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Visualização e caracterização de campos ultra-sônicos via óptica de schlieren

Vizualization and characterization of ultrasonic fields using schlieren optics

Resumos

Neste trabalho aplicamos um método óptico sensível e de baixo custo denominado ‘Schlieren’ para visualização e caracterização de feixes ultra-sônicos em solução aquosa. Esta caracterização assume papel importante na Medicina para diagnóstico não invasivo via método ultra-sônico.

‘Schlieren’; ultra-som; campos ultra-sônicos; visualização


In this work we applied a sensible and low cost optical technique called Schlieren for visualization and caracterization of ultrasonic beam in aqueous solution. This caracterization have an important role in Medicine for non invasive diagnostic via ultrasound method.

Schlieren; ultrasound; ultrasonic field; visualization


VISUALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DE CAMPOS ULTRA-SÔNICOS VIA ÓPTICA DE SCHLIEREN

Gerson Antonio SANTARINE** Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil. Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil.

Alzira Cristina de Mello STEIN-BARANA** Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil. Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil.

RESUMO: Neste trabalho aplicamos um método óptico sensível e de baixo custo denominado ‘Schlieren’ para visualização e caracterização de feixes ultra-sônicos em solução aquosa. Esta caracterização assume papel importante na Medicina para diagnóstico não invasivo via método ultra-sônico.

PALAVRAS-CHAVE: ‘Schlieren’, ultra-som, campos ultra-sônicos, visualização.

Introdução

Nos últimos anos, dentre os fantásticos avanços no campo da Medicina destaca-se a área do diagnóstico não invasivo, representado por técnicas nas quais a aplicação de radiações ultra-sônicas merece fator de destaque. Imagens do interior de organismos vivos podem ser obtidas com boa resolução e em tempo real, utilizando-se dos já difundidos imageadores de ultra-som . A tecnologia de fabricação de tais equipamentos exibe como ferramenta central, dispostivos geradores e focalizadores de feixes ultra-sônicos denominados lentes sônicas, cujas propriedades óticas são determinantes na qualidade final da imagem média requerida. Assim sendo, conhecimentos prévios inerentes à natureza do feixe ultra-sônico tais como geometria, fator de espalhamento e atenuação, potencia dentre outros assumem papel primordial para projeto e construção destas lentes. O trabalho aqui apresentado reporta-se ao desenvolvimento e aplicação de uma técnica óptica (‘Schlieren’)[1,4,7,8,] destinada a visualização e caracterização de feixes ultrasônicos gerados por transdutores comerciais de Titanato Zirconato de Chumbo (PZT), sob as mais diversas condições de geometria, para freqüências de 1.0 MHz e 3.0 MHz. O sistema óptico em questão opera em virtude do fato do índice de refração n do meio considerado ser uma função da densidade deste meio. Um arranjo experimental, para esta técnica, consiste basicamente de um sistema composto de espelhos esféricos curvos, lentes e fontes de luz visível. Dentre as várias possíveis configurações, um satisfatório processo de ‘Schlieren’ pode ser realizado utilizando-se de um conjunto de espelhos esféricos, cujo objetivo principal está em se conseguir feixes de luz, paralelos com grande abertura, onde a amostra a ser estudada é inserida. Para uma geometria adequada, parte deste feixe luminoso é desviado pela amostra através de um gradiente de densidade, o qual pode ser gerado por diferenças de temperatura ou variações de pressão, produzindo-se desta forma em um anteparo, convenientemente focalizado um padrão de áreas brilhantes e escuras retratando-se com fidelidade os gradientes de densidade produzidos pelo fenômeno físico estudado. Este padrão assim obtido, contendo as informações desejadas, pode ser fotografado ou filmado para posterior interpretação.

A apresentação deste trabalho está dividida em três partes distintas. Na seção I está reportada de maneira suscinta alguns dos principais aspectos teóricos relativos ao método de ‘Schlieren’. Obtenção dos resultados seguido de discussões são evidenciadas na seção II. A seção III está reservada à conclusões, agradecimentos e bibliografia.

Aspectos teóricos relativos à técnica de ‘Schlieren’

Deflexão da luz por gradiente de densidade.

Um problema fundamental inerente à experimentação, é a necessidade de que não haja mudanças de estado no objeto sob teste, introduzidas pelo método de investigação. É um fato incontestável que esta condição não pode ser completamente considerada, mas, felizmente, este problema pode ser transposto com certo grau de precisão, se medidas ópticas puderem ser realizadas. Em muitos casos, processos envolvendo óptica como ferramenta para medições tem apresentado bons resultados devido a fraca interação entre o feixe de medidas e o objeto de prova considerado. Partindo desta constatação empírica, tais técnicas surgem como excelentes candidatas na solução de uma classe de problemas as quais seriam inviabilizadas por outra metodologia. Dentre um grande número de arranjos ópticos experimentais, cada qual com sua especificidade e denominação (Michelson, Fabry Perot, Toepler, Mach-Zehnder et al), destaca-se a técnica de ‘Schlieren’ a qual tem seu princípio de operação baseado no fato de que o índice de refração n de um meio seja uma função da densidade deste. Em outras palavras, mudanças infinitesimais do índice de refração conduzem a informações relativas ao campo de densidade.

O índice de refração n de um meio homogêneo é uma função do estado termodinâmico, mais frequentemente de sua densidade r . Para n @ 1 estas grandezas estão relacionadas via Equação de Gladstone – Dale.

sendo que r varia ligeiramente com o comprimento de onda da radiação luminosa que o atravessa, possuindo valor específico para cada gás. A constante C está relacionado a um índice de refração padrão n0 pela expressão:

onde

Considerando-se y (direção normal ao feixe de luz Fig. 1) como sendo a direção na qual o gradiente de densidade é produzido por uma diferença de temperatura ou pressão, pode-se calcular levando-se em conta que para um gás ideal à pressão constante:


Desta forma obtém-se:

Esta expressão a qual se aplica ao processo de Schileren evidencia de maneira simples a relação entre o gradiente de temperatura e a variação do índice de refração do meio considerado. Para o caso de fenômenos nos quais a variação do índice de refração é induzida por gradiente de pressão, a expressão anterior pode ser modificada levando-se em consideração que para uma processo adiabático em um gás ideal, a pressão, temperatura e densidade estão relacionadas por:

onde:

k = é a razão de calores específicos do gás a pressão e volume constantes.

P = pressão do gás.

Desta forma obtém-se que o gradiente de densidade originado pelo gradiente de pressão é dado por:

Esta equação revela o modo pelo qual um gradiente de pressão pode modular o índice de refração do meio sob análise.

Descrição do arranjo experimental da técnica de ‘Schlieren’

A montagem da técnica de ‘Schlieren’ para visualização de campos ultrasônicos esta esquematicamente ilustrado na Figura 1. Neste arranjo, uma fonte de luz é colocada, através de espelho plano, no foco de uma espelho esférico M1, com distância focal de 1.500mm e diâmetro 152,4 mm, cujo objetivo principal é o de se produzir um feixe de luz paralelo (seção de testes). Um segundo espelho M2, com as mesmas características técnicas do primeiro, preso a um trilho óptico é posicionado em frente ao feixe de luz paralelo, emergente do espelho M1. Uma vez que o feixe luminoso é estritamente paralelo entre M1 e M2, a luz proveniente de cada ponto da seção transversal do feixe (plano xy) pode ser considerada como dando origem a uma imagem individual da fonte no plano focal do espelho M2. Através de um sistema de objetivas a imagem da fonte luminosa é focalizada em uma tela branca e lisa de 600mm ´ 600mm. No plano focal do espelho M2 é colocada uma lâmina metálica fina, ajustada de tal forma a cortar pela metade, a intensidade luminosa que chega à tela de observação. O objeto a ser estudado é então colocado entre os espelhos M1 e M2 (região de testes). Caso a presença do objeto a ser estudado provoque variações do índice de refração do fluido circundante a deflexão angular de alguns raios de luz irá causar um correspondente deslocamento da imagem da fonte luminosa no plano focal do espelho esférico M2, com deslocamentos proporcionais ao gradiente de densidade considerado. Os raios luminosos deslocados ao passarem pela borda da lâmina metálica (situada no plano focal de M2), podem ou não atingir a tela de observação dependendo da geometria da deflexão. Em outras palavras, variações do índice de refração em torno do objeto a ser estudado irão desviar os raios luminosos e causar mudanças dinâmicas na iluminação da tela de projeção, sendo possível visualizar a sombra do objeto estudado com regiões de contorno em tons de claros e escuros. Estes contrastes de luzes e sombras que aparecem na tela de observações retratam com fidelidade gradientes da densidade do meio estudado.

Resultados experimentais: visualização dos campos ultrasônicos e discussões

Após ajustes variados do conjunto óptico montado (‘Schlieren’ ) vários ensaios visando a operacionalidade do sistema puderam ser realizados. Para a iluminação do arranjo ilustrado na Figura 1, foram inicialmente utilizados fonte de luz branca com potência total de 250 watts e posteriormente, substituída por um feixe LASER CW operado no modo multilinhas (Laser de argônio mod ILA 120 Zeiss).

O primeiro resultado da visualização de um gradiente de densidade induzido por diferença de temperatura foi efetuado a partir da observação direta da extremidade de um ferro de soldar, com potência de dissipação térmica de 20 watts. Avaliou-se desta forma o desempenho do sistema como um todo, adequando-se os vários parâmetros necessários ao registro fotográfico. O passo seguinte constituiu-se na utilização de um tanque acústico tipo aquário com dimensões de 40cm ´ 40cm ´ 30cm destinado a acondicionar o transdutor ultra-sônico. Este conjunto foi inserido na seção de testes da montagem óptica. Aproximadamente uma centena de fotografias a cores e em preto e branco foram realizadas com o transdutor imerso em meio aquoso, sob as mais diversas condições de geometria e potência ultra-sônica, para duas freqüências distintas de 1.0 MHz e 3.0 MHz, modo contínuo de operação. Como gerador de ultra-som utilizou-se o modelo comercial SONOPULSE 00166 fabricado pela IBRAMED (Indústria Brasileira de Equipamentos Médicos Ltda.). Deste total três fotografias foram selecionadas para neste texto ilustrarem os excelentes resultados obtidos.

As experiências de visualização com transdutor de PZT foram efetuadas com o tanque acústico mencionado contendo água destilada e degasada. O procedimento de degasamento da água é fator importante para se minimizar (ou mesmo até se evitar) a formação do indesejável fenômeno da cavitação, muito comum em experiências com feixes ultrasônicos acima de determinada potência. Todos os experimentos foram realizados com o transdutor imerso em água à temperatura ambiente 25oC.

Considerações gerais

Uma questão que merece destaque numa montagem ‘Schlieren’ refere-se à qualidade dos componentes ópticos e da sensibilidade para a qual se destina. Para o caso da aplicação desta técnica na visualização de campos ultra-sônicos, trabalho que requer alta sensibilidade, a qualidade óptica dos espelhos merece grande importância. Os espelhos côncavos empregados são usualmente construídos em vidro com espessura de 1/8’’ ou 1/6’’ do diâmetro do espelho. Com este procedimento procura-se minimizar as deformações que sempre ocorrem na superfície refletora do espelho, as quais tendem a prejudicar o resultado final do experimento de maneira apreciável. Outros requisitos necessários para uma boa qualidade da imagem estão relacionados aos parâmetros contrastes e sensibilidade respectivamente. Um ajuste preciso do corte da intensidade luminosa no plano focal de um dos espelhos em relação à imagem da fonte só é possível se a qualidade da imagem for suficientemente boa. Esta qualidade é afetada por principalmente aberrações esféricas e acromáticas relacionadas à curvatura de superfícies ópticas, efeitos de difração etc. O diâmetro dos espelhos esféricos é normalmente determinado pelo tamanho da câmara de trabalho (seção de testes); desta forma, a aberração óptica dependerá largamente da distância focal em relação à abertura do espelho.

É um fato bem determinante que o contraste relativo da figura projetada depende da potência da fonte luminosa. Por este argumento uma fonte LASER pode ser considerada como sendo muito superior a uma fonte de iluminação convencional uma vez que a densidade de potência do LASER é infinitamente superior a esta, pelo menos teoricamente. Do ponto de vista experimental o grande comprimento de coerência do LASER acaba por trazer problemas quanto a sua utilização, completamente desconhecidos das técnicas clássicas. Dentre os principais efeitos destaca-se a formação de ‘speckles’ e figuras de difração, causadas principalmente por partículas de pó, indesejáveis e sempre presentes em superfícies ópticas (lentes, espelhos, janelas ópticas etc). Deste ponto de vista pode-se considerar que a substituição de fontes de luz ordinária por luz LASER não introduz progressos significativos nas técnicas de ‘Schlieren’ .

Conclusões

O sistema óptico construído destinado à visualização de feixes ultrasônicos mostrou-se sensível, versátil e prático para retratar com fidelidade as variações infinitesimais do índice de refração produzidas por gradiente de densidade (induzidas por feixes ultra-sônicos) no meio líquido considerado. Desta forma, campos ultra-sônicos gerados por transdutores de PZT puderam se tornar visíveis, produzindo-se fotografias de interesse e grande qualidade técnica, conforme amostragem ilustrada no texto. Assim sendo, podendo tais campos serem caracterizados, um procedimento experimental de baixo custo relacionado a uma óptica ultra-sônica pode ser bem estabelecido.

Agradecimentos

Os autores agradecem a valiosa colaboração do Prof. Hiroshi Tejima (UFSCar) e a FUNDUNESP pelo apoio financeiro.

SANTARINE, G.A., STEIN-BARANA, A.C.M. Vizualization and characterization of ultrasonic fields using schlieren optics. Ecl. Quím. (São Paulo), v.25, p. , 2000

ABSTRACT: In this work we applied a sensible and low cost optical technique called Schlieren for visualization and caracterization of ultrasonic beam in aqueous solution. This caracterization have an important role in Medicine for non invasive diagnostic via ultrasound method.

KEYWORDS: Schlieren, ultrasound, ultrasonic field, visualization.

Recebido em 28.2.2000

Aceito em 3.4.2000

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  • * Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil.
    Departamento de Física, Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Unesp, 13500-970 , Rio Claro, SP. , Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Nov 2002
    • Data do Fascículo
      2000

    Histórico

    • Aceito
      03 Abr 2000
    • Recebido
      28 Fev 2000
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