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PROGRAMA DE ORIENTAÇÃO PSICO-PEDAGÓGICA E PROFISSIONAL (POPPE), FACULDADE DE MEDICINA DA UFRJ. I. PROJETO DE IMPLANTAÇÃO

O levantamento das necessidades dos estudantes da U.F.R.J. emergentes do processo ensino-aprendizagem vem indicando a existência, entre os universitários, de problemas que merecem a atenção dos responsáveis pelo Ensino Superior. Observa-se, em geral, nas Instituições de Ensino do 3.o Grau, um espaço não preenchido entre o aluno e o professor como pessoas e as atividades acadêmicas exercidas pelos mesmos, que é o das relações e experiências evidentemente interpessoais.

O baixo rendimento escolar, primeiro sintoma a ser notado em alunos com problemas, precisa ser analisado sob perspectiva mais ampla, isto é, dentro de um contexto em que o aluno é apenas um dos pontos a serem considerados na estrutura da Instituição.

A tentativa ocasional de ajuda pessoal aos estudantes por parte dos professores muitas vezes é frustrada por motivos vários, entre os quais se salientam a falta de formação específica para esta tarefa e o reduzido apoio da própria Instituição, vista não raro como instrumento repressivo e não de formação e assistência.

De longa data vêm sendo feitas recomendações informais e formais, inclusive em documentos oficiais, no sentido de serem criados Serviços de Orientação e Assistência aos Estudantes Universitários.

O Conselho de Reitores, na XXVII Reunião Plenária em Guarapari, em 1978, já fizera recomendações específicas sobre o assunto, enfatizando a necessidade da não adoção de um modelo único, mas de adequação dos Serviços de Assistência e Orientação à realidade dos estudantes e da Instituição em que atuarão. Foi também recomendada a conscientização dos docentes, recriando nas Universidades estruturas interdisciplinares de orientação e assistência ao estudante. A estrutura prevista ensejaria, ainda, o preparo dos docentes para essa função orientadora33. SEMINÁRIO SOBRE ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL EM INSTITUIÇÃO DE NÍVEL SUPERIOR. Relatório final. Rio de Janeiro, Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, 1973. mimeo.),(44. REUNIÃO PLENÁRIA DO CONSELHO DE REITORES DAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS, 27. Guarapari, 27 jul. 1978. Relatórios dos grupos e documento final. s.n.t. mimeo..

Por outro lado, orientadores educacionais dos diversos graus de Ensino, reunidos no Encontro Regional de Orientadores Educacionais em São Paulo, em 1981, enfatizaram a importância da continuidade da Orientação Educacional a estudantes do Ensino Superior. Para tanto, fundamentaram-se no fato, também comprovado no atendimento aos alunos da UFRJ, de que a Orientação Educacional cessa justamente quando os alunos ingressam no Ensino Superior e as condições existenciais e as opções que serão obrigados a fazer passam a ser mais complexas. Desnecessário lembrar que o alunado, na sua quase totalidade, ingressa adolescente na Universidade e, ao colar grau, inicia a etapa adulta de sua vida, passando ao longo do curso superior por período evolutivo que se reveste de particular importância no processo de consolidação da identidade.

O PROCESSO NA UFRJ

Baseado na experiência da Assistência Orientação e Aconselhamento ao Estudante d; Educação da UFRJ, foi concluído, em 1979, um “Projeto de Implantação de um Serviço de Orientação e Assistência ao Estudante” nesta Universidade77. PROJETO de implantação de um serviço de orientação e assistência ao estudante da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1978. mimeo..

Ainda na UFRJ pesquisas sobre as necessidades e problemas dos alunos, bem como sobre o apoio necessário aos professores em suas atividades pedagógicas, freqüentemente solicitado pelos mesmos, apontam o espaço citado - entre o aluno como estudante e como pessoa e o professor, como profissional e como pessoa. Em conseqüência, o aluno se vê apenas como um nome numa relação ou um número do computador, e o professor, como um instrumento de transmissão de conteúdos, abolidos os fatores afetivos e sociais inerentes à relação humana. Este fato parece indicar a propriedade do atendimento e apoio a alunos e professores por Serviços de Assistência e Orientação Psico-pedagógica ou similares emergentes na UFRJ, humanizando a relação docente-discente.

O PROCESSO DA FACULDADE DE MEDICINA

De longa data a Faculdade de Medicina vem-se preocupando com o atendimento de seu alunado, particularmente nos casos em que já se evidenciavam distúrbios de comportamento. Neste sentido, atividades conjuntas da Diretoria, do Departamento de Psiquiatria e Medicina Legal e dos então denominados Setores de Medicina Psicossomática foram realizadas nos últimos anos. No entanto, tais tentativas não chegaram a ser sistematizadas e formalizadas.

A atual Direção, sensibilizada pelas necessidades de seus alunos e professores, em suas relações com o grupo familiar, .com a comunidade acadêmica e com o grupo social em geral, propõe-se a implantar o Programa de Orientação Psico-pedagógica e Profissional (POPPE), o qual visa a atender sob diversos aspectos, o seu corpo discente, docente e administrativo ligado à área de ensino, através de atividades extensivas de orientação acadêmica, orientação educacional assistência à saúde e particularmente aconselha menta psicológico, assessoria didática e pedagógica, educação permanente e atividades de extensão. Este Programa foi aprovado pelos Colegiados competentes da Faculdade de Medicina no ano de 1983, sendo, portanto, uma atividade oficial da Unidade.

O PROGRAMA DE ORIENTAÇÃO PSICO­PEDAGÓGICA E PROFISSIONAL (POPPE)

A assistência e a orientação aos estudantes, através do Programa de Orientação Psico-pedagógica e Profissional, apontam a demanda crescente de orientação e assessoria por parte do alunado, de professores e até de funcionários outros que lidam com os alunos e, conseqüentemente, a importância desta forma de apoio à comunidade acadêmica da Unidade.

Percebe-se, entretanto, que alunos, professores e demais funcionários da Faculdade de Medicina mantêm constantes arranjos de relação, na medida em que integram um grupo social amplo (Fig. n.o 1). Desta forma, vivem, na relação destes conjuntos, ansiedades e problemas pessoais e outros oriundos das estruturas e dinamismos particulares de cada grupo que devem ser permanentemente equacionados.

Fig. 1

Neste sentido, o POPPE abrangeria fases dos Programas de Orientação propostas por Bennet11. BENNET, M. E. Guidance in group. New York, McGraw. Hill, 1963., tais como a curativa, a preventiva e a de desenvolvimento pessoal voltadas a alunos, professores ou outros funcionários, visando também a prevenir os aspectos negativos das crises vitais que venham a ocorrer aos alunos ao longo do curso médico.

Segundo Gatti, “esse desenvolvimento está relacionado, diretamente à compreensão de si mesmo, de suas atitudes, seus interesses, suas aptidões, seu amadurecimento físico, mental e social, seus desejos e expectativas pessoais e sociais em direção à maior coerência e melhor integração, à aquisição de auto-direção na escolha de experiências que favoreça, a atualização de suas possibilidades de desenvolvimento”55. GATTI, B. A. Le canseil en situation de groupe et l´aproche mon directive. Paris, 1972. Tese..

Vale enfatizar que, ao ingressar nas Instituições de Ensino Superior, o aluno fica praticamente entregue a si mesmo quanto ao desempenho acadêmico, distinguindo-se do processo ensino-aprendizagem a que esteve submetido nas escolas de 1o e 2o graus. Observa-se que, no processo de adaptação pessoal do estudante às novas condições físicas, sociais e pedagógicas da Universidade, pouco ou nada lhe é oferecido em termos de apoio pessoal, e, quando este existe, freqüentemente ocorre sem a visão holística de sua inserção.

O baixo rendimento escolar indica freqüentemente que o aluno, além das dificuldades acadêmicas identificadas, traz consigo outras necessidades, dificuldades e problemas sociais. Tais dificuldades, quando não elaboradas precocemente constituem-se em efeito cumulativo-causal, criando-se um círculo vicioso que compromete estruturas e processos.

De acordo com o POPPE, a relação professor-aluno seria representada segundo a Fig. no 2, adaptando-se o esquema de S. Bloom da relação médico-paciente22. BLOOM, S. W. The doctor and his patient. New York, The Free Press, 1965..

Fig. 2

Esta proposta de implantação do POPPE está sendo desenvolvida através das Diretorias Adjuntas de Graduação e de Pós-Graduação da Faculdade de Medicina, integradas da seguinte forma:

OBJETIVOS DO POPPE

O Programa de Orientação Psico-Pedagógica e Profissional tem como objetivos gerais promover atividades preventivas de saúde, de orientação psico-pedagógica, de orientação profissional e de educação permanente e extensão. Propõe-se a atender aos estudantes, apoiando-os em suas crises vitais, visando à utilização e à promoção do desenvolvimento de seus recursos pessoais, bem como de recursos disponíveis na Instituição para o futuro desempenho de atividade médica, e também ao corpo docente e demais funcionários envolvidos no processo educacional.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS

  • Facilitar ao aluno a administração de sua vida acadêmica, visando a obter os melhores resultados da formação universitária;

  • Proporcionar aos alunos condições facilitadoras de auto-desenvolvimento com vistas à sua formação ética e humanística;

  • Proporcionar aos alunos a formação de atitudes de promoção e de proteção à saúde em nível individual e de grupo;

  • Apoiar alunos, visando estimular o desenvolvimento pessoal através da valorização do aspecto anímico, atuando preventivamente com vistas a minimizar nos estudantes as conseqüências nocivas das crises evolutivas e acidentais ao longo do curso;

  • Possibilitar aos alunos de pós-graduação, como parte de sua formação docente, participação em programas especiais de orientação junto aos diversos cursos oferecidos pela Faculdade de Medicina;

  • Promover atividades visando à maior integração do professor no processo ensino aprendizagem, valorizando o relacionamento professor-aluno visto estruturalmente como totalidade unitária;

  • Incentivar e apoiar docentes através de programas de auto-desenvolvimento e do aprimoramento da metodologia do ensino superior visando à otimização do processo ensino-aprendizagem;

  • Promover estudos e pesquisas visando ao aprimoramento do processo ensino-aprendizagem, do próprio processo de orientação psico-pedagógica, do planejamento de programas preventivos de saúde junto ao alunado e seu grupo familiar e outros estudos que se tornem relevantes no desenvolvimento do POPPE.

METODOLOGIA

População-alvo

Arbitrou-se, para o projeto-piloto, trabalhar de início com a população de alunos de graduação ingressos na Faculdade de Medicina no 2o semestre de 1982 e nos 1o e 2o semestres de 1983.

O atendimento tem-se estendido aos demais alunos, inclusive do ciclo profissional, na medida da sua solicitação.

A partir desta experiência, o Programa pretende acompanhar, ao longo do curso médico, as turmas-alvo acima referidas, bem como as subseqüentes.

Funcionamento

Para o desenvolvimento das atividades, o POPPE baseou-se em pesquisas realizadas sobre as necessidades dos alunos8 e professores e também das experiências individuais dos integrantes da equipe organizadora do POPPE.

Caracterizam o funcionamento do Programa seu aspecto fundamentalmente dinâmico, pela sua reformulação contínua de acordo com as necessidades emergentes e a interdisciplinaridade do grupo de trabalho.

O funcionamento inclui:

  • levantamento de dados dos alunos;

  • levantamento de dados de professores e outros funcionários;

  • atendimento a alunos:
    1. por turma;

    2. em grupos;

    3. individualmente.

  • assessoria a professores:
    1. em grupos;

    2. individualmente.

  • atividades de educação permanente e de extensão:
    1. atividades culturais e de lazer;

    2. cursos;

    3. palestras e conferências;

    4. painéis e mesas-redondas;

    5. visitas;

    6. programa de recepção aos novos alunos;

    7. elaboração de programas audiovisuais (didáticos, Memória da Faculdade etc.);

    8. pesquisas;

    9. publicações.

  • atividades de promoção e prevenção de saúde.

Avaliação do projeto

As atividades realizadas pelo POPPE serão objeto de avaliação freqüente, visando à maior adequação possível às necessidades da comunidade acadêmica e ao desenvolvimento do Programa, no sentido de permanente adaptação às demandas.

Embora se reconheça ser de difícil execução, pretende-se uma avaliação global do Programa através do acompanhamento comparativo de turmas de alunos que não foram atendidos pelo mesmo, após a conclusão do seu curso, utilizando-se indicadores ainda não plenamente definidos.

Considerações gerais

As atividades propostas estão sendo pautadas, de preferência, na demanda da pessoa ou grupo interessado, o que não impede tentar motivar os divorciados do processo.

O atendimento e orientação individual ao aluno são realizados a partir da solicitação e interesse do próprio, da família, da solicitação de colegas ou da Instituição, quando evidenciam o interesse pelo bem-estar do estudante e do grupo.

A assessoria e apoio aos professores são oferecidos a partir da solicitação e interesse demonstrados pelos mesmos; a assessoria se faz, também, quando dados gerais do alunado podem colaborar para melhor compreensão da turma pelo professor e assim contribuir no sentido de melhorar o relacionamento professor-aluno e o desenvolvimento do processo pedagógico.

São desenvolvidas, ainda, atividades conjuntas para estudantes e professores, segundo as necessidades e o interesse dos mesmos.

Considerando os serviços de Assistência, Orientação e de Saúde já existentes na UFRJ, o POPPE não constitui duplicação de meios já existentes na Universidade na medida em que:

  1. pesquisas junto ao alunado apontam a demanda do mesmo para a existência de Serviço de Orientação em cada Unidade de Ensino visando às características e necessidades específicas de seus corpos discente e docente;

  2. O Programa de Orientação Psico-Pedagógica Profissional visa a atender de início a alunos e professores da Faculdade de Medicina, já que se constituem em unidade funcional;

  3. O atendimento psico-pedagógico ao alunado indica a importância atribuída pelo mesmo às atividades da equipe do POPPE junto às turmas, na medida em que se reporta a crises específicas da formação médica perfeitamente identificadas;

  4. O atendimento individual aos alunos evidencia que estes dificilmente procuram ajuda ou apoio em Serviços que lhe sejam desconhecidos e/ou distantes de sua Unidade de Ensino, o que é enfatizado pelos mesmos da seguinte forma: “que o Serviço seja em local de fácil acesso aos estudantes e funcione sem burocracias”;

  5. Evidencia-se que os estudantes, quando procuram setores não ligados à sua Unidade buscando determinada ajuda, apresentam problemas já instalados, em geral de certa gravidade;

  6. O apoio oferecido aos professores através de reflexões contínuas sobre os problemas educacionais emergentes, no cotidiano das atividades didáticas de uma Unidade de Ensino, têm evidenciado o interesse crescente dos docentes pelo POPPE, bem como o aumento na demanda de assessoria;

  7. As atividades desenvolvidas junto a alunos e grupos de professores vêm, por fim, apontando a relevância das mesmas e do Programa de Orientação Psico-Pedagógica Profissional em termos amplos de prevenção de problemas individuais e institucionais, bem como de ampla promoção de saúde e do desenvolvimento da pessoa humana, através dos projetos de educação permanente e de extensão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
    BENNET, M. E. Guidance in group New York, McGraw. Hill, 1963.
  • 2
    BLOOM, S. W. The doctor and his patient New York, The Free Press, 1965.
  • 3
    SEMINÁRIO SOBRE ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL EM INSTITUIÇÃO DE NÍVEL SUPERIOR. Relatório final Rio de Janeiro, Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras, 1973. mimeo.
  • 4
    REUNIÃO PLENÁRIA DO CONSELHO DE REITORES DAS UNIVERSIDADES BRASILEIRAS, 27. Guarapari, 27 jul. 1978. Relatórios dos grupos e documento final s.n.t. mimeo.
  • 5
    GATTI, B. A. Le canseil en situation de groupe et l´aproche mon directive Paris, 1972. Tese.
  • 6
    PENTEADO, Wilma M. A. Fundamentos de orientação educacional São Paulo, EPU, 1976.
  • 7
    PROJETO de implantação de um serviço de orientação e assistência ao estudante da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1978. mimeo.
  • 8
    SOUZA, Ingrid S. Problemas e necessidades dos estudantes de graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro com vistas à organização de serviços de orientação Rio de Janeiro, 1978. Tese de mestrado apresentada ao Instituto de Estudos Superiores e Avançado em Educação da Fundação Getúlio Vargas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Set 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 1984
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