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Caracterização do progresso temporal do míldio da cebola em diferentes regimes de pulverização de fungicidas

Characterization of onion downy mildew temporal progress under different fungicide spraying regimes

RESUMO

O míldio da cebola é controlado por meio de pulverizações foliares com fungicidas seguindo um calendário fixo. O regime de pulverização baseado em um sistema de previsão pode predizer e minimizar o progresso da doença. Como não se conhece o comportamento epidemiológico da doença nas condições de sul de Brasil, esse trabalho teve como objetivo analisar o progresso temporal da doença em diferentes regimes de pulverizações. Em delineamento experimental de blocos casualizados com quatro repetições foram avaliados os regimes de pulverização baseados no sistema de Wallin (1962) com valores diários de severidade (VDS) acumulado de 6, 8, 10 e 12 comparados ao controle padrão (intervalo de pulverizações de 5 e 7 dias). A avaliação da severidade da doença foi realizada semanalmente em dez plantas ao acaso previamente demarcadas em cada repetição. A curva de progresso da doença para cada um dos regimes foi ajustada ao modelo de Gompertz, já que a severidade observada correspondeu ao modelo e foi confirmada pela coerência entre os pontos estimados e pelo resíduo. Foi verificado que o regime de 5 dias apresentou a maior taxa (0,42338) de progresso, enquanto que VDS 8 a menor (0,30853). Verificou-se que o regime com VDS 8 apresentou o pico máximo da severidade com 41,5% e que o regime de 5 dias teve o menor acúmulo da doença com 30,9%. Os regimes de pulverização não apresentaram diferenças no comportamento do progresso temporal do míldio da cebola. O uso do sistema de previsão mostrou ser uma ferramenta viável no manejo do míldio da cebola no estado de Santa Catarina e encontra-se disponível para a cadeia produtiva em http://www.ciram.sc.gov.br/agroconnect/.

Palavras-chave
Allium cepa ; Peronospora destructor ; epidemiologia

ABSTRACT

Onion downy mildew can be controlled by foliar spraying with fungicides following a fixed schedule. The spraying regime based on a forecasting system can predict and minimize the disease progression. As the epidemiological behavior of this disease in southern Brazil is unknown, the present study aimed to analyze its temporal progress under different spraying regimes. A randomized block design and four replicates were used to evaluate the spraying regimes based on Wallin system (1962) with accumulated daily severity values (DSV) of 6, 8, 10 and 12, compared with standard control regimes (5- and 7-day application intervals). The disease severity was weekly evaluated in ten random plants previously demarcated in each replicate. The disease progress curve for each regime was adjusted to Gompertz model, since the observed severity corresponded to the model and was confirmed by the consistency between the estimated points and by the residue. The five-day regime had the highest progress rate (0.42338), while DSV 8 had the lowest one (0.30853). The regime with DSV 8 presented maximum severity, peaking at 41.5%, and the 5-day regime had the lowest disease accumulation, of 30.9%. The spraying regimes showed no difference in the temporal progress behavior of onion downy mildew. The use of this forecasting system has proven to be a viable tool for the management of onion downy mildew in Santa Catarina State, Brazil, and is available for the production chain at http://www.ciram.sc.gov.br/agroconnect/.

Keywords
Allium cepa ; oil spot; culture medium

A cebola (Allium cepa L.) é amplamente cultivada no Brasil, porém a ocorrência de doenças é um fator limitante para a produção da cultura. Entre as doenças, o míldio causado por Peronospora destructor (Berk. (Casp.), tem sido considerada uma das mais destrutivas nas épocas de cultivo com temperaturas amenas (≤22 °C) e alta umidade relativa do ar (≥ 90%) (11 Araújo, E.R.; Marcuzzo, L.L.; Alves, D.P. Manejo de doenças. In: Nick, C.; Borém, A. Cebola: do plantio a colheita. Viçosa: UFV, Cap.7, p.126-155, 2018.,1111 Wordell Filho, J. A.; Boff, P. Míldio. In: Wordell Filho, J.A.; Rowe, E.; Gonçalves, P.A.; Debarba, J.F.; Boff, P.; Thomazelli, L.F.. Manejo Fitossanitário na cultura da cebola. Florianópolis: EPAGRI, p.31-43, 2006.) e redução da produtividade que varia de 36 a 72% (44 Marcuzzo, L.L. Validação de um sistema de previsão para o míldio da cebola. Summa Phytopathologica, Botucatu, v.43, n.4, p.348-352, 2017.).

O uso de diferentes regimes de pulverização de fungicida pode ser uma das formas de manejo dessa doença, porém é necessária a avaliação do comportamento temporal da doença entre eles. Entre as formas de caracterizar o desenvolvimento da doença, a curva de progresso temporal é a melhor representação de uma epidemia. Onde a interpretação do formato dessas curvas e seus componentes, como a taxa e a severidade final são fundamentais para se efetuar o manejo de epidemias (22 Bergamim Filho, A.; Amorim, L. Doenças de plantas tropicais: epidemiologia e controle econômico. São Paulo: Ceres, 1996, 289p.).

Como não se dispõe de informação sobre o assunto, o objetivo deste trabalho foi caracterizar o progresso temporal do míldio da cebola em função de diferentes regimes de pulverização.

O experimento foi conduzido de 2 de julho a 7 de novembro de 2014 no Instituto Federal Catarinense, Campus de Rio do Sul, município de Rio do Sul/SC com latitude Sul de 27°11’07”, longitude Oeste de 49°39’39” e altitude de 687 m acima do nível do mar.

Os dados meteorológicos foram obtidos de uma estação Davis® Vantage Vue 300m localizado ao lado do experimento e os dados médios durante a condução do experimento foram de 18,0ºC para temperatura do ar, de 14,9 horas de umidade relativa do ar ≥90% e a precipitação pluvial acumulada foi de 464,7 mm.

Mudas de cebola da cultivar Empasc 352/Bola Precoce produzidas em canteiros e com 60 dias de idade foram transplantadas para a área experimental em blocos casualizados com seis tratamentos e quatro repetições. Cada repetição apresentada por uma área de 1,65 x 2,00 m com 33 cm entre fileiras totalizando 5 filas e de 10 cm entre plantas, totalizando 100 plantas, equivalente a 300.000 planta.ha-1. A calagem, adubação, tratos culturais seguiram as normas da cultura (66 Menezes Júnior, F.O.G.; Marcuzzo, L.L. Manual de boas práticas agrícolas: sustentabilidade das lavouras de cebola do estado de Santa Catarina. Florianópolis: Epagri, 2016, 143p.). Não se utilizou inseticidas devido a não ocorrência de insetos no período de avaliação.

Em ambos os anos ao redor do experimento e da testemunha foi cultivado a cada um metro linear uma muda de cebola infectada naturalmente com míldio para garantir a presença do patógeno na área.

Para o controle do míldio foram comparados os seguintes regimes de pulverização com mancozeb (80%) + oxicloreto de cobre (50%) na dose de 250 g + 200 g pc.hl-1 baseado no modelo descrito por Wallin (88 Wallin, J.R. Summary of recent progress in predicting late blight epidemics in United States and Canada. American Potato Journal, Orono, v.39, p.306-312, 1962.) através de valores diários de severidade (VDS).

Os tratamentos foram constituídos de valores de VDS de 6, 8, 10 e 12 e comparados com sistema convencional com pulverização a cada 5 dias e 7 dias. A pulverização no sistema de previsão foi realizada quando o somatório diário dos valores de VDS (66 Menezes Júnior, F.O.G.; Marcuzzo, L.L. Manual de boas práticas agrícolas: sustentabilidade das lavouras de cebola do estado de Santa Catarina. Florianópolis: Epagri, 2016, 143p., 88 Wallin, J.R. Summary of recent progress in predicting late blight epidemics in United States and Canada. American Potato Journal, Orono, v.39, p.306-312, 1962., 1010 Wordell Filho, J.A.; Stadnik, M.J. Efeito de produtos alternativos no controle do míldio e na produtividade da cebola no Alto Vale do Itajaí. Agropecuária Catarinense, Florianópolis, v.19, n.1, p.40-45, 2006. e 12) fosse atingida, sendo então zerado o somatório e iniciada nova soma dos VDS. A cada ocorrência de 25 mm de chuva, todos os tratamentos eram reaplicados, zerados e reiniciava-se a contagem do somatório dos VDS.

As pulverizações nos sistemas de previsão iniciaram-se 30 dias após o transplante, período de estabelecimento da muda para surgimento de novas folhas, já os tratamentos de cinco e sete dias foram pulverizados desde o transplante conforme realizado no sistema convencional. As pulverizações foram feitas com um pulverizador costal eletrônico Jetbras® calibrado para 400 L.ha-1.

Semanalmente, após a semeadura em 10 plantas demarcadas aleatoriamente dentro de cada repetição a severidade da doença foi estimada visualmente pela análise da área foliar afetada pela doença (0 a 100%) em cada folha conforme Wordell Filho & Stadnik (1010 Wordell Filho, J.A.; Stadnik, M.J. Efeito de produtos alternativos no controle do míldio e na produtividade da cebola no Alto Vale do Itajaí. Agropecuária Catarinense, Florianópolis, v.19, n.1, p.40-45, 2006.).

Modelos não lineares, comumente usados para representar crescimento de epidemias como o Logístico e o de Gompertz foram usados para ajuste com os dados observados utilizando o software R versão 2.15.1 (77 R Development Core Team (2012). R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. Disponível em: <http://www.R-project.org>. Acesso em: 15 mai. 2018.
http://www.R-project.org...
). Os critérios estabelecidos para comparação dos modelos, em função da qualidade do ajustamento dos dados foram: a) erro padrão da estimativa; b) estabilidade dos parâmetros; c) erro padrão dos resíduos; d) visualização da distribuição dos resíduos ao longo do tempo e e) pseudo R2.

Os dados da taxa foram submetidos à análise de variância pelo teste de F, e se significativos, as médias seriam comparadas estatisticamente pelo teste de Tukey ao nível de 5% pelo software estatístico SASM-Agri (33 Canteri, M.G.; Althaus, R.A.; Virgens Filho, J.S.; Giglioti, E.A.; Godoy, C.V. SASM - Agri: Sistema para análise e separação de médias em experimentos agrícolas pelos métodos Scoft - Knott, Tukey e Duncan. Revista Brasileira de Agrocomputação, Ponta Grossa, v.1, p.18-24, 2001.) para avaliar se há diferença entre os regimes de pulverização quanto a taxa de progresso da doença.

O modelo de Gompertz expresso por *y = ymax *(exp (ln (y0/ymax) * exp (r * x))), onde y: severidade estimada final (% de severidade/100); ymax: severidade máxima de doença/100; ln(y0/ymax) refere-se a função de proporção da doença na primeira observação; r: taxa,x o tempo em semanas após o inicio da doença foi escolhido para representar o progresso do míldio na avaliação dos regimes de pulverização (Tabela 1), devido o míldio ser considerado uma doença explosiva após o inicio dos primeiros sintomas. Possivelmente todos os dados se ajustaram em decorrência de ser a época de cultivo da cultura e a presença da doença no local.

Tabela 1
Parâmetros estimados pelo modelo de Gompertz ajustado aos dados do míldio da cebola em diferentes regimes de pulverização. IFC/Campus Rio do Sul, 2014

A análise dos dados e as equações originadas pelo modelo de Gompertz (Tabela 1) resultaram em um coeficiente de determinação significativo, e a severidade observada correspondeu ao modelo, confirmada pela coerência entre os pontos estimados e do resíduo (erro) nas onze semanas de avaliação (Figura 1).

Figura 1
Curva da severidade estimada do progresso da severidade do míldio da cebola sob diferentes regimes de pulverização e seus respectivos resíduos ajustados pelo modelo de Gompertz. IFC/Campus Rio do Sul, 2014.

A taxa de progresso da doença não apresentou diferenças estatísticas entre os regimes de pulverização (Tabela 1). Foi verificado que o regime com 5 dias apresentou a maior taxa (0,42388) de progresso, enquanto que VDS 8 a menor (0,30853). Constatou-se que o VDS 8 apresentou o pico máximo da severidade com 41,5% e que o regime de 5 dias teve o menor acúmulo da doença com 30,5% com uma diferença de 11% na severidade máxima entre esses dois regimes (Tabela 1).

Wordell filho et al. (99 Wordell Filho, J. A.; Martins, D.A.; Stadnick, M.J. Aplicação foliar de tratamentos para controle do míldio e da podridão-de-escamas em bulbos de cebola. Horticultura brasileira, Brasília, v.25, n.4, p.544-549, 2007.) também encontrou valores de intensidade de 29% quando realizou a pulverização semanal com o uso de calda boldalesa (0,3%), valor esse próximo ao verificado nesse trabalho (Figura 1), mas sem caracterizar o progresso da doença, mesmo quando avaliou fungicidas protetores e penetrantes-móveis aplicados aos 7 e 14 dias nas condições da região de execução desse trabalho (1010 Wordell Filho, J.A.; Stadnik, M.J. Efeito de produtos alternativos no controle do míldio e na produtividade da cebola no Alto Vale do Itajaí. Agropecuária Catarinense, Florianópolis, v.19, n.1, p.40-45, 2006.).

Conclui-se que os regimes de pulverização avaliados não apresentaram diferença no comportamento de progresso temporal do míldio da cebola causado por Peronospora destructor, mesmo que fosse com pulverização de sistêmico-móvel (55 Marcuzzo, L.L.; Harbs, S.C.; Rampelotti, M.A. Viabilidade técnica e econômica de um sistema de previsão para manejo do míldio da cebola. SummaPhytopathologica, Botucatu, v.46, n.2, p.129-134, 2020.). O uso do sistema de previsão mostrou ser uma ferramenta viável no manejo do míldio da cebola em Santa Catarina e encontra-se disponível gratuitamente para uso da cadeia produtiva na plataforma Agroconnect da EPAGRI-CIRAM disponível em http://www.ciram.sc.gov.br/agroconnect/ no menu atividade agropecuária cebola, alerta fitossanitário.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Araújo, E.R.; Marcuzzo, L.L.; Alves, D.P. Manejo de doenças. In: Nick, C.; Borém, A. Cebola: do plantio a colheita Viçosa: UFV, Cap.7, p.126-155, 2018.
  • 2
    Bergamim Filho, A.; Amorim, L. Doenças de plantas tropicais: epidemiologia e controle econômico São Paulo: Ceres, 1996, 289p.
  • 3
    Canteri, M.G.; Althaus, R.A.; Virgens Filho, J.S.; Giglioti, E.A.; Godoy, C.V. SASM - Agri: Sistema para análise e separação de médias em experimentos agrícolas pelos métodos Scoft - Knott, Tukey e Duncan. Revista Brasileira de Agrocomputação, Ponta Grossa, v.1, p.18-24, 2001.
  • 4
    Marcuzzo, L.L. Validação de um sistema de previsão para o míldio da cebola. Summa Phytopathologica, Botucatu, v.43, n.4, p.348-352, 2017.
  • 5
    Marcuzzo, L.L.; Harbs, S.C.; Rampelotti, M.A. Viabilidade técnica e econômica de um sistema de previsão para manejo do míldio da cebola. SummaPhytopathologica, Botucatu, v.46, n.2, p.129-134, 2020.
  • 6
    Menezes Júnior, F.O.G.; Marcuzzo, L.L. Manual de boas práticas agrícolas: sustentabilidade das lavouras de cebola do estado de Santa Catarina Florianópolis: Epagri, 2016, 143p.
  • 7
    R Development Core Team (2012). R: A language and environment for statistical computing R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. Disponível em: <http://www.R-project.org>. Acesso em: 15 mai. 2018.
    » http://www.R-project.org
  • 8
    Wallin, J.R. Summary of recent progress in predicting late blight epidemics in United States and Canada. American Potato Journal, Orono, v.39, p.306-312, 1962.
  • 9
    Wordell Filho, J. A.; Martins, D.A.; Stadnick, M.J. Aplicação foliar de tratamentos para controle do míldio e da podridão-de-escamas em bulbos de cebola. Horticultura brasileira, Brasília, v.25, n.4, p.544-549, 2007.
  • 10
    Wordell Filho, J.A.; Stadnik, M.J. Efeito de produtos alternativos no controle do míldio e na produtividade da cebola no Alto Vale do Itajaí. Agropecuária Catarinense, Florianópolis, v.19, n.1, p.40-45, 2006.
  • 11
    Wordell Filho, J. A.; Boff, P. Míldio. In: Wordell Filho, J.A.; Rowe, E.; Gonçalves, P.A.; Debarba, J.F.; Boff, P.; Thomazelli, L.F.. Manejo Fitossanitário na cultura da cebola Florianópolis: EPAGRI, p.31-43, 2006.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2022

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2018
  • Aceito
    12 Abr 2022
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