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Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) Construindo a Capacitação em Londrina

Problem-Based Learning (PBL): Developing Medical Training in Londrina, Brazil

Resumo:

Objetivo:

registrar as ações desenvolvidas pela comissão de capacitação docente (CC) do curso médico na Universidade Estadual de Londrina (UEL, no sentido de sensibilizar e treinar professores durante a implementação da ABP.

Método:

Consulta ao arquivo dos registros das ações da CC e análise das atividades desenvolvidas.

Resultados:

Entre 1977 e 2001, foram realizados cursos de sensibilização, de aprofundamento em ABP; de elaboração de problemas, de construção de módulo temático, fóruns de tutores e cursos de capacitação de tutores com dois desenhos. As atividades desenvolvidas nossos cursos influenciaram: observar e vivenciar grupos tutoriais; elaborar problemas; planejar módulos temáticos; discutir os passos da dinâmica tutorial e os problemas surgidos no desempenho da avaliação.

Conclusão:

o programa de capacitação docente em Londrina foi construído a partir de demandas surgidas com a implementação da nova metodologia de acordo com o grau de inscrição e resistência dos docentes ao processo. Avalia-se compositivo o trabalho desenvolvido e aponta-se como pertinente um programa de capacitação mais abrangente, que envolva as instâncias gerenciais, profissionais e pedagógicas do processo.

Palavras-chave:
Educação Médica; Docente de Medicina; Capacitação; Aprendizagem Baseada em Problemas

Abstract:

Objective:

To record the activities conducted by the Teacher Qualification Committee (TQC) at the School of Medicine of the State University in Londrina, Paraná, Brazil (UEL), in order to sensitize and train professors during the implementation of problem-based learning (PBL).

Method:

Consult the Committee file, and analyze the activities conducted by it.

Results:

From 1997 to 2001, awareness raising courses were held on the in-depth use of PBL; elaboration of problems development of a thematic module; forums of tutors; and training courses for tutors with to different designs. Activities in the courses included: observing and experiencing tutor groups; elaborating problems planning thematic modules; discussing steps in tutorial dynamics and problems emerging in performing the tutor's role; training in skills and activities in course-community interaction; and the evaluation system.

Conclusion:

The teacher training program in Londrina was designed and implemented on the basis of demand emerging from the implementation of the new methodology, and according to the degree of the teacher participation (or resistance to) the process. The work received a positive assessment and identified the importance of a broader training program involving the management professional, and pedagogical tiers in the process.

Key-words:
Educacion, Medical; Faculty Medical; Training; Problem Based Learning

INTRODUÇÃO

A capacitação docente é considerada de fundamental importância nos processos de implementação e sustentação das inovações curriculares na área da saúde. Este tema tem sido abordado de forma frequente na literatura, variando os aspectos focalizados. Alguns trabalhos relativamente recentes descrevem experiências de capacitação docente em diferentes países11. Price DA. Tutor training for problem-based learning: the experience of a large medical school. Adv Med Educ.1997: 241-243.,22. Murray I, Savin-Baden M. Staff development in problem based learning. Teach High Educ 2000; 5:107-126.,33. Morales-Mann ET, Kaitell CA. Problem-based learning in a new Canadian curriculum. J Adv Nurs 2001; 33:13-19.) Considerando especificamente a área médica, alguns autores 44. Wilkerson L, Irby DM. Strategies of improving teaching practices: a comprehensive approach to faculty development. Acad Med 1998; 73: 387-395.propõem estratégias para melhorar as práticas de ensino, havendo aqueles que assumem a capacitação docente como um componente essencial nos processos de mudanças curriculares e de sua consolidação55. Des Marchais JE. The association of Canadian Medical Colleges: commemorating 50 years of the ACMC-5 contributions to medical education: student-centred, problem curriculum: 5 years experience. CMAJ 1993; 148: 1567-1572.,66. Jones R, Higgs R, de Angelis C, Prideaux D. Changing face of medical curricula. Lancet 2001; 357:699-703.

Em 1995, após um período estimado de três anos em que ocorreram discussões informais e pontuais sobre a metodologia da Aprendizagem Baseada em Problemas (ABP) e as possibilidades de sua implementação no Curso de Graduação em Medicina, foram intensificados os debates sobre o terna no Centro de Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Londrina (CCS-UEL). Em maio daquele ano, 20 docentes participaram de uma oficina de trabalho, ministrada por professores da Universidade de Limburg, em Maastricht, na Holanda, no âmbito do CCS-UEL, para disseminar conhecimentos sobre essa metodologia.

Em 1995, dois professores do CCS-UEL visitaram as Universidades de McMaster, no Canadá, e um visitou a de Limburg, na Holanda, local onde se aplica o método da ABP no Curso de Medicina. Em 1996, sete docentes visitaram a Universidade de Limburg, e em 1997 mais três frequentaram os Cursos de Verão sobre ABP. Ainda em 1997, dois docentes frequentaram uma oficina de trabalho sobre formação de tutores, em Temuco, no Chile.

Em novembro de 1996, houve dois cursos sobre ABP, ministrados por docentes da UEL, aos interessados em conhecer o método no âmbito do CCS-UEL. Participaram 80 docentes e 72 alunos de graduação.

Em fevereiro de 1997, a Oficina de Planejamento do Colegiado do Curso de Medicina discutiu concretamente as possibilidades de implementação do método já para 1998.

Em 5 de março de 1997, foi constituída uma Comissão para reformulação curricular do Curso de Medicina. Na primeira reunião desta Comissão, em março de 1997, criaram-se cinco subcomissões: de currículo, de desenvolvimento de problemas, de habilidades e estágio, de avaliação e de treinamento. Estas subcomissões tinham por finalidade facilitar e agilizar os trabalhos da Comissão Geral de Reforma Curricular, que recebeu do Colegiado do Curso de Medicina um prazo até agosto de 1997- para entrega de uma proposta preliminar de currículo (anteprojeto do novo currículo).

A Comissão de Treinamento, originalmente, era integrada por cinco membros, todos docentes. Cinco meses depois, foi reformulada e passou a contar com dez docentes e três alunos. Atualmente, esta Comissão tem seis docentes e se denomina Comissão de Capacitação. Suas funções são: capacitar docentes para atender às várias funções demandadas pela implementação do novo currículo; sensibilizar a comunidade universitária para as mudanças; promover a divulgação da nova metodologia aos interessados; auxiliar o Colegiado na realização de consultorias externas.

Os objetivos do presente trabalho são o registro das ações desenvolvidas pelos membros dessa Comissão, utilizadas inicialmente na sensibilização de professores, alunos e funcionários, e no treinamento dos docentes, bem como a descrição dos atuais métodos de capacitação aplicados.

METODOLOGIA

A Comissão de Capacitação, desde a sua criação, inclui na sistematização de seu trabalho o registro de todas as atividades que promove e as atas da maioria de suas reuniões. O arquivo desses registros inclui os folders de divulgação dos cursos, encontros, oficinas e similares; o programa de cada um e as listas de presença dos participantes. Estes documentos são mantidos junto à secretaria do Colegiado do Curso de Medicina e tomados disponíveis sempre que necessário. A análise das informações contidas nesta memória histórica da Comissão de Capacitação permitiu a elaboração do presente trabalho.

Os cursos de sensibilização envolviam dois períodos de dia, sendo ministrados em período integral ou em duas manhãs ou duas noites, sequenciais ou não. O primeiro período abrangia uma pequena palestra sobre o que é a ABP, seguida de discussão. Depois, ocorria a demonstração do funcionamento da dinâmica do grupo tutorial, com emprego de duas técnicas: na primeira, um grupo de alunos treinados realizava uma sessão tutorial; na segunda, os participantes do curso se dividiam em pequenos grupos e eram "tutorados" por um facilitador. No segundo período do curso, os participantes eram divididos em pequenos grupos; cada um desses grupos elaborava um problema e a seguir trocavam de problemas entre si, de forma que um grupo resolvesse o problema preparado por outro que não o seu, e a seguir o inverso. No final, uma plenária discute as dúvidas surgidas.

Os dois cursos de aprofundamento envolviam quatro períodos cada um e ocorriam de forma intensiva ou intermitente. Conforme mostrado na Tabela 1, eram proferidas cinco palestras, referentes a: 1. Dinâmica do grupo tutorial e seus elementos; 2. Planejamento de módulos temáticos; 3. Elaboração de problemas; 4. Treinamento de habilidades; 5. Avaliação de forma geral. As três primeiras palestras eram seguidas de trabalho em grupo sobre o tópico abordado. Todas as atividades incluíam discussões para esclarecimentos.

Os cursos sobre elaboração de problemas envolviam dois períodos, como indicado na Tabela 1. Ocorria uma palestra inicial sobre a estrutura de um problema e as características de um bom problema. O trabalho restante era realizado em pequenos grupos, que montavam e resolviam problemas uns dos outros. Ao final do curso, havia uma plenária com discussões.

Tabela 1
Conteúdo dos cursos oferecidos pela Comissão de Capacitação desde a sua implantação

O curso de construção de módulos temáticos foi proposto para ser desenvolvido em dois períodos diurnos. O esquema utilizado previa pequenas palestras antes das atividades práticas em pequenos grupos. Estes grupos construíram a árvore temática de um módulo e, a partir desta, os objetivos do módulo. Em seguida, com base na árvore temática, distribuímos temas que seriam abordados em diversos tipos de atividades, ou seja, palestras, problemas, atividades práticas. No segundo período do curso, elaboravam e resolviam problemas. A plenária ocorreu ao final do curso.

Os cursos de capacitação de tutores tiveram três formatos. Os dois cursos iniciais previam palestras sobre o papel do tutor e dos alunos no grupo tutorial e a dinâmica de seu funcionamento. Os treinando simulavam as ações de uma sessão tutorial e recebiam um problema para que fosse aplicada a dinâmica dos sete passos. O papel de tutor era desempenhado pelo orientador do curso de capacitação. As dúvidas surgidas ao final dos trabalhos eram discutidas e esclarecidas.

Os 24 cursos que se seguiram incluíram quatro períodos, que tiveram uma variação muito grande de combinações entre manhãs, tardes e noites. Foram estruturados em três etapas. A primeira delas (um período) era dedicada a esclarecimentos sobre a dinâmica do grupo tutorial, seus elementos e seus papéis. A segunda etapa aconteceu nos 15 dias seguintes, e cada treinando teria como tarefa assistir a duas sessões de tutoria reais do curso de medicina, preferencialmente sequenciais, como observador. Estas sessões se constituíam em grupos tutoriais verdadeiros, realizados para os alunos do curso de medicina. O treinador deveria observar um problema sendo discutido pelo grupo e os objetivos de estudo traçados e, no encontro seguinte, a resolução do problema após o estudo individual dos alunos. A última etapa do treinamento consistia num período em que os treinandos voltassem às reuniões para esclarecer as dúvidas surgidas com as observações dos tutoriais e receber treinamento sobre o sistema de avaliação utilizado no novo currículo.

A partir de 2001, a capacitação de tutores passou a ser realizada em três etapas, que ocupavam cinco períodos. Na primeira etapa (dois períodos), além dos esclarecimentos sobre a dinâmica do grupo tutorial, foram acrescentados tópicos sobre psicologia cognitiva e de como ocorre a aprendizagem dos adultos. Num segundo período, auxiliados pelos membros da Comissão de Habilidades e Atitudes e da Comissão de Interação Ensino-Comunidade (PIN), os treinandos eram esclarecidos sobre os objetivos dessas comissões e dos módulos por elas coordenados. A segunda etapa (dois períodos) era semelhante ao curso anterior, e os docentes deveriam acompanhar dois grupos tutoriais, visualizando na prática como se processavam os sete passos. Na terceira etapa (um período), auxiliados pelos membros da Comissão de Avaliação, os professores discutiam o sistema de avaliação dos alunos em vigor.

Em 1999 e em 2001, foram realizados fóruns de tutores, com a participação somente de docentes que já haviam atuado como tutores em algum módulo temático, com a finalidade de reciclagem e discussão dos problemas encontrados nos grupos tutoriais, apontando pontos positivos e negativos, e como solucioná-los.

RESULTADOS

A Tabela 2 mostra o número de vezes em que os cursos foram ofertados pela Comissão de Capacitação e o número de participantes. Salienta-se, principalmente nos cursos de sensibilização e nos primeiros cursos de capacitação de tutores, a grande participação de docentes não médicos, pertencentes ao antigo ciclo básico.

Tabela 2
Cursos oferecidos pela Comissão de Capacitação desde implantação da ABP em Londrina, de acordo com o número de participantes

DISCUSSÃO

A decisão efetiva da adoção da Aprendizagem Baseada em Problemas como método de ensino no curso médico em Londrina demandou intenso trabalho entre os professores em 1997, a fim de capacitá-los para as novas funções que assumiram no ano seguinte com a entrada da primeira turma de alunos no novo sistema. A partir de 1998, começaram a conviver dois tipos de currículo no curso médico: o currículo tradicional e o novo currículo.

O programa de capacitação docente aqui descrito não foi elaborado prospectivamente em toda a sua extensão, nem teve seu cronograma de atividades previamente estabelecido. Num momento inicial, ele foi parcialmente planejado, mas sua construção obedeceu, em parte, às demandas que vinham sendo apresentadas com a implementação do novo currículo e, por outro lado, considerou o feedback resultante do impacto desta implementação sobre a comunidade docente.

Logo após a sua criação em 1997, a Comissão de Capacitação (inicialmente chamada Comissão de Treinamento) assumiu a importante tarefa de divulgar a nova metodologia de ensino para toda a comunidade universitária. Com esta finalidade, foram criados os chamados cursos de sensibilização. Com as características já descritas, estes cursos reuniram 104 participantes em quatro cursos oferecidos em 1997. Considerando que este número não incluía apenas docentes e que havia 250 professores no curso médico, avalia-se como tímido o seu interesse sobre a nova metodologia. Nessa ocasião, um núcleo de docentes participava mais ativamente dos trabalhos da implementação do novo currículo. Estes professores pertenciam a departamentos do ciclo básico do currículo anterior e também das áreas clínicas. A destacada participação de docentes das áreas básicas observada nessa fase deveu-se à introdução da ABP no primeiro do curso, no qual estes professores tinham forte atuação.

Um número pequeno de docentes expressava claramente sua resistência às mudanças curriculares. A grande massa de professores tinha uma postura de indiferença, não responde no adequadamente aos estímulos à participação. Os cursos de sensibilização tentavam atingir exatamente esses professores, aparentemente indiferentes. Cox77. Cox K. Persuading colleagues to change: fifteen lessons learned more than 20 years of trying. Educ Health 1999; 12: 347-353. considera que, nos processos de implementação de inovações, os docentes se manifestam com papéis específicos de inovadores, resistentes e líderes, mas a maioria dos professores tem uma postura neutra, porém tolerante às mudanças. A participação pouco expressiva dos docentes nos cursos de sensibilização pode ser interpretada como uma manifestação de resistência às inovações.

Alguns autores22. Murray I, Savin-Baden M. Staff development in problem based learning. Teach High Educ 2000; 5:107-126.,55. Des Marchais JE. The association of Canadian Medical Colleges: commemorating 50 years of the ACMC-5 contributions to medical education: student-centred, problem curriculum: 5 years experience. CMAJ 1993; 148: 1567-1572.) descrevem cursos com estrutura semelhante à do aqui descrito, ministrados em suas escolas por ocasião da mudança da metodologia de ensino para a ABP. Em outros locais, como também ocorreu aqui, estes cursos foram seguidos de outros, que permitiram aprofundar o conhecimento docente a respeito do tópico, principalmente daqueles professores que iriam atuar como facilitadores ou tutores(12) . Murray & Savin-Baden22. Murray I, Savin-Baden M. Staff development in problem based learning. Teach High Educ 2000; 5:107-126. precederam a realização do workshop inicial, com a duração de um dia, por uma fase em que estimularam a circulação de artigos-chave sobre a ABP. Durante a realização do evento, os tópicos abordados e as atividades realizadas tiveram bastante similaridade com aquelas do presente trabalho. Pequenas palestras e reuniões em pequenos grupos, seguidas de debates, foram comuns aos dois cursos. Des Marchais55. Des Marchais JE. The association of Canadian Medical Colleges: commemorating 50 years of the ACMC-5 contributions to medical education: student-centred, problem curriculum: 5 years experience. CMAJ 1993; 148: 1567-1572. também cita a realização de um workshop por ocasião da introdução da ABP na Universidade de Sherbrooke, no Canadá, em resposta à falta de informação dos docentes, porém não cita o desenho do evento.

Os cursos de "Aprofundamento em ABP" surgiram inicialmente como uma estratégia para formar um número significativo de docentes que fossem replicadores do treinamento na metodologia da ABP. Tratava-se de melhorar de forma consistente e convincente os conhecimentos de alguns professores, para que pudessem provocar uma reação em cadeia de treinamento de outros colegas e a consequente adesão aos trabalhos com o novo currículo. O primeiro curso, realizado num hotel fora de Londrina durante um final de semana, contou com 22 participantes, e sua avaliação foi satisfatória. O segundo curso, realizado nas dependências da UEL, em Londrina, em quatro sessões, uma a cada semana, teve baixa adesão. O terceiro curso foi cancelado por ter somente dois inscritos. Além da baixa frequência aos cursos, o efeito replicante desejado não foi observado. Cox77. Cox K. Persuading colleagues to change: fifteen lessons learned more than 20 years of trying. Educ Health 1999; 12: 347-353. afirma que o processo de divulgação das inovações entre os docentes é lento e requer paciência e persistência.

Os cursos de elaboração de problemas e construção de módulos temáticos surgiram em resposta a demandas trazidas pela implementação dos módulos do novo currículo. Considerando o caráter interdisciplinar multiprofissional de cada módulo e respeitando as decisões do Colegiado do Curso de Medicina de que a sequência modular obedeceria ao ciclo vital, com ênfase na ecologia humana, grande número de professores teve que ser treinado para que os módulos fossem fiéis a estas características. Os professores inscritos nestes cursos pertenciam, em geral, aos chamados "grupos de planejamento de módulos temáticos". Contribuíram de forma significativa para o desenho destes cursos as orientações e o conteúdo expostos por Dolmans & Snellen-Balendong88. Dolmans D, Snellen-Badendong H. Educación medica basada en problemas - construcion de blogues. Departamento de educación investigación Maastricht, Imprenta Universidad de Maastricht, tradución: Myriam Stroobandt, Maastricht, 1995. e Snellen-Balendong & Dolmans99. Snellen-Baden Dong H, Dolmans D. Educación médica basada en problemas - construcion de tares. Departamento de educación investigación Maastricht, Imprenta Universidad de Maastricht, tradución: Myriam Stroobandt, Maastricht, 1995. modificados para a realidade local. Na literatura revista, não foram encontradas referências a cursos versando especificamente sobre estes tópicos, mas sim como partes do treinamento de tutores55. Des Marchais JE. The association of Canadian Medical Colleges: commemorating 50 years of the ACMC-5 contributions to medical education: student-centred, problem curriculum: 5 years experience. CMAJ 1993; 148: 1567-1572..

A capacitação de tutores foi a atividade que envolveu o maior número de horas/atividades dos membros da Comissão de Capacitação. Isto não só porque a sessão tutorial é considerada atividade-chave dentro da ABP, mas também porque era preciso atender à demanda crescente de tutores surgida a cada ano com a implementação dos novos módulos para o segundo, terceiro e depois quartos anos do curso.

A base teórica oferecida aos treinandos em tutoria até o ano 2000 foi muito semelhante. Somente aos primeiros tutores não foi oferecida a possibilidade de observação de grupos tutoriais reais com alunos, posto que estes ainda não existiam, realizando eles próprios a sua sessão de tutoria, assumindo as funções de alunos, tutorados pelo orientador do curso. Os inúmeros cursos (24) oferecidos nos três anos seguintes (1998 a 2000), alguns com frequência muito baixa de inscritos, se deveram à necessidade de atender à demanda crescente de tutores com a implementação dos novos módulos.

Nos primeiros anos de funcionamento do novo currículo, foi observada resistência dos docentes das áreas clínicas em aderir às novas funções. Havia dificuldade em convencer os docentes a participar como membros das comissões de elaboração de módulos e depois como tutores. A razão inicial alegada pelos professores era falta de tempo, pois teriam também que atuar com os alunos do currículo antigo, que corria paralelamente ao novo.

Em razão da pouca disponibilidade de tempo manifestada pelos docentes, optou-se por um desenho de curso de capacitação de tutores curto, com treinamento o mínimo indispensável para permitir a atuação como tutor. A complementação deste treinamento era realizada na prática, atuando, e as dúvidas eram discutidas nas reuniões semanais de tutores que ocorriam em todos os módulos, às quais sempre estava presente um membro da Comissão de Capacitação. Estes momentos foram considerados essenciais ao aprendizado dos tutores.

O desenho do curso de treinamento de tutores descrito por Price11. Price DA. Tutor training for problem-based learning: the experience of a large medical school. Adv Med Educ.1997: 241-243. na implementação da ABP na Universidade de Queensland, na Austrália, tem aspectos semelhantes ao adotado aqui. Até o ano 2000. Outros autores1010. Venturelli J, Fiorini VML. Programas educacionais inovadores em escolas médicas: capacitação docente. Rev Bras Educ Med. 2001; 25:7-21., descrevendo uma experiência brasileira, propõem treinamento de tutores em duas etapas-capacitação básica com duração de 120 horas e avançada, através de reuniões semanais durante três meses.

A partir de 2001, foi aumentada a carga horária do curso de formação de novos tutores. O acréscimo de noções sobre a psicologia cognitiva veio facilitar a exposição, principalmente aos docentes mais resistentes, das razões pelas quais a ABP foi escolhida localmente como metodologia para o ensino de medicina. A apresentação aos novos tutores de como funcionam os dois módulos longitudinais - habilidade e atitudes, e integração ensino-comunidade - visa sensibilizá-los a também participar desses módulos como instrutores. A decisão de mudar o desenho do curso de capacitação ocorreu em resposta às solicitações dos tutores já em atividade, manifestadas nos resultados de dois fóruns de debates (1999 e 2000). Estes fóruns visaram levantar os pontos positivos da dinâmica tutorial e os problemas mais frequentemente detectados durante sua realização e como solucioná-los. Neste sentido, foram atendidas, também, as reivindicações dos coordenadores de módulo e da comissão de gerenciamento, que solicitavam maior uniformização na atuação dos tutores.

Os programas de capacitação docente devem ser cuidadosamente avaliados, considerando-se percepções, experiências e perspectivas dos professores a respeito do processo. Neste sentido, Murray & Savin-Baden22. Murray I, Savin-Baden M. Staff development in problem based learning. Teach High Educ 2000; 5:107-126. desenvolveram um interessante trabalho, no qual avaliaram um treinamento em diferentes fases, com possibilidade de feedback a longo prazo.

Foi de grande utilidade nos cursos de capacitação de tutores o Manual do Tutor, cuja redação foi finalizada em 19981111. Lima GZ, Thomson JC Manual do tutor. Londrina (PR): EDUEL, 2002. 52p.. Ele contém as informações essenciais aos tutores, e sua leitura era obrigatória para os treinandos. Morales-Mann & Kaitell33. Morales-Mann ET, Kaitell CA. Problem-based learning in a new Canadian curriculum. J Adv Nurs 2001; 33:13-19. utilizam recurso semelhante para o workshop de treinamento de facilitadores.

Excluídos os professores extremamente resistentes e aqueles considerados líderes do processo de mudança, a maioria da comunidade docente mostrou um comportamento evolutivo padrão frente à nova proposta curricular. No início, a atitude observada foi de resistência passiva, que passou depois a indiferença, caminhando para a cooperação não espontânea e, por fim, a adesão responsável.

O fator que mais contribuiu para estas mudanças de postura talvez tenha sido a preocupação dos docentes com a representatividade do conteúdo de suas "antigas disciplinas" no novo currículo. O desaparecimento gradativo das atividades do currículo anterior estimulou a reflexão dos professores sobre o cumprimento dos objetivos educacionais específicos de suas respectivas áreas dentro da estrutura do novo currículo. Isto de alguma forma foi permissivo para o conhecimento do novo arranjo curricular e a necessidade dos cursos de capacitação.

A regulamentação do tempo de atividade docente nos cursos de graduação é considerada fator facilitador dos cursos de capacitação. Des Marchais55. Des Marchais JE. The association of Canadian Medical Colleges: commemorating 50 years of the ACMC-5 contributions to medical education: student-centred, problem curriculum: 5 years experience. CMAJ 1993; 148: 1567-1572. expõe a participação anual requerida dos docentes que trabalham em regime de tempo integral como sendo a tutoria em dois módulos, acrescidos de participação no ensino de habilidades.

Considera-se plenamente estabelecido que os processos de inovações curriculares exigem programas de capacitação docente eficientes. Idealmente, esses programas devem ser amplos, como propõem Wilkerson & Irby44. Wilkerson L, Irby DM. Strategies of improving teaching practices: a comprehensive approach to faculty development. Acad Med 1998; 73: 387-395.), atingindo todas as etapas de desenvolvimento do processo. Nossa experiência é que, no processo de mudança curricular, deve-se ter maleabilidade para formar professores aptos a participar da mudança, da melhor maneira possível.

A capacitação pedagógica desenvolvida pela Comissão de Capacitação durante os primeiros três anos e meio de implementação da ABP no curso médico de Londrina, aqui relatada, constitui somente parte dos objetivos que se propõem seus componentes. Entende-se que programas de capacitação em processos de mudanças curriculares tão profundas demandam graus de abrangência e eficiência muito maiores, atingindo instâncias de desenvolvimento gerencial, profissional e de lideranças, além da pedagógica.

A capacitação permanente da comunidade envolvida no processo é meta a ser atingida num continuam de ações, das quais o que aqui foi realizado constitui apenas o ponto de partida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • 1
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  • 4
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    Jones R, Higgs R, de Angelis C, Prideaux D. Changing face of medical curricula. Lancet 2001; 357:699-703.
  • 7
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  • 8
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  • 9
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  • 10
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  • 11
    Lima GZ, Thomson JC Manual do tutor. Londrina (PR): EDUEL, 2002. 52p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2003

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2002
  • Aceito
    18 Out 2002
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