1999). Nas plantas de arroz regeneradas, 75% apresentaram mutações morfológicas (Oono, 1978). Entretanto a freqüência de alteração em altura, fertilidade e outras características tem sido variável em diferentes cultivares (Zhuravlev & Zmeeva, 1996). Neste trabalho a freqüência de características desejáveis de somaclones derivados da cultivar IAC47 pode ser considerada alta. A fonte principal de variação foi a obtenção de plantas regeneradas a partir de calos de panículas imaturas. Alguns dos somaclones têm valor para o melhoramento genético, com precocidade e aroma do grão. A variação somaclonal, a partir de cultivares comerciais de arroz pode ser utilizada para recuperar, em alta freqüência, características agronômicas que permanecem estáveis ao longo das gerações.

AGRADECIMENTOS

Ao Dr. Francisco José P. Zimmermann pelo auxílio na análise estatística, ao Pedro Maurício Machado pela assistência na realização dos experimentos de campo e ao CNPq por ter financiado parcialmente este estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2001
  • Data do Fascículo
    Set 2001

Histórico

  • Aceito
    15 Maio 2001
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