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Produção Científica dos Docentes do Curso Médico da Umversidade de Pernambuco - Um Estudo Exploratório

Scientific Output by Medical School Faculty at the University of Pernambuco, Brazil: A Preliminary Study

Resumo:

Objetivo:

caracterizar o desenvolvimento de pesquisas pelos docentes do curso médico da Universidade de Pernambuco (UPE).

Material e método:

estudo descritivo, censitário, com 246 docentes da Faculdade de Ciências Médicas e do Instituto de Ciências Biológicas. Quatro alunos de iniciação científica utilizaram dois instrumentos para coleta; as questões abertas foram submetidas à análise de conteúdo.

Resultados:

74,4% desses docentes eram professores, 47,1% especialistas, 34,5% mestres e 14,2% doutores; 82,5% já realizaram pesquisa, 51,2% com iniciação científica. De janeiro de 1999 a agosto de 2002, 68,3% desenvolveram pesquisa, 48,8% com iniciação científica: 48,3% referiram falta de financiamento como o maior obstáculo: apenas 30,9% tiveram financiamento, sendo o CNPq a principal fonte (42,3%). O interesse científico motivou pesquisas (76,8%), esperavam fazer descobertas científicas (53,0%) e adquirir novos conhecimentos (41,7%). Metade dos projetos divulgou seus resultados, sobretudo em eventos científicos nacionais.

Conclusões:

é preciso estimular as potencialidades da UPE para que constitua um recanto privilegiado de interação professor-aluno no processo de ensino-aprendizagem-pesquisa.

Palavras-chave:
Docentes de Medicina; Projetos de Pesquisa; Apoio a Pesquisa

Abstract:

The objective of this article was to characterize the development of research by the medical school faculty of the University of Permmbuco (UPE), Brazi1. This was a descriptive survey with a total of 246 faculty members (professor and instructors), at the School of Medicine and Institute of Biological Science. Four first-year science fellows used two instruments for the suvey. The open questions were submitted to a content analysis. Of the faculty members, 74.4% had professor status, 47.1% were specialists, 34.5% had Master’s degrees, and 14.2% were PhDs; 82,5% had conducted research, 51.2% of whom with science initiation grants. From january 1999 to august 2002, 68.3% conducted rescarch, 48.8%, with Science initiation grants; 48.3% reported lack of funding as the main obstacl to conducting research; only 30.9% received funding with the National Research Council (CNPq) as the main sorce (42.3%). Motivations for the research included scientific interest (76.8%), the expectation of making scientific discoveries (53.0%), and the hope of acquiring new knowledge (41.7%). Half of the projects had their results disseminated, especially at national scientific events. The authors conclude that it is neressary to sstimulate the potentialities at UPE in order for it to become a prime center for faculty-study interaction in the teaching-learning-research.

Keywords:
Faculty, Medicine; Research Desing; Research Support

INTRODUÇÃO

A formação do profissional médico é um processo extremamente complexo que não está restrito apenas ao âmbito da escola médica, mas vinculado a inúmeros fatores, como os processos de trabalho em saúde, as condições de articulação da academia com os serviços, a intervenção do Estado e os paradigmas pedagógicos, entre outros11. Lampert JB. Formação Médica. ln: Lampert JB. Tendências de Mudanças na Formação Médica no Brasil. São Paulo: Hucitec,2002, p 31-62.. Assim o ensino médico não é a mera transmissão de conhecimento, mas o desenvolvimento da capacidade de se fazer profissional tecnicamente competente, crítico e atuante, por meio da reconstrução do conhecimento, da exploração das potencialidades e da criação de alternativas para responder às necessidades que permeiam a prática cotidiana. Entre ensino e pesquisa existe uma relação estreita, pois, como afirma Freire22. Freire P. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998.

Fala-se hoje, com insistência, no professor pesquisador. No meu entender o que há de pesquisador no professor não é uma qualidade ou uma forma de ser ou atuar que se acresente à de ensinar. Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador.

Ao mesmo tempo em que deve fazer parte da formação do professor, a pesquisa deve constituir uma atividade básica da formação do aluno33. Demo P. Introdução à metodologia científica. 2a edição. São Paulo: Alias, 1987.. A iniciação científica, a nosso ver, cumpre importante papel porque estimula a reflexão crítica sobre a prática, por meio de sua captação sistemática, da busca de maior profundidade nas explicações, do desenvolvimento da capacidade de contra-argumentação, preparando o caminho para que os futuros profissionais possam lidar de modo criativo com a rigorosidade metódica, aspecto essencial para traçar maior aproximação com as necessidades de saúde e as respostas frente a elas. Além do mais, a interação entre professor e aluno no processo de ensino-aprendizagem-pesquisa propicia o aprimoramento e a emergência de novas linhas de pesquisa. Nesse contexto é relevante a disponibilidade das atividades de iniciação científica nas instituições formadoras. Apesar de a cobertura ainda ser restrita, considerando-se o contingente de alunos na graduação, tem havido nas últimas décadas um crescimento do Programa de Iniciação Científica no País, treinando mais de 30 mil jovens a cada ano44. Guimarães J. A Pesquisa Médica e Biomédica no Brasil. Comparações com o Desempenho Científico Brasileiro e Mundial. Ciência & Saúde Coletiva,9(2):303-327,2004. Entretanto, não tem sido fácil construir uma formação que seja recanto privilegiado para a aprendizagem crítica do exercício, simultaneamente técnico e social, do trabalho médico.

Mais uma vez, na década de 1990, os impasses na articulação entre educação e prática profissional levaram à constatação de que o ensino médico brasileiro é inadequado para dar conta das demandas sanitárias e sociais do País. Em um esforço conjunto, instituições brasileiras que têm como propósito subsidiar a transformação da prática médica constituíram a Comissão Interinstitucional Nacional de Avaliação do Ensino Médico (Cinaem)55. Comissão lnterinstiucional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM). Transformando a Educação Médica Brasileira: Projeto CJNAEM III Fase: relatório 1998., que realizou um levantamento sobre a situação do ensino médico no País, com o propósito de identificar as necessidades relacionadas à formulação de propostas de reforma educacional capazes de melhorar a adequação de conhecimentos e habilidades na formação dos novos médicos.

Nesse estudo da Cinaem, o corpo docente foi reconhecido como um dos elementos centrais para o êxito das reformulações que deveriam ser efetivadas no sistema educacional em questão. Ficou também demostrado que, no Brasil, a docência médica configura-se como atividade complementar ou secundária ao trabalho médico. A grande maioria dos docentes estudados é constituída por profissionais com residência médica, com poucos tendo se especializado em educação. Embora se reconheçam a dedicação e a competência da maior parte desses profissionais, as recomendações atuais para a constituição de corpo docente prescrevem como ideal a aquisição de titulação em mestrado e doutorado.

Reiterando esses resultados, outro estudo realizado para caracterizar o perfil dos médicos brasileiros identifica 11 escassez de profissionais com pós-graduação stricto sensu, ou seja, o pequeno número de médicos-mestres e médicos-doutores capacitados para o desenvolvimento de pesquisa66. Conselho Federal de Medicina (CFM). Perfil dos Médicos: A Formação Profissional dos Médicos. Jornal Conselho Federal de Medicina ·1997 ; 84 : 11-21.. Embora, em 2001, 21 % do total de 1.812 programas de pós-graduação oferecidos no Brasil abrangessem as áreas de medicina, saúde coletiva, odontologia e ciências biomédicas44. Guimarães J. A Pesquisa Médica e Biomédica no Brasil. Comparações com o Desempenho Científico Brasileiro e Mundial. Ciência & Saúde Coletiva,9(2):303-327,2004. Esta situação parece retratar a falta de formulação de políticas de produção cientifica na área médica77. Guimarães R. Bases para uma Política Nacional de Ciência, Tecnologia e lnovação em Saúde. Ciência &Saúde Coletiva, 9(2):375-387,2004 em nosso país, contrariamente ao que acontece cm nível mundial, resultando cm prejuízo do conhecimento próprio e da formação do aluno66. Conselho Federal de Medicina (CFM). Perfil dos Médicos: A Formação Profissional dos Médicos. Jornal Conselho Federal de Medicina ·1997 ; 84 : 11-21..

Vale ressaltar que os países mais desenvolvidos investem de 2% a 3% de seu PIB (Produto Interno Bruto) em Ciência e Tecnologia, ou seja, de três a cinco vezes mais do que o que se tem feito no Brasil nos últimos anos. Apesar dessas limitações, registra-se um acentuado aumento da produção científica no País nas últimas décadas, guardando relação direta com a expansão do programa nacional de pós-graduação, no qual é significativa a participação das áreas médica e biomédica, principalmente no quinquênio 1997-2001, representando 36%, da produção total. Comportamento semelhante também foi observado na produção mundial. A profissionalização dos docentes, incluindo capacitação pedagógica, remuneração adequada e estímulo à realização de pesquisas científicas, além da dotação dos serviços de infraestrutura mínima para pesquisa são elementos indispensáveis à conformação de educadores qualificados para ensinar aos estudantes de graduação e pós-graduação em medicina88. Venturelli J. Programas Educacionais Inovadores em Escolas Médicas: Capacitação Docente. Rev. Bras. Educ. Med. 2001; 25:7-21.,99. Facchini LA; Piccini RX; Santos RC. Aspectos Históricos e Conceitos em Educação Médica. Disponível em Disponível em http://www.infonct.com.br/camed/sys11dmin/download/arquivos Acessado em 27/11/2002.
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Neste contexto, o incremento da produção científica da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) e do Instituto de Ciências Biológicas (ICD) da Universidade de Pernambuco constitui uma preocupação recente, advinda da necessidade de aten­der às exigências da Lei ele Diretrizes e Bases do Ministério da Educação, promulgada em 19961010. Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases. Lei 9394/20 de Dezembro de 1996. Disponível em Disponível em http://www.mec.gov.br Acessado em 05/05/2003.
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. No momento, este é ainda resultado do programa de capacitação docente e da expansão das atividades de pós-graduação da FCM, com a implantação de novos cursos de especialização e de dois mestrados. Em uma evidência das contradições que permeiam este processo de institucionalização da pesquisa, são marcantes as restrições dos órgãos de fomento, cujas exigências para financiamento, em especial no que se refere à produção científica, priorizam os grupos de pesquisa consolidados em detrimento dos emergentes. Estas limitações também se refletem no acesso às bolsas de iniciação científica.

Com o propósito de ampliar a inserção dos alunos em projetos de pesquisa, incentivando talentos entre estudantes de graduação e fortalecendo as linhas de pesquisas institucionais, a FCM tomou algumas iniciativas, como a instituição de horários livres no novo currículo em fase de implantação, a transferência de recursos atualmente aplicados em bolsas de monitorias para bolsas de iniciação científica e a criação do Programa de Apoio às Atividades de Iniciação Científica. Este programa, iniciado cm 2000 com os objetivos de qualificar e fomentar as atividades nessa área, oferece cursos introdutórios de metodologia científica e, desde 2001, mantém um sistema de acompanhamento e suporte que visa identificar e ajudar na solução de dificuldades relacionadas à realização dos projetos1111. Faculdadede Ciências Médicas, Universidade de Pernambuco (FCM/UPE). Projeto de Mudança Curricular do Curso de Medicina (Promed). Anexo IV. Recife, 2002..

Desse modo, torna-se particularmente importante caracterizar o desenvolvimento de pesquisas pelos docentes da FCM e do JCB, ressaltando aspectos relativos a acesso a financiamento, inserção de alunos de iniciação científica, produção científica, e motivações, expectativas e percepções dos obstáculos para concretização dessas atividades. Espera-se que este estudo contribua para identificar êxitos e fracassos deste processo de institucionalização da pesquisa, ampliando as chances de os sucessos se repetirem, diversificarem e multiplicarem.

MATERIAL E MÉTODO

Estudo descritivo, de corte transversal, censitário, realizado de março a setembro de 2002 na Faculdade de Ciências Médicas e no Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Pernambuco, com a participação de 246 professores e preceptores do total de 274 docentes que exercem suas atividades até o 9° período do curso médico. Os 28 professores que não participaram, representando 11,4% de perdas, estavam cedidos a outras instituições ou se aposentaram no período de operacionalização do trabalho de campo. O projeto foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de Pernambuco, de acordo com o parecer n° 080/01, emitido cm 20 de fevereiro de 2002. O trabalho foi desenvolvido respeitando os aspectos éticos estabelecidos por esse Comitê.

A coleta de dados foi feita por quatro estudantes de Medicina, como parte das atividades de iniciação científica, com a utilização de dois instrumentos: a) um questionário padronizado que abrangeu a titulação do docente, vínculo com a universidade, unidade e departamento de origem, participação em pesquisa, orientação na iniciação científica, número e fontes de financiamento dos projetos realizados e divulgação dos resultados; e b) um roteiro estruturado com perguntas abertas que permitiu uma aproximação das expectativas e motivações para orientar pesquisas e dos obstáculos para sua execução. Os dados referem-se à produção científica do período de janeiro de 1999 a agosto de 2002.

Na análise dos dados quantitativos foi realizada a distribuição de frequência absoluta e relativa por categorias de respostas das variáveis estudadas. As respostas às perguntas abertas foram submetidas às técnicas de análise de conteúdo preconizadas por Bardin1212. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.. Assim, foi realizada leitura cuidadosa para apreendes e mapear os "núcleos de sentido" emergentes. Os temas que convergiam para um significado comum, com base nos critérios de "homogeneidade interna", foram classificados em uma mesma categoria; simultaneamente, buscou se garantir que as diferenças entre as distintas categorias fossem nítidas e claras, isto é, que houvesse "heterogeneidade externa". Para aumentar a confiabilidade da avaliação, afinando as possíveis divergências de interpretação, recorreu-se ao trabalho de três avaliadores. A análise temática foi encaminhada para a conta­gem de frequência das unidades de significação, e estas variáveis dicotômicas foram introduzidas na matriz de dados construída com o programa Epi-info 6.04.

RESULTADOS

Dos docentes entrevistados, 74,4% eram professores, 23,6% preceptores e 2,0% professores de outras instituições (Tabela 1). Cerca de 81,3% pertenciam à Faculdade de Ciências Médicas, sendo a maior proporção constituída por professores e preceptores vinculados ao Departamento de Clínica Médica e ao Departamento Materno-Infantil. A inserção de docentes de outras instituições foi observada apenas nos Departamentos de Clínica Cirúrgica e Clínica Médica daquela unidade de ensino. Praticamente todos os docentes do Instituto de Ciências Biológicas eram professores, e a maior parte deles exercia suas atividades nos Departamentos de Patologia e Ciências Morfológicas.

TABELA 1
Distribuição dos docentes entrevistados segundo os Departamentos da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicas/UPE, Recife, 2002

A Tabela 2 mostra que 43,5% desses docentes eram do sexo feminino, delineando-se entre os preceptores uma predominância das mulheres (53,4%) em relação aos homens (46,6%). A distribuição etária estava concentrada entre 40 e 49 anos, mas era impor tante a participação do grupo de 50 a 59 anos. Em geral, aqueles com 60 e mais anos de idade eram professores. Cerca de 47,l% tinham título de especialista, muito mais freqüente entre os preceptores (79,3%), 34,5% de mestre, em uma proporção 3,5 vezes maior entre os professores (42,1%) quando comparados aos preceptores (12,1 %), e 14,2% de doutor, com quase todos fazendo parte do quadro de professores. Era constituído por professores o pequeno percentual dos que não cursaram pós-graduação.

TABELA 2
Sexo, idade e titulação dos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológícas/UPE, Recife, 2002

A Tabela 3 informa que 82,5% dos docentes já haviam participado de alguma pesquisa, em 51,2% das quais tinham sido incluídos alunos de iniciaçãocientífica, esta inserção foi maior nos projetos desenvolvidos pelos professores (68,4%) do que naqueles realizados pelo preceptores (42,5%) e docentes de outras instituições (50%). Aproximadamente79,0% dos que nunca participaram de uma pesquisa expressaram o desejo de vir a participar, mas uma importante parcela de professores deixou patente o desinteresse em relação a esta atividade.

TABELA 3
Experiência em pesquisa dos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicos/UPE, Recife, 2002

Quanto ao desenvolvimento de pesquisas pelos docentes entre janeiro de 1999 e agosto de 2002, 31,7% não participaram de nenhum projeto (Tabela 4). Entre os que participaram, observou-se maior proporção de professores (73,3%) quando comparados aos preceptores (50%) e do centes de outras instiuições. Os professors também realizaram maior número de pesquisas nesse período. Cerca de 48,8% incluíram alunos de iniciação científica, sendo mais comum esta inserção entre os professors (54,7%) em relação aos preceptors (24,1%). A maior parte desses projetos foram realizados no Hospital Universitário Oswaldo Crus, em especial no caso dos preceptores, e em outras instituições de ensino do estado, sobre tudo na Universidade Federal de Pernambuco. Os consultórios/laboratórios privados e o Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros constituíram também locais importantes para a realização de pesquisas.

TABELA 4
Desenvolvimento de projetos de pesquisas pelos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicas/UPE, de jan eiro de 1999 a agosto de 2002

Conforme a Tabela 5, 86,3% dos docentes identificaram algum tipode obstáculo à realização de pesquisas no período mencionado, entre os quais se destacaram: falta de financiamento, pouca disponibilidade de tempo, falta de colaboração da equipe e falta de infra-estrutura material. Apenas 30,8% desses projetos tiveram financiamento, com os professores informando maior acesso a fontes financiadoras (33,6%) do que os preceptores (20,7%) (Tabela 6). Entre as pesquisas financiadas, 28,3% contaram com duas ou mais fontes. A grande maioria dos professores recebeu financiamento do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq), do Fundo de Desenvolvimento à Pesquisa e à Extensão (FOPE/UPE) e da Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia de Pernambuco (Ficepe), enqunnto uma proporção maior de preceptores foi financiada pela indústria farmacêutica.

TABELA 5
Obstáculos identificados pelos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicas/ UPE para o desenvolvimento d os projetos de pesquisas, de janeiro de 1999 a agosto de 2002

TABELA 6
Fontes de financiainento dos projetos de pesquisa desenvolvidos, no período de janeiro de 1999 a agosto de 2002, pelos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicas/ UPE

O interesse científico constituiu a principal motivaão para o desenvolvimento de pesquisas, aparecendo em uma frequência 5,9 vez maior do que a segunda colocada, o enriquecimento do currículo (Tabela 7). O compromisso social foi citado por um pequeno número de professores. As expectativas frente às pesquisas estavam direcionadas principalmente para as possibilidades de fazer novas descobertas científicas e obter novos conhecimentos, inclusive sobre os métodos científicos. Os professores, em particular, também esperavam poder contribuir para o processo de transformação social e de melhoria dos serviços de saúde.

TABELA 7
Motivações e expectativas sobre o desenvolvimento de pesquisas pelos docentes da Faculdade de Ciências Médicas e Institut o de Ciências Bioló gicas/UPE, Recifo, 2002

Os projetos desenvolvidos tiveram seus resultados divulgados por meio da publicação (52,6%) e da apresentação de trabalhos (49,1%) (Tabela 8). Os trabalhos foram publicados, principalmente, em anais dos eventos científicos nacionais e, com freqüência bastante menor, em periódicos nacionais e internacionais. Apenas um trabalho foi publicado na internet. O meio mais utilizado de divulgação foi a apresentação em eventos científicos nacionais. Foi muito pequena a divulgação de resultados em eventos organizados para a comunidade.

TABELA 8
Distribuição da produção científica do período de janeiro de 1999 a agosto de 2002, segundo a forma de divulgação. Faculdade de Ciências Médicas e Instituto de Ciências Biológicas/UPE, Recife, 2002

DISCUSSÃO

Na comparação do perfil de titulação dos docentes do curso médico da Universidade de Pernambuco com os docentes de outras instituições de ensino da Região Nordeste, adquirem relevância à alta freqüência de especialistas e o pequeno número de mestres e doutores existentes nesta. A Universidade Federal de Pernambuco, por exemplo, possui, entre seus docentes efetivos, 46,7% de doutores, 34,3% de mestres e apenas 9,4% de cspecialistas1313. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Sobre a UFPE -Indicadores. Disponível em: Disponível em: http://www.ufpc.br Acessado em 15/02/2003.
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. Apesar do destaque, em 2001, da oferta de pós-graduação na faea médica no Brasil - cerca de 10% em relação aos programas recomendados pela Capes em todas as áreas44. Guimarães J. A Pesquisa Médica e Biomédica no Brasil. Comparações com o Desempenho Científico Brasileiro e Mundial. Ciência & Saúde Coletiva,9(2):303-327,2004, a implantação mais tardia de um plano de capacitação docente na UPE, associada a maior concentração das bolsas para pós-graduação strico sensu na Região Sudeste1414. Coordenação de Avaliação de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Avaliação dos Mestrados e Doutorados Reconhecidos. Disponível em: Disponível em: http://www.capes.gov.br Acessado em 08/10/2003.
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, certamente justifica esta defasagem. Como, nos últimos anos, muitos docentes vêm realizando cursos de mestrado e doutorado, em futuro próximo a UPE poderá contar com maior número de professores e preceptores titulados.

Embora quatro quintos dos docentes já tenham participado ao menos de um projeto de pesquisa, apenas a metade destes haviam incluído alunos de iniciação científica. A pequena participação de alunos mantém-se inalterada ao longo do tempo, revelando uma lacuna entre as atividades de investigação científica e a formação do futuro médico. A constituiçãu de grupos de pesquisas, ao invés de pesquisadores com produção individual, poderá ampliar na inserção de acadêmicos. Aqui desempenham papel fundamental os órgãos de fomento como um estímulo a mais aos alunos. A referência residual à formação do aluno/rcsidcnte como elemento que motivaria a realização de pesquisas,·em apenas reforçar a percepção de que professores e preceptores ainda não se deram conta de que esta atividade é parte fundamental do processo de formação do aluno. A idéia da dissociação entre ensino e pesquisa persiste quando parte dos professores que nunca participaram de qualquer pesquisa deixou clara a folta de interesse em vir a participar. É necessário destacar que o contexto institucional da UPE ainda prioriza as atividades assistenciais em detrimento da pesquisa. A falta de financiamento foi o principal obstáculo mencionado pelos docentes, o que é uma realidade para o País. Os recursos, além de insuficientes frente às necessidades, em grande parte estão desvinculados de um critério nicional de prioridades, sobretudo devido à desarticulação entre os financiadores principais77. Guimarães R. Bases para uma Política Nacional de Ciência, Tecnologia e lnovação em Saúde. Ciência &Saúde Coletiva, 9(2):375-387,2004. Além disso, freqüentemente os resultados das investigações não acarrelam, mudanças no sistema de saúde, havendo necessidade de maior integração entre pesquisadores e usuários dos resultados da pesquisa1515. Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Fomento à Pesquisa: Investimentos Realizados segundo as Instituições. Disponível em: Disponível em: http://www.cnpq.br/serviços/estatisticas/historicas.htm Acessado em 03/11/2004.
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. Assim, cerca de dois terços dos projetos de docentes da FCM não contaram com uma fonte financiadora. Há que levar em conta também o número reduzido de bolsas de produtividade em pesquisa, que constituem um estimulo ao docente, destinadas à Região Nordeste, cm relação a outras regiões do Brasil - das 7.461 bolsas oferecidas em 2000, o CNPq destinou, respectivamente, 8,94% e 70,94% às Regiões Nordeste e Sudeste1313. Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Sobre a UFPE -Indicadores. Disponível em: Disponível em: http://www.ufpc.br Acessado em 15/02/2003.
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A inadequada titulnção dos docentes, as deficiências na infra-cstrutura -como demonstra a crise dos hospitais de ensino no Brasil77. Guimarães R. Bases para uma Política Nacional de Ciência, Tecnologia e lnovação em Saúde. Ciência &Saúde Coletiva, 9(2):375-387,2004 -, a carência de grupos de pesquisa produtivos e de professores disponíveis para serem orientadores potencializam as dificuldades para obtenção de recursos. flustrnndo essa realidade, no período de 2001 a 2003, a Universidade de Pernambuco não aparece no ranking de investimento do CNPq no fomento de pesquisa, devendo ter sido incluída no grupo das 450 instituições que, reunidas, receberam 5% dos recursos. Paralelamente, a Universidade Federal de Pernambuco ocupa a 13a colocação, tendo recebido 1,74% do montante total aplicado1616. Universidade de Pernambuco -Resolução CEPE N° 021/95, datada em 07/12/1995.. Não por acaso, entre janeiro de 1999 e agosto de 2002, o Fundo de Desenvolvimento à Pesquisa e à Extensão1717. Coordenação de Avaliação de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Critérios de Avaliação: 15-Medicina. Disponível em: Disponível em: http://www.capes.gov.br/distribuicaoarquivo/avaliacao/arquivo/2000/criterios/2000 Acessado em 05/04/2003.
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órgão, da própria UPE, responde por 39,1% dos financiamentos, todos correspondendo a bolsas de iniciação científica.

A mais importante motivação para os docentes realizarem pesquisas foi o interesse científico, mas também foram citadas as intenções de enriquecer o currículo e alcançar reconhecimento no meio acadêmico. Estes dois últimos motivos podem estar sendo alimentados pelas atuais exigências dos órgãos financiadores e reguladores das políticas de ciência e tecnologia no País, a exemplo da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Superior) e do CNPq, que vêm estabelecendo um conjunto cada vez mais rígido de critérios para avaliar a produção científica nacional1818. Ministério da Educação-Secretaria de Educação Superior. Avaliação das Condições de Ofertas dos Cursos de Medicina, FCM/UPE, 1999. Pg. 86.. Assim, para avaliação da pós-graduação na área médica, a Capes estabelece a publicação trienal pelo corpo docente de cada curso de, no mínimo, três artigos em periódicos qualis A ou internacional. Há que considerar que alguns docentes que não estão vinculados à pós-graduação na UPE podem ler esta vinculação em outras instituições de ensino.

No que se refere à divulgação dos resultados das pesquisas realizadas no período abrangido neste estudo, cerca da metade dos trabalhos já foram publicados e/ou apresentados em eventos científicos. Os eventos científicos nacionais têm sido os principais locais utilizados para esta divulgação, por meio das publicações em seus anais ou das aprcsentações. A internet praticamente não é usada como meio de divulgação. Apesar das exigências crescentes das políticas públicas de ciência e tecnologia, acrescidas de novas reivindicações do Ministério da Educação quanto à classificação dos cursos médicos1919. Luckesi C, Barreto E, Cosma J, Baptista N. Fazer Universidade: Uma Proposta Metodológica. Capítulo II. Cortez Editora, 1996. Pgs. 29-44., a avaliação da produção científica do corpo docente da UPE no período de 1996 a 1998, realizada pelo Ministério da Educação através da Secretaria de Educação Superior, encontrou o valor de 0,54 produção científica por docente/ano. A submissão pela FCM e aprovação pela Capes de novos cursos stritos sensu acenam para o crescimento gradual da produççao científica de alguns grupos de pesquisa.

Apesar de tudo, de modo bastante otimista, é possível reconhecer o envolvimento da UPE no processo de construção de uma universidade moderna, cuja atuação seja pautada pelos ensinamentos de Jaspers apud Luckesi1919. Luckesi C, Barreto E, Cosma J, Baptista N. Fazer Universidade: Uma Proposta Metodológica. Capítulo II. Cortez Editora, 1996. Pgs. 29-44.

Ensinar é participar do processo de pesquisa. Só o homem voltado para à pesquisa pode realmente ensinar; do contrário, ele reduz seu trabalho a transmitir um pensamento inerte, mesmo sendo pedagogicamente ordenado, no lugar de comunicar a vida do pensamento.

Ou seja, de uma universidade mais próxima das aspirações daqueles que sabem, assim como Demo33. Demo P. Introdução à metodologia científica. 2a edição. São Paulo: Alias, 1987. e Freire22. Freire P. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998., que é preciso superar a monotonia da repetição parasitária, fazendo com que os alunos aprendam a andar com os próprios pés. Comprometida, portanto, com a preparação de profissionais capacitados para lidar com a excelência científica, a habilidade técnica e a dimensão relacional da prática médica.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Lampert JB. Formação Médica. ln: Lampert JB. Tendências de Mudanças na Formação Médica no Brasil. São Paulo: Hucitec,2002, p 31-62.
  • 2
    Freire P. Pedagogia da Autonomia: Saberes Necessários à Prática Educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1998.
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    Demo P. Introdução à metodologia científica. 2a edição. São Paulo: Alias, 1987.
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    Guimarães J. A Pesquisa Médica e Biomédica no Brasil. Comparações com o Desempenho Científico Brasileiro e Mundial. Ciência & Saúde Coletiva,9(2):303-327,2004
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    Comissão lnterinstiucional de Avaliação do Ensino Médico (CINAEM). Transformando a Educação Médica Brasileira: Projeto CJNAEM III Fase: relatório 1998.
  • 6
    Conselho Federal de Medicina (CFM). Perfil dos Médicos: A Formação Profissional dos Médicos. Jornal Conselho Federal de Medicina ·1997 ; 84 : 11-21.
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    Guimarães R. Bases para uma Política Nacional de Ciência, Tecnologia e lnovação em Saúde. Ciência &Saúde Coletiva, 9(2):375-387,2004
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    Venturelli J. Programas Educacionais Inovadores em Escolas Médicas: Capacitação Docente. Rev. Bras. Educ. Med. 2001; 25:7-21.
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    Facchini LA; Piccini RX; Santos RC. Aspectos Históricos e Conceitos em Educação Médica. Disponível em Disponível em http://www.infonct.com.br/camed/sys11dmin/download/arquivos Acessado em 27/11/2002.
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  • 11
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2005

Histórico

  • Recebido
    14 Nov 2003
  • Revisado
    17 Dez 2004
  • Revisado
    05 Jan 2005
  • Aceito
    11 Maio 2005
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