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Controle biológico de Colletotrichum acutatum, agente causal da queda prematura dos frutos cítricos

Biological control of Colletotrichum acutatum, causal agent of citrus postbloom fruit drop disease

Resumos

O trabalho teve por finalidade estudar a potencialidade antagonística de isolados de Bacillus subtilis a Colletotrichum acutatum, agente causal da queda prematura dos frutos cítricos (Citrus spp.) (QPFC), sob condições de laboratório e de campo. Foram estudados 64 isolados de B. subtilis, quatro isolados de Bacillus spp. e um isolado de B. thuringiensis quanto à capacidade de inibir o desenvolvimento do patógeno em cultura pareada e quanto à produção de metabólitos com atividade antimicrobiana. Os isolados mais promissores foram testados em condições de campo para controle da doença. In vitro, todos os isolados de Bacillus spp. inibiram o crescimento de C. acutatum, não havendo diferenças significativas entre eles. Os isolados de Bacillus spp. produziram, in vitro, metabólitos capazes de inibir o crescimento micelial de C. acutatum, os quais mantiveram suas atividades capazes de causar a inibição, após autoclavagem a 120 ºC, durante 20 min. Dentre os sete isolados de B. subtilis testados para o controle da QPFC, em condições naturais, o ACB-69 diferiu da testemunha e de vários outros isolados, porém equiparou-se estatisticamente ao benomyl, proporcionando menor porcentagem de flores com sintomas e maior número médio de frutos efetivos. Ainda, sob condições de campo, isolados de cada uma das espécies Trichoderma viride, T. pseudokoningii e T. aureoviride foram ineficientes, apresentando o mesmo comportamento da testemunha. Em relação aos métodos de avaliação da doença, a porcentagem de flores com sintomas foi mais eficiente do que o número médio de frutos efetivos (NMFE), uma vez que esses resultam do efeito direto do patógeno.

Citrus sinensis; controle biológico; substâncias antifúngicas


The present study evaluated the antagonistic potential of different isolates of Bacillus subtilis to Colletotrichum acutatum, causal agent of post-bloom fruit drop of citrus (Citrus spp.) (PFD), under laboratory and field conditions. Sixty four isolates of B. subtilis, four isolates of Bacillus spp. and one isolate of B. thuringiensis were evaluated in relation to their ability to inhibit the development of the plant pathogen in paired cultures and their production of metabolites with antimicrobial activity. The most promising isolates were tested for the control of the disease under field conditions. All the Bacillus spp. isolates induced strong inhibition on the growth of the plant pathogen. The isolates of Bacillus spp. produced, in vitro, metabolites capable of inhibiting the mycelial growth of C. acutatum, and they maintained their activities in enough concentrations to cause the inhibition, even after submitted to 120 ºC, for 20 min. The inhibition of C. acutatum by B. subtilis was due to antibiosis. Among seven isolates of B. subtilis tested for the disease control, in natural conditions, the BCA-69 differed from the control, and was statistically similar to benomyl, presenting lower percentage of symptomatic flowers and higher average number of effective fruits. An isolate of each of the species of Trichoderma viride, T. pseudokoningii and T. aureovirde were also tested, in field conditions, for controlling PFD, and none differed from the control. The percentage of symptomatic flowers was more efficient than the average number of effective fruits (ANEF) in determining the effect of the applications of the biocontrol agents on disease control.


ARTIGOS / ARTICLES

Controle biológico de Colletotrichum acutatum, agente causal da queda prematura dos frutos cítricos* * Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal-SP. (2000) ** Bolsista da FAPESP

Biological control of Colletotrichum acutatum, causal agent of citrus postbloom fruit drop disease

Katia C. Kupper** * Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal-SP. (2000) ** Bolsista da FAPESP ; Nelson Gimenes-Fernandes; Antonio de Goes

Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, FCAV/UNESP, CEP 14884-900, Jaboticabal, SP, Brasil, e-mail: kupper@fcav.unesp.br

RESUMO

O trabalho teve por finalidade estudar a potencialidade antagonística de isolados de Bacillus subtilis a Colletotrichum acutatum, agente causal da queda prematura dos frutos cítricos (Citrus spp.) (QPFC), sob condições de laboratório e de campo. Foram estudados 64 isolados de B. subtilis, quatro isolados de Bacillus spp. e um isolado de B. thuringiensis quanto à capacidade de inibir o desenvolvimento do patógeno em cultura pareada e quanto à produção de metabólitos com atividade antimicrobiana. Os isolados mais promissores foram testados em condições de campo para controle da doença. In vitro, todos os isolados de Bacillus spp. inibiram o crescimento de C. acutatum, não havendo diferenças significativas entre eles. Os isolados de Bacillus spp. produziram, in vitro, metabólitos capazes de inibir o crescimento micelial de C. acutatum, os quais mantiveram suas atividades capazes de causar a inibição, após autoclavagem a 120 ºC, durante 20 min. Dentre os sete isolados de B. subtilis testados para o controle da QPFC, em condições naturais, o ACB-69 diferiu da testemunha e de vários outros isolados, porém equiparou-se estatisticamente ao benomyl, proporcionando menor porcentagem de flores com sintomas e maior número médio de frutos efetivos. Ainda, sob condições de campo, isolados de cada uma das espécies Trichoderma viride, T. pseudokoningii e T. aureoviride foram ineficientes, apresentando o mesmo comportamento da testemunha. Em relação aos métodos de avaliação da doença, a porcentagem de flores com sintomas foi mais eficiente do que o número médio de frutos efetivos (NMFE), uma vez que esses resultam do efeito direto do patógeno.

Palavras-chave adicionais:Citrus sinensis, controle biológico, substâncias antifúngicas.

ABSTRACT

The present study evaluated the antagonistic potential of different isolates of Bacillus subtilis to Colletotrichum acutatum, causal agent of post-bloom fruit drop of citrus (Citrus spp.) (PFD), under laboratory and field conditions. Sixty four isolates of B. subtilis, four isolates of Bacillus spp. and one isolate of B. thuringiensis were evaluated in relation to their ability to inhibit the development of the plant pathogen in paired cultures and their production of metabolites with antimicrobial activity. The most promising isolates were tested for the control of the disease under field conditions. All the Bacillus spp. isolates induced strong inhibition on the growth of the plant pathogen. The isolates of Bacillus spp. produced, in vitro, metabolites capable of inhibiting the mycelial growth of C. acutatum, and they maintained their activities in enough concentrations to cause the inhibition, even after submitted to 120 ºC, for 20 min. The inhibition of C. acutatum by B. subtilis was due to antibiosis. Among seven isolates of B. subtilis tested for the disease control, in natural conditions, the BCA-69 differed from the control, and was statistically similar to benomyl, presenting lower percentage of symptomatic flowers and higher average number of effective fruits. An isolate of each of the species of Trichoderma viride, T. pseudokoningii and T. aureovirde were also tested, in field conditions, for controlling PFD, and none differed from the control. The percentage of symptomatic flowers was more efficient than the average number of effective fruits (ANEF) in determining the effect of the applications of the biocontrol agents on disease control.

INTRODUÇÃO

A "queda prematura dos frutos cítricos" (QPFC), causada pelo fungo Colletotrichum acutatum Simmonds ocorre nos trópicos e subtrópicos úmidos das Américas. No Brasil, a doença foi relatada inicialmente no Rio Grande do Sul (Dornelles, 1977) e, atualmente, está presente em todos os municípios de São Paulo, além de outros Estados como Rio de Janeiro, Paraná, Bahia, Minas Gerais, Goiás e Amazonas.

Condições que propiciam mais de uma florada dos citros (Citrus spp.), ou variedades que floresçam mais de uma vez por ano, favorecem a ocorrência da doença. Assim sendo, no Brasil, a doença é mais severa nos limões verdadeiros [Citrus limon (Linn.) Burm.], em lima ácida (C. latifolia Tanaka) 'Tahiti', no limão (C. aurantifolia Swingle) 'Galego' e na laranja (C. sinensis Osbeck) 'Pêra' (Feichtenberger, l991).

A medida predominante de controle é a pulverização com produtos químicos na época da florada. Vários produtos encontram-se registrados, sendo mais eficientes os benzimidazóis, alguns triazóis e ftalimida. Entretanto, sob condições de elevada precipitação ou de chuvas prolongadas, os fungicidas têm eficiência limitada, principalmente, pelas dificuldades de aplicações, além do que os produtos são mais facilmente lavados. Considerando-se os custos financeiros e ambientais de tais aplicações, assim como as crescentes restrições à presença de resíduos nos frutos, faz-se necessário o estudo de novas alternativas. Entres estas, o controle biológico torna-se uma alternativa importante e tecnicamente justificável.

Dentre os antagonistas mais estudados encontra-se a bactéria Bacillus subtilis Ehrenberg, a qual vem-se destacando no controle de doenças do filoplano e em pós-colheita (Pusey et al., 1986, Ferreira et al., 1991, Kalita et al., 1996, Sonoda & Guo, 1996) e, espécies do gênero Trichoderma, até mesmo no que se refere a fitopatógenos de parte aérea, quando aplicado em pulverizações (Tronsmo & Dennis, 1977; Gullino & Garibaldi, 1983 e Bastos, 1988).

O presente trabalho teve por objetivo estudar a potencialidade antagonística de diferentes isolados de B. subtilis e espécies de Trichoderma spp., obtidos de pomares de citros, em relação a C. acutatum, sob condições de laboratório e de campo.

MATERIAL E MÉTODOS

A partir de amostras de folhas e flores retiradas de plantas cítricas de diferentes localidades, onde a doença ocorre naturalmente, porém, não de forma tão intensa, foram obtidos 57 isolados de B. subtilis e três de Bacillus spp. Essas amostras foram obtidas nos municípios de Altinópolis, Bebedouro, Botucatu, Itápolis, Jaboticabal, Mogi-Guaçu, Taiaçu, Taiúva e Taquaral, todos do Estado de São Paulo. Para a obtenção dos isolados de Bacillus spp., adotou-se a técnica descrita por Bettiol (1995). Foram também incluídos no trabalho sete isolados de Bacillus subtilis (ACB 01, 02, 08, 09, 10, 11 e 12), um isolado de Bacillus sp. (ACB-07) e um isolado de B. thuringiensis Berliner (ACB-13) pertencentes ao Laboratório de Fitopatologia da FCAV/UNESP, Jaboticabal - SP. Quanto a C. acutatum, empregou-se isolado obtido de pétalas de laranja. Folha murcha com sintomas da doença, cuja patogenicidade foi posteriormente comprovada em inoculações, realizadas sob condições de casa de vegetação.

Influência do cultivo pareado de isolados de Bacillus spp. no crescimento de C. acutatum

Para estudar o efeito antagônico dos isolados de Bacillus spp. no crescimento micelial de C. acutatum, utilizou-se a técnica de cultivo pareado em placa de Petri contendo BDA (Dennis & Webster, 1971). Foram realizados dois Ensaios, sendo que no primeiro foram avaliados os isolados de Bacillus spp. (ACB 01, 02, 07, 08, 09, 10, 11, 12 e 13), e no segundo, os demais (60 isolados). Para isso, discos de 5 mm de diâmetro, contendo meio e colônias de C. acutatum, foram repicados para o centro de placas de Petri contendo BDA. Dois dias após, foram repicados os isolados de agentes de controle biológico (ACBs) a 3 cm de distância da colônia do fitopatógeno. No segundo ensaio, foram repicados dois isolados de ACB, um de cada lado da colônia do patógeno, porém, à mesma distância. Após sete dias, em condições ambientes de laboratório, efetuou-se a medição da distância do centro ao bordo da colônia de C. acutatum. Empregou-se um delineamento inteiramente casualizado, com quatro e duas repetições, respectivamente, para os Ensaios 1 e 2, considerando-se cada placa uma parcela experimental.

Após 12 dias de incubação, montaram-se quatro lâminas, em azul lático, e efetuou-se a medição, mediante ocular graduada, de 20 conídios de C. acutatum, na região de influência da ação de metabólitos produzidos por isolados de Bacillus spp., utilizados no Ensaio 1. Para a testemunha foram medidos conídios do patógeno a partir de colônias onde não houve pareamento com os antagonistas.

No Ensaio 1, efetuou-se análise de variância e as médias foram comparadas pelo teste de Tukey a 5% de probabilidade. No caso do Ensaio 2 foram realizadas apenas análises comparativas, por haver apenas duas repetições.

Avaliação da produção e termoestabilidade de metabólitos produzidos por Bacillus spp.

Para testar a produção e termoestabilidade de metabólitos produzidos por isolados de Bacillus spp., colônias da bactéria foram transferidas para Erlenmeyers de 250 ml, contendo 100 ml de meio líquido à base de batata-dextrose. Após a incubação em condições ambiente de laboratório por sete dias, sob agitação em agitador mecânico, no escuro, amostras de 10 ml de cada caldo fermentado foram transferidas para Erlenmeyers com capacidade para 250 ml, contendo 90 ml de BDA, e posteriormente esterilizados em autoclave por 20 min, a 120 ºC e 1 atm de pressão. Após homogeneização da suspensão, procedeu-se a deposição de 20 ml em placas de Petri. Após a solidificação do meio, transferiu-se para o centro de cada placa um disco de 5 mm de diâmetro, obtido do bordo de colônias de C. acutatum, com oito dias de idade. As testemunhas foram constituídas de placas contendo o fitopatógeno nos meios de cultura, sem a presença de metabólitos. Após cinco dias de incubação, efetuou-se a medição da distância do centro ao bordo da colônia de C. acutatum. Utilizou-se um delineamento inteiramente casualizado, com cinco repetições, em que cada placa de Petri constituiu-se em uma unidade experimental.

Controle da queda prematura dos frutos cítricos, sob condições de campo

Utilizou-se pomar de laranja 'Natal', enxertada sobre limoeiro 'Volkameriano', de 14 anos de plantio, no município de Mogi Guaçu - SP.

Para a produção das suspensões dos antagonistas, colônias de cada agente de controle biológico foram repicadas para Erlenmeyers (dois frascos para cada ACB), com capacidade para 1.000 ml, contendo 300 ml de meio batata-dextrose. Em seguida, procedeu-se a incubação, em condições ambientes de laboratório, no escuro, sob agitação constante em agitador mecânico, por 13 dias (ACBs utilizados para a primeira aplicação no campo) e dois dias (ACBs utilizados para a segunda e terceira aplicações no campo). Foram testados sete isolados de B. subtilis (ACB-11, 15, 16, 69, 70, 72 e 77), um de Trichoderma viride Pers. ex S. F. Gray (ACB-14), um de T. pseudokoningii Rifai (ACB-37) e um de T. aureoviride Rifai (ACB-39) (Moretto et al., 2001). Como referência utilizou-se um tratamento com benomyl e outro no qual foi aplicada apenas água (testemunha).

Para uniformização do florescimento e estabelecimento de ambiente favorável à ocorrência da doença, todas as plantas da área experimental foram irrigadas, através de aspersores, de tal maneira que se garantisse 100% de molhamento foliar, desde as fases iniciais de formação dos primórdios florais, até a completa queda das pétalas.

Foram feitas três aplicações com agentes de controle biológico ou benomyl, nos dias 05, 06 e 11/10/1999, em cujo período as flores encontravam-se entre os estádios "cabeça-de-fósforo" e "cotonete". O estádio "cabeça de fósforo" caracterizou-se pela predominância de botões florais arredondados e verdes, ao passo que, no estádio de "cotonete" predominavam botões florais brancos, fechados, alongados ou em expansão.

Para a produção de inóculo de C. acutatum, fragmentos de colônias do fitopatógeno foram colocados em Erlenmeyers com capacidade para 1.000 ml contendo 300 ml de meio batata-dextrose, seguido de agitação constante durante oito dias, no escuro, sob temperatura ambiente de laboratório.

No dia 07/10/1999 foi realizada inoculação de todas as plantas, mediante aplicação de suspensão (contendo 4x104 conídios/ml) de um isolado de C. acutatum, obtido desse mesmo pomar. Nessa inoculação foi empregado pulverizador tratorizado adotado de duas pistolas, gastando-se em média 5 l de calda por planta.

Os antagonistas foram aplicados por meio de pulverizador manual com capacidade para 5 l. O volume de calda aplicado foi calibrado para atingir o início do ponto de escorrimento. Essa pulverização foi realizada apenas em um lado da planta, gastando-se em média 1 l de calda por planta. Para obtenção da suspensão foram empregados 600 ml de metabólito contendo células vivas do antagonista, completados com água, para a obtenção do volume final de 5 l e concentração de 1,2 x 107 células/ml. Utilizou-se delineamento experimental de blocos ao acaso, com cinco repetições, em que cada parcela experimental foi constituída por uma planta.

A primeira avaliação foi realizada 17 dias após a primeira aplicação dos tratamentos, efetuando-se a contagem do número de flores com sintomas de infecção por C. acutatum e do número de flores sadias, em uma amostra de 100 flores, calculando-se a porcentagem de flores com sintomas.

A segunda avaliação foi realizada cerca de 90 dias após a primeira aplicação dos antagonistas, efetuando-se a contagem do número de frutos vingados e do número de cálices retidos e/ou amarelecidos devido à doença, a fim de se obter o número médio de frutos efetivos (NMFE), de acordo com Goes (1995).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Influência do cultivo pareado de isolados de Bacillus spp. no crescimento de Colletotrichum acutatum

Todos os isolados de Bacillus spp. provocaram forte inibição no crescimento micelial do fitopatógeno (Tabelas 1 e 2). Embora, durante o pareamento, não tenha ocorrido sobreposição da colônia do ACB sobre o fitopatógeno, observou-se escurecimento do micélio de C. acutatum, na região de influência dos possíveis metabólitos produzidos pela bactéria. Exames ao microscópio óptico comum revelaram encurtamento das células e forte engrossamento das paredes das hifas do patógeno, exposto na região de influência dos metabólitos.

Os isolados de Bacillus spp. não afetaram o comprimento e a largura dos conídios de C. acutatum. Entretanto, foi verificado que os conídios do fitopatógeno submetidos aos tratamentos com os ACBs apresentavam maior tamanho que o das testemunhas, isto é, os não submetidos a tratamentos, embora essa diferença não tenha sido estatisticamente significativa.

A obtenção de espécies de Bacillus, a partir da parte aérea de plantas cítricas, como apresentado neste estudo, é muito promissora, por várias razões: 1) pode ocorrer uma pronta ou nenhuma dificuldade de readaptação do microrganismo ao seu habitat de origem; 2) Bacillus spp. é reconhecidamente um excelente produtor de compostos antimicrobianos (Huang & Chang, 1975; Baker et al., 1983; Motomura & Hirooka, 1996) e, 3) B. subtilis pode ser multiplicado de forma sistemática e rotineira sob condições in vitro.

Avaliação da produção e termoestabilidade de metabólitos produzidos por Bacillus spp.

Com exceção dos ACBs 12 e 13, todos os demais isolados de Bacillus spp. diferiram estatisticamente da testemunha, o que revela que os metabólitos produzidos mostraram-se termoestáveis e mantiveram suas atividades mesmo após a autoclavagem (Tabelas 3 a 5). A produção rápida e eficiente de metabólitos termoestáveis por microrganismos, juntamente com atividade antimicrobiana, como observado no presente trabalho, torna B. subtilis um organismo atraente para estudos de controle biológico.

Embora nem sempre os bons resultados de antagonismo obtidos in vitro sejam garantias de eficiência no campo, essa eficácia constitui-se em prognóstico e indicativo, quanto à sua viabilidade no controle dos fitopatógenos sob condições naturais de infecção. Muitas vezes, a eficácia dos antagonistas in vitro ou em casa de vegetação, pode ser insuficiente para estabelecer o limiar de população exigida para um biocontrole no campo. O próprio estabelecimento das bactérias antagonistas sobre o filoplano das plantas é sempre um desafio no controle biológico. Em muitos experimentos de campo, células dos antagonistas, quando cultivadas em meio sólido, suspensas em água e aplicadas nas plantas, não encontram ambiente apropriado para seu desenvolvimento. Na filosfera ficam expostas à luz ultravioleta, às mudanças rápidas de temperatura e às mudanças na disponibilidade de água e nutrientes, entre outras causas (Stockwell et al., 1998).

A constatação da produção de substâncias inibidoras ao C. acutatum, produzidas pelos diversos isolados de Bacillus spp., é especialmente importante para o entendimento do mecanismo de ação de tal antagonismo, possibilitando, dessa forma, o controle da doença pelo uso das substâncias produzidas e, não apenas pela introdução massal dos agentes de biocontrole. A inibição do crescimento de C. acutatum, sob condições in vitro, foi devida à antibiose, uma vez que muitos isolados foram capazes de produzir substâncias que impediram o desenvolvimento do fitopatógeno. As bactérias antagônicas, como B. subtilis, de modo geral agem significativamente por antibiose e, ocasionalmente, por parasitismo e competição (Arras & Arru, 1997). Microrganismos que agem por antibiose, geralmente têm amplo espectro de ação, de forma que na inibição dos fungos a produção de substâncias tóxicas é mais efetiva do que qualquer outro mecanismo de ação envolvido. Através da literatura tem-se verificado registros quanto ao efeito inibitório de B. subtilis a Monilinia fructicola (Wint) Honey, agente causal da podridão parda do pessegueiro [Prunus persicae (L.) Batsch] (Pusey & Wilson, 1984; Mckeen et al., 1986 e Pusey et al., 1986), e a Eutypa lata (Pers.:Fr) Tul. & C. Tul. (Libertella blepharis A. L. Smith), agente causal do declínio da videira (Vitis vinifera L.) (Ferreira et al., 1991).

O desempenho dos filtrados utilizados no presente trabalho pode ser comparado com alguns outros citados na literatura (Cubeta et al., 1985 e Bettiol & Kimati, 1990), os quais têm demonstrado que produtos desta natureza, originados de colônias de Bacillus spp., inibem o crescimento de muitos fungos. Bettiol & Kimati (1989) observaram a ocorrência de grande número de microrganismos antagônicos a Pyricularia oryzae Cavana, sendo os mais eficientes os pertencentes à espécie B. subtilis, cujo mecanismo de ação, segundo os autores, era a antibiose.

Em relação à termoestabilidade, Bettiol & Kimati (1990) ao estudarem o efeito de B. subtilis sobre P. oryzae, verificaram que a multiplicação da bactéria em meio líquido, com ou sem agitação constante, liberou metabólitos em concentrações suficientes para inibir completamente o crescimento micelial do fungo, após um dia de incubação. Substâncias antagônicas, como observado no presente trabalho, também apresentaram termoestabilidade, proporcionando significativa redução no tamanho das colônias de C. acutatum.

Controle da queda prematura dos frutos cítricos, sob condições de campo

Nas plantas correspondentes à testemunha, a doença ocorreu com grande intensidade. Apenas os tratamentos com benomyl e com o ACB-69 (B. subtilis) diferiram estatisticamente da testemunha, propiciando menores níveis da doença (Tabela 6). A baixa eficiência da maioria dos antagonistas pode ser atribuída às condições altamente favoráveis ao patógeno, ou então, ao fato de que alguns antagonistas, principalmente as espécies de Trichoderma, precisem de um tempo maior para se estabelecer e, assim, exercer suas atividades de forma mais efetiva.

A eficiência do isolado ACB-69, equiparando-se ao fungicida padrão, confirma a potencialidade verificada, previamente, em testes in vitro e em flores destacadas (Moretto, 2000). Em ensaios preliminares, no campo e em casa de vegetação, com plantas de laranjeira `Pêra-Rio', observou-se que nas plantas tratadas com os agentes de controle biológico, anteriormente ou simultaneamente à inoculação de C. acutatum, a intensidade de doença foi sempre inferior àquela das parcelas testemunhas. Estudos mais detalhados devem ser realizados, no que diz respeito, principalmente, às formulações mais adequadas, dose, período e número de aplicações dos antagônicos.

Com relação aos dados referentes ao NMFE, os melhores resultados foram obtidos quando se utilizou benomyl e ACB-69, os quais diferiram da testemunha e não diferiram entre si. Entretanto, também não foi constatada diferença estatisticamente significativa entre o antagônico ACB-69 e os ACBs: 15, 72 e 77, que por sua vez não diferiram da testemunha.

Vários trabalhos na literatura têm demonstrado a viabilidade de isolados de B. subtilis controlarem biologicamente doenças da parte aérea. Baker et al. (1985) verificaram que a severidade da ferrugem do feijoeiro (Phaseolus vulgaris L.), foi reduzida em pelo menos 75%, em 1982 e 1983, com três aplicações por semana de B. subtilis, cujo nível de controle foi comparável ao obtido com o fungicida mancozeb, aplicado uma vez por semana.

Contrariamente ao que se observara com B. subtilis, nenhum dos isolados de Trichoderma spp. foi eficiente no controle da queda prematura dos frutos cítricos em condições de campo. Acredita-se que a quantidade de metabólitos produzidos não tenha sido suficiente para controlar a doença no campo, em função, principalmente, do curto período de incubação (48 h) utilizado para produção de substâncias antimicrobianas pelo fungo. Resultados em condições de laboratório revelaram que quanto maior o período de incubação, maior é o acúmulo de metabólitos produzidos pelo Trichoderma spp. no caldo fermentado (Moretto, 2000). Não deve, portanto, ser descartada a possibilidade de estudos mais aprofundados sobre a viabilidade do uso de Trichoderma spp. no controle desta doença.

De modo geral, para as culturas perenes existem indicações de que o uso de antagonistas que atuam através de parasitismo conduz a resultados mais promissores, pois o estabelecimento do antagonista é facilitado e pode suprimir a sobrevivência do patógeno, como também a infecção (Bettiol, 1997). A QPFC é uma doença de ocorrência relativamente rápida, onde a existência de um filme de água na superfície dos órgãos suscetíveis da planta, de 18 h de duração após a deposição dos conídios, já é suficiente para que ocorra a germinação dos mesmos e o estabelecimento da infecção (Feichtenberger et al., 1997). Portanto, a curta fase de pré- penetração do fungo, período em que o mesmo permanece vulnerável aos antagonistas, limita a efetividade dos mesmos. Em função disso, o mecanismo de ação por antibiose, como ocorre com Bacillus spp., abre a possibilidade de controle mais efetivo e imediato do patógeno. Além do mais, sendo os antibióticos compostos de múltipla ação, existe a possibilidade de que os mesmos possam agir não só no controle da QPFC, como também no controle de doenças que ocorrem em frutos jovens de citros, como verrugose da laranja doce, melanose e pinta preta.

A metodologia da determinação da porcentagem de flores infetadas, como adotado por Timmer & Zitko (1996), aparentemente mostra-se mais eficiente que a determinação do NMFE, como utilizado por Goes (1995). Flores infetadas resultam do efeito direto do patógeno sobre os tecidos florais, enquanto que, o NMFE, além do efeito direto do patógeno em tecidos florais, e conseqüente retenção de cálices, pode refletir também o efeito de outros tipos de fatores, especialmente os de natureza fisiológica, que podem mascarar a magnitude dos resultados.

AGRADECIMENTOS

Esta pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), conforme processo nº 1996/02312-2.

Aceito para publicação em 06/01/2003

Autor para correspondência: Katia Cristina Kupper

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    Parte da Tese de Doutorado do primeiro autor. Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal-SP. (2000)
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    Bolsista da FAPESP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Ago 2003
    • Data do Fascículo
      Jun 2003

    Histórico

    • Recebido
      06 Jan 2003
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