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Da ruína e da conservação do mundo: o mundo como espaço discursivo e como discurso espacial

Resumos

Este trabalho discute o conceito heideggeriano de mundo a partir das noções de espaço e discurso, tais como elas aparecem em Ser e tempo. Pretendemos assim pensar o mundo como espaço discursivo e como discurso espacial. Isto permitirá entender por que, como Heidegger diz em A origem da obra de arte, "a ruína de um mundo é irreversível". Pensar o mundo como discurso pode também esclarecer a definição grega do homem como animal político e discursivo, assim como o conceito wittgensteiniano de jogos de linguagem.

Mundo; Espaço; Discurso; Cidade; Jogo; Linguagem


This paper discuss Heidegger's concept of world based on the notions of space and discourse, as they appear in Being and Time. We intend to think world as discursive space and spatial discourse. That would allow us to understand the reason why, as Heidegger says in The Origin of the Work of Art, "the ruin of a world is irreversible". Thinking world as discourse may also enlighten the Greek definitions of man as political and discursive animal, as well as Wittgenstein's concept of language games.

World; Space; Discourse; City; Game; Language


ARTIGOS

Da ruína e da conservação do mundo: o mundo como espaço discursivo e como discurso espacial1 1 Conferência de abertura do Seminário do Patrimônio, realizado de 06 a 08 de dezembro de 2002, no Centro Cultural da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), promovido pelo Projeto de Pesquisa Tempo e Memória na Obra de Arte, coordenado pela Profa. Dra. Glória Ribeiro, do Departamento de Filosofia da UFSJ.

Cláudio Oliveira

Professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal Fluminense. claudio.oliveira@uol.com.br

RESUMO

Este trabalho discute o conceito heideggeriano de mundo a partir das noções de espaço e discurso, tais como elas aparecem em Ser e tempo. Pretendemos assim pensar o mundo como espaço discursivo e como discurso espacial. Isto permitirá entender por que, como Heidegger diz em A origem da obra de arte, "a ruína de um mundo é irreversível". Pensar o mundo como discurso pode também esclarecer a definição grega do homem como animal político e discursivo, assim como o conceito wittgensteiniano de jogos de linguagem.

Palavras-chave: Mundo; Espaço; Discurso; Cidade; Jogo; Linguagem.

ABSTRACT

This paper discuss Heidegger's concept of world based on the notions of space and discourse, as they appear in Being and Time. We intend to think world as discursive space and spatial discourse. That would allow us to understand the reason why, as Heidegger says in The Origin of the Work of Art, "the ruin of a world is irreversible". Thinking world as discourse may also enlighten the Greek definitions of man as political and discursive animal, as well as Wittgenstein's concept of language games.

Keywords: World; Space; Discourse; City; Game; Language.

Para Glória Ribeiro, a "Glorinha".

Numa conferência pronunciada em 1935, sob o título "A origem da obra de arte", Heidegger afirma, num determinado momento: "A subtração e a ruína de um mundo são para sempre irreversíveis".2 2 " Weltentzug und Weltzerfall sind nie mehr rückgängig zu machen" (HEIDEGGER, 1999, p. 36). Trad. portuguesa: "A subtração e a ruína do mundo não são reversíveis" (HEIDEGGER. A origem da obra de arte, p. 31). Como podemos entender essa afirmação?

Naturalmente, não podemos entendê-la sem que nos perguntemos: o que Heidegger entende por mundo? O que é o mundo para que sua ruína seja irreversível? Proponho-me a responder a essas questões através de uma explicitação do modo como Heidegger pensa a questão do mundo a partir do espaço e do discurso: trata-se de entender o mundo como espaço discursivo e como discurso espacial. Talvez assim nos seja dado entender em que medida sua ruína é irreversível.

A espacialidade do mundo3 3 As considerações que se seguem baseiam-se, sobretudo, no terceiro capítulo, "A mundanidade do mundo" (" Die Weltlichkeit der Welt"), de Heidegger (1993. [Trad. bras.: HEIDEGGER, 1988]).

O espaço constitui o mundo. Os entes que pertencem ao mundo e que, por isso, chamamos de entes intramundanos, são entes intra-espaciais. A espacialidade do ente intramundano constitui sua estrutura ontológica. Essa espacialidade aparece, cotidianamente, no caráter de proximidade desses entes. A proximidade se mostra no fato de esses entes serem, essencialmente, entes que se encontram à mão. Eles estão sempre disponíveis ao manuseio. Não podemos, no entanto, entender essa manualidade em sentido estrito. Quando vamos à praia, "pegar um sol", nos ocupamos com o sol, com sua luz e seu calor. Tornamos o astro um manual intramundano. Sua proximidade é seu estar à mão. Nisso consiste, ao mesmo tempo, sua espacialidade.

Essa proximidade, no entanto, é uma distância que não pode ser medida em metros, centímetros ou quilômetros. É no uso que se descobre a proximidade dos entes, isto é, a distância em que eles se encontram. Na ocupação, sempre sabemos onde as coisas estão e para onde levá-las. O onde e o para onde da ocupação cotidiana dão a distância e a direção que constituem a espacialidade que Heidegger chama de espacialidade existencial ou espacialidade originária, em contraposição a uma espacialidade puramente física ou geométrica.

Um manual intramundano, nesse sentido, nunca se encontra meramente localizado num ponto do espaço, mas instalado numa conjuntura com outros entes. O manual tem seu lugar nessa conjuntura. Nela, cada lugar se determina como o lugar de um utensílio, como o seu onde, mas também como o seu para onde, isto é, como aquilo em que esse utensílio pode ser utilizado, ou seja, como a sua utilidade.

O lugar é sempre o aqui e o lá a que pertence um utensílio. E o utensílio sempre pertence a um todo de utensílios que constituem uma conjuntura de lugares utensiliários. Nesse espaço constituído pelos utensílios e pelas tramas tecidas pelos seus usos, já sempre nos orientamos e sabemos, não só onde estamos e para onde vamos, mas também onde estão as coisas e para onde as levamos: para que servem, no que podemos empregá-las. Em última instância, sabemos qual é o lugar delas e qual é o nosso próprio lugar dentro desse mundo.

Quando perguntamos, por exemplo, "onde está fulano?", e respondemos "no trabalho", "na missa", "no cinema", estamos falando de lugares, mas não de pontos do espaço. Com essas respostas, localizamos uma pessoa, não num espaço geométrico, mas num espaço existencial. Nós a localizamos em sua vida, em sua atividade, em sua existência. A espacialidade existencial não é geométrica, mas constituída pela própria rede de lugares que chamamos mundo. As coisas, nesse sentido, não ocupam pontos do espaço geométrico, ocupam lugares no espaço do mundo. Saber o lugar das coisas e nosso próprio lugar no espaço do mundo produz a familiaridade sem surpresas com que nos movemos cotidianamente. Mas essa espacialidade existencial que o homem descobre como mundo só é possível porque o próprio homem é em si mesmo espacial.

O homem lida, em suas ocupações, com as coisas que encontra dentro do mundo. Ao lidar com elas, sempre as localiza, sempre as descobre em seus lugares. Sem os lugares, o homem não encontraria as coisas e também não se encontraria em relação a elas. A produção do lugar é um caráter essencial do ser homem. Heidegger a define como o "dar-espaço" constitutivo do homem enquanto ser-no-mundo. Esse "dar-espaço" não é senão o que fazemos ao arrumar. Ao arrumar, damos às coisas lugares, isto é, permitimos que elas advenham no espaço existencial do mundo. Porque esses lugares não estão já dados ou previamente determinados é que podemos arrumar, e também desarrumar, ou simplesmente mudar a arrumação. Ao arrumar, dotamos uma coisa de um lugar, e um lugar, de uma coisa.

O lugar de uma coisa é a posição que ela ocupa em relação às outras coisas e aos homens. Os lugares são referências. Na cadeia de remetimentos que se estabelece entre as coisas, se constituem os lugares. Ao localizar uma coisa, sempre o fazemos por referência a uma outra: "onde está o livro?" "No armário", "atrás da porta", "em cima da mesa". É sempre em referência a outro ente que um ente se localiza, que um ente tem seu lugar. O lugar de um ente é o lugar que ele ocupa na cadeia de relações que se estabelece entre os entes. Essa cadeia é um mundo. Seguindo-a, descobrimos a distância e a proximidade que há entre as coisas e os homens. Nunca uma distância é tão longa que não seja também uma proximidade. Nunca uma proximidade é tão curta que não seja também uma distância. Proximidade e distância são o mesmo.

Mas só numa ocupação descobrimos as distâncias e proximidades que constituem os lugares. Só numa ocupação descobrimos propriamente o espaço existencial do mundo, pois só numa ocupação podem-se descobrir lugares. Lugares não podem ser descobertos através de uma mera observação das coisas. Numa cozinha, por exemplo, é cozinhando que se descobre onde estão os utensílios e os ingredientes destinados a essa tarefa: as panelas e o feijão.

Ao se ocupar, o próprio homem se localiza, ganha seu lugar. Ao providenciar, ao aprontar, ao ter simplesmente algo à mão, o próprio homem habita essa cadeia de relações que é o mundo. Chamemos essa cadeia uma articulação. Chamemos essa articulação um discurso. Chegamos então à idéia de que o próprio espaço do mundo é um discurso.

A discursividade do mundo4 4 As considerações que se seguem baseiam-se, sobretudo, no quinto capítulo, "O ser-em como tal" (" Das In-Sein als solchest"), de Heidegger (1993 [Trad. bras.: HEIDEGGER, 1988]).

No discurso, o que se articula é uma compreensão. O discurso é a articulação da compreensão. Toda compreensão do que quer que seja já se encontra sempre articulada num discurso. Enquanto articulação da compreensão, o discurso está na base de toda interpretação. O discurso sempre se explicita no modo como interpretamos as coisas, no modo como as compreendemos. O que se articula no discurso é o sentido, ou seja, o que as coisas significam, isto é, o que elas são. A articulação do discurso estrutura uma totalidade significativa. Essa totalidade, por sua vez, se desmembra em significações.

A manifestação mundana do discurso é a linguagem. O discurso é, para Heidegger, o fundamento ontológico-existencial da linguagem. Na linguagem, vem à palavra a totalidade significativa que é o mundo. Na linguagem, se pronuncia o mundo enquanto discurso. O ser "mundano" do discurso, a linguagem, se constitui como uma totalidade de palavras que podem ser encontradas como qualquer outro utensílio intramundano. As palavras, como os utensílios, se articulam num discurso. Dizemos: panela, fogo, fogão; como dizemos: sujeito, verbo, predicado. Usar palavras e utensílios implica articulá-los discursivamente. Sem essa articulação, cada um utilizaria as palavras e os utensílios como quisesse ou lhe aprouvesse. Não é o que ocorre, e por isso pode haver comunicação.

A comunicação se constitui como a articulação da convivência dos que compartilham uma mesma compreensão, um mesmo mundo. O mundo é sempre o mundo compartilhado.

Se o discurso é a articulação da compreensão do mundo, a ele sempre pertence o ser com os outros, o qual já sempre se mantém num determinado modo de convivência ocupacional. Enquanto nos ocupamos com as coisas, já sempre nos preocupamos com os outros. Toda ocupação já sempre é preocupação: convivência. E a convivência é discursiva.

O fenômeno da comunicação só pode ser entendido nesse contexto fundamentalmente existencial. Em sentido existencial, a comunicação significa a "partilha" da compreensão que nos une aos outros.

A comunicação, nesse sentido, nunca é transposição de vivências, de opiniões, de desejos, do interior de um sujeito para o interior de outro sujeito. Numa palavra, a comunicação não é expressão. Ao se comunicar, o homem não sai de um "interior" onde estaria encapsulado para um exterior. Como ser-no-mundo, ao compreender, o homem já se acha "fora". O ser com os outros na convivência se revela, na verdade, na compreensão comum. Esse ser com os outros é "partilhado" no discurso.

A comunicação é esse momento constitutivo do discurso enquanto articulação de uma compreensão compartilhada do mundo. A comunicação, nesse sentido, não precisa se dar necessariamente "em palavras". Mesmo "sem palavras", a comunicação é sempre um modo de discurso. Quando trabalhamos, mesmo calados, nos entendemos, porque convivemos desde um mesmo discurso.

Ora, na medida em que o discurso é constitutivo do mundo, na medida em que o próprio mundo se constitui como discurso, ser homem enquanto ser-no-mundo significa: ser em um discurso. É o que, segundo Heidegger, se descobre na definição aristotélica do homem como ser dotado de linguagem ou como ser que habita a linguagem.

A definição aristotélica do homem como animal que tem linguagem (dzôion ékhon lógon) aparece, curiosamente, na Política (I, 2, 1253a1-9) e não nos tratados lógicos de Aristóteles. É que não se trata de uma definição lógica do homem, nem do discurso. Mas também não se trata de uma definição "política". Ao menos não no sentido em que hoje entendemos esse termo. A definição do homem como animal dotado de linguagem aparece no mesmo parágrafo em que Aristóteles define o homem como politikòn dzôion. Se traduzirmos essa expressão por "animal político", devemos ter em mente que politikós, em grego, significa, primariamente, aquilo que é relativo à pólis, à cidade. Dzôin politikón, animal político, deve, nesse sentido, ser entendido como animal urbano ou animal que habita a cidade. Sobrepondo-se as duas definições, temos que polikón e lógon ékhon são o mesmo: ser político é ter a linguagem, habitar a cidade (pólis) é habitar a linguagem (lógos). A cidade do homem é o discurso. O discurso do homem é a cidade.5 5 Cf. WITTGENSTEIN, 1975, p. 19: "Nossa linguagem pode ser considerada como uma velha cidade".

Nesse sentido, a definição aristotélica do homem como animal dotado de linguagem esclarece em que medida o homem é um animal político. É um animal político porque dotado de linguagem. Os outros animais são apenas gregários. Só o homem é político no sentido de ser dotado de linguagem. O fenômeno político enquanto fenômeno político só tem lugar na linguagem. O fenômeno político é um fenômeno de linguagem. O homem é político enquanto fala. E sempre que fala é político. A cidade, nesse sentido, se constitui discursivamente, no espaço da fala: é espaço discursivo, é discurso espacial. Só como discurso há a cidade, e só como falante na cidade o homem é político.

É o que vemos também no Protágoras de Platão. Segundo o mito que Protágoras conta nesse diálogo, o homem é descrito como o único animal a possuir a arte de articular voz e palavras (Zôion mónon [...] phonèn kaì onómata dierthrósato têi tékhnei, 322a). Tal virtude, que Protágoras distingue como a virtude política, é aquela que permite que haja cidades. Ela é ao mesmo tempo chamada de virtude humana, o que quer dizer que, para Protágoras, como para Aristóteles, só na cidade o homem é homem e só há cidade porque o homem fala.

Essa virtude humana ou política, segundo Protágoras, nem é natural, nem se dá por si só, mas é ensinável (utèn ou phýseieînai oud' apò toû automátou allá didaktón, 323c). É uma virtude que se adquire (paraskeuastòn eînai aretén, 324a). Ninguém nasce homem, aprende-se a sê-lo. Aprende-se essa virtude, a virtude de ser homem, como se aprende uma língua, diz Protágoras. E quem a ensina? São todos aqueles que fazem parte da cidade, que falam a sua língua. Ensinam a virtude humana todos aqueles habitam a cidade, assim como ensinam grego todos os que falam grego.

Voltando à Política, Aristóteles diz que um homem que não fizesse parte de cidade nenhuma seria como uma peça isolada do jogo. O que quer dizer que, para Aristóteles, o homem só é homem na cidade, mas também que a cidade é um jogo: um jogo de linguagem. Mas, como nos lembra Wittgenstein, um jogo de linguagem é sempre uma forma de vida.6 6 "E representar uma linguagem significa representar-se uma forma de vida" (WITTGENSTEIN, 1975, p. 19). "O termo ' jogo de linguagem' deve aqui salientar que o falar da linguagem é uma parte de uma atividade ou de uma forma de vida" ( Idem, p. 22). Por isso, o que está em jogo num jogo de linguagem é a própria vida dos que nele jogam. No jogo de linguagem que é a cidade, está em jogo a vida dos que aí vivem. A própria vida é esse jogo e, ao mesmo tempo, o que está em jogo.

Concluindo

Se voltarmos agora à nossa questão inicial, veremos que o que Heidegger chama de "ruína de um mundo" só pode ser entendido como ruína de um certo espaço constituído pelos lugares que só podem ser descobertos por uma ocupação. A ruína de um mundo é a ruína de um discurso enquanto aquilo que articula uma compreensão comum que orienta essa ocupação. Quando essa compreensão não orienta mais ninguém, não pertence a mais ninguém e não pode mais ser transmitida, ensinada, se dá a ruína desse mundo. Não se trata tanto das coisas, mas das relações que se estabelecem entre elas, dos lugares que elas ocupam umas em relação às outras, e do lugar que os homens ocupam nessas relações. Mesmo que as coisas, utensílios e obras de arte que pertencem a um mundo sobrevivam, mesmo que possamos encontrá-los ainda em exposições ou nos acervos dos museus, o seu mundo não pode mais ser restaurado ou restituído. Os críticos e conhecedores podem ocupar-se das coisas que pertenceram a esse mundo, mas apenas como objetos. Pode haver um comércio deles, um mercado para eles. A história pode transformá-los em objeto de uma ciência. Mas o mundo dessas coisas já ruiu. E essa ruína é irreversível.

Podemos certamente ter desses objetos um gozo artístico, público ou privado. Podemos cuidar deles e transformá-los em nosso patrimônio, mas fazendo isso só estaremos confirmando a morte irreversível do mundo ao qual eles pertenceram. Por maior que seja a qualidade desses objetos, por melhor que seja seu estado de conservação, ao transferi-los para um museu ou para uma exposição, nós já os retiramos de seu mundo, o único lugar em que eles podem ser o que de fato são.

Enquanto ruínas ou antigüidades, esses objetos são um passado que não volta mais, pois a ruína de um mundo é irreversível. A conservação dos objetos pode continuar sendo empreendida, mesmo que esse mundo já não mais exista. A conservação de um mundo, todavia, só pode ser feita por aqueles que nele vivem. Se os homens vivem nas cidades, as cidades, por sua vez, vivem nos homens, e só neles se mantêm vivas. Se os homens que habitam uma cidade desaparecem, desaparece também a cidade que os habita. Por isso, os que conservam um mundo, e não apenas os objetos que pertencem a esse mundo, são aqueles que preservam os lugares que esses objetos ocupam nesse mundo e as ocupações que constituem esses lugares; são aqueles que se conservam numa convivência ocupacional na qual surgem esses lugares e o discurso a partir do qual essa convivência se dá; são aqueles que jogam o jogo de linguagem que constitui esse mundo como discurso. E assim como um jogo só se conserva sendo jogado, uma língua só se mantém sendo falada. Se o mundo é um discurso que abre um espaço de relações, para que esse espaço se mantenha aberto, é preciso que esse discurso esteja vivo. Não existe a conservação de um mundo passado. Só existe a conservação de um mundo presente. E um mundo só é presente se ele tem um futuro. Em outras palavras: um mundo só se conserva mantendo-se vivo. Pois a morte de um mundo, como toda morte, é irreversível.

Artigo recebido em dezembro de 2005 e aprovado em março de 2008.

  • HEIDEGGER, M. Der Ursprung des Kunstwerkes Stuttgart: Reclam, 1999. [Trad. portuguesa: A origem da obra de arte Trad. Maria da Conceição Costa. Lisboa: Edições 70, s.d.
  • HEIDEGGER, M. Sein und Zeit Tübingen: Niemeyer, 1993. [Ed. Bras.: Ser e tempo Trad. Márcia de Sá Cavalcanti. Petrópolis-RJ: Vozes, 1988. 2 v.
  • PLATON. Protagoras Texte établit et traduit par A. Croiset. Paris: Les Belles Lettres, 1984. (Collection des Universités de France).
  • ARISTOTE. Politique Texte établit et Traduit par Jean Aubonnet. Paris: Les Belles Lettres, 2002. (Collection des Universités de France). [Ed. Bras.: ARISTÓTELES. Política Trad. Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1988]
  • WITTGENSTEIN, L. Investigações Filosóficas Trad. José Carlos Bruni. São Paulo: Abril Cultural, 1975. (Coleção Os Pensadores).
  • 1
    Conferência de abertura do Seminário do Patrimônio, realizado de 06 a 08 de dezembro de 2002, no Centro Cultural da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), promovido pelo Projeto de Pesquisa Tempo e Memória na Obra de Arte, coordenado pela Profa. Dra. Glória Ribeiro, do Departamento de Filosofia da UFSJ.
  • 2
    "
    Weltentzug und Weltzerfall sind nie mehr rückgängig zu machen" (HEIDEGGER, 1999, p. 36). Trad. portuguesa: "A subtração e a ruína do mundo não são reversíveis" (HEIDEGGER.
    A origem da obra de arte, p. 31).
  • 3
    As considerações que se seguem baseiam-se, sobretudo, no terceiro capítulo, "A mundanidade do mundo" ("
    Die Weltlichkeit der Welt"), de Heidegger (1993. [Trad. bras.: HEIDEGGER, 1988]).
  • 4
    As considerações que se seguem baseiam-se, sobretudo, no quinto capítulo, "O ser-em como tal" ("
    Das In-Sein als solchest"), de Heidegger (1993 [Trad. bras.: HEIDEGGER, 1988]).
  • 5
    Cf. WITTGENSTEIN, 1975, p. 19: "Nossa linguagem pode ser considerada como uma velha cidade".
  • 6
    "E representar uma linguagem significa representar-se uma forma de vida" (WITTGENSTEIN, 1975, p. 19). "O termo '
    jogo de linguagem' deve aqui salientar que o falar da linguagem é uma parte de uma atividade ou de uma forma de vida" (
    Idem, p. 22).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Recebido
      Dez 2005
    • Aceito
      Mar 2008
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