Acessibilidade / Reportar erro

O PROBLEMA DA PENETRABILIDADE COGNITIVA DA PERCEPÇÃO: UM CASO DE VÍCIO INTELECTUAL?

RESUMO

A percepção, o modo pelo qual sentimos o mundo, é comumente distinta da cognição, o modo pelo qual o pensamos. Entretanto, a percepção parece exercer um papel importante na justificação de crenças empíricas, ainda que haja divergência a respeito de como isso ocorre. A hipótese da penetrabilidade cognitiva da percepção problematiza ambas essas afirmações. Segundo essa teoria, estados cognitivos anteriores podem afetar a etiologia do conteúdo sensório da experiência, gerando, como efeito, uma espécie de insensibilidade aos estímulos externos. Como resultado, lançam-se suspeitas quanto à isenção do “tribunal” da experiência. Este artigo tem o propósito de discutir casos de má penetrabilidade cognitiva como consequências de vícios intelectuais. Vícios intelectuais são traços de caráter, como dogmatismo e preconceito, que impedem o exercício apto e responsável da inquirição e outras práticas epistêmicas. Essa abordagem tem a dupla vantagem de, por um lado, elucidar esse “comércio ilegal” entre percepção e cognição, e por outro, responder ao problema da circularidade epistêmica, causado pela penetrabilidade cognitiva da percepção.

Palavras-chave:
Penetrabilidade cognitiva da percepção; epistemologia da virtude; percepção; justificação epistêmica; vícios intelectuais.

ABSTRACT

Perception, the way we experience the world, is often distinguished from cognition, the way we think about the world. However, even though there is no agreement about how it happens, perception seems to have an important role in the justification of empirical beliefs. The hypothesis of cognitive penetration ofperception contradicts such claims. According to such hypothesis, early cognitive states can affect the etiology of the contents of sensory experience, yielding a kind of insensibility to external stimuli. This casts doubts on impartiality of the “tribunal” of sense experience. The aim of this article is to discuss cases of bad cognitive penetrability which result from intellectual vices. Intellectual vices are character traits, such as dogmatism and prejudice, which prevent the apt and responsible exercise of inquiry and others epistemicpractices. This approach has two advantages: first, it elucidates “illegal trades” between perception and cognition, and second, it answers the problem of epistemic circularity, posed by the cognitive penetrability of perception.

Keywords:
Cognitive penetrability of perception; epistemology of virtue; perception; epistemic justification; intelectual vices.

Introdução

A percepção sensoria provê um acesso epistêmico primário e direto a um mundo objetivo e independente-da-mente. Ela provê, ainda, um determinado estado ou conteúdo representacional que chamamos de experiência perceptual. Esse estado difere de outros estados cognitivos, como crenças, que envolvem conteúdo representacional estruturado em proposições, as quais atribuímos valores de verdade. Ambos esses estados mentais, de natureza perceptual e doxástica-proposicional, parecem, contudo, que se relacionam no campo das justificações.

Se assim o for, a percepção exerceria uma fUnção relevante na justificação de juízos empíricos, como quando um sujeito vê um objeto com determinadas propriedades, por exemplo, uma maçã vermelha; essa percepção sensória visual causa a crença de que ele vê uma maçã vermelha e, essa crença, por sua vez, justifica-se pelo fato de que parece, de fato, haver uma maçã vermelha.

Há diversos problemas envolvendo o papel da percepção na justificação de crenças - se é que esse papel pode ser atribuído à percepção. Um em específico diz respeito à hipótese da penetrabilidade cognitiva da percepção, tema deste artigo e uma controversa tese epistêmica que move um debate atual.

Há situações em que certos estados cognitivos, como desejos, crenças, medos, dúvidas, inferências, etc. podem afetar o conteúdo da experiência perceptiva, influenciando o modo como percebemos o mundo. Como quando um especialista em arte percebe mais nuances em um quadro, um cientista dedicado identifica corretamente dados coletados de um experimento ou uma pessoa com medo desconfia de passantes numa rua escura.

A penetrabilidade cognitiva pode comprometer a percepção como um “tribunal” para nossas crenças. Mas nem todos os casos de penetrabilidade cognitiva da percepção são prejudiciais ao curso da inquirição. Alguns deles são epistemicamente benéficos aos agentes.

Neste artigo defendo a hipótese de que alguns casos de penetrabilidade cognitiva podem ser entendidos e solucionados a partir de uma abordagem pela epistemologia das virtudes. Assim, casos em que o conteúdo da experiência é ilegitimamente penetrado por estados mentais anteriores são analisados como práticas decorrentes de vícios epistêmicos. Esses vícios epistêmicos, como dogmatismo e preconceito, falham em regular a inquirição por impossibilitarem que a percepção exerça sua função no processo de justificação de crenças.

Baseio minha análise nos trabalhos pioneiros de Susanna Siegel (2011SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011., 2012______. “The epistemic impact of the etiology of experience”. Philosophical Studies, Vol. 162, Nr. 3, pp. 697-722, 2012., 2016______. “How is wishful seeing like wishful thinking?”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 95, Nr. 2, pp. 408-435, 2016.) sobre penetração cognitiva, e nas teorias responsabilistas da virtude de Linda Zagzebski (1996)ZAGZEBSKI, L. T. “Virtues of the mind: An inquiry into the nature of virtue and the ethical foundations of knowledge”. Cambridge: Cambridge University Press, 1996., Jason Baehr (2011)BAEHR, J. “The inquiring mind: On intellectual virtues and virtue epistemology”. Oxford: Oxford University Press, 2011., Chirstopher Hookway (2003)HOOKWAY, C. “How to be a virtue epistemologist”. In: DePAUL, M., ZAGZEBSKI, L. (eds.). Intellectual virtue: Perspectives from ethics and epistemology. Oxford/New York: Oxford University Press, 2003. pp. 149-60. e Qassin Cassam (2016)CASSAM, Q. “Vice epistemology”. The Monist, Vol. 99, pp. 159-180, 2016.. Na primeira seção apresento os principais conceitos, definições e dois exemplos que ilustram a teoria da penetração cognitiva da percepção; na segunda, enfatizo como isso gera um problema de justificação epistêmica. Na terceira seção comparo casos de penetrabilidade cognitiva com erros de percepção provocados por ilusão e alucinação. Na quarta e última examino a questão sob a perspectiva da epistemologia das virtudes. Concluo que essa abordagem teórica tem uma dupla vantagem de, por um lado, investigar um cenário cético diferente daqueles tradicionais em epistemologia e, por outro, recomendar soluções para o problema da circularidade epistêmica, causado especificamente por penetrabilidade cognitiva.

1 Definições conceituais e teóricas

A tese da penetrabilidade cognitiva da percepção (para abreviar, PC) diz respeito ao modo como determinados estados cognitivos e afetivos -crenças, desejos, sentimentos, expectativas, traços de caráter, etc. - podem afetar o processo perceptual, modelando parcialmente a experiência visual que resulta dessa atividade. Alguns casos de penetrabilidade cognitivas são epistemicamente benéficos, enquanto outros, epistemicamente prejudiciais ao sujeito.

Precisamos, antes de expor esta tese, esclarecer os conceitos de percepção e experiência perceptual com os quais estamos trabalhando. O foco deste trabalho é a percepção visual.

Assumimos, seguindo Pylyshyn (2007)PYLYSHYN, Z. “Things and places: how the mind connects with the world”. Cambridge, MA: MIT Press/ Bradford Book, 2007., que o processo perceptual ocorre em duas fases ou estágios. No primeiro estágio, chamado visão anterior (early vision), estímulos são discriminados pelo sujeito; no segundo, chamado visão posterior (late vision), há uma atenção consciente direcionada aos objetos que resulta na constituição do percepto.1 1 Por percepto entendo o conteúdo mental da experiência. Concordamos com Pylyshyn (2007), Raftopoulos (2009RAFTOPOULOS, A. “Cognition and perception”. Cambridge, Mass.: MIT Press, 2009., 2019______. “Cognitive penetrability and the epistemic role of perception”. Switzerland: Palgrave Macmillan, 2019.) e Siegel (2011SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011., 2012______. “The epistemic impact of the etiology of experience”. Philosophical Studies, Vol. 162, Nr. 3, pp. 697-722, 2012., 2016______. “How is wishful seeing like wishful thinking?”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 95, Nr. 2, pp. 408-435, 2016.) ao sustentar que o estágio de visão anterior é modular ou impenetrável cognitivamente. O cerne desta pesquisa, portanto, é esse estágio posterior de percepção visual. Nesse estágio, há a formação de um conteúdo fenomenológico da experiência visual que, supomos, é um estado consciente de ver um objeto O como possuindo propriedades x1, x,2 x3... etc. (Siegel, 2011).2 2 Neste artigo não discutirei a natureza deste conteúdo da experiência (se ele é ou não estruturado proposicionalmente, por exemplo) apenas assumo ser um estado mental que resulta do processo perceptivo.

A tese da PC diz respeito à etiologia do conteúdo da experiência visual, isto é, ao modo como esse conteúdo mental é formado no estágio de visão posterior (Raftopoulos, 2019______. “Cognitive penetrability and the epistemic role of perception”. Switzerland: Palgrave Macmillan, 2019.; cf. Siegel, 2012______. “The epistemic impact of the etiology of experience”. Philosophical Studies, Vol. 162, Nr. 3, pp. 697-722, 2012., p. 699, n. 4; Siegel, 2016______. “How is wishful seeing like wishful thinking?”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 95, Nr. 2, pp. 408-435, 2016., pp. 5-6). Porém, nem todo tipo de influência ou efeito causal sobre a experiência, nesse estágio posterior, pode ser considerado um caso de PC. Atenção, por exemplo, é um mecanismo de seleção de estímulos, e não conta como PC, porque esta possui um escopo teórico mais estreito e provoca, como efeito, circularidade na justificação3 3 Cf. seção 2 deste artigo. (Siegel, 2011, pp. 3-4).

O que caracteriza a PC é a influência de fatores irracionais, oriundos de estados mentais anteriores ou de repertório, sobre a formação do conteúdo da experiência que geram, como efeito, um tipo específico de insensibilidade aos estímulos externos.

É possível, então, que dois sujeitos (ou o mesmo, em situações contrafactuais distintas) tenham diferentes experiências, com conteúdos diferentes, quando atentam para o mesmo estímulo perceptual sob as mesmas condições externas, como resultado de estados cognitivos de repertório (Siegel, 2011SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011., pp. 5-6).4 4 Pode ser o caso, porém, de dois sujeitos estarem atentando para diferentes aspectos da experiência, como a forma de um objeto ou suas propriedades (tamanho, cor), o que claramente não seria um caso de PC, mas que ajuda a diferenciá-lo de situações de atenção seletiva (Silins, 2016, p. 27). A maioria desses casos deve atender, portanto, a seguinte cláusula contrafactual de sensibilidade, que parafraseamos do seguinte modo (ibidem, p. 6):

Cláusula (PC): Se o sujeito S não estivesse em um estado cognitivo de repertório C que ele atualmente está, nas mesmas circunstâncias e sob os mesmos estímulos sensórios, ele não teria a experiência visual com o conteúdo E.

Os estados cognitivos ou afetivos anteriores que afetam as crenças podem ser de diversos tipos. E um dos principais problemas com a tese da PC é identificar corretamente casos genuínos de PC, diferenciando-os de outros casos semelhantes. Siegel, por exemplo, identifica pelo menos cinco exemplos hipotéticos (2012, pp. 698-699). Ater-me-ei aqui a dois casos de crenças cuja legitimidade epistêmica é comprometida pela penetrabilidade cognitiva da percepção. São eles:

Caso (1): Maria acredita que as notícias de um telejornal são ideologicamente enviesadas e que o apresentador A lê uma notícia desfavorável ao partido político B expressando um sentimento de raiva. Assim, quando Maria assiste ao telejornal, parece a ela que o apresentador A está com raiva.5 5 Esse caso é análogo ao proposto por Siegel do “Jack zangado” (angry Jack): Jill tem motivos para crer que Jack está com raiva e, quando vê o amigo, parece a ela que Jack está realmente com raiva. Se Jill não tivesse a crença de que Jack está com raiva, ela provavelmente não teria experiência visual de ver Jack com raiva (Siegel, 2011, pp. 9-11). Este caso atende à cláusula (PC):

Cláusula (PC): Se Maria não acreditasse que as notícias do telejornal fossem ideologicamente enviesadas, ela não teria a experiência visual de ver o rosto do apresentador A como expressando raiva.

Caso (2): O policial militar João acredita que negros e pobres que moram em favelas são perigosos e andam armados. Ele então “confunde”, durante uma operação policial em uma favela, um guarda-chuva nas mãos de um morador com um fuzil. Este caso também atende à cláusula (PC):

Cláusula (PC): Se João não acreditasse que negros e pobres que moram em favelas são perigosos, ele não teria a experiência visual de ver um fuzil nas mãos de um morador, ao invés de um guarda-chuva.

Esse caso (2) é mais complexo e pode nos ajudar a diferenciar casos de PC de casos de alucinação ou ilusão perceptual (por isso as aspas em “confunde”), como veremos mais à frente (seção 3). O exemplo baseia-se em caso ocorrido em 2018 no Rio de Janeiro que motivou protestos de grupos de direitos humanos (Moura, 2019MOURA, C. “PM confunde guarda-chuva com fuzil e mata garçom no Rio, afirmam testemunhas”. El País. Rio de Janeiro, 19 set. 2018. [Online] Disponível em https:// brasil.elpais.com/brasil/2018/09/19/politica/1537367458_048104.html. Acessado em 16 de julho de 2019.
https:// brasil.elpais.com/brasil/2018/0...
). Payne (2001)PAYNE, K. B. “Prejudice and perception: The role of automatic and controlled processes in misperceiving a weapon”. Journal of Personality and Social Psychology, Vol. 81, Nr. 2, 181, pp. 181-192, 2001. desenvolveu um experimento em psicologia social e cognitiva, também baseado em caso semelhante, ocorrido nos Estados Unidos em 1999, no qual relata o impacto de estereótipos raciais sobre a percepção.6 6 No experimento, imagens de rostos de homens brancos e negros eram mostradas aos participantes, em um computador, seguidas rapidamente por imagens de uma arma ou uma ferramenta. Era então pedido aos participantes (americanos brancos) para clicarem nas opções “arma” ou “ferramenta”, associadas às imagens. Como resultado, quando os voluntários do experimento eram pressionados pelo tempo, houve um número maior de erros de percepção que confundiam ferramentas com armas associadas a imagens de rostos negros do que a imagens de rostos brancos. Tragicamente, em outro caso ocorrido no Rio de Janeiro em 2010, um morador foi morto por um policial militar que confundiu uma furadeira com uma arma de fogo nas mãos da vítima (Tabak, 2010). O experimento de Payne é considerado um exemplo de PC.

Imagem 1
Imagens mostradas em experimento (Payne, 2001PAYNE, K. B. “Prejudice and perception: The role of automatic and controlled processes in misperceiving a weapon”. Journal of Personality and Social Psychology, Vol. 81, Nr. 2, 181, pp. 181-192, 2001., p. 184).

Tratamos aqui de casos hipotéticos de crenças de cunho irracional, mas estados afetivos ou outros tipos de estados cognitivos também podem constituir casos PC. E há casos de PC que atendem a essa cláusula, mas são epistemicamente benéficos ao sujeito, como, por exemplo, um experiente radiologista, cujo treinamento permite que ele perceba uma pequena fratura olhando para uma radiografia, o que seria apenas um borrão para um não especialista (Siegel, 2011SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011., p. 1). Outro exemplo é o de uma comunidade acadêmica que cultua virtudes como rigor, diligência e honestidade; ainda que seus participantes não estejam conscientes dessas qualidades, elas terão impacto sobre seus experimentos individuais.

Pode-se assim diferenciar casos benéficos de prejudiciais, que nesta pesquisa considerarei como casos de virtude ou vício epistêmicos (cf. seção 4), que decorrem do modo como crenças, emoções, traços da personalidade e habilidades podem afetar a percepção. Enquanto pessoas dogmáticas, muito confidentes ou pessimistas podem tornar o processo epistêmico vicioso, outras com determinadas habilidades (como o especialista em raio X) ou qualidades (rigorosa em sua pesquisa e procedimentos), podem, ao contrário, tornar o processo epistêmico virtuoso.7 7 Entendemos que não somente sujeitos, mas comunidades podem ser virtuosas ou viciosas em suas condutas epistêmicas de acordo com o tipo de PC que afeta a percepção dos indivíduos. Um exemplo é a sociedade descrita em To Kill a Mockinbird (no Brasil, O Sol é para todos), romance de Harper Lee publicado em 1960, cujos personagens têm sua percepção da realidade afetada por preconceito racial. Estes últimos são aqueles que envolvem, por exemplo, aprendizagem ou informações de repertório do sujeito, que o permite ter uma percepção mais acurada das coisas. Um aluno curioso, motivado e entusiasmado com a matéria pode ter reflexos positivos em seu aprendizado. Mesmo estados negativos podem ter efeitos benéficos, como o medo de falhar nos exames ou o desgosto de ter que repetir aquele curso. O que, portanto, diferencia casos ruins e bons?

2 A experiência “sequestrada”

Em casos de PC, elementos irracionais ou subpessoais, estados cognitivos ou afetivos, afetam a formação do conteúdo da experiência em seu estágio posterior; como efeito, provocam, em casos viciosos, um tipo específico de insensibilidade aos estímulos sensórios. Mas, em casos virtuosos, eles “elevam” epistemicamente os agentes. O que difere casos viciosos e virtuosos de PC é o comprometimento da função justificatória da experiência, que Siegel chama de rebaixamento epistêmico (epistemic downgrade).

O rebaixamento epistêmico ocorreria quando há um comprometimento do suporte racional provido pela experiência na justificação de crenças empíricas, em decorrência de elementos irracionais em sua etiologia, ou seja, de seu passado duvidoso (checkeredpast) (Siegel, 2012______. “The epistemic impact of the etiology of experience”. Philosophical Studies, Vol. 162, Nr. 3, pp. 697-722, 2012., 2017______. “The rationality of perception”. Oxford: Oxford University Press, 2017.). Isso excluiría casos de aprendizagem, por exemplo. Nessas situações, a autora diz que essas perspectivas prévias e irracionais que afetam a crença (desejos, medos, preconceitos etc.) sequestram a experiência (Siegel, 2017______. “The rationality of perception”. Oxford: Oxford University Press, 2017.).

O que ocorre é que a insensibilidade aos estímulos sensórios causada por PC provoca uma circularidade viciosa que compromete a justificação epistêmica. Podemos resumir esse processo na seguinte estrutura de justificação circular:8 8 No simbolismo usado a seguir, “C1” representa um estado cognitivo de background que afeta o conteúdo da experiência; “E” representa o percepto ou conteúdo da experiência, e “C2”, a crença “C1” “justificada” pela experiência; “S” é o sujeito ou agente epistêmico.

C1: S crê que α é Φ

E: S percebe que α é Φ com base em C1, tendo a experiência E.

C2: A experiência E justifica a crença C1, tornando-a legítima (C2).

Aplicando essa estrutura ao caso (1) temos:

C1: Maria crê que “o apresentador A lê uma notícia desfavorável ao partido político B expressando um sentimento de raiva”

E: Maria percebe (a ela parece) que o apresentador A está com raiva (com base em C1 tem a experiência E).

C2: O conteúdo da experiência E justifica (reforça) o conteúdo cognitivo Cp tornando legítimo crer que “o apresentador A lê uma notícia desfavorável ao partido político B expressando um sentimento de raiva” (C2).

A circularidade epistêmica viciosa ocorre quando um estado de crença prévio de S afeta a etiologia do conteúdo da experiência visual de S e essa experiência (percepto), por sua vez, reforça (justifica) a crença de S. Uma crença irracional torna-se, assim, legitimada. Um caso virtuoso de PC não geraria tal circularidade, pois o sujeito seria sensível a alternativas relevantes. Por exemplo, um especialista em expressões faciais seria sensível a elementos da percepção do objeto que imporia constrangimento à sua crença. O que a PC ameaça, portanto, é a percepção como “tribunal” de crenças empíricas, e, de modo geral, a inquirição.

A tese da PC contraria o chamado conservadorismo ou dogmatismo fenomenal-perceptual (Huemer, 2007HUEMER, M. “Compassionate phenomenal conservatism”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 74, Nr. 1, pp. 30-55, 2007.; Tucker, 2014TUCKER, C. “If dogmatists have a problem with cognitive penetration, you do too”. Dialectica, Vol. 68, Nr. 1, pp. 35-62, 2014.; Siegel, 2011SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011., p. 8), segundo o qual se o objeto O parece perceptualmente ter uma propriedade F para um sujeito S, então, na ausência de evidências contrárias (defeaters), S está prima facie justificado a crer que “O é F”. Em síntese, o conservadorismo fenomenal (Huemer) ou dogmatismo perceptual (Tucker) é uma doutrina que endossa um fundacionismo internalista, de acordo com o qual um sujeito está justificado a crer numa proposição p se, e somente se, ele tem acesso a determinados estados mentais não doxásticos, capazes de prover uma justificação imediata a juízos empíricos.

Se a hipótese da PC estiver correta, ter o conteúdo da experiência E não confere a S uma justificação prima facie para uma crença p.9 9 Para ser mais específico, o conservadorismo fenomenal/dogmatismo perceptual é uma teoria que trata da justificação proposicional, não doxástica, ou seja, diz respeito à justificação de uma proposição p, quer ou não o sujeito creia que p (Tucker, 2014, p. 35, n. 1; cf; Raftopoulos, 2019, p. 25). Siegel discute esta questão em Siegel (2012, pp. 702-706), argumentando a favor de uma compreensão holística da justificação doxástica, que inclui a proposicional. Não tenho motivos, neste artigo, para problematizar isso. Isso acontece porque estados mentais anteriores influenciam a constituição desse conteúdo da experiência, rebaixando epistemicamente a percepção. De acordo com o conservadorismo fenomenal, podemos supor a seguinte situação: se parece a Mariana que “este anel de noivado é de ouro”, então, na ausência de evidências contrárias, Mariana está justificada prima facie a crer que “este anel de noivado é de ouro”. Contudo, podemos supor uma segunda situação semelhante a essa, com a diferença de que Mariana tivesse um enorme desejo de que o anel fosse, de fato, de ouro. Nesse caso, a simples aparência de ouro do objeto não poderia prover uma justificação do tipo sugerido pelas teorias dogmatistas e fundacionistas, pois o desejo de Mariana comprometeria o seu estado interno (percepto), gerando insensibilidade a evidências e circularidade epistêmica.

Teorias coerentistas puras, ainda que pouco em voga atualmente, estariam imunes à PC. Contudo, versões mais moderadas, que levem em conta não apenas a coerência de um sistema de crenças, mas a percepção como elementos de justificação,10 10 Uma teoria como o fundarentismo proposto por Susan Haack (1993), por exemplo. parecem, todavia, serem vulneráveis a esses casos de PC.11 11 Com base nisso, Tucker (2014) conclui que, se a PC é um problema sério para o dogmatismo perceptual, ele o é, até muito mais, para diferentes abordagens epistemológicas.

3 Um problema à parte de ilusões e alucinações perceptuais

A teoria do dogmatismo é em parte motivada por problemas envolvendo cenários céticos, aos quais pretende oferecer resposta. Afinal, na ausência de evidências para crer que não tenho mãos, posso estar justificado a crer que tenho mãos pelo simples fato de vê-las. Casos de PC, porém, diferem de cenários céticos mais conhecidos, como ilusões ou alucinações perceptuais, conforme veremos a seguir.

Exemplos de ilusões relatam situações nas quais o objeto comum é percebido como tendo propriedades diferentes daquelas que realmente tem. Por exemplo, uma construção com paredes brancas que parecem vermelhas sob uma iluminação especial; ou a experiência de ilusão Müller-Lyer, na qual linhas retas com o mesmo tamanho parecem ter comprimentos diferentes do que realmente têm (imagem 1).

Imagem 2
Ilusão Müller-Lyer (fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Ilus%C3%A3o_de_M%C3%BCller-Lyer).

Já casos de alucinação ocorrem quando percebemos um objeto que, de fato, não existe independente-da-mente, como quando alguém acredita ver um monstro marinho na praia ou um parente morto tomando café na sala de estar. A diferença é que, enquanto num caso de ilusão o sujeito tem uma percepção inacurada (não verídica) do objeto visualizado, no caso de uma alucinação não há objeto externo que o sujeito supõe perceber no ambiente. Um exemplo de alucinação é a grade de Hermann, na qual vemos quadrados cinzas aparecendo nos pontos de intersecção entre os quadrados (imagem 2).12 12 Não há, contudo, consenso em classificar a grade de Hermann como um caso de ilusão ou alucinação (cf. Macpherson, 2016).

Imagem 3
Grade de Hermann (fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Grid_illusion).

Erros de percepção, desta forma, podem ser rudemente (para os propósitos deste artigo) classificados em dois tipos (Macpherson, 2016MACPHERSON, F. “Redefining illusion and hallucination in light of new cases”. Philosophical Issues, Vol. 26, Nr. 1, pp. 263-296, 2016.):13 13 Restrinjo-me aqui a casos que envolvem percepção visual.

  • (i) Ilusão: propriedades de um objeto externo são percebidas de maneira inacurada pelo sujeito;

  • (ii) Alucinação: não há percepção de objeto externo ou de suas propriedades pelo sujeito.

De que forma exemplos de PC comporiam tipos diversos desses erros de percepção?

O que caracteriza a PC, conforme dissemos na seção 1, é a influência de estados mentais anteriores, de repertório, sobre a constituição do conteúdo da experiência, o que provoca insensibilidade aos estímulos externos. Nos casos de ilusão ou alucinação não há essa insensibilidade aos estímulos - o sujeito que vê uma parede vermelha a veria como branca em condições externas favoráveis, e o que vê um monstro marinho não veria esses animais fictícios se não sofresse de eventuais distúrbios que afetam seu mecanismo cognitivo e sensório.

Casos de PC, sobretudo, dizem respeito à etiologia do conteúdo da experiência visual, diferentemente dos anteriores, que não atendem à cláusula (1):

Cláusula (PC): Se o sujeito S não estivesse um estado cognitivo de repertório C que ele atualmente está, nas mesmas circunstâncias e sob os mesmos estímulos sensórios, ele não teria a experiência visual com o conteúdo E (parede branca/ vermelha, uma miragem no deserto).

Mesmo em um caso de PC virtuosa, no qual, por exemplo, eu aprendo que as duas linhas da experiência Müller-Lyer possuem, na verdade, o mesmo comprimento, eu continuarei as percebendo como sendo distintas (cf. Silins, 2016SILINS, N. “Cognitive penetration and the epistemology of perception”. Philosophy Compass, Vol. 11, Nr. 1, pp. 24-42, 2016., pp. 25-26); e no caso da parede, mesmo sabendo que sou enganado por um projetor de luz, ainda a verei como vermelha, não como branca. Situações que envolvem alucinação também não atendem à cláusula. Não é difícil imaginar que uma pessoa alucinando possa saber que está alucinando, pois racionalmente pode duvidar da existência de animais marinhos ou pode saber que está sob efeitos de drogas alucinógenas.

Em terceiro lugar, o que é afetado em condições de ilusão ou alucinação visuais é apenas a crença perceptual, não o conteúdo da experiência, ou seja, não há influência entre esses dois estados. Tanto nos casos de ilusão quanto nos de alucinação, os erros de percepção não ocorrem por problemas com o conteúdo da experiência, mas com o conteúdo da crença.

Em suma, em cenários de erros de percepção a experiência não serve como razão para minhas crenças, mas por motivos diferentes de casos de circularidade epistêmica descrito anteriormente.

Voltando ao caso (2):

Caso (2): O policial militar João acredita que negros e pobres que moram em favelas são perigosos e andam armados. Ele então confunde, durante uma operação policial em uma favela, um guarda-chuva nas mãos de um morador com um fuzil.

Poderiamos facilmente transformar esse caso em erros perceptuais causados por ilusão visual, como supondo que o guarda-chuva pudesse ser facilmente confundido com um fuzil em uma rua mal iluminada ou, num caso de alucinação, o policial veria um fuzil inexistente nas mãos do morador. Não seria, ainda assim, um caso específico de PC, em que a formação do conteúdo da experiência é afetada por crenças anteriores, sem que estejamos conscientes dos efeitos de um processo irracional (Siegel, 2012).

Por último, outro aspecto que diferencia casos de PC é que problemas envolvendo ilusão ou alucinação perceptuais ocorrem em razão da relação entre o sujeito epistêmico e um objeto independente-da-mente. Em parte esses problemas envolvem, portanto, limitações do aparato perceptivo causadas por condições externas não confiáveis para que a experiência resultante seja acurada, como um ambiente mal iluminado ou iluminado propositalmente para confundir o sujeito, ou defeitos no próprio aparato perceptual, causado por drogas alucinógenas, por exemplo. Casos de PC, ao contrário, derivam de fatores internos ao próprio indivíduo, ou seja, seus próprios estados mentais (Siegel, 2017______. “The rationality of perception”. Oxford: Oxford University Press, 2017., p. 9). Por outro lado, não devem ser confundidos com erros de introspecção, cujo impacto é sobre o conteúdo do juízo (crença), não sobre a própria experiência ou percepto. No caso de um erro introspectivo, o sujeito confunde a experiência de ver guarda-chuva com a experiência de ver uma arma (ilusão).14 14 Siegel (2017, pp. 9-10) relata outros dois casos de sequestro da experiência que, diferentemente da PC, impactam o conteúdo do juízo: descrença (o sujeito duvida da experiência de ver um guarda-chuva) e ignorância [by-pass] (o sujeito ignora a experiência de ver um guarda-chuva).

Poderiamos assim classificar a PC como um problema à parte dos erros de percepção:

  • (i) Ilusão: propriedades de um objeto externo são percebidas de maneira inacurada pelo sujeito;

  • (ii) Alucinação: não há percepção de objeto externo ou de suas propriedades pelo sujeito.

  • (iii) Penetração cognitiva: propriedades de um objeto não podem ser percebidas de maneira acurada pelo sujeito.

Ainda que haja muita pesquisa a ser feita a respeito, temos a impressão de casos de PC serem epistemicamente mais graves e facilmente confundidos com casos de ilusão ou de alucinação. Uma análise preliminar, contudo, mostra que podemos diferenciar esses casos de PC por quatro razões: (i) causam insensibilidade aos estímulos externos; (ii) dizem respeito à etiologia do conteúdo perceptivo; (iii) afetam, portanto, o conteúdo da experiência, não da crença; e (iv) dizem respeito unicamente a fatores internos ao sujeito.

4 Penetrabilidade cognitiva: vícios epistêmicos

Retorno agora ao problema envolvendo justificação epistêmica em PC, que analisamos no capítulo 2, para apresentar uma tentativa de solução. A questão é como evitar o rebaixamento epistêmico de crenças envolvidas nos casos hipotéticos, mostrados na seção 1, que diferem de casos tradicionais de erros perceptivos (seção 3). Há diversas propostas de solucionar esses casos (cf. Georgakakis; Moretti, 2019GEORGAKAKIS, C.; MORETTI, L. “Cognitive penetrability of perception and epistemic justification”. The Internet Encyclopedia of Philosophy (IEP), 2019. [Online] Disponível em https://www.iep.utm.edu/cog-pene/. Acessado em 19 de maio de 2019.
https://www.iep.utm.edu/cog-pene/...
), mas nenhuma delas trabalha diretamente com a hipótese de vícios epistêmicos.

Epistemologia da virtude é um campo da epistemologia contemporânea que entende serem as virtudes epistêmicas, de sujeitos e comunidades, o principal foco de avaliação e de valores epistêmicos. Por um lado, muda-se o foco da natureza das crenças para faculdades e virtudes do agente, por outro, o conhecimento como representação para o conhecimento como performance.15 15 Para uma visão geral da epistemologia das virtudes, cf. Battaly, 2008. Costuma-se classificar a epistemologia da virtude em dois ramos, uma teoria confiabilista (externalista) da virtude e uma teoria responsabilista das virtude, que, grosso modo, diferem em razão da segunda conferir primazia aos traços de caráter (coragem, mente aberta, integridade, humildade, perseverança, etc.) em relação a capacidades ou habilidades, inatas ou aprendidas (como boa memória, visão acurada, raciocínio lógico, habilidades discursivas, etc.).16 16 Entre os representantes da primeira estão Ernest Sosa, John Greco, Alvin Goldman, e da segunda, Linda Zagzebski, Christopher Hookway, Lorraine Code e James Montmarquet. Sobre essa distinção, cf. Battaly, 2008 e Baher, 2011. A abordagem adotada aqui é a responsabilista de Zagzebski (1996)ZAGZEBSKI, L. T. “Virtues of the mind: An inquiry into the nature of virtue and the ethical foundations of knowledge”. Cambridge: Cambridge University Press, 1996., Baehr (2011BAEHR, J. “The inquiring mind: On intellectual virtues and virtue epistemology”. Oxford: Oxford University Press, 2011.), Hookway (2003HOOKWAY, C. “How to be a virtue epistemologist”. In: DePAUL, M., ZAGZEBSKI, L. (eds.). Intellectual virtue: Perspectives from ethics and epistemology. Oxford/New York: Oxford University Press, 2003. pp. 149-60.) e Cassam (2016)CASSAM, Q. “Vice epistemology”. The Monist, Vol. 99, pp. 159-180, 2016.. Em específico, de Zagzebski adotamos a matriz conceitual básica, de Baehr e Hookway, o endosso de uma perspectiva normativa da inquirição, e de Cassam, uma doutrina dos vícios intelectuais.17 17 Não discutirei a diferença entre essa autora e esses autores, por consideramos os propósitos exegéticos secundários à pesquisa. Porém, pode-se dizer que Hookway propõe um âmbito de aplicação diferente daquele da epistemologia tradicional, voltada ao conhecimento e justificação, ainda que trate do ceticismo: “Virtudes parecem ter um papel fundamental em explicar não o que é o conhecimento, mas como o conhecimento é possível” (Hookway, 2003, p. 191). Nisso difere do programa de Zagzebiski, cuja maior força parece estar justamente na definição de conhecimento e sua resposta aos problemas de Gettier (Zagzebski, 1996). Cassam, por outro lado, discorda da perspectiva baseada na motivação de Zagzebski, pois, segundo ele, alguns vícios intelectuais, como ser crédulo ou obtuso, não poderiam ser explicados pela falta do componente motivacional epistêmico (Cassam, 2016, p. 168).

Por virtude intelectual, entende-se uma qualidade ou excelência cognitiva adquirida por um processo de formação de hábitos de conduta, por agentes e comunidades epistêmicas. São, portanto, traços de caráter cuja função é regular processos de inquirição e outros tipos de deliberações epistêmicas (Hookway, 2003HOOKWAY, C. “How to be a virtue epistemologist”. In: DePAUL, M., ZAGZEBSKI, L. (eds.). Intellectual virtue: Perspectives from ethics and epistemology. Oxford/New York: Oxford University Press, 2003. pp. 149-60.). Essas virtudes possuem, de acordo com a definição neoaristotética de Zagzebski, dois componentes distintos: uma motivação, que direciona a ação a um determinado fim, e o sucesso em atingir esse objetivo de maneira confiável (Zagzebski, 1996ZAGZEBSKI, L. T. “Virtues of the mind: An inquiry into the nature of virtue and the ethical foundations of knowledge”. Cambridge: Cambridge University Press, 1996., p. 131). Virtudes intelectuais, segundo essa abordagem, são motivadas, de modo geral, pelo desejo de atingir crenças verdadeiras, isto é, motivadas pelo conhecimento (ibidem, p. 167). Assim, por exemplo, uma pessoa que seja mente-aberta é motivada pelo desejo de buscar a verdade, mesmo que isso contrarie suas crenças, e o faz com sucesso se isso é atingido de modo confiável, em decorrência dessa virtude.

Agora, se virtudes intelectuais são excelências adquiridas, vícios intelectuais, do mesmo modo, podem ser entendidos como defeitos adquiridos (ibidem, p. 116). Esses defeitos epistêmicos de caráter não incorporam o valor do conhecimento (carecem de motivação) e, assim, obstam o caminho de uma inquirição efetiva e responsável (Cassam, 2016CASSAM, Q. “Vice epistemology”. The Monist, Vol. 99, pp. 159-180, 2016., pp. 160, 164). Entre esses vícios intelectuais, Zagzebski relaciona os seguintes: arrogância, indolência, conformidade, negligência, inflexibilidade, preconceito, wishful thinking, mente-fechada, insensibilidade ao detalhe, obtusidade e falta de rigor (1996, p. 152).

O dogmatismo, por exemplo, pode ser considerado um vício intelectual por não ser condutivo à verdade. Uma pessoa dogmática tende a ignorar ou rejeitar evidências contrárias às suas próprias crenças e, desse modo, prejudica os processos de justificação.18 18 Vícios intelectuais podem ter um papel regulativo positivo na inquirição? No caso do dogmatismo, Zagzebski afirma que essa conduta pode ser condutiva à verdade em um conjunto de práticas epistêmicas restrito, como por exemplo, no caso de em crenças religiosas. Mas, tão logo esse hábito seja generalizado, em um âmbito social e comunitário ele se torna um vício (1996, pp. 192-194). Battaly (2018) trabalha a hipótese de que, em ambientes epistemicamente hostis - como cenários fictícios (“1984”, de George Orwell, por exemplo), comunidades epistemicamente injustiçadas ou sociedades assoladas por regimes autoritários - o dogmatismo pode se tornar uma virtude intelectual, minimizando efeitos epistêmicos deletérios sobre o agente. O preconceito, por seu turno, pode ser entendido como uma atitude decorrente desse tipo de vício intelectual, no qual juízos são asseridos com base em processos de formação de crenças comprometidas por essa conduta. Ambos, dogmatismo e preconceito, podem ainda serem considerados formas de mente-fechada (cf. Battaly, 2018______. “Can closed-mindedness be an intellectual virtue?”. Royal Institute of Philosophy Supplement, Vol. 84, pp. 23-45, 2018.).

A hipótese aqui defendida é a de que o conceito de vícios intelectuais pode ajudar a entender (i) como ocorrem casos ruins de PC; e (ii) como evitar o “sequestro” da experiência nesses casos.

Conforme visto na seção 1, Siegel distingue casos de PC entre aqueles que são epistemicamente benéficos e aqueles que são epistemicamente prejudiciais à inquirição. No primeiro caso, procedimentos de formação de crenças são confiáveis por dois motivos: (1) tornam agentes e comunidades epistêmicas mais sensíveis aos estímulos e informações do ambiente; (2) tornam processos inferenciais baseados na percepção aptos (efetivos) em justificar essas crenças (Siegel, 2011; Raftopoulos, 2019______. “Cognitive penetrability and the epistemic role of perception”. Switzerland: Palgrave Macmillan, 2019.). No segundo caso, tem-se o oposto, ou seja: (1a) tornam agentes e comunidades epistêmicas menos sensíveis ao estímulo e informações do ambiente; e (2a) tornam processos inferenciais baseados na percepção inaptos (não efetivos) na justificação de crenças. No primeiro caso, o conhecimento pode ser dito como obtido, ao longo de uma inquirição, de maneira consciente e responsável. Nesse caso a experiência desempenha seu papel de “tribunal” para crenças. O oposto ocorre no segundo.

Dispositivos externalistas, como o princípio de sensibilidade e segurança, claramente não inibem casos ruins de PC, pois, conforme argumentei, são fatores internos que impedem a formação de crença de modo confiável e segura. Esses fatores internos, sugiro, podem ser, de modo geral, entendidos como - ou sendo produzidos por - traços ou hábitos de natureza intelectual de sujeitos e comunidades epistêmicas, em resumo, vícios intelectuais. Casos de PC diferem de cenários céticos tradicionais (ilusão e alucinação), conforme visto na seção 3, em razão de estados anteriores (crenças, emoções) afetarem não o conteúdo doxástico da percepção, mas o conteúdo sensório da experiência (o percepto). Vícios intelectuais são estados motivacionais (emoções) que não afetam o conteúdo da crença, pois é possível, por exemplo, em casos de dogmatismo ou preconceito, endossar crenças verdadeiras. Casos prejudiciais de PC, portanto, são casos em que vícios intelectuais, apresentados na forma de diferentes estados cognitivos, afetam o conteúdo não doxástico da experiência.

Em ambos os exemplos analisados neste artigo (seção 2), pode-se atribuir o comprometimento do papel justificatório da percepção a casos de PC que envolvem vícios intelectuais, em decorrências dos quais o processo de inquirição não é efetivo e nem responsável:

Caso (1): Maria acredita que as notícias de um telejornal são ideologicamente enviesadas e que o apresentador A lê uma notícia desfavorável ao partido político B expressando um sentimento de raiva. Assim, quando Maria assiste ao telejornal, parece a ela que o apresentador A está com raiva.

Caso (2): O policial militar João acredita que negros e pobres que moram em favelas são perigosos e andam armados. Ele então “confunde”, durante uma operação policial em uma favela, um guarda-chuva nas mãos de um morador com um fuzil.

Nos dois casos, de modo geral, a insensibilidade aos estímulos externos pode ser atribuída ao vício de mente-fechada e a falta de virtudes intelectuais como mente-aberta e objetividade.19 19 Podemos definir objetividade como (i) sensibilidade aos estímulos externos, e (ii), seguindo Gascón (2016), autoconhecimento, no sentido de observância das motivações e preconceitos pelo próprio sujeito conhecedor. No primeiro caso, a conduta epistêmica é prejudicada pelo dogmatismo, que impede o sujeito de explorar alternativas relevantes (o apresentador A não expressa raiva em seu rosto, mas ansiedade, indiferença ou cinismo).20 20 Note-se que não se exclui caso em que um comportamento ideológico, sendo dogmático, poderia ser condutivo à verdade. No segundo, o preconceito racial também gera um hábito que torna o agente epistêmico insensível a evidências que poderiam contrariar suas crenças, mais uma vez, tornando a inquirição irresponsável e inapta para conduzir à verdade.

Mas, esses casos de penetrabilidade cognitiva viciosa poderiam ainda ser caracterizados como perceptuais? Pois, assumindo que a PC afeta apenas o conteúdo fenomênico da percepção, de um ponto de vista disjuntivista epistêmico teríamos uma experiência de categoria diferente daquela na qual o agente acuradamente percebe o objeto.21 21 Sou grato ao parecerista anônimo por apontar esta questão e me permitir esclarecer este ponto. A questão aqui, porém, é sobre situações desviantes que decorrem do caráter processual e justificatório da inquirição. Visto por este ângulo, não precisamos nos comprometer com uma posição disjuntivista. Casos de penetrabilidade cognitiva tornam-se viciosos em decorrência do modo pelo qual afetam a justificação de crenças, dada sua intransigência (do agente) em fazer ajustes correcionais diante das evidências. Pesquisas futuras poderão elucidar esse estágio de formação de estados doxásticos virtuosos/viciosos, em comparação com aqueles gerados em cenários céticos tradicionais, no campo das teorias contemporâneas da percepção.

Conclusões

Neste artigo vimos como estados cognitivos e afetivos de agentes epistêmicos podem penetrar cognitivamente no conteúdo da experiência, no estágio da visão posterior, impedindo que a percepção exerça sua função constranger crenças diante de objetos independentes-da-mente. Como resultado, o processo de justificação torna-se circular, obstando o percurso da inquirição de agentes e comunidades.

Virtudes intelectuais são qualidades internas do sujeito que regulam práticas epistêmicas como a inquirição e a formação de crenças justificadas. Vícios intelectuais, ao contrário, violam normas epistêmicas que regulam essas práticas.

A hipótese defendida nesta pesquisa foi a de que casos de penetrabilidade cognitiva (PC) podem ser compreendidos como casos de vícios intelectuais. Isso teria uma dupla vantagem: (i) esclarecer como a PC ocorre e pode afetar sujeitos e comunidades; e (ii) sugerir uma solução para casos de PC através do cultivo de virtudes intelectuais, tornando os agentes responsáveis e aptos a obter conhecimento. Para isso, estudamos dois casos de considerados serem de PC e, neles, apontamos o vício intelectual de mente-fechada (dogmatismo e preconceito) como sendo causas desse problema.

O que fundamentou nossa análise foi a definição de penetração cognitiva em Siegel, que sugere como estados mentais anteriores que afetam o conteúdo da experiência, e a teoria responsabilista da virtude (Zagzebski, Hookway, Baehr), para a qual a presença (ou falta) de um componente motivacional (interno) é um traço que define essas virtudes (e vícios) intelectuais. O exame de erros perceptuais provocados por ilusão ou alucinação foi outro fator que contribuiu para elucidar essa tese, mostrando como esses casos diferem dos cenários céticos tradicionais em epistemologia.

Concluo que casos de PC são um problema de natureza epistêmica, ética e social, a respeito da qual comunidades epistêmicas devem ter por tarefa a observação reflexiva de virtudes e vícios de seus agentes, e estes, pragmáticamente, observar seus hábitos.

  • 1
    Por percepto entendo o conteúdo mental da experiência.
  • 2
    Neste artigo não discutirei a natureza deste conteúdo da experiência (se ele é ou não estruturado proposicionalmente, por exemplo) apenas assumo ser um estado mental que resulta do processo perceptivo.
  • 3
    Cf. seção 2 deste artigo.
  • 4
    Pode ser o caso, porém, de dois sujeitos estarem atentando para diferentes aspectos da experiência, como a forma de um objeto ou suas propriedades (tamanho, cor), o que claramente não seria um caso de PC, mas que ajuda a diferenciá-lo de situações de atenção seletiva (Silins, 2016, p. 27).
  • 5
    Esse caso é análogo ao proposto por Siegel do “Jack zangado” (angry Jack): Jill tem motivos para crer que Jack está com raiva e, quando vê o amigo, parece a ela que Jack está realmente com raiva. Se Jill não tivesse a crença de que Jack está com raiva, ela provavelmente não teria experiência visual de ver Jack com raiva (Siegel, 2011, pp. 9-11).
  • 6
    No experimento, imagens de rostos de homens brancos e negros eram mostradas aos participantes, em um computador, seguidas rapidamente por imagens de uma arma ou uma ferramenta. Era então pedido aos participantes (americanos brancos) para clicarem nas opções “arma” ou “ferramenta”, associadas às imagens. Como resultado, quando os voluntários do experimento eram pressionados pelo tempo, houve um número maior de erros de percepção que confundiam ferramentas com armas associadas a imagens de rostos negros do que a imagens de rostos brancos. Tragicamente, em outro caso ocorrido no Rio de Janeiro em 2010, um morador foi morto por um policial militar que confundiu uma furadeira com uma arma de fogo nas mãos da vítima (Tabak, 2010TABAK, B. Policial do Bope confunde furadeira com arma e mata morador do Andaraí. G1 RJ. Rio de Janeiro, 19 maio 2010. [Online] Disponível em http://g1.globo.com/ rio-de-janeiro/noticia/2010/05/policial-do-bope-confunde-furadeira-com-arma-e-mata-morador-do-andarai.html. Acessado em 03 de agosto de 2019.
    http://g1.globo.com/ rio-de-janeiro/noti...
    ).
  • 7
    Entendemos que não somente sujeitos, mas comunidades podem ser virtuosas ou viciosas em suas condutas epistêmicas de acordo com o tipo de PC que afeta a percepção dos indivíduos. Um exemplo é a sociedade descrita em To Kill a Mockinbird (no Brasil, O Sol é para todos), romance de Harper Lee publicado em 1960, cujos personagens têm sua percepção da realidade afetada por preconceito racial.
  • 8
    No simbolismo usado a seguir, “C1” representa um estado cognitivo de background que afeta o conteúdo da experiência; “E” representa o percepto ou conteúdo da experiência, e “C2”, a crença “C1” “justificada” pela experiência; “S” é o sujeito ou agente epistêmico.
  • 9
    Para ser mais específico, o conservadorismo fenomenal/dogmatismo perceptual é uma teoria que trata da justificação proposicional, não doxástica, ou seja, diz respeito à justificação de uma proposição p, quer ou não o sujeito creia que p (Tucker, 2014, p. 35, n. 1; cf; Raftopoulos, 2019______. “Cognitive penetrability and the epistemic role of perception”. Switzerland: Palgrave Macmillan, 2019., p. 25). Siegel discute esta questão em Siegel (2012, pp. 702-706), argumentando a favor de uma compreensão holística da justificação doxástica, que inclui a proposicional. Não tenho motivos, neste artigo, para problematizar isso.
  • 10
    Uma teoria como o fundarentismo proposto por Susan Haack (1993)HAACK, S. “Evidence and inquiry: Towards reconstruction in epistemology”. Malden: Blackwell Publishing, 1993., por exemplo.
  • 11
    Com base nisso, Tucker (2014) conclui que, se a PC é um problema sério para o dogmatismo perceptual, ele o é, até muito mais, para diferentes abordagens epistemológicas.
  • 12
    Não há, contudo, consenso em classificar a grade de Hermann como um caso de ilusão ou alucinação (cf. Macpherson, 2016).
  • 13
    Restrinjo-me aqui a casos que envolvem percepção visual.
  • 14
    Siegel (2017______. “The rationality of perception”. Oxford: Oxford University Press, 2017., pp. 9-10) relata outros dois casos de sequestro da experiência que, diferentemente da PC, impactam o conteúdo do juízo: descrença (o sujeito duvida da experiência de ver um guarda-chuva) e ignorância [by-pass] (o sujeito ignora a experiência de ver um guarda-chuva).
  • 15
    Para uma visão geral da epistemologia das virtudes, cf. Battaly, 2008BATTALY, H. “Virtue epistemology”. Philosophy Compass, Vol. 3, Nr. 4, pp. 639663, 2008..
  • 16
    Entre os representantes da primeira estão Ernest Sosa, John Greco, Alvin Goldman, e da segunda, Linda Zagzebski, Christopher Hookway, Lorraine Code e James Montmarquet. Sobre essa distinção, cf. Battaly, 2008BATTALY, H. “Virtue epistemology”. Philosophy Compass, Vol. 3, Nr. 4, pp. 639663, 2008. e Baher, 2011.
  • 17
    Não discutirei a diferença entre essa autora e esses autores, por consideramos os propósitos exegéticos secundários à pesquisa. Porém, pode-se dizer que Hookway propõe um âmbito de aplicação diferente daquele da epistemologia tradicional, voltada ao conhecimento e justificação, ainda que trate do ceticismo: “Virtudes parecem ter um papel fundamental em explicar não o que é o conhecimento, mas como o conhecimento é possível” (Hookway, 2003, p. 191). Nisso difere do programa de Zagzebiski, cuja maior força parece estar justamente na definição de conhecimento e sua resposta aos problemas de Gettier (Zagzebski, 1996). Cassam, por outro lado, discorda da perspectiva baseada na motivação de Zagzebski, pois, segundo ele, alguns vícios intelectuais, como ser crédulo ou obtuso, não poderiam ser explicados pela falta do componente motivacional epistêmico (Cassam, 2016, p. 168).
  • 18
    Vícios intelectuais podem ter um papel regulativo positivo na inquirição? No caso do dogmatismo, Zagzebski afirma que essa conduta pode ser condutiva à verdade em um conjunto de práticas epistêmicas restrito, como por exemplo, no caso de em crenças religiosas. Mas, tão logo esse hábito seja generalizado, em um âmbito social e comunitário ele se torna um vício (1996, pp. 192-194). Battaly (2018)BATTALY, H. “Virtue epistemology”. Philosophy Compass, Vol. 3, Nr. 4, pp. 639663, 2008. trabalha a hipótese de que, em ambientes epistemicamente hostis - como cenários fictícios (“1984”, de George Orwell, por exemplo), comunidades epistemicamente injustiçadas ou sociedades assoladas por regimes autoritários - o dogmatismo pode se tornar uma virtude intelectual, minimizando efeitos epistêmicos deletérios sobre o agente.
  • 19
    Podemos definir objetividade como (i) sensibilidade aos estímulos externos, e (ii), seguindo Gascón (2016)GASCÓN, J. Á. “Pursuing objectivity: How virtuous can you get?”. OSSA Conference Archive, Nr. 137, 2016. [Online] Disponível em https://scholar.uwindsor.ca/ossaarchive/ OSSA11/papersandcommentaries/137. Acessado em 31 de agosto de 2019.
    https://scholar.uwindsor.ca/ossaarchive/...
    , autoconhecimento, no sentido de observância das motivações e preconceitos pelo próprio sujeito conhecedor.
  • 20
    Note-se que não se exclui caso em que um comportamento ideológico, sendo dogmático, poderia ser condutivo à verdade.
  • 21
    Sou grato ao parecerista anônimo por apontar esta questão e me permitir esclarecer este ponto.

Referências

  • BAEHR, J. “The inquiring mind: On intellectual virtues and virtue epistemology”. Oxford: Oxford University Press, 2011.
  • BATTALY, H. “Virtue epistemology”. Philosophy Compass, Vol. 3, Nr. 4, pp. 639663, 2008.
  • ______. “Can closed-mindedness be an intellectual virtue?”. Royal Institute of Philosophy Supplement, Vol. 84, pp. 23-45, 2018.
  • CASSAM, Q. “Vice epistemology”. The Monist, Vol. 99, pp. 159-180, 2016.
  • GASCÓN, J. Á. “Pursuing objectivity: How virtuous can you get?”. OSSA Conference Archive, Nr. 137, 2016. [Online] Disponível em https://scholar.uwindsor.ca/ossaarchive/ OSSA11/papersandcommentaries/137 Acessado em 31 de agosto de 2019.
    » https://scholar.uwindsor.ca/ossaarchive/ OSSA11/papersandcommentaries/137
  • GEORGAKAKIS, C.; MORETTI, L. “Cognitive penetrability of perception and epistemic justification”. The Internet Encyclopedia of Philosophy (IEP), 2019. [Online] Disponível em https://www.iep.utm.edu/cog-pene/ Acessado em 19 de maio de 2019.
    » https://www.iep.utm.edu/cog-pene/
  • HAACK, S. “Evidence and inquiry: Towards reconstruction in epistemology”. Malden: Blackwell Publishing, 1993.
  • HOOKWAY, C. “How to be a virtue epistemologist”. In: DePAUL, M., ZAGZEBSKI, L. (eds.). Intellectual virtue: Perspectives from ethics and epistemology Oxford/New York: Oxford University Press, 2003. pp. 149-60.
  • HUEMER, M. “Compassionate phenomenal conservatism”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 74, Nr. 1, pp. 30-55, 2007.
  • MACPHERSON, F. “Redefining illusion and hallucination in light of new cases”. Philosophical Issues, Vol. 26, Nr. 1, pp. 263-296, 2016.
  • MOURA, C. “PM confunde guarda-chuva com fuzil e mata garçom no Rio, afirmam testemunhas”. El País Rio de Janeiro, 19 set. 2018. [Online] Disponível em https:// brasil.elpais.com/brasil/2018/09/19/politica/1537367458_048104.html Acessado em 16 de julho de 2019.
    » https:// brasil.elpais.com/brasil/2018/09/19/politica/1537367458_048104.html
  • PAYNE, K. B. “Prejudice and perception: The role of automatic and controlled processes in misperceiving a weapon”. Journal of Personality and Social Psychology, Vol. 81, Nr. 2, 181, pp. 181-192, 2001.
  • PYLYSHYN, Z. “Things and places: how the mind connects with the world”. Cambridge, MA: MIT Press/ Bradford Book, 2007.
  • RAFTOPOULOS, A. “Cognition and perception”. Cambridge, Mass.: MIT Press, 2009.
  • ______. “Cognitive penetrability and the epistemic role of perception”. Switzerland: Palgrave Macmillan, 2019.
  • SIEGEL, S. “Cognitive penetrability and perceptual justification”. Noûs, Vol. 46, Nr. 2, pp. 1-22, 2011.
  • ______. “The epistemic impact of the etiology of experience”. Philosophical Studies, Vol. 162, Nr. 3, pp. 697-722, 2012.
  • ______. “How is wishful seeing like wishful thinking?”. Philosophy and Phenomenological Research, Vol. 95, Nr. 2, pp. 408-435, 2016.
  • ______. “The rationality of perception”. Oxford: Oxford University Press, 2017.
  • SILINS, N. “Cognitive penetration and the epistemology of perception”. Philosophy Compass, Vol. 11, Nr. 1, pp. 24-42, 2016.
  • TABAK, B. Policial do Bope confunde furadeira com arma e mata morador do Andaraí. G1 RJ Rio de Janeiro, 19 maio 2010. [Online] Disponível em http://g1.globo.com/ rio-de-janeiro/noticia/2010/05/policial-do-bope-confunde-furadeira-com-arma-e-mata-morador-do-andarai.html Acessado em 03 de agosto de 2019.
    » http://g1.globo.com/ rio-de-janeiro/noticia/2010/05/policial-do-bope-confunde-furadeira-com-arma-e-mata-morador-do-andarai.html
  • TUCKER, C. “If dogmatists have a problem with cognitive penetration, you do too”. Dialectica, Vol. 68, Nr. 1, pp. 35-62, 2014.
  • ZAGZEBSKI, L. T. “Virtues of the mind: An inquiry into the nature of virtue and the ethical foundations of knowledge”. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jan 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    05 Set 2019
  • Aceito
    27 Nov 2019
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG Av. Antônio Carlos, 6627 Campus Pampulha, CEP: 31270-301 Belo Horizonte MG - Brasil, Tel: (31) 3409-5025, Fax: (31) 3409-5041 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: kriterion@fafich.ufmg.br