Acessibilidade / Reportar erro

BOA-FÉ E VALIDADE DOS CONTRATOS EM HOBBES: UMA INTERPRETAÇÃO A PARTIR DE RAWLS*

RESUMO

O texto acalenta a hipótese de que as razões pelas quais Hobbes justifica a desobediência e mesmo a resistência ao soberano possam ser compreendidas a partir da teoria da boa-fé contratual, tal qual apresentada por Rawls em Uma teoria da justiça.

Palavras-chave:
Hobbes; direito natural; jus naturale; lei civil; lex civilis; absolutismo; resistência; autodefesa

ABSTRACT

The text raises the hypothesis that the reasons why Hobbes justifies disobedience and even resistance to the sovereign can be understood from the contractual good-faith theory, as presented by Rawls in A Theory of Justice.

Keywords:
Hobbes; Right of nature; jus naturale; civil law; lex civilis; absolutism; resistance; self-defense

Introdução

As interpretações dos posicionamentos políticos de Hobbes, bem como qual regime de governo a sua teoria embasa, são conflitantes. Uma das teorias predominantes a respeito é a de que a sua filosofia política sustentaria um Estado absolutista. Talvez, Kant seja o mais radical desses intérpretes que consideraram Hobbes um absolutista quando diz ser terrível a tese do De cive de que o soberano não poderia errar ou cometer injustiça.1 1 “Hobbes é de opinião contrária. Segundo ele (De Cive, cap. VII, g 14), o chefe de Estado de nenhum modo está ligado por contrato ao povo e não pode cometer injustiça contra o cidadão (seja qual for a sua decisão a respeito deste). - Semelhante tese seria totalmente correcta se, por injustiça, se entende a lesão que reconhece ao lesado um direito de constrangimento relativamente àquele que comete a injustiça; mas, considerada na sua generalidade, a tese é terrível [erschrecklich]” [TP, AA 08: 303-304]. Constant, por seu turno, também viu em Hobbes um exemplar de absolutismo: “vê-se claramente que o caráter absoluto que Hobbes atribui à autoridade social é a base de todo o seu sistema”.2 2 “L'on voit clairement que le caractère absolu, que Hobbes attribue à l'autorité sociale, est la base de tout son système” (2000, p. 60). Ademais, ele anota: “On voit que dans Hobbes un mot superflu cause tout le mal. Il part aussi d'une vérité, c'est qu'il faut une force coercitive pour gouverner les ssociations humaines. Mais il glisse dans sa phrase une seule épithète superflue, le mot absolu, et tout son système devient un tissu d'erreurs” (Constant, 2000, p. 63). Segundo Pettit (1997, p. 37PETTIT, P. “Republicanism: A Theory of Freedom and Government”. Oxford: Oxford University Press, 1997.; 2008, pp. 1, 96, 133)______. “Made with Words: Hobbes on Language, Mind, and Politics”. Princeton and Oxford: Princeton University Press, 2008., Hobbes pertence à tradição absolutista e é um crítico do republicanismo. No mesmo sentido, Curran (2007, p. 20)______. “Reclaiming the Rights of the Hobbesian Subject”. Chippenham: Palgrave Macmillan, 2007. registra que Hobbes foi um monarquista absolutista,3 3 “Hobbes was a royalist. He supported Charles I during the English Civil War and advocated absolutism of the most extreme variety” (Curran, 2007, p. 11). não obstante, segundo ela, isso ter mudado no Leviatã.

Que a matéria seja controversa se pode ver pela própria declaração de Bramhall, já na época da publicação do Leviatã, dizendo que Hobbes havia escrito um catecismo para rebeldes, “Por que não mudamos o nome do Leviatã para Catecismo de rebeldes?”4 4 “Why should we not change the name of Leviathan into the Rebel’s Catechism?” (Bramhall, 2011, p. 347). Da mesma forma, Edward (1676, p. 5)EDWARD, E. C. “A Brief View and Survey of the Dangerous and Pernicious Errors to Church and State in Mr. Hobbes’s Book, Entitled Leviathan”. Oxford: Bathurst, 1676., à época, registrou que a obra continha os mais destrutivos princípios do Estado e da igreja: “os princípios mais perniciosos e mais destrutivos da paz para a igreja e para o Estado, que estão espalhados por todo o livro do Leviatã".

O direito natural de resistir ao soberano

Rawls, no capítulo III de Uma teoria da justiça, especialmente os parágrafos 28, 29 e 30, argumenta contra o utilitarismo em razão de ele pressupor uma psicologia que não honraria a boa-fé de uma expectativa razoável de cumprimento de um contrato. Nesse sentido, o utilitarismo médio seria recusado por ser vão, uma vez que pressuporia um indivíduo benevolente, simpático: “A sua concepção de justiça é ameaçada por instabilidade, a menos que a simpatia e a benevolência possam ser ampla e intensamente cultivadas”.5 5 “Their conception of justice is threatened with instability unless sympathy and benevolence can be widely and intensely cultivated” (1999, p. 155). Desse modo, a estabilidade teria que se fundamentar no homem interessado pelo seu próprio bem, ou seja, desinteressado no bem dos outros. Segue-se, portanto, que a boa-fé contratual pede um tratamento a partir do autointeresse e não a partir da benevolência. Por isso, o presente texto pretende alavancar a tese de que a teoria da boa-fé contratual de Rawls pode ser mobilizada para explicar por que Hobbes considera certas cláusulas do contrato social como nulas. Isso significa, ao final, que a boa-fé é reformulada por Rawls em um sentido hobbesiano de contrato.

No capítulo XXI do Leviatã, Hobbes sustenta em uma mesma frase duas teses que parecem dissonantes de seu sistema, quais sejam, que o soberano pode ser desobedecido e que ele pode ser desobedecido sem cometer injustiça. Eis o que ele afirma:

Passando agora concretamente à verdadeira liberdade dos súditos, ou seja, quais são as coisas que, embora ordenadas pelo soberano, não obstante eles podem sem injustiça recusar-se a fazer, é preciso examinar quais são os direitos que transferimos no momento em que criamos um Estado (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXI).

Tal formulação parece ser fatal para a interpretação absolutista de Hobbes: “Para os monarquistas, direito algum de um súdito poderia ser um trunfo contra os direitos do rei. Para Hobbes, nenhum dos direitos políticos de um soberano pode ser um trunfo contra o direito de um súdito defender e preservar a sua vida” (Curran, 2007______. “Reclaiming the Rights of the Hobbesian Subject”. Chippenham: Palgrave Macmillan, 2007., p. 144). Mais que isso, como pode um sistema para o qual a justiça é estabelecida pelo contrato afirmar que depois do contrato este pode ser desrespeitado sem que tal desobediência seja considerada injustiça? A resposta, Hobbes a oferta apelando à nulidade de certas cláusulas contratuais. Hobbes considera nulas certas promessas contratuais. Deveras, logo em seguida à afirmação anterior, ele sustenta: “Já no capítulo 14 mostrei que os pactos no sentido de cada um abster-se de defender seu próprio corpo são nulos. Portanto, [...] Ninguém fica obrigado pelas próprias palavras a matar-se a si mesmo ou a outrem” (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXI). O efeito da nulidade, portanto, é claro no texto de Hobbes: a desobediência a uma cláusula nula não pode ser inquinada de injustiça. Porém, o que significa uma nulidade contratual? Por que certas cláusulas de um contrato são nulas de pleno direito?

Watkins bem resume o ponto aqui em questão: “cada súdito renuncia ao direito de defender outros súditos contra o soberano e, acima de tudo, concorda em ajudar o soberano no exercício de seu direito natural contra outros súditos. Homem algum renuncia ao seu direito natural de autodefesa”.6 6 “Each subject renounces the right to defend other subjects against the sovereign and, moreover, agrees to assist the sovereign in exercising his natural right against other subjects who break the law. No man renounces his natural right to defend himself” (Watkins, 1973, p. 97). Permanece íntegro, portanto, o direito de resistir à pena de morte: “da mesma forma, um direito do súdito resistir à pena de morte permanece do estado de natureza anterior”.7 7 “a subjects's right to resist the death-penalty likewise remains from the first right of nature” (Watkins, 1973, p. 98). A obrigação de obedecer só existe até o ponto em que o poder do soberano possa proteger, de tal forma que “a relação entre o soberano e o súdito a quem ele condenou à morte reverte àquela entre dois antagonistas no estado de natureza, exceto que, agora, um deles é muito mais poderoso do que o outro”.8 8 “the relation between the sovereign and a subject whom he has condemned to death reverts to that between two antagonists in a state of nature, except that, now, one of them is much more powerful than the other” (Watkins, 1973, p. 98). Por isso, no limite, um Estado vai depender de pelo menos uma parte dos súditos obedecerem à lei de forma voluntária. De fato, Hobbes afirma: “Pois, se os homens não conhecessem o seu dever, o que lhes poderia forçar a obedecer às leis? Um exército, você dirá. Mas, o que forçaria o exército”?9 9 “For if men know not their duty, what is there that can force them to obey the laws? An army, you will say. But what shall force the army”? (Hobbes, 1839, p. 148).

Recusar as ordens do soberano

As teses apresentadas acima implicam, aparentemente, um enfraquecimento da interpretação absolutista da autoridade do soberano. Pretende-se defender que tais posicionamentos da teoria hobbesiana do Estado, na verdade, não são incompatíveis com o caráter absoluto da soberania, isso porque este caráter absoluto da soberania significa que a sua decisão é final e que a sua autoridade pode contar com um poder maior para impor a decisão do que o poder que resta aos súditos, pois o Leviatã resulta precisamente de dois fatores. Por um lado, da união do poder de um grande número de humanos que se omitem de interferir com o seu poderio e, por outro, de um número de humanos, pequeno ou grande, que se dispõem a executar os seus comandos, os quais, aliás, são movidos menos pela obrigação enquanto tal e mais pelo salário que o soberano está apto a lhes pagar regularmente. Ou seja, o pacto político é uma forma de criar desigualdade de poder em uma condição de perfeita igualdade, já que no estado de natureza todos são igualmente matáveis, mesmo o homem mais forte. No caso do súdito recalcitrante, a questão se resolve no âmbito do direito natural, como um conflito de poder, vencendo o poder maior, o do Leviatã, que é capaz de impedir pela coação que o uso da liberdade que o indivíduo tem de usar do seu poder para a sua autoconservação exorbite o direito de autodefesa:

Entende-se que a obrigação dos súditos para com o soberano dura enquanto, e apenas enquanto, dura também o poder mediante o qual ele é capaz de protegê-los. Porque o direito que por natureza os homens têm de defender-se a si mesmos não pode ser abandonado através de pacto algum. […] O fim da obediência é a proteção […] (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXI).

No cap. XXI do Leviatã, Hobbes explica que a resistência à espada do Estado é uma liberdade, ou seja, dependente de um ato voluntário. Ele nega que exista tal liberdade quando ela prejudica o fim em vista do qual a soberania foi criada. O exemplo de Hobbes é o da liberdade de resistir à espada do Estado em defesa de outrem, porque tal resistência destrói a essência mesma do Estado, pois priva o soberano dos meios de impor a sua decisão. Segue-se disso que resistir à espada do Estado para se autodefender não atenta contra a finalidade do Estado, apenas exige que o poder do soberano seja maior do que o poder de resistência do indivíduo. Vale a pena anotar que o conceito de poder em Hobbes é bastante amplo, contudo, o principal poder é aquele que resulta da união dos homens.10 10 “The Greatest of humane Powers, is that which is compounded of the Powers of most men, united by consent, in one person, Naturall, or Civill, that has the use of all their Powers depending on his will; such as is the Power of a Common-wealth: Or depending on the wills of each particular; such as is the Power of a Faction, or of divers factions leagued. Therefore to have servants, is Power; To have friends, is Power: for they are strengths united” (Hobbes, 1998, cap. X).

Logo, o fundamento do direito à resistência para a autodefesa não se funda, como pensa BurgessBURGESS, G. “Hobbesian Resistance Theory”. Political Studies, Vol. 42, Nr. 1, pp. 62-83, 1994. 11 11 Nesse sentido, a aproximação que ela faz entre Hobbes e Locke é exagerada. (1994)BURGESS, G. “Hobbesian Resistance Theory”. Political Studies, Vol. 42, Nr. 1, pp. 62-83, 1994., na desobediência do soberano às leis naturais, mas no direito natural de reagir em prol da defesa do seu corpo, o que pode acontecer mesmo quando o soberano cumpre a lei natural, como quando ele ordena prender ou matar quem desrespeitou a própria lei natural. É de se ressaltar que a lei natural e o direito natural não operam com o mesmo registro. Aliás, no cap. XXVIII do Leviatã, Hobbes defende o direito de punir não com base na lei natural, mas com base no direito natural a todas as coisas, que o soberano mantém, mesmo no estado civil. Contudo, se o soberano transforma a lei natural em lei civil, então, ele, ao ordenar esse fim, ordena também o meio da punição. Ou seja, a reação ao direito de punir do soberano se dá no mesmo nível do direito do homem de reagir. Como bem anota Hobbes, o direito de punir do soberano não advém da sua autoridade, mas do seu direito no estado de natureza:

[...] antes da instituição do Estado, cada um tinha direito a todas as coisas, e a fazer o que considerasse necessário a sua própria preservação, podendo com esse fim subjugar, ferir ou matar a qualquer um. E é este o fundamento daquele direito de punir que é exercido em todos os Estados. Porque não foram os súditos que deram ao soberano esse direito; simplesmente, ao renunciarem ao seu, reforçaram o uso que ele pode fazer do seu próprio, da maneira que achar melhor, para a preservação de todos eles. De modo que ele não lhe foi dado, foi-lhe deixado, e apenas a ele; e tão completo (com exceção dos limites estabelecidos pela lei natural) como na condição de simples natureza, ou de guerra de cada um contra seu próximo. (Hobbes, 1998______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a., cap. XXVIII).

Forçoso concluir, portanto, que os atos de punição, inclusive as punições justas, ativam o estado de guerra latente, determinando que se trata de um conflito de poder, o qual se resolve pela força: “O poder não é mais do que o excesso de poder de um sobre o outro. Pois, poderes iguais opostos destroem-se um ao outro”.12 12 “power simply is no more, but the excess of the power of one above that of another. For equal powers opposed, destroy one another” (Hobbes, 1928, §4). Desse modo, o súdito que resiste à execução da sentença não comete injustiça, haja vista a operação ocorrer no estado de natureza, até porque, se cláusula contratual houvesse a comprometer o súdito a não reagir, ela seria nula de pleno direito.

Em uma época de guerras religiosas, para justificar o Estado, Hobbes teve que apresentar fundamentos fortes para tal. Por isso, a força do argumento para o Estado deve residir mais naquilo que ele evita e menos no que ele promove, pois a aversão é em geral mais forte do que o apetite. A dor é um repelente mais forte do que a atração do prazer. Ora, se no estado de natureza vigesse a lei natural, seguir-se-ia um estado fraco, porque já haveria uma certa concórdia, sendo o Estado apenas uma melhoria da situação. Não, o Estado nasce para resolver um estado da guerra. Hobbes pôde partir do estado de guerra devido às guerras entre os Estados, às guerras religiosas, às guerras civis, à anarquia. O último parágrafo do Leviatã registra a motivação do texto: “as desordens dos tempos presentes”. Dito claramente, Hobbes “temia a anarquia mais do que a tirania”,13 13 “feared anarchy more than tyranny” (Gauthier, 1969, p. 144). um caminho, aliás, que mais tarde parece ter sido seguido também por Kant.

Ou seja, o estado de guerra permanece sempre uma possibilidade, basta o soberano não ter mais a força ou a autoridade de garantir a paz. Entre a autoridade e a força, melhor que ele tenha a força. O problema que o Leviatã enfrenta é o exercício de um poder do corpo, segundo o juízo privado do homem. Formulado em termos naturalistas ou em termos de psicologia, como preferiria Rawls, o movimento que o corpo é, como mecanismo de poder, porta uma certa inércia que catapulta junto consigo um indeclinável juízo privado, qual seja, aquele da autodefesa.

Se o soberano perde o poder de proteger o cidadão ou se ele tenta tomar a vida dele como punição por crimes sérios ou de qualquer modo que seja, seus comandos não são lei para o cidadão envolvido, de tal forma que o julgamento em relação ao seu próprio caráter extremo pode, em última análise, ser feito somente pelo próprio cidadão. Assim, salvação e preservação são valores que não são criados pelo comando soberano, portanto, eles restringem a competência da lei civil quando esta conflita com os mesmos - uma circunstância que é geralmente evitada somente porque tais conflitos não podem ocorrer normalmente.14 14 “If the sovereign loses the power to protect the citizen, or if he tries to take his life as punishment for serious crime or otherwise, his commands are not law for the citizen involved, and the judgement regarding his own extremity can ultimately be made only by the citizen himself. Thus salvation and preservation are values which are not created by sovereign command, and they restrict the competence of civil law where it conflicts with them - a circumstance that is generally averted only because such conflicts cannot normally occur” (Warrender, 1957, p. 327).

Junto com a renúncia àqueles direitos que são necessários para a convivência, para a pacificação da sociedade, para o estabelecimento da ordem, ocorre a renúncia do julgamento de cada um sobre tais matérias, bem como a renúncia da decisão sobre elas. De fato, um dos elementos fundamentais do direito natural no estado de natureza é o direito de julgar (Hobbes, 1928______. (1640). “The Elements of Law Natural and Politic”. Cambridge: Cambridge University Press, 1928., cap. 14, §8; 1983______. (1642). “De Cive”. Oxford: Clarendon, 1983., cap. I, §IX). Ora, em relação àqueles direitos que devem ser renunciados, pois que necessário para a consecução da paz, ocorre também a renúncia da decisão sobre eles, tornando-se o soberano autorizado para tal:

Usando a definição de Schmitt sobre soberania como uma ferramenta analítica, eu fiz duas reinvindicações: (i) no argumento de Hobbes, o indivíduo (e não o Estado) é soberano: os indivíduos decidem se as circunstâncias são excepcionais, sendo que no caso particular excepcional no qual o direito de autopreservação foi ameaçado pelo Estado, Hobbes sustenta que a obediência ao mesmo pode ser afastada; (ii) na teoria de Hobbes, o direito de autopreservação, não o Estado, é absoluto: o primeiro é uma característica permanente do homem que impõe limites e funções ao último.15 15 “Using Schmitt’s definition of sovereignty as an analytical tool, I made two claims: (i) in Hobbes’s argument, the individual (and not the state) is sovereign: individuals decide if circumstances are exceptional; and in the particular exceptional case in which one’s right to self-preservation has been endangered by the state, Hobbes maintains that obedience to the state can be withdrawn; (ii) in Hobbes’s theory, the right to self-preservation and not the state is absolute: the former is a permanent characteristic of man which imposes limits on the aims and functions of the latter” (Slomp, 2010, p. 365).

Se, mesmo não tendo a vida ameaçada, o escravo reage, muito mais aquele que tem a vida ameaçada. Todo dever decorre de obrigações livremente assumidas. Por isso mesmo, um escravo não tem obrigações em relação ao seu senhor, pois sua situação não decorre de escolha, ou seja, seu corpo não permanece livre, mas a ferros.16 16 “For such men, commonly called slaves, have no obligation at all” (Hobbes, 1998b, cap. XX). Se Rousseau pôde dizer que os grilhões tiram a vontade de ser livre, não há grilhão capaz de tirar a vontade de viver. Tivessem os grilhões tal condão, ficaria solapado o fundamento mesmo da escravidão. Como bem apontou Hegel (1992)HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do espírito. [2 v.]. Petrópolis: Vozes, 1992., o apego do escravo à vida torna-se exatamente a sua cadeia (§190).17 17 "En effet l'esclave n'est pas proprement esclave du maître, mais de la vie" (Hyppolite, p. 166). Ora, a vontade de viver é a inércia do movimento que constitui um corpo vivo. Se não houver impedimento externo, então, a tal movimento do corpo Hobbes atribui o predicado da liberdade. Se houver impedimento, a força do movimento inercial implicará uma resistência ao impedimento em questão, quando, então, o soberano precisará de poder para matar o súdito recalcitrante às suas ordens. Eis a sua força e o seu limite: “o poder do Estado encontra o seu limite absoluto nesse direito natural e não em outro fato moral”.18 18 “the power of the state finds its absolute limit in that natural right and in no other moral fact” (Strauss, 1965, p. 181).

Nesse diapasão, pode-se compreender a defesa de Warrender de que em Hobbes operariam dois conceitos de direito, um como pretensão moral contra os outros e outro como não ser obrigado a renunciar: “Hobbes usa o termo direito com dois sentidos distintos: (1) como aquilo ao qual se tem uma titularidade; (2) como aquilo ao que não se é obrigado a renunciar”.19 19 “Hobbes uses the term right with two distinct meanings: (1) as that to which one is morally entitled; (2) as that which one cannot be obliged to renounce” (Warrender, 1957, p. 18). No primeiro caso, os direitos seriam o verso da medalha de deveres, seriam sombras de deveres. No segundo caso, os direitos seriam uma antítese dos deveres, ou seja, uma liberdade ou isenção de obrigação: “Ao passo que no sentido considerado por primeiro, direitos são as sobras dos deveres, no segundo sentido, eles são a antítese de deveres, sendo um direito uma liberdade ou isenção de obrigação”.20 20 “Whereas in the sense considered first, rights are the shadows of duties, in the present sense they are the antitheses of duties and a right is a freedom or exemption from obligation” (Warrender, 1957, p. 19). Quando Hobbes fala das verdadeiras liberdades dos súditos ou do direito a todas as coisas, a referência seria ao direito como isenção de obrigação (Warrender, 1957WARRENDER, H. “The Political Philosophy of Hobbes”. Oxford: Oxford University Press, 1957., p. 20). Com efeito, ao se referir ao direito do súdito contra a punição do Estado, ele anota “[...] ninguém é obrigado a não lhe resistir” (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. IV). Ou seja, “A auctoritas só pode se afirmar numa relação de validação ou de suspensão da potestas” (Agamben, 2004AGAMBEN, G. “Estado de exceção”. [I. D. Poleti: Stato di eccezione]. São Paulo: Boitempo, 2004., p. 130). Esta é jurídica; aquela, política. “É um poder [a auctoritas] que suspende ou reativa o direito, mas não tem vigência formal como direito” (Agamben, 2004AGAMBEN, G. “Estado de exceção”. [I. D. Poleti: Stato di eccezione]. São Paulo: Boitempo, 2004., p. 121).

Portanto, uma característica desses direitos é que eles não constituem uma pretensão contra os outros. Foi por isso que Hobbes pôde afirmar, sem incoerência, que alguém tem direito à autopreservação e que os outros têm direito de matá-lo, pois o seu direito não implica uma obrigação por parte dos outros. Um significado preciso disso é que, por exemplo, “o indivíduo não pode ser obrigado a renunciar à sua vida”.21 21 “the individual cannot be obliged to renounce his life” (Warrender, 1957, p. 20). Trata-se, como bem anotou Agamben, de uma tradição do direito que o conecta e o articula com a vida, ou seja, “a tradição do pensamento jurídico que via o direito, em última análise, como idêntico à vida ou imediatamente articulado com ela” (2004, p. 129)AGAMBEN, G. “Estado de exceção”. [I. D. Poleti: Stato di eccezione]. São Paulo: Boitempo, 2004.. A consequência disso é que o dever de não matar não pode ser derivado do direito à vida de alguém. O dever de não matar tem que ser derivado de outra fonte, por exemplo, da lei civil ou da lei natural. Segue-se disso, também, que o soberano pode matar o súdito e este pode resistir ao soberano, sem que nenhum dos dois cometa injustiça, porque o direito que está em questão é aquele no sentido de uma isenção de obrigação. Nenhum dos dois está obrigado a renunciar ao direito que pretende.22 22 “It is with this meaning that Hobbes speaks of the 'true liberties' of the subject, which, as we shall see, are concerned with those things that the citizen cannot be obliged to do. It is also the type of right exemplified by the so-called 'right to all things' in the Hobbesian State of Nature. […] Likewise, a right to life or to self-preservation, in Hobbes's doctrine, does not signify that the individual is entitled to life, in the sense that other men or the sovereign have a duty to spare him; it signifies that the individual cannot be obliged to renounce his life and so it is always consistent with duty for him to resist or escape attempts upon his life. But with this provision, such a right is exhausted, and if, for example, fellow citizens have a duty to refrain from killing the individual, this will derive from the civil law, forbidding murder, or from another source, and not from his right to life. Likewise, the sovereign may attempt to put a subject to death and the subject may resist violently, and both sovereign and subject be completely justified. These are typical situations in Hobbes's philosophy” (Warrender, 1957, p. 20). “The duties-formula, moreover, gives also the limitations of these rights or entitlements of the sovereign. The subject may still be justified in running away from the battle line when he is hard pressed, and the entitlements of the sovereign exist no longer when he has lost the power to protect the citizen” (Warrender, 1957, p. 188).

Portanto, o cap. XXI do Leviatã não pode ser dispensado sob o pretexto de ser retórico.23 23 Essa é a tese de Taylor para preterir o Leviathan em favor dos Elements (Taylor, 1938, p. 406). Ele está no cerne daquilo que Hobbes considerou fundamental. Trata-se de Hobbes levando a sério os fundamentos de sua própria teoria, pois é precisamente nele que Hobbes afirma: “Entende-se que a obrigação dos súditos para com o soberano dura enquanto, e apenas enquanto, dura também o poder mediante o qual ele é capaz de protegê-los”. (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXI), o que é repetido no último parágrafo do Leviatã, onde Hobbes declina que o objetivo do texto não foi outro “senão colocar diante dos olhos dos homens a mútua relação entre proteção e obediência”. Segundo Schmitt, um direito fundamental é justamente aquele que vale como anterior e superior ao Estado, como esferas de liberdade, sendo o direito de resistência o meio mais extremo de sua defesa (Schmitt, 2003SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. [F. Ayala: Verfassungslehre]. Madrid: Alianza, 2003., p. 169). Por isso mesmo, eles são absolutos, pois não são informados pela lei e a desafiam quando a oposição for extrema (Schmitt, 2003SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución. [F. Ayala: Verfassungslehre]. Madrid: Alianza, 2003., p. 171). Como bem percebeu Arendt:

Parece como se o retrato hobbesiano do homem desafia o seu objetivo de providenciar uma base para o Estado e fornece, em vez disso, um padrão consistente de atitudes por meio das quais toda comunidade genuína pode ser destruída. Isso resulta na instabilidade admitida e inerente do Estado hobbesiano, cuja concepção mesma inclui sua própria dissolução.24 24 “It seems as though Hobbes's picture of man defeats his purpose of providing the basis for a Commonwealth and gives instead a consistent pattern of attitudes through which every genuine community can easily be destroyed. This results in the inherent and admitted instability of Hobbes's Commonwealth, whose very conception includes its own dissolution” (Arendt, 1976, p. 140).

Segundo Arendt, o que funda o Estado em Hobbes não é uma lei constituinte, nem o pacto social, mas o próprio interesse do indivíduo. Assim, o interesse do indivíduo passa a ser o interesse público, de tal forma que quando este último desafiar frontalmente aquele, o indivíduo poderá resistir:

O Leviatã de Hobbes expõe a única teoria política de acordo com a qual o Estado é baseado não em alguma espécie de lei constituinte - seja a lei divina, a lei natural ou a lei do contrato social - que determine os direitos e os erros dos interesses individuais com respeito aos assuntos públicos, mas sobre os próprios interesses individuais, de tal forma que ‘o interesse privado é o mesmo que o público’.25 25 “Hobbes's Leviathan exposed the only political theory according to which the state is based not on some kind of constituting law - whether divine law, the law of nature, or the law of social contract-which determines the rights and wrongs of the individual's interest with respect to public affairs, but on the individual interests themselves, so that ‘the private interest is the same with the publique’" (Arendt, 1976, p. 139). “Hobbes's Commonwealth is a vacillating structure and must always provide itself with new props from the outside; otherwise it would collapse overnight into the aimless, senseless chaos of the private interests from which it sprang” (Arendt, 1976, p. 142).

Há que se anotar, por fim, que essa interpretação da soberania não desdiz a função básica do Leviatã, qual seja, a de coibir o que causa o estado de guerra, especialmente o ataque preventivo aos outros: “A natureza deu a cada homem o direito de se proteger com sua própria força, e o de invadir um vizinho suspeito a título preventivo, e a lei civil tira essa liberdade, em todos os casos em que a proteção da lei pode ser imposta de modo seguro” (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXIV). Melhor dito, “o direito de autodefesa não é o único direito de autopreservação que o homem tem no estado de natureza. Ele tem, em acréscimo, um direito ofensivo de atacar outros que não o estão atacando no momento, se a sua preservação, sob seu ponto de vista, requerer isso”.26 26 “the right to self-defense is not the only right of self-preservation man has in the state of nature. He has, in addition, an offensive right to attack others who are not presently attacking him, if his preservation, in his view, requires it” (Finkelstein, 2001, p. 354). Ora, é isso mesmo que o Leviatã evita. Essa é a razão pela qual não se justificaria um discurso como o de Breivik.27 27 No processo de Anders Behring Breivik na justiça norueguesa por ato terrorista em Oslo em julho de 2011 que levou à morte de 77 pessoas, a Corte proibiu a transmissão dos atos processuais, especialmente o interrogatório do réu, para que o julgamento não fosse usado para a divulgação da sua plataforma anti-imigração e antimulticulturalista. Ele alegou que seus atos foram de autodefesa por parte de um determinado grupo de pessoas nativo da Noruega, ao qual ele pertenceria, contra imigrantes e outras culturas não cristãs. Porém, a defesa legítima é aquela contra um perigo certo e iminente. Ora, certamente não foi este o caso. A sua ação foi de defesa preventiva, a qual ele tinha abdicado frente ao Leviatã.

A força do direito contra a autoridade da lei

Sreedhar apresenta três argumentos para a defesa da força do direito contra a autoridade da lei, sendo que ela recusa os dois primeiros.

O primeiro deles apela para a impossibilidade conceitual ou psicológica de abandonar parte do direito natural, mormente aquele da autodefesa. Segundo essa interpretação, faria parte do conceito de transferir direitos a retenção da autodefesa, porque em toda transferência de direito haveria sempre um benefício em vista por parte do cedente do direito. Ora, não há benefício a registrar na renúncia ao direito de se autodefender (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 786).28 28 Ver, também, Sreedhar (2010).

O segundo argumento que ela apresenta é o da impossibilidade psicológica, o qual remete à observação de os homens em geral não conseguirem deixar de se defender quando de fato ameaçados. Uma formulação muito parecida com essa interpretação de Sreedhar foi apresentada por Lloyd (2001)LLOYD, S. A. “Hobbes’s Self-effacing Natural Law Theory”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 285-308, 2001. em uma tese que ela nomina de argumento da involuntariedade e da incapacidade. Porém, como se pode inferir a partir da leitura rawlsiana de Hobbes, tais argumentos não são acurados. Segundo Rawls,

Ele [Hobbes] sabe perfeitamente que as pessoas, algumas vezes, fazem coisas irracionais, como acredita que algumas pessoas, com pleno conhecimento, preferem a morte do que a desgraça ou a desonra. Ele diz que a maioria dos homens preferiria perder as suas vidas do que sofrer difamação e que um filho preferiria morrer do que obedecer a uma ordem de matar o seu pai, sob o fundamento de que se ele fosse obedecer a tal ordem, ele pareceria infame e seria odiado por todo mundo e que não poderia suportar a vergonha ou a desonra (isso é assim na primeira obra, De Cive). Talvez, o que Hobbes esteja a dizer é que o desejo de autopreservação é o mais forte de todos os desejos naturais, mas que, muito embora isso pudesse explicar a primazia que ele dá ao mesmo na sua teoria política, não implicaria que ele fosse sempre o mais forte dos desejos naturais, levando tudo em consideração. Em outras palavras, eu estou fazendo um contraste entre dizer que alguma coisa é o mais forte dos desejos naturais e dizer que alguma é o mais forte de todos os nossos desejos, tudo considerado. Desse modo, ele diz no De Cive, uma das primeiras obras, que nós buscamos evitar a morte por um certo impulso da natureza, não menos certo do que aquele de uma pedra que se move para baixo. Contudo, como sabemos, pedras, algumas vezes, se movem para os lados ou são jogadas para cima.29 29 “he [Hobbes] knows perfectly well that people sometimes do irrational things; and he believes that some persons, with full knowledge, prefer death rather than disgrace or dishonor. He says that most men would rather lose their lives than suffer slander; and that a son would rather die than obey an order to kill his father, on the grounds that if he were to do obey such an order, he would look infamous and would be hated by all the world; and that, from shame or dishonor, he cannot bear (this is in the earlier work, De Cive). Perhaps what Hobbes is saying is that the desire for self-preservation is the strongest of all natural desires, but that while this will explain the primacy that he gives to it in his political theory, this doesn’t imply that it is always the strongest of all desires, when everything is taken into account. In other words, I am making a contrast between saying something is the strongest of natural desires and saying something is the strongest of all of our desires; everything considered. Thus, he says in De Cive, an earlier work, that we seek to avoid death by a certain impulsion of nature, no less than whereby a stone moves downwards. But, as we all know, stones sometimes move sideways, or they get thrown upward” (Rawls, 2007, pp. 46-47).

Um dos pontos centrais do argumento de Sreedhar é justamente mostrar a existência de contratos, sustentados por Hobbes, que desafiam a morte. Ela aponta duas situações. Uma delas seria aquela do filho que prefere morrer a matar o pai (Hobbes, 1998______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a., cap. VI, §13) e a outra seria o contrato de soldado,30 30 “Mas aquele que se alista como soldado, ou toma dinheiro público emprestado, perde a desculpa de uma natureza timorata, e fica obrigado não apenas a ir para o combate, mas também a dele não fugir sem licença de seu comandante” (Hobbes, 1979, cap. XXI). ambos os contratos defendidos por Hobbes. Segundo ela, seriam tais contraexemplos que tornariam inválidos os argumentos anteriores.

Sem embargo dessa argumentação, Shreedhar se equivoca ao pensar que o direito de autoconservação possa ser deixado de lado por vínculos contratuais, sejam eles quais forem, mormente o direito de autodefesa. Mesmo o soldado que faz um contrato para ir à guerra retém esse direito. O que ele assume são riscos maiores. Ainda assim, ele pode resistir à prisão, não precisa se entregar à morte e, mesmo como “bucha de canhão”, mantém o direito de autodefesa até o ponto em que puder fazê-lo. Portanto, não se trata de distinguir contratos para tornar Hobbes coerente. O que se precisa fazer é dar elasticidade ao direito natural.

É verdade que Hobbes afirma no De Cive que o impulso da natureza para evitar a morte é tão certo quanto uma pedra que cai: “Pois todo homem é desejoso do que é bom para ele, e foge do que é mau, mas acima de tudo do maior dentre os males naturais, que é a morte; e isso ele faz por um certo impulso da natureza, com tanta certeza como uma pedra cai” (Hobbes, 1998______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a., cap. I, §7). Ainda que isso seja verdade, o cair de uma pedra pode sofrer impedimentos, os quais implicarão uma reação em seu movimento. Por exemplo, se a pedra em sua queda livre bater em uma outra pedra, poderá voltar a subir ou se desviar do trajeto que seguia, de forma tão necessária quanto caía em uma certa direção. No caso do ser humano, isso é mais complexo ainda, pois ele tem vontade. Ora, a vontade é o predomínio do último apetite ou aversão, como afirma o Leviatã cap. VI. Portanto, ainda que o impulso para evitar a morte seja certo, não significa que ele será o último, pois o homem porta muitos outros apetites e aversões que poderiam ser qualificados com a mesma certeza, como evitar a dor causada pelo fogo. Embora a determinação da vontade seja ditada pela necessidade, a complexidade das causas nela envolvida só permite prognósticos. Assim, a certeza que se pode ter do impulso para evitar a morte torna nulo qualquer vínculo contratual, o que não implica que alguém não possa preferir a morte em razão de alguma outra aversão, como aquela de matar um filho ou matar o pai. Da mesma forma, alguém pode executar a pena de morte como suicídio, como foi o caso de Sócrates ou de Cícero, como alguém pode se entregar à polícia para ser preso.

Sreedhar e Lloyd concordam com a tese da defesa da força do direito contra a autoridade da lei, mas não em razão dos argumentos apresentados.

Lloyd defende a inalienabilidade de certos direitos básicos em razão da tese hobbesiana do benefício que todo contrato deve ter como finalidade:

ninguém pode renunciar ao direito de resistir a quem o ataque pela força para tirar-lhe a vida, dado que é impossível admitir que através disso vise a algum benefício próprio. O mesmo pode dizer-se dos ferimentos, das cadeias e do cárcere, tanto porque desta aceitação não pode resultar benefício [...] (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XIV).

Sabidamente, Hobbes considera medo e liberdade compatíveis, o que torna difícil defender o argumento da involuntariedade de algum contrato. Por isso, Finkelstein redescreve o argumento da involuntariedade nos termos do argumento do benefício, o qual é o único que ela aceita. Desse modo, ela dispensa o argumento da involuntariedade e o da incapacidade e sufraga, como dito, o argumento do benefício: “Ainda que ambos os argumentos [da involuntariedade e da incapacidade] possam parecer inicialmente bastante sensatos, eu sugerirei que Hobbes não poderia sustentá-los”.31 31 “While both arguments [involuntariness and incapacity] may seem initially quite sensible, I shall suggest that Hobbes could not in fact have intended either” (Finkelstein, 2001, pp. 338-9). Se essa tese for aceita, então, “pessoa alguma poderia ver-se como beneficiária do abandono do direito de autodefesa. [...] se atacado, nunca seria do meu interesse não me defender”.32 32 “no person could rationally regard herself as benefitted by abandoning the right to self-defense. […] if attacked, it would never be in my interest not to defend myself” (Finkelstein, 2001, pp. 342-343). Como se pode perceber, há várias interpretações visando reconstruir os argumentos que poderiam sustentar a inalienabilidade do direito de se autodefender. Umas das possibilidades mais promissoras é o terceiro argumento que Sreedhar apresenta. Segundo o seu terceiro argumento, a inalienabilidade do direito de se autodefender não seria oponível a qualquer contrato, por exemplo, não seria oponível ao contrato de soldado. Não, para ela, tal inalienabilidade seria uma característica específica do contrato social, em razão de três princípios que o caracterizariam: o princípio da necessidade, o princípio da fidelidade aos fins do contrato e o princípio da razoabilidade ou da confiança. Ela fundamenta a sua tese no argumento das finalidades peculiares do contrato social. A base para tal ela a encontra na seguinte definição de Hobbes:

Por último, o motivo e fim devido ao qual se introduz esta renúncia e transferência do direito não é mais do que a segurança da pessoa de cada um, quanto a sua vida e quanto aos meios de preservá-la de maneira tal que não acabe por dela se cansar. Portanto se através de palavras ou outros sinais um homem parecer despojar-se do fim para que esses sinais foram criados, não deve entender-se que é isso que ele quer dizer, ou que é essa a sua vontade, mas que ele ignorava a maneira como essas palavras e ações irão ser interpretadas (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XVI).

O primeiro princípio ligado às peculiaridades do contrato social que ela destaca é aquele da necessidade. O contrato social exige que certas liberdades sejam renunciadas, mas não todas. O critério para operar a distinção entre o que renunciar e o que não renunciar seria aquele da necessidade, ou seja, haveria liberdades que necessariamente deveriam ser abandonadas e outras que não seriam necessárias:

Ele [Hobbes] insiste repetidamente que se deve renunciar ao direito de julgar o certo e o errado, fazer e interpretar leis, arrecadar impostos, criar e manter um exército e interpretar as escrituras religiosas. Reter qualquer desses direitos seria inconsistente com a ideia hobbesiana de soberania. Porém, o direito de autodefesa é o exemplo perfeito de um direito que pode ser retido sem prejuízo para a paz.33 33 “He [Hobbes] repeatedly insists that one must give up one’s right to judge right and wrong, make and interpret laws, levy taxes, raise and maintain an army, and interpret religious scripture. Retaining any of these rights would be inconsistent with Hobbes’s idea of sovereignty. But the right of self-defense is the perfect example of a right that can be retained without the loss of peace” (Sreedhar, 2008, p. 796). “Under the second law of nature only those rights or freedoms that were found to be counterproductive to our preservation have been given up” (Curran, 2007, p. 103).

Ela argumenta que o soberano deve poder ter outros meios de matar o súdito desobediente, caso necessário. Com isso, estabelece-se a tese de que não precisa haver correspondência entre soberania absoluta e obediência absoluta. Como pontua Hobbes, “o supremo poder não precisa contratar com alguém para que esse, mansamente, se submeta ao castigo por ele determinado - basta-lhe a promessa de que nenhum súdito vá defender outro contra o seu poder” (Hobbes, 1998b______. (1651). “Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil”. Oxford: Oxford University Press, 1998b., p. 107, cap. II, §18), de tal foram que “haverá outros que aceitarão cumprir tal ordem [de matar]” (Hobbes, 1998a______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a. [1642], p. 109, cap. VI, §13). Isso garante, portanto, o poder e a autoridade do soberano. Como bem resume Hobbes: “Ao fundar um Estado, cada um renuncia ao direito de defender os outros, mas não de defender-se a si mesmo. Além disso, cada um se obriga a ajudar o soberano na punição de outrem, mas não na sua própria” (1979, cap. XXVIII)______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979..

O segundo princípio é aquele da fidelidade, segundo o qual o contrato não pode ter um resultado dissonante daquele da sua finalidade: “não se pode transferir um direito que contradiga (ou enfraqueça) a finalidade para a qual tal direito é transferido”.34 34 “one cannot transfer a right the transfer of which contradicts (or undermines) the purpose for which that right is transferred” (Sreedhar, 2008, p. 795). Ora, o objetivo do Estado é precisamente aquele da proteção contra os males do estado de natureza, portanto, se os efeitos da ação do Estado sobre a pessoa forem iguais ou piores do que aqueles do estado de guerra, não haveria obrigação de obediência, quando, então, o súdito poderia resistir.35 35 “The purpose of the state is to protect you from the evils of the state of nature; where the state threatens you with conditions equal to the evils of the state of nature, you have no obligation to obey and so you have a Hobbesian right to resist” (Sreedhar, 2008, p. 799). Para Hobbes, há uma correlação entre proteção e obediência,36 36 “The Obligation of Subjects to the Soveraign, is understood to last as long, and no longer, than the power lasteth, by which he is able to protect them. For the right men have by Nature to protect themselves, when none else can protect them, can by no Covenant be relinquished. […] The end of Obedience is Protection” (Hobbes, 1998b, chap. XXI). como já mencionado. Desse modo, Hobbes não teria sido um apologeta ingênuo do poder absoluto (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 798), como parece sugerir Kant.

Por fim, o terceiro princípio é aquele da expectativa razoável, segundo o qual não se pode ter a expectativa razoável de que alguém vá cumprir um contrato que lhe seja desfavorável naquilo que pode ser o mais essencial para ele, a sua vida: “Tal qual eu entendo o projeto político mais amplo, Hobbes intentou mostrar que a obrigação política coincide com o autointeresse ilustrado ou racional”.37 37 “As I understand the larger political project, Hobbes intended to show that political obligation coincides with rational or enlightened self-interest” (Sreedhar, 2008, p. 798). Por isso, escolher a morte em certos casos não pode ser considerado loucura ou irracionalidade: “Tais casos mostram, tão somente, que possível a morte ser uma escolha racional e ocasiões raras”.38 38 “Such cases merely show that it is possible for death to be a rational choice on rare occasions” (Sreedhar, 2008, p. 795).

A boa-fé contratual de Rawls como chave interpretativa de Hobbes

[...] pois é a fé, somente, o que nos prende nos contratos. (Hobbes, 1998a______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a., p. 107, cap. II, §18).

Com já mencionado, pretende-se usar a teoria da boa-fé contratual de Rawls para explicar por que Hobbes considera certas cláusulas do contrato nulas. Para tal, primeiro, reconstruir-se-á o argumento de Rawls para, em seguida, sugerir como tal argumento poderia ser usado para explicar a nulidade de certas teses contratuais em Hobbes, a partir da interpretação sugerida por Sreedhar.

Na sua crítica ao utilitarismo, Rawls mobiliza vários argumentos, contudo, um dos pontos centrais do seu empreendimento reside no conceito de boa-fé. A boa-fé significa que as partes “podem confiar uma na outra para aderir aos princípios adotados”.39 39 “can rely on one another to adhere to the principles adopted” (Rawls, 1999, p. 153). Ora, a base de tal confiança tem que ser avaliada tendo em vista averiguar se o contratante vai honrar o contrato mesmo que dele resulte a pior possibilidade para ele: “nós temos que poder honrá-lo mesmo que a pior possibilidade ocorra”.40 40 “we must be able to honor it even should the worst possibilities prove to be the case” (Rawls, 1999, p. 153). Se da avaliação dessa possibilidade o contratante não puder intencionar cumprir o contrato, ele não terá agido de boa-fé ao contratar: “Caso contrário, não teríamos agido de boa-fé”.41 41 “Otherwise we have not acted in good faith” (Rawls, 1999, p. 153). Pois bem, a capacidade que as partes têm para a justiça, o senso de justiça, implica levar em conta a psicologia moral e os motivos humanos (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 154) para se poder avaliar o quão pesado o compromisso é em relação à possibilidade motivacional para o cumprimento dele. Ora, é a partir do peso do compromisso que se pode avaliar se este foi assumido de boa-fé ou de má-fé.

Por isso, desempenham papel fundamental no argumento de Rawls determinações que na tradição são consideradas como referidas ao conceito de natureza humana, pois é a psicologia humana que se deve ter em conta para avaliar o quão pesado é cumprir o compromisso assumido. A psicologia ou o conceito de natureza humana pode ser caracterizado de várias maneiras. Rawls destaca duas dessas caracterizações. Segundo uma delas, o homem poderia ser apresentado como um ser egoísta. Tradicionalmente, atribui-se essa perspectiva a Hobbes. Rawls não toma tal senda. Para ele, o homem é caracterizado como “mutuamente desinteressado”.42 42 “mutually disinterested” (Rawls, 1999, p. 131). Ou seja, por um lado, ele não é um egoísta no sentido de que só pensa em si, mas, por outro, ele não tem um interesse pelo bem do outro. Ele tem um interesse pelo seu bem. Dessas considerações decorre, para Rawls, a lei psicológica da busca do próprio bem: “a lei psicológica que as pessoas tendem a amar, estimar e apoiar o que quer que seja que afirme o seu bem”.43 43 “the psychological law that persons tend to love, cherish, and support whatever affirms their own good” (Rawls, 1999, p. 155). Essa lei é importante para uma teoria da decisão em condições de incerteza que considera as partes como avessas ao risco. Nesse particular, Rawls (1999, p. 149)RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999. pressupõe a aversão ao risco como sendo o caso normal. Desse modo, quando ocorre a coincidência entre o bem próprio de cada um com os princípios de justiça pode-se pensar em um senso de justiça que não seja vão, pois desperta a motivação ou a inclinação para tal: “Visto que o bem de cada um é afirmado, todos adquirem inclinações para apoiar o esquema”.44 44 “Since everyone’s good is affirmed, all acquire inclinations to uphold the scheme” (Rawls, 1999, p. 155). É com base nessa tese de psicologia moral ou de natureza humana que Rawls criticará o utilitarismo como faltoso em relação à boa-fé.

Nessa perspectiva, o primeiro ponto a destacar é que na posição original o utilitarismo que as partes escolheriam seria aquele da utilidade média e não aquele da soma total de utilidade, ou seja, trata-se “de maximizar não a soma total, mas a utilidade média (per capita)”.45 45 “to maximize not the total but the average utility (per capita)” (Rawls, 1999, p. 140). Tal escolha dar-se-ia justamente porque com o utilitarismo da utilidade média ficaria assegurada uma quantidade de felicidade igual para todos, independentemente da soma total de utilidade. Ou seja, tal opção honraria a racionalidade das partes interessadas no seu próprio bem e honraria a aversão ao risco destas sob condições de incerteza. Sabidamente, a tese básica de Rawls contra o utilitarismo, inclusive o utilitarismo que defende a utilidade média, é que ele pode exigir que alguns sacrifiquem o seu bem pessoal em nome do bem coletivo: “Fidelidade ao sistema social pode demandar que alguns, particularmente os menos favorecidos, devam renunciar vantagens em nome do bem maior do todo”.46 46 “Allegiance to the social system may demand that some, particularly the less favored, should forgo advantages for the sake of the greater good of the whole” (Rawls, 1999, p. 155). Por exemplo, pode ser o caso que o favorecimento de uma certa concepção de bem possa gerar um maior grau de utilidade média (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 152). Pense-se, por exemplo, em uma concepção de bem com base na proibição da pornografia, da prostituição, ou com base em uma religião civil, como pensada por Rousseau. Melhor dito, as expectations nas quais a utilidade se baseia não seriam consideradas igualmente, mesmo no caso da utilidade média, pois ela não teria preocupação com a qualidade da utilidade. Portanto, o utilitarismo não tem um dispositivo de proteção da individualidade e particularidade da pessoa que pode escolher fins e valorá-los de forma absoluta, ao menos em certos domínios.

O diferencial da teoria da justiça proposta por Rawls é que ela funciona justamente como um dispositivo de proteção contra os piores resultados, pois garante, ao menos em circunstâncias normais (vale observar que para ele a normalidade não pode ser o caso excepcional, mas aquilo que ocorre pelo menos durante a maior parte do tempo), que os direitos fundamentais não podem ser violados, bem como que as diferenças de riqueza têm que beneficiar os menos favorecidos: “os dois princípios de justiça têm uma vantagem definitiva. Não somente as partes protegem seus direitos básicos, mas se asseguram contra as piores eventualidades”.47 47 “the two principles of justice have a definite advantage. Not only do the parties protect their basic rights but they insure themselves against the worst eventualities” (Rawls, 1999, p. 154). Por isso, considerada a natureza humana como definida acima, o contrato poderia ser assinado de boa-fé, pois o risco do pior resultado seria evitado. Como mencionado, a boa-fé pede a disposição de cumprir o contrato mesmo que ocorra o pior resultado para o contratante. Ora, ele sustenta que este não seria o caso do utilitarismo, pois neste as partes teriam que poder concordar com uma perda de liberdade para que uma maior quantidade de bem fosse desfrutada pelos outros: “aquiescer com uma perda de liberdade no curso de suas vidas pela razão de um maior bem desfrutado por outros”.48 48 “acquiesce in a loss of freedom over the course of their life for the sake of a greater good enjoyed by others” (Rawls, 1999, p. 154). Ou seja, ele exige que o indivíduo dê uma alta consideração ao bem dos outros: “requer que alguns que são menos afortunados aceitem mesmo prospectos de vida mais baixos em razão dos outros”.49 49 “requires some who are less fortunate to accept even lower life prospects for the sake of others” (Rawls, 1999, p. 157).

Tendo em vista tais considerações, Rawls conclui que tais contratos não poderiam ser feitos de boa-fé porque suplantariam a capacidade da natureza humana para a fidelidade a eles: “contratos desta sorte excedem a capacidade da natureza humana”.50 50 “Compacts of this sort exceed the capacity of human nature” (Rawls, 1999, p. 154). Deveras, segundo a lei psicológica acima estatuída, o senso de justiça de cada um implica que os princípios de justiça honrem o bem próprio do contratante, sem prejuízo de honrarem também o bem dos outros, já que não se trata de um jogo de soma zero. Ora, não seria este o caso do utilitarismo, já que exigiria um maior sacrifício de alguns para o maior bem dos outros.

Assim considerado, o utilitarismo exigiria um sacrifício que dificilmente seria aceitável, pois ele ordenaria um sacrifício demasiado: “aceitar as maiores vantagens para os outros como uma razão suficiente para expectativas menores em todo o curso de nossas vidas”.51 51 “accept the greater advantages of others as a sufficient reason for lower expectations over the whole course of our life” (Rawls, 1999, p. 155). Dito claramente, a estabilidade dependeria de as pessoas serem altruístas. As pessoas teriam que aceitar menos para si para que outros se beneficiassem, como se viu há pouco. Seria isso que explicaria por que os utilitaristas em geral deram tanta importância à simpatia e à benevolência, como já apontado acima, pois sem estas a sua concepção de justiça seria socialmente instável. Deveras, é o próprio Mill quem registra: “a felicidade que forma o padrão utilitarista do que é correto na conduta, não é a felicidade do próprio agente, mas de todos os concernidos. Entre a sua felicidade e a dos outros, o utilitarismo requer que seja tão estritamente imparcial, quando um expetador benevolente e desinteressado”.52 52 “the happiness which forms the utilitarian standard of what is right in conduct, is not the agent’s own happiness, but that of all concerned. As between his own happiness and that of others, utilitarianism requires him to be as strictly impartial as a disinterested and benevolent spectator” (p. 194).

A conclusão de Rawls é que o utilitarismo é uma concepção de justiça que demanda um indivíduo que não corresponde àquilo que podemos julgar como realidade. Por isso ele chama os princípios de justiça por ele mesmo defendidos uma “ideia mais realista”.53 53 “more realistic idea” (Rawls, 1999, p. 155). Em suma: “ao passo que o princípio da utilidade media é a ética de um indivíduo racional singular (não avesso ao risco) que tenta maximizar seus próprios prospectos, a doutrina clássica é a ética de um perfeito altruísta”.54 54 “while the average principle of utility is the ethic of a single rational individual (with no aversion to risk) who tries to maximize his own prospects, the classical doctrine is the ethic of perfect altruists” (Rawls, 1999, p. 164-165). Ademais, ao contrário do utilitarismo, a sua teoria da justiça não maltrata o autorrespeito, o qual seria indispensável para a realização da concepção de bem própria de cada um. Essa razão deve ser acrescida àquelas que contribuem para a estabilidade. Destarte, o efeito da falta de autorrespeito é o autodesprezo. O autodesprezo cria instabilidade porque ele produz os mesmos efeitos da inveja, a qual leva o indivíduo a ter ações que prejudicam os outros. Rawls é franciscano ao descrever a racionalidade das partes. Ele diz pouco sobre isso. Ele afirma, sumariamente, que ser racional é poder ter uma concepção de bem. Além disso, Rawls explicitamente sustenta ser irracional alguém se prejudicar para com isso prejudicar os outros: “a assunção especial que eu faço é que um indivíduo racional não sofre de inveja. Ele não está disposto a aceitar uma perda para si mesmo para os outros terem também uma perda”.55 55 “The special assumption I make is that a rational individual does not suffer from envy. He is not ready to accept a loss for himself if only others have less as well” (Rawls, 1999, p. 124). Ora, como dito, o autodesprezo teria o mesmo efeito da inveja: “autodesprezo leva ao desprezo pelos outros e ameaça o seu bem tanto quanto a inveja ameaça”.56 56 “Self-contempt leads to contempt of others and threatens their good as much as envy does” (Rawls, 1999, p. 156). Desse modo, o utilitarismo, ao exigir o sacrifício de uns para o bem de outros, poderia levar aquele que se sacrifica a atribuir um valor menor para si do que para os outros, o que seria um caso de autodesprezo que conduziria aos mesmos efeitos da inveja, tornando a sociedade instável.

Por fim, Rawls não inquina de nulidade os termos de um contrato cujo objeto seja princípios utilitaristas de justiça. Contudo, ao dizer que tal contrato é instável, ele está afirmando que as partes, em razão de sua psicologia ou de sua natureza, não iriam honrá-lo. Dito de outro modo, alguém que olhasse para si mesmo com cuidado não agiria de boa-fé se assinasse um contrato com o risco mencionado, pois ele não estaria levando a sério a possibilidade do pior resultado para si e as consequências que isso implicaria, por isso, ocorrendo o pior resultado para si, ele teria uma forte tentação de descumprir o contrato.

Ora, o argumento de Hobbes - ainda que com afirmações mais contundentes, como a de que seria impossível alguém executar um contrato no qual se comprometesse a se matar -, poderia ser reconstruído como um argumento de boa-fé contratual. Poder-se-ia dizer que a nulidade de certas cláusulas desempenha a mesma função de princípios que protegem os contratantes dos piores resultados, como os de Rawls. Assim como Rawls afirma que os direitos fundamentais têm que ser garantidos, mesmo contra o benefício coletivo, Hobbes poderia dizer que aquilo que fundamenta a possibilidade da desobediência ao soberano, como defender a sua vida, dispor de ar, água, remédio, ir e vir, é o que deveria ser assegurado, mesmo em detrimento do benefício coletivo que o Leviatã possa pretender. Seria uma espécie de um mínimo de direitos e um mínimo existencial de bens indispensáveis para a vida que não poderiam ser comprometidos, ainda que para o maior benefício da sociedade como um todo.

Obviamente, o modo como Hobbes põe a questão ressoa a argumentos naturalistas e mecanicistas, o que, aliás, não está completamente ausente da perspectiva de Rawls, vis-à-vis de suas teses de psicologia moral e de natureza humana. Aparentemente, também, não há consideração sobre o autorrespeito em Hobbes que Rawls (1999, p. 156)RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., aliás, associa à fórmula do imperativo categórico da humanidade como fim em si mesma. Nesse particular, o autorrespeito implica dar estatuto de justiça a certas determinações psicológicas, o que também demonstra o quanto a teoria da justiça pode estar dissociada da autarquia de um sujeito que pode determinar o seu plano de vida de forma independente das circunstâncias sociais?57 57 Se circunstâncias sociais, como aquelas que ocorreriam em uma sociedade utilitarista, podem afetar o autorrespeito que é condição de um plano de vida bem-sucedido, pois tal respeito dependeria de um reconhecimento pelos outros do valor de alguém como pessoa, o que é negado em uma sociedade utilitarista, por que, então, determinações de eugenia também não poderiam interferir com os planos de vida? Ver a esse respeito Habermas (2001).

Notas conclusivas

Em apertada síntese, poder-se-ia reformular a tese da nulidade de certas cláusulas contratuais para dizer que não honraria a boa-fé fazer uma promessa desse jaez. Em termos kantianos, uma tal promessa não enganaria a ninguém (Anth, AA 07: 14; Anth, AA 07: 152; Anth, AA 07: 307) pois, a partir de si mesmo, todo homem poderia julgar que elas são nulas, porque não poderiam traduzir a boa-fé, vis-à-vis da psicologia humana. Nesse sentido, boa parte dos argumentos apresentados acima, incluso o argumento da impossibilidade em sua versão conceitual e psicológica, recusados por Sreedhar, bem como o argumento das finalidades peculiares do contrato social, são formulações, vieses, dessa ideia básica da boa-fé. Veja-se que, no argumento das finalidades peculiares do contrato, Sreedhar chama a atenção para três princípios que o caracterizariam: o princípio da necessidade, o princípio da fidelidade aos fins do contrato e o princípio da razoabilidade ou da confiança. É de especial importância o último deles. Ou seja, o contrato social não pode exorbitar da razoabilidade. Ora, não é razoável pedir que alguém cumpra voluntariamente a pena de se matar. Com efeito, há uma passagem do De cive que pode atestar essa interpretação:

Ninguém está obrigado, por qualquer contrato que seja, a não resistir a quem vier matá-lo, ou ferir ou de qualquer outro modo machucar seu corpo. [...] E assim, por uma necessidade natural, ele o esquiva o mais possível, e supomos que de outro modo não possa agir. Ora, quando alguém chega a esse grau de medo, tudo o que dele podemos esperar é que se salve pela luta ou pela fuga. Ninguém está obrigado ao que é impossível: portanto, quem se vê ameaçado pela morte, que é o maior dos males que possa afetar a natureza, ou por um ferimento ou ainda por danos físicos de qualquer espécie, e não é corajoso o bastante para suportá-los, não está obrigado a sofrê-los. Além disso, quem está obrigado por um contrato tem a confiança de seu beneficiário (pois é a fé, somente, o que nos prende nos contratos) - mas quem é levado ao castigo, seja este o suplício capital ou outro mais ameno, vai acorrentado ou sob forte guarda, o que é um sinal certíssimo de que não parece estar suficientemente obrigado pela sua não-resistência aos contratos que tenha firmado antes (1998, p. 107, cap. II, §18).

Esta citação é de fundamental importância para a comprovação da hipótese deste trabalho. Com efeito, nela Hobbes atesta não haver contrato que possa obrigar alguém a não resistir a quem quiser matá-lo. O fundamento que ele alega para tal resistência é uma necessidade natural, cuja base é um certo grau de medo, neste caso, aliás, o grau máximo de medo, por se tratar do medo da morte, que faz com que se possa concluir ser inexigível conduta diversa daquela da autodefesa. Mutatis mutandis, veja-se que Rawls também apela a uma lei psicológica para fazer valer o seu argumento.

Hobbes usa o termo impossível para descrever o que desobriga do cumprimento do contrato: “Ninguém está obrigado ao que é impossível”. Forçoso concluir que uma cláusula impossível de cumprir, considerada a natureza ou a psicologia humanas, é nula de pleno direito. Interessantemente, a própria referência do texto apela à fé contratual para explicar o que ocorre. Ele não usa o termo “boa” para caracterizar a “fé”, mas, por certo, não discrepa do sentido que ele sustenta a caracterização de tal “fé” como sendo “boa-fé”. Como ele mesmo diz, o condenado é levado para a morte “acorrentado ou sob forte guarda”. Ora, se é conhecido o que ocorre no cumprimento de tais atos, discrepa da “boa-fé” alguém prometer tal, como discrepa da razoabilidade a não mais poder alguém acreditar que um tal contrato cria vínculos. O impossível não vincula, por definição.

Essa interpretação a partir de Rawls tem a vantagem de agregar todos os argumentos usados pelos diferentes comentadores na tentativa de dar uma explicação, especialmente para o cap. XXI do Leviatã. Pode-se, portanto, considerar todas as explicações e formulações apresentadas vieses do que Rawls chamou de boa-fé contratual, cuja base envolve o que ele chama de psicologia. Psicologia serve muito bem como um outro nome para uma definição da natureza humana, justamente o que Hobbes apresenta na primeira parte do Leviatã e que opera com toda certeza na passagem há pouco comentada.

  • 1
    “Hobbes é de opinião contrária. Segundo ele (De Cive, cap. VII, g 14), o chefe de Estado de nenhum modo está ligado por contrato ao povo e não pode cometer injustiça contra o cidadão (seja qual for a sua decisão a respeito deste). - Semelhante tese seria totalmente correcta se, por injustiça, se entende a lesão que reconhece ao lesado um direito de constrangimento relativamente àquele que comete a injustiça; mas, considerada na sua generalidade, a tese é terrível [erschrecklich]” [TP, AA 08: 303-304].
  • 2
    “L'on voit clairement que le caractère absolu, que Hobbes attribue à l'autorité sociale, est la base de tout son système” (2000, p. 60). Ademais, ele anota: “On voit que dans Hobbes un mot superflu cause tout le mal. Il part aussi d'une vérité, c'est qu'il faut une force coercitive pour gouverner les ssociations humaines. Mais il glisse dans sa phrase une seule épithète superflue, le mot absolu, et tout son système devient un tissu d'erreurs” (Constant, 2000CONSTANT, B. “Principes de politique applicables à tous les gouvernements”. S.l: Numilog, 2000., p. 63).
  • 3
    “Hobbes was a royalist. He supported Charles I during the English Civil War and advocated absolutism of the most extreme variety” (Curran, 2007______. “Reclaiming the Rights of the Hobbesian Subject”. Chippenham: Palgrave Macmillan, 2007., p. 11).
  • 4
    “Why should we not change the name of Leviathan into the Rebel’s Catechism?” (Bramhall, 2011BRAMHALL, J. (1658). “The Catching of Leviathan, Or the Great Whale”. In: HOBBES, T. Leviathan Parts I and II. [Edited By A. P. Martinich and Brian Battiste]. Toronto: Broadview Edition, 2011., p. 347).
  • 5
    “Their conception of justice is threatened with instability unless sympathy and benevolence can be widely and intensely cultivated” (1999, p. 155).
  • 6
    “Each subject renounces the right to defend other subjects against the sovereign and, moreover, agrees to assist the sovereign in exercising his natural right against other subjects who break the law. No man renounces his natural right to defend himself” (Watkins, 1973WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 97).
  • 7
    “a subjects's right to resist the death-penalty likewise remains from the first right of nature” (Watkins, 1973WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 98).
  • 8
    “the relation between the sovereign and a subject whom he has condemned to death reverts to that between two antagonists in a state of nature, except that, now, one of them is much more powerful than the other” (Watkins, 1973WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 98).
  • 9
    “For if men know not their duty, what is there that can force them to obey the laws? An army, you will say. But what shall force the army”? (Hobbes, 1839______. (1668). “Dialogue, Behemoth, Rhetoric”. Indianápolis: Liberty Fund, 1839. [Edition used: The English Works of Thomas Hobbes of Malmesbury; Now First Collected and Edited by Sir William Molesworth, Bart., (London: Bohn, 1839-45). 11 Vols. Vol. 6]. [http://files.libertyfund.org/files/770/Hobbes_0051-06_EBk_v6.0.pdf].
    http://files.libertyfund.org/files/770/H...
    , p. 148).
  • 10
    “The Greatest of humane Powers, is that which is compounded of the Powers of most men, united by consent, in one person, Naturall, or Civill, that has the use of all their Powers depending on his will; such as is the Power of a Common-wealth: Or depending on the wills of each particular; such as is the Power of a Faction, or of divers factions leagued. Therefore to have servants, is Power; To have friends, is Power: for they are strengths united” (Hobbes, 1998______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a., cap. X).
  • 11
    Nesse sentido, a aproximação que ela faz entre Hobbes e Locke é exagerada.
  • 12
    “power simply is no more, but the excess of the power of one above that of another. For equal powers opposed, destroy one another” (Hobbes, 1928______. (1640). “The Elements of Law Natural and Politic”. Cambridge: Cambridge University Press, 1928., §4).
  • 13
    “feared anarchy more than tyranny” (Gauthier, 1969GAUTHIER, D. “The Logic of Leviathan”. Oxford: Clarendon Press, 1969., p. 144).
  • 14
    “If the sovereign loses the power to protect the citizen, or if he tries to take his life as punishment for serious crime or otherwise, his commands are not law for the citizen involved, and the judgement regarding his own extremity can ultimately be made only by the citizen himself. Thus salvation and preservation are values which are not created by sovereign command, and they restrict the competence of civil law where it conflicts with them - a circumstance that is generally averted only because such conflicts cannot normally occur” (Warrender, 1957WARRENDER, H. “The Political Philosophy of Hobbes”. Oxford: Oxford University Press, 1957., p. 327).
  • 15
    “Using Schmitt’s definition of sovereignty as an analytical tool, I made two claims: (i) in Hobbes’s argument, the individual (and not the state) is sovereign: individuals decide if circumstances are exceptional; and in the particular exceptional case in which one’s right to self-preservation has been endangered by the state, Hobbes maintains that obedience to the state can be withdrawn; (ii) in Hobbes’s theory, the right to self-preservation and not the state is absolute: the former is a permanent characteristic of man which imposes limits on the aims and functions of the latter” (Slomp, 2010SLOMP, G. “The Liberal Slip of Thomas Hobbes’s Authoritarian Pen”. Critical Review of International Social and Political Philosophy, Vol. 13, Nr. 2, pp. 357-369, 2010., p. 365).
  • 16
    “For such men, commonly called slaves, have no obligation at all” (Hobbes, 1998b______. (1651). “Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil”. Oxford: Oxford University Press, 1998b., cap. XX).
  • 17
    "En effet l'esclave n'est pas proprement esclave du maître, mais de la vie" (Hyppolite, p. 166).
  • 18
    “the power of the state finds its absolute limit in that natural right and in no other moral fact” (Strauss, 1965STRAUSS, L. “Natural Right and History”. Chicago: The University of Chicago Press, 1965., p. 181).
  • 19
    “Hobbes uses the term right with two distinct meanings: (1) as that to which one is morally entitled; (2) as that which one cannot be obliged to renounce” (Warrender, 1957, p. 18).
  • 20
    “Whereas in the sense considered first, rights are the shadows of duties, in the present sense they are the antitheses of duties and a right is a freedom or exemption from obligation” (Warrender, 1957WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 19).
  • 21
    “the individual cannot be obliged to renounce his life” (Warrender, 1957WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 20).
  • 22
    “It is with this meaning that Hobbes speaks of the 'true liberties' of the subject, which, as we shall see, are concerned with those things that the citizen cannot be obliged to do. It is also the type of right exemplified by the so-called 'right to all things' in the Hobbesian State of Nature. […] Likewise, a right to life or to self-preservation, in Hobbes's doctrine, does not signify that the individual is entitled to life, in the sense that other men or the sovereign have a duty to spare him; it signifies that the individual cannot be obliged to renounce his life and so it is always consistent with duty for him to resist or escape attempts upon his life. But with this provision, such a right is exhausted, and if, for example, fellow citizens have a duty to refrain from killing the individual, this will derive from the civil law, forbidding murder, or from another source, and not from his right to life. Likewise, the sovereign may attempt to put a subject to death and the subject may resist violently, and both sovereign and subject be completely justified. These are typical situations in Hobbes's philosophy” (Warrender, 1957WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 20). “The duties-formula, moreover, gives also the limitations of these rights or entitlements of the sovereign. The subject may still be justified in running away from the battle line when he is hard pressed, and the entitlements of the sovereign exist no longer when he has lost the power to protect the citizen” (Warrender, 1957WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas. 2. ed., London: Hutchinson, 1973., p. 188).
  • 23
    Essa é a tese de Taylor para preterir o Leviathan em favor dos Elements (Taylor, 1938TAYLOR, Alfred Edward. The Ethical Doctrine of Hobbes. Philosophy. N. 13, pp. 406-424, 1938., p. 406).
  • 24
    “It seems as though Hobbes's picture of man defeats his purpose of providing the basis for a Commonwealth and gives instead a consistent pattern of attitudes through which every genuine community can easily be destroyed. This results in the inherent and admitted instability of Hobbes's Commonwealth, whose very conception includes its own dissolution” (Arendt, 1976ARENDT, H. “The Origins of Totalitarianism”. San Diego, New York, London: Harcourt Brace, 1976., p. 140).
  • 25
    “Hobbes's Leviathan exposed the only political theory according to which the state is based not on some kind of constituting law - whether divine law, the law of nature, or the law of social contract-which determines the rights and wrongs of the individual's interest with respect to public affairs, but on the individual interests themselves, so that ‘the private interest is the same with the publique’" (Arendt, 1976ARENDT, H. “The Origins of Totalitarianism”. San Diego, New York, London: Harcourt Brace, 1976., p. 139). “Hobbes's Commonwealth is a vacillating structure and must always provide itself with new props from the outside; otherwise it would collapse overnight into the aimless, senseless chaos of the private interests from which it sprang” (Arendt, 1976ARENDT, H. “The Origins of Totalitarianism”. San Diego, New York, London: Harcourt Brace, 1976., p. 142).
  • 26
    “the right to self-defense is not the only right of self-preservation man has in the state of nature. He has, in addition, an offensive right to attack others who are not presently attacking him, if his preservation, in his view, requires it” (Finkelstein, 2001FINKELSTEIN, C. “A Puzzle about Hobbes on Self-Defense”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 332-361, 2001., p. 354).
  • 27
    No processo de Anders Behring Breivik na justiça norueguesa por ato terrorista em Oslo em julho de 2011 que levou à morte de 77 pessoas, a Corte proibiu a transmissão dos atos processuais, especialmente o interrogatório do réu, para que o julgamento não fosse usado para a divulgação da sua plataforma anti-imigração e antimulticulturalista.
  • 28
    Ver, também, Sreedhar (2010)______. “Hobbes on Resistance: Defying the Leviathan”. Cambridge: Cambridge University Press, 2010..
  • 29
    “he [Hobbes] knows perfectly well that people sometimes do irrational things; and he believes that some persons, with full knowledge, prefer death rather than disgrace or dishonor. He says that most men would rather lose their lives than suffer slander; and that a son would rather die than obey an order to kill his father, on the grounds that if he were to do obey such an order, he would look infamous and would be hated by all the world; and that, from shame or dishonor, he cannot bear (this is in the earlier work, De Cive). Perhaps what Hobbes is saying is that the desire for self-preservation is the strongest of all natural desires, but that while this will explain the primacy that he gives to it in his political theory, this doesn’t imply that it is always the strongest of all desires, when everything is taken into account. In other words, I am making a contrast between saying something is the strongest of natural desires and saying something is the strongest of all of our desires; everything considered. Thus, he says in De Cive, an earlier work, that we seek to avoid death by a certain impulsion of nature, no less than whereby a stone moves downwards. But, as we all know, stones sometimes move sideways, or they get thrown upward” (Rawls, 2007______. “Lectures on the History of Political Philosophy”. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2007., pp. 46-47).
  • 30
    “Mas aquele que se alista como soldado, ou toma dinheiro público emprestado, perde a desculpa de uma natureza timorata, e fica obrigado não apenas a ir para o combate, mas também a dele não fugir sem licença de seu comandante” (Hobbes, 1979______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979., cap. XXI).
  • 31
    “While both arguments [involuntariness and incapacity] may seem initially quite sensible, I shall suggest that Hobbes could not in fact have intended either” (Finkelstein, 2001FINKELSTEIN, C. “A Puzzle about Hobbes on Self-Defense”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 332-361, 2001., pp. 338-9).
  • 32
    “no person could rationally regard herself as benefitted by abandoning the right to self-defense. […] if attacked, it would never be in my interest not to defend myself” (Finkelstein, 2001FINKELSTEIN, C. “A Puzzle about Hobbes on Self-Defense”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 332-361, 2001., pp. 342-343).
  • 33
    “He [Hobbes] repeatedly insists that one must give up one’s right to judge right and wrong, make and interpret laws, levy taxes, raise and maintain an army, and interpret religious scripture. Retaining any of these rights would be inconsistent with Hobbes’s idea of sovereignty. But the right of self-defense is the perfect example of a right that can be retained without the loss of peace” (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 796). “Under the second law of nature only those rights or freedoms that were found to be counterproductive to our preservation have been given up” (Curran, 2007______. “Reclaiming the Rights of the Hobbesian Subject”. Chippenham: Palgrave Macmillan, 2007., p. 103).
  • 34
    “one cannot transfer a right the transfer of which contradicts (or undermines) the purpose for which that right is transferred” (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 795).
  • 35
    “The purpose of the state is to protect you from the evils of the state of nature; where the state threatens you with conditions equal to the evils of the state of nature, you have no obligation to obey and so you have a Hobbesian right to resist” (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 799).
  • 36
    “The Obligation of Subjects to the Soveraign, is understood to last as long, and no longer, than the power lasteth, by which he is able to protect them. For the right men have by Nature to protect themselves, when none else can protect them, can by no Covenant be relinquished. […] The end of Obedience is Protection” (Hobbes, 1998b______. (1651). “Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil”. Oxford: Oxford University Press, 1998b., chap. XXI).
  • 37
    “As I understand the larger political project, Hobbes intended to show that political obligation coincides with rational or enlightened self-interest” (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 798).
  • 38
    “Such cases merely show that it is possible for death to be a rational choice on rare occasions” (Sreedhar, 2008SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008., p. 795).
  • 39
    “can rely on one another to adhere to the principles adopted” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 153).
  • 40
    “we must be able to honor it even should the worst possibilities prove to be the case” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 153).
  • 41
    “Otherwise we have not acted in good faith” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 153).
  • 42
    “mutually disinterested” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 131).
  • 43
    “the psychological law that persons tend to love, cherish, and support whatever affirms their own good” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 155).
  • 44
    “Since everyone’s good is affirmed, all acquire inclinations to uphold the scheme” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 155).
  • 45
    “to maximize not the total but the average utility (per capita)” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 140).
  • 46
    “Allegiance to the social system may demand that some, particularly the less favored, should forgo advantages for the sake of the greater good of the whole” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 155).
  • 47
    “the two principles of justice have a definite advantage. Not only do the parties protect their basic rights but they insure themselves against the worst eventualities” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 154).
  • 48
    “acquiesce in a loss of freedom over the course of their life for the sake of a greater good enjoyed by others” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 154).
  • 49
    “requires some who are less fortunate to accept even lower life prospects for the sake of others” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 157).
  • 50
    “Compacts of this sort exceed the capacity of human nature” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 154).
  • 51
    “accept the greater advantages of others as a sufficient reason for lower expectations over the whole course of our life” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 155).
  • 52
    “the happiness which forms the utilitarian standard of what is right in conduct, is not the agent’s own happiness, but that of all concerned. As between his own happiness and that of others, utilitarianism requires him to be as strictly impartial as a disinterested and benevolent spectator” (p. 194).
  • 53
    “more realistic idea” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 155).
  • 54
    “while the average principle of utility is the ethic of a single rational individual (with no aversion to risk) who tries to maximize his own prospects, the classical doctrine is the ethic of perfect altruists” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 164-165).
  • 55
    “The special assumption I make is that a rational individual does not suffer from envy. He is not ready to accept a loss for himself if only others have less as well” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 124).
  • 56
    “Self-contempt leads to contempt of others and threatens their good as much as envy does” (Rawls, 1999RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999., p. 156).
  • 57
    Se circunstâncias sociais, como aquelas que ocorreriam em uma sociedade utilitarista, podem afetar o autorrespeito que é condição de um plano de vida bem-sucedido, pois tal respeito dependeria de um reconhecimento pelos outros do valor de alguém como pessoa, o que é negado em uma sociedade utilitarista, por que, então, determinações de eugenia também não poderiam interferir com os planos de vida? Ver a esse respeito Habermas (2001).

Referências

  • AGAMBEN, G. “Estado de exceção”. [I. D. Poleti: Stato di eccezione]. São Paulo: Boitempo, 2004.
  • ARENDT, H. “The Origins of Totalitarianism”. San Diego, New York, London: Harcourt Brace, 1976.
  • BURGESS, G. “Hobbesian Resistance Theory”. Political Studies, Vol. 42, Nr. 1, pp. 62-83, 1994.
  • BRAMHALL, J. (1658). “The Catching of Leviathan, Or the Great Whale”. In: HOBBES, T. Leviathan Parts I and II [Edited By A. P. Martinich and Brian Battiste]. Toronto: Broadview Edition, 2011.
  • CONSTANT, B. “Principes de politique applicables à tous les gouvernements”. S.l: Numilog, 2000.
  • CURRAN, E. “Hobbes's Theory of Rights: A Modern Interest Theory”. The Journal of Ethics, Vol. 6, Nr. 1, pp. 63-86, 2002.
  • ______. “Reclaiming the Rights of the Hobbesian Subject”. Chippenham: Palgrave Macmillan, 2007.
  • EDWARD, E. C. “A Brief View and Survey of the Dangerous and Pernicious Errors to Church and State in Mr. Hobbes’s Book, Entitled Leviathan”. Oxford: Bathurst, 1676.
  • FINKELSTEIN, C. “A Puzzle about Hobbes on Self-Defense”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 332-361, 2001.
  • GAUTHIER, D. “The Logic of Leviathan”. Oxford: Clarendon Press, 1969.
  • HABERMAS, J. “Die Zukunft der menschlichen Natur. Auf dem Weg zu einer liberalen Eugenik?” Frankfurt a. M.: Suhrkamp, 2001.
  • HEGEL, G.W.F. Fenomenologia do espírito [2 v.]. Petrópolis: Vozes, 1992.
  • HOBBES, T. (1668). “Leviathan: sive de materia, forma, et potestate civitatis ecclesiasticae et civilis”. [Thomæ Hobbes Malmesburiensis Opera Philosophica Quæ Latine Scripsit Omnia, Vol. 3, W. Molesworth (ed.)]. Charleston: Nabu Press, 2010.
  • ______. (1642). “De Cive”. Oxford: Clarendon, 1983.
  • ______. (1642). “Do cidadão”. [R. J. Ribeiro: Philosophical Rudiments Concerning Government and Society]. 2a. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998a.
  • ______. (1651). “Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil”. Oxford: Oxford University Press, 1998b.
  • ______. (1651). “Leviatã ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil”. [Trad. J. P. Monteiro e M.B.N. da Silva: Leviathan, or Matter, Form, and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil]. 2a. ed. São Paulo: Abril Cultural, 1979.
  • ______. (1668). “Dialogue, Behemoth, Rhetoric”. Indianápolis: Liberty Fund, 1839. [Edition used: The English Works of Thomas Hobbes of Malmesbury; Now First Collected and Edited by Sir William Molesworth, Bart., (London: Bohn, 1839-45). 11 Vols. Vol. 6]. [http://files.libertyfund.org/files/770/Hobbes_0051-06_EBk_v6.0.pdf].
    » http://files.libertyfund.org/files/770/Hobbes_0051-06_EBk_v6.0.pdf
  • ______. (1640). “The Elements of Law Natural and Politic”. Cambridge: Cambridge University Press, 1928.
  • HYPPOLITE, Jean. Genèse et structure de la Phénomélogie de l'Esprit de Hegel [Tome I, II]. Paris: Aubier, Editions Montaigne, 1946.
  • KANT, I. “Kant’s gesammelte Schiriften/Kant’s Werke”. (28 Vols.). (Preussischen Akademie der Wissenschaten). Berlin: Reimer, 1911.
  • LLOYD, S. A. “Hobbes’s Self-effacing Natural Law Theory”. Pacific Philosophical Quarterly, Vol. 82, Nr. 3-4, pp. 285-308, 2001.
  • MILL, J. S. “Utilitarianism and On Liberty. Including Mill’s ‘Essay on Bentham’ and selections from the writings of Jeremy Bentham and John Austin”. [Ed. with an Introduction by M. Warnock]. 2a. ed. Oxford: Blackwell, 2003.
  • PETTIT, P. “Republicanism: A Theory of Freedom and Government”. Oxford: Oxford University Press, 1997.
  • ______. “Made with Words: Hobbes on Language, Mind, and Politics”. Princeton and Oxford: Princeton University Press, 2008.
  • RAWLS, J. “A Theory of Justice”. [Revised Edition]. Oxford: Oxford University Press, 1999.
  • ______. “Lectures on the History of Political Philosophy”. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2007.
  • SCHMITT, Carl. Teoría de la Constitución [F. Ayala: Verfassungslehre]. Madrid: Alianza, 2003.
  • SLOMP, G. “The Liberal Slip of Thomas Hobbes’s Authoritarian Pen”. Critical Review of International Social and Political Philosophy, Vol. 13, Nr. 2, pp. 357-369, 2010.
  • SREEDHAR, S. “Defending the Hobbesian Right of Self-Defense”. Political Theory, Vol. 36, Nr. 6, pp. 781-802, 2008.
  • ______. “Hobbes on Resistance: Defying the Leviathan”. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.
  • STRAUSS, L. “Natural Right and History”. Chicago: The University of Chicago Press, 1965.
  • TAYLOR, Alfred Edward. The Ethical Doctrine of Hobbes. Philosophy N. 13, pp. 406-424, 1938.
  • WARRENDER, H. “The Political Philosophy of Hobbes”. Oxford: Oxford University Press, 1957.
  • WATKINS, J. W. N. Hobbes's System of Ideas 2. ed., London: Hutchinson, 1973.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    13 Fev 2017
  • Aceito
    20 Maio 2017
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 Campus Pampulha, CEP: 31270-301 Belo Horizonte MG - Brasil, Tel: (31) 3409-5025, Fax: (31) 3409-5041 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: kriterion@fafich.ufmg.br