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Tabagismo no currículo da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

Tobacco education in the curriculum of the Mercy Hospital School of Medicine, São Paulo, Brazil

Resumos

Este trabalho avalia a inclusão da problemática do tabagismo no currículo da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) e investiga o envolvimento de alunos e professores de Medicina e Enfermagem em relação ao assunto. Coordenadores das disciplinas dos dois cursos dessa faculdade foram entrevistados sobre abordagem do tabagismo e engajamento pessoal no assunto. Pedimos que formulassem questões sobre tabagismo discutidas durante o curso. Entrevistamos 120 alunos do curso médico e 80 do curso de Enfermagem, aplicando-lhes as questões formuladas. Alunos dos dois últimos períodos dos dois cursos responderam, ainda, a perguntas sobre o trato com pacientes. Os resultados apontam suficiente carga horária destinada ao assunto, havendo disciplinas com aulas específicas sobre tabagismo e outras que abordam o assunto num contexto mais amplo. Os alunos tiveram êxito nos questionários, ficando claro que o assunto é abordado com competência. A maioria dos professores de Medicina tem contato com pacientes, mas um pequeno número questiona sobre o tabagismo, porém não orienta seus pacientes a abandoná-lo. Uma minoria dos professores de Enfermagem tem contato com pacientes, mas, quando tem, questiona e orienta seus pacientes sobre o assunto. Alunos dos últimos períodos dos dois cursos, na maioria das vezes, questionam sobre tabagismo, porém são inseguros quanto ao seguimento das orientações. Concluímos que os alunos formandos estão preparados para enfrentar os problemas referentes ao tabagismo, mas os professores estão pouco envolvidos.

Tabagismo; Prevenção primária; Escolas médicas


This study analyzes the inclusion of tobacco use in the curriculum of the São Paulo Mercy Hospital School of Medicine (FCMSCSP) and studies the involvement by medical and nursing students and faculty in this topic. Course coordinators from the two courses were interviewed on the approach to smoking and personal involvement in the issue. We asked them to draft questions on smoking as discussed during their courses. We interviewed 120 medical students and 80 nursing students. Patients from the last two semesters in the two courses were also asked about patient treatment. The findings point to a sufficient number of class hours on the subject, with some disciplines including specific classes on smoking and others approaching it within a broader context. The students answered the questionnaires successfully, demonstrating clearly that the topic is approached competently. Most of the medical school professors have direct contact with patients, but few ask about the smoking habit or orient their patients to quit. Few nursing professors have contact with patients, but when they do they provide patients with appropriate orientation. Most students from the last two semesters usually ask patients about smoking, but they are insecure about how closely their orientation is followed. We conclude that by the end of their undergraduate training students are ready to deal with smoking-related problems, but professors show limited involvement in the issue.

Smoking; Primary prevention; Schools, Medical


PESQUISA

Tabagismo no currículo da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

Tobacco education in the curriculum of the Mercy Hospital School of Medicine, São Paulo, Brazil

Marcio Henrique de Oliveira Mattos; Leticia Aparecida da Silva; Roberto Alexandre Franken

Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Roberto Alexandre Franken Rua Doutor Franco da Rocha, 163 - apto 52 Perdizes CEP. 05015-040 - São Paulo - SP E-mail: frankenr@terra.com.br

RESUMO

Este trabalho avalia a inclusão da problemática do tabagismo no currículo da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) e investiga o envolvimento de alunos e professores de Medicina e Enfermagem em relação ao assunto. Coordenadores das disciplinas dos dois cursos dessa faculdade foram entrevistados sobre abordagem do tabagismo e engajamento pessoal no assunto. Pedimos que formulassem questões sobre tabagismo discutidas durante o curso. Entrevistamos 120 alunos do curso médico e 80 do curso de Enfermagem, aplicando-lhes as questões formuladas. Alunos dos dois últimos períodos dos dois cursos responderam, ainda, a perguntas sobre o trato com pacientes. Os resultados apontam suficiente carga horária destinada ao assunto, havendo disciplinas com aulas específicas sobre tabagismo e outras que abordam o assunto num contexto mais amplo. Os alunos tiveram êxito nos questionários, ficando claro que o assunto é abordado com competência. A maioria dos professores de Medicina tem contato com pacientes, mas um pequeno número questiona sobre o tabagismo, porém não orienta seus pacientes a abandoná-lo. Uma minoria dos professores de Enfermagem tem contato com pacientes, mas, quando tem, questiona e orienta seus pacientes sobre o assunto. Alunos dos últimos períodos dos dois cursos, na maioria das vezes, questionam sobre tabagismo, porém são inseguros quanto ao seguimento das orientações. Concluímos que os alunos formandos estão preparados para enfrentar os problemas referentes ao tabagismo, mas os professores estão pouco envolvidos.

Palavras-chave: Tabagismo; Prevenção primária; Escolas médicas.

ABSTRACT

This study analyzes the inclusion of tobacco use in the curriculum of the São Paulo Mercy Hospital School of Medicine (FCMSCSP) and studies the involvement by medical and nursing students and faculty in this topic. Course coordinators from the two courses were interviewed on the approach to smoking and personal involvement in the issue. We asked them to draft questions on smoking as discussed during their courses. We interviewed 120 medical students and 80 nursing students. Patients from the last two semesters in the two courses were also asked about patient treatment. The findings point to a sufficient number of class hours on the subject, with some disciplines including specific classes on smoking and others approaching it within a broader context. The students answered the questionnaires successfully, demonstrating clearly that the topic is approached competently. Most of the medical school professors have direct contact with patients, but few ask about the smoking habit or orient their patients to quit. Few nursing professors have contact with patients, but when they do they provide patients with appropriate orientation. Most students from the last two semesters usually ask patients about smoking, but they are insecure about how closely their orientation is followed. We conclude that by the end of their undergraduate training students are ready to deal with smoking-related problems, but professors show limited involvement in the issue.

Key words: Smoking; Primary prevention; Schools, Medical.

INTRODUÇÃO

O tabagismo é descrito como a principal causa removível de doenças crônicas, tornando-se fundamental que precocemente os acadêmicos se tornem adeptos da cultura do não fumar, para, assim, ajudar na composição de uma nova comunidade sem o vício do cigarro. É indiscutível a importância do médico e da enfermeira no processo de abandono do tabagismo. Muitos trabalhos mostram que os profissionais de saúde reconhecem a morbidade e a mortalidade relacionadas ao fumo, mas, geralmente, orientam pouco ou nada seus pacientes a abandonar o tabagismo1-5. Entre estudantes de Medicina admite-se que a abordagem e o aprendizado referentes ao tabagismo são insuficientes6.

Estudo realizado no Canadá entre médicos internistas observou que, apesar de avaliar como importante o aprendizado e treinamento no manejo de pacientes tabagistas, a avaliação da preparação na escola médica foi muito baixa7. Entre estudantes de Enfermagem, a impressão é de que o tema é pouco abordado durante o curso de formação8. O treinamento desses alunos durante a graduação reverte em melhoria da qualidade da prevenção e do tratamento do tabagismo1. Discute-se ainda se este treinamento deve ser feito num módulo específico ou em diferentes disciplinas durante o curso.

OBJETIVOS

O presente trabalho tem por objetivo avaliar o nível de inclusão da problemática do tabagismo no currículo dos cursos de graduação em Medicina e Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) e investigar o quanto os alunos estão envolvidos com o tema, assim como avaliar o comportamento dos professores em relação ao assunto junto a seus pacientes.

MATERIAIS E MÉTODOS

Nossa casuística incluiu os professores coordenadores das disciplinas da FCMSCSP, 120 alunos do curso de Medicina e 40 alunos de Enfermagem. Usamos o método de questionários simples, aplicados diretamente pelos pesquisadores.

Foram entrevistados os professores coordenadores de cada disciplina dos cursos de Enfermagem e de Medicina para que tivéssemos uma base de como é formado e trabalhado o currículo da FCMSCSP em relação ao assunto. A entrevista foi aplicada com a utilização de uma carta endereçada aos professores na qual constava um texto - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - sobre a pesquisa e em que os pesquisadores se colocaram à disposição para maiores informações; e um questionário referente à abordagem do tabagismo em seu curso. Depois de responderem ao questionário, os professores eram convidados a redigir duas questões de sua disciplina que abordassem o tema tabagismo. Posteriormente, os pesquisadores aplicaram as questões sugeridas pelos professores juntamente com as questões predefinidas para o questionário de alunos.

Os alunos de Medicina e de Enfermagem foram divididos em subgrupos, sendo 20 de cada ano do curso de Medicina e 10 de cada semestre do curso de Enfermagem. Esses alunos foram escolhidos aleatoriamente, por sorteio com base na lista de presença cedida pela secretaria dos respectivos cursos. Foi requerido também aos alunos que preenchessem um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para que pudessem participar da pesquisa.

O questionário aplicado aos alunos era estruturado de tal forma que eles respondessem as questões referentes às disciplinas que já haviam cursado e ainda estavam cursando - ou seja, os alunos do primeiro ano (de Medicina) ou primeiro semestre (de Enfermagem) responderam só as questões de seu período; já os do quarto ano (ou semestre) responderam as questões respectivas a esse período e as dos anteriores (terceiro, segundo e primeiro). O sexto ano e o oitavo semestre responderam a todas as questões.

Foram excluídos os professores que não são coordenadores de disciplinas curriculares, assim como os alunos com matrícula "trancada", os quais não foram convidados a participar.

As notas atribuídas aos acertos dos alunos no questionário foram estratificadas em "ruim", "regular" e "ótimo", de tal maneira que fossem divididas em pesos equivalentes às quantidades totais de acertos em cada série. Por exemplo: para alunos do terceiro ano do curso de Medicina cujo questionário continha 17 questões, quem obteve de 0 a 6 acertos recebeu a classificação "ruim"; de 7 a 11; "regular"; e de 12 a 17, "ótimo".

O presente trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Santa Casa de São Paulo e teve apoio financeiro por meio de bolsa de iniciação científica Pibic/CNPq 2005/2006.

RESULTADOS

No curso de graduação em Medicina, existem 74 disciplinas, com um ou dois coordenadores responsáveis por cada uma delas. Todos receberam a carta, conforme descrito. Responderam professores de 65 disciplinas, o que representa 87,8% do total. Desses, 45 responderam que abordam o tabagismo, sendo que 39 o abordam num contexto maior, e apenas 6 disciplinas abordam especificamente o tema, ou seja, têm uma ou mais aulas dedicadas ao assunto. São elas: Embriologia II (segundo ano), Farmacologia II e Oftalmologia Geral (terceiro ano), Hematologia e Oncologia e Sistema Respiratório (quarto ano) e Emergências em Oftalmologia (sexto ano).

Entre as 45 disciplinas, a maioria dos coordenadores estima que o tabagismo é abordado por menos de uma hora durante seu curso. No curso médico sobre Epidemiologia I (primeiro ano), o coordenador estima que o aborda por mais de duas horas, assim como em Propedêutica II (segundo ano), Propedêutica III e Anatomia Patológica (terceiro ano), Hematologia e Oncologia, e Sistema Respiratório (quarto ano), no Internato do Departamento de Clínica Médica (quinto ano) e nas Emergências em Clínica Médica (sexto ano). Nas disciplinas Noções de Enfermagem e Primeiros Socorros (primeiro ano), Patologia Geral, e Propedêutica Ginecológica e Obstétrica (terceiro ano), a abordagem é estimada em 1 hora e 30 minutos.

Quando inquiridos sobre o trato com pacientes, 41 professores responderam que indagam sobre tabagismo; 2 responderam que não; 16 não têm contato direto com o paciente; e os outros não responderam a essa pergunta. Dos que perguntam sobre esse hábito, 25 estimam que isso dure menos de três minutos; 12, de 3 a 5 minutos; 3, de 5 a 10 minutos; e 1, mais de 10 minutos.

No curso de graduação em Enfermagem, existem 52 disciplinas. Responderam 42 professores, o que representa 84,6% do total. Desses, 15 responderam que abordam o tabagismo, sendo que 14 o abordam num contexto maior, e apenas uma disciplina aborda especificamente o tema, ou seja, tem uma ou mais aulas dedicadas ao assunto, que é o curso de Saúde Ambiental e Ecologia.

Entre as 15 disciplinas, 11 coordenadores estimam que o tabagismo é abordado por menos de uma hora durante seu curso. Em Enfermagem na Saúde da Criança e do Adolescente e em Primeiros Socorros, o coordenador estima que são dedicadas 1 hora e 30 minutos ao assunto. Em Saúde Ambiental e Ecologia e em Epidemiologia, o tema é abordado por mais de duas horas.

Quando inquiridos sobre o trato com pacientes, 9 professores responderam que indagam sobre tabagismo; nenhum respondeu que não indaga; 23 não têm contato direto com o paciente; e os outros não responderam a essa pergunta. Dos que perguntam sobre esse hábito, 3 estimam que isso dure menos de 3 minutos; 4, de 3 a 5 minutos; 1, de 5 a 10 minutos; e 1, mais de 10 minutos.

Em relação ao questionário proposto (Gráfico 1), dos 17 alunos do primeiro ano de Medicina que devolveram o questionário com 3 perguntas, 2 só acertaram 1, 14 acertaram 2, e só 1 acertou as 3. Dos 18 alunos do segundo ano, 1 não acertou nenhuma, 7 acertaram 2, 6 acertaram 3, e 4 acertaram 4 das 7 questões. Entre os 17 acadêmicos do terceiro ano, 1 acertou 6 questões, 2 acertaram 7, 3 acertaram 8, 6 acertaram 9, 3 acertaram 10, e 2 acertaram 11, das 17 propostas. Dos 15 alunos do quarto ano, 1 acertou 12, 1 acertou 15, 3 acertaram 16, 1 acertou 17, 2 acertaram 18, 2 acertaram 19, 4 acertaram 20, e 1 acertou 23 das 30 questões disponíveis. Dos 16 alunos do quinto ano, 1 acertou 16, 1 acertou 18, 2 acertaram 19, 3 acertaram 20, 1 acertou 22, 4 acertaram 23, 2 acertaram 24, e 2 acertaram 25 das 33 disponíveis. Dos 14 alunos do sexto ano, 2 acertaram 22, 4 acertaram 23, 1 acertou 24, 2 acertaram 25, 1 acertou 26 e 1 acertou 27 das 39 questões disponíveis.


Em relação aos acadêmicos do curso de Enfermagem (Gráfico 2), entre os 9 do primeiro semestre que devolveram o questionário que continha uma única pergunta, só 2 a acertaram. Dos 10 do segundo semestre, 3 acertaram 1, 2 acertaram 2, e 1 acertou as 3 questões disponíveis. Dos 9 alunos do terceiro semestre, 3 acertaram 4, 3 acertaram 5, e 3 acertaram 6 das 9 disponíveis. Dos 8 alunos do quarto semestre, um acertou 5, 4 acertou 6, 1 acertou 7, 1 acertou 8, e 1 acertou as 9 questões disponíveis. Dos 10 alunos do quinto semestre, 1 acertou 2 questões, 1 acertou 5, 3 acertou 6, e 5 acertaram 7 das 9 questões disponíveis. Dos 9 do sexto semestre, 4 acertaram 6 questões, 3 acertaram 7 questões, 1 acertou 8, e 1 acertou as 9 questões disponíveis. Dos 7 alunos do sétimo semestre, 2 acertaram 6, 3 acertaram 7, e 2 acertaram 8 das 9 questões disponíveis. Dos 8 alunos do oitavo semestre, 1 acertou 4, 1 acertou 6, 3 acertaram 7, e 3 acertaram 8 das 9 questões disponíveis.


Os alunos de quinto e sexto anos (do curso de Medicina) e de sétimo e oitavo semestres (do curso de Enfermagem) responderam, ainda, a questões sobre o trato com o paciente.

No quinto ano, dos 16 acadêmicos que responderam, 14 alunos afirmaram que sempre perguntam sobre tabagismo, 1 respondeu que pergunta dependendo do ambulatório em que está, e 1 respondeu que pergunta dependendo da doença que o paciente apresenta. Treze responderam que, quando o paciente é fumante, discutem o assunto com ele e o orientam em relação ao abandono, e 3 responderam que não. Nenhum deles achava que, quando dada, sua orientação era valorizada pelo paciente, 2 achavam que em geral era valorizada, 12 responderam que às vezes, e 2 achavam que nunca.

No sexto ano, dos 14 alunos que responderam, 13 assinalaram sempre perguntar sobre tabagismo, e 1 respondeu que quando se lembra. Nove responderam que, quando o paciente é fumante, discutem o assunto com ele e o orientam em relação ao abandono, e 5 responderam que não. Um deles achava que, quando dada, sua orientação era valorizada pelo paciente, 3 achavam que em geral era valorizada, 9 responderam que às vezes, e 1 achava que nunca.

No sétimo semestre, dos 7 alunos de Enfermagem que responderam, 6 afirmaram que sempre perguntam sobre tabagismo e 1 respondeu que dependendo do ambulatório. Seis responderam que, quando o paciente é fumante, discutem o assunto com ele e o orientam em relação ao abandono, e 1 respondeu que não. Um deles achava que, quando dada, sua orientação era valorizada pelo paciente, e 6 responderam que às vezes.

No oitavo semestre, dos oito acadêmicos que responderam, 6 revelaram que sempre perguntam sobre tabagismo, 1 respondeu que dependendo do ambulatório e 1 que dependendo da doença do paciente. Sete responderam que, quando o paciente é fumante, discutem o assunto com ele e o orientam em relação ao abandono, e 1 respondeu que não. Sete deles achavam que, quando dada, às vezes sua orientação era valorizada pelo paciente, e 1 achava que em geral era valorizada.

DISCUSSÃO

A importância do assunto pode ser avaliada pelo recente relatório do Subcommittee on Cessation of the Interagency Committee on Smoking and Health nos Estados Unidos, que publicou um plano de ação nacional para o abandono do tabaco que incluía recomendações para avaliação de clínicos quanto à capacidade de atender estes pacientes. Se houvesse necessidade, os médicos receberiam treinamento adequado9. Em 1992, o Instituto Nacional do Câncer nos Estados Unidos já havia proposto que se estabelecesse um currículo específico sobre tabagismo nas escolas médicas10.

O currículo que se procura estabelecer para a formação dos profissionais nas áreas da saúde é o de competências em diferentes áreas de atuação. A abordagem do tema tabagismo deveria, de acordo com estes grupos, ser desenvolvida em um módulo curricular. Geller et.al.11 analisaram 12 escolas com currículos específicos sobre o tema do tabagismo, propondo uma ação nacional no sentido de conseguir competências no trato do tabagismo.

Ao contrário, em nossa instituição o tema é abordado nas diferentes disciplinas ao longo do curso. Com base nas respostas dos professores, pode-se estimar que nos seis anos do curso de graduação em Medicina em torno de 28,5 horas de carga horária são usadas na abordagem do assunto. Para o curso de Enfermagem, estimam-se sete horas curriculares. Consideramos tais cargas horárias suficientes para a completa compreensão da problemática do tabagismo desde a farmacologia, epidemiologia, clínica até o tratamento.

Em relação ao comportamento dos professores de Medicina no contato com os pacientes e a problemática do tabagismo, observamos que 23 não têm contato com pacientes e 42 sim. Dos que responderam que têm contato com doentes, somente 9 perguntam sobre tabagismo (9%), o que consideramos pouco, indicando que profissionais mais antigos estão despreparados para a abordagem do tabagismo. Em relação aos professores do curso de Enfermagem, 23 não têm contato com pacientes, só 9 têm, e todos perguntam sobre tabagismo, o que pode sugerir maior envolvimento do enfermeiro.

Quanto aos alunos de quinto e sexto anos do curso médico e do sétimo e oitavo semestres do curso de Enfermagem, observamos que, na maioria das vezes, durante o atendimento os pacientes são inquiridos sobre o tabagismo e orientados a abandonar o hábito. Este fato indica treinamento e conhecimento adequados dos jovens profissionais.

Estratificamos as notas atribuídas aos acertos dos alunos no questionário em "ruim", "regular" e "ótimo", e com isso obtivemos os gráficos para cada série (Gráficos 1 e 2).

Percebemos que a grande maioria dos alunos do curso de graduação em Medicina obteve a nota "regular", o que consideramos um resultado esperado e satisfatório, havendo adequada preparação dos alunos frente a esse tema. Tanto que a maioria dos alunos de quinto e sexto anos, ao serem questionados, responderam que sempre perguntam sobre tabagismo no atendimento ao paciente e, se este for fumante, sempre discutem o assunto com ele (Tabela 1). Este fato não foi observado em estudo realizado entre alunos da Faculdade de Medicina da UFRGS entre 1995 e 199612 ou em escolas médicas dos Estados Unidos, onde foram observadas falhas no treinamento de estudantes13.

Essas diferenças com nossos resultados talvez se devam a que a problemática do tabagismo era menos discutida e divulgada em anos anteriores. Já no curso de graduação em Enfermagem, percebemos uma nítida transformação das notas, que melhoraram no decorrer do curso. Nos primeiros semestres, a nota predominante era "ruim", e nos últimos, "ótimo", sendo que nos semestres intermediários a maioria dos alunos obteve a nota "regular". Isto demonstra que o curso é devidamente estruturado em relação ao tema, levando a maioria dos alunos de sétimo e oitavo semestres a sempre perguntar sobre tabagismo no atendimento ao paciente, assim como, se este for fumante, sempre discutir o assunto com ele (Tabela 1).

Em ambos os cursos, a maioria dos alunos considera que somente às vezes sua orientação sobre o abandono ou tratamento do tabagismo é valorizada. Isto nos leva a crer que, apesar de bem estruturados, os cursos não proporcionam a devida segurança ao aluno para atuar como promotor de saúde na prevenção da problemática do tabagismo. Tal fato já havia sido constatado14 em estudo britânico segundo o qual isto se deve a problemas no treinamento dos alunos durante o curso15.

CONCLUSÕES

Nos cursos de graduação em Medicina e Enfermagem da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, dedica-se uma boa carga horária à problemática do tabagismo, e o aluno recebe formação relacionada ao tema. O assunto é discutido no decorrer do curso em diferentes disciplinas, indicando a universalidade do tema.

A maioria dos professores médicos não questiona sobre tabagismo no atendimento ao paciente, em contraste com o aluno da graduação, que quase sempre pergunta sobre ele. Isto pode se dever ao fato de que as novas gerações de médicos estejam se formando mais conscientes dessa problemática; ou pelo conceito clássico de tabagismo como fator de risco e não como doença primária; ou, finalmente, porque, com o passar do tempo, o profissional deixa de se interessar pelo problema, o que resulta em perda da sua capacidade de atuar como promotor de saúde.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Pibic/CNPq, pela bolsa de iniciação científica no período de 2005/2006. E também ao Núcleo de Apoio à Publicação da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (NAP-SC) pelo suporte técnico-científico à publicação deste manuscrito.

Recebido em: 23/11/2007

Reencaminhado em: 15/03/2008

Reencaminhado em: 26/03/2008

Aprovado em:31/03/2008

CONFLITO DE INTERESSES: Declarou não haver

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  • Endereço para correspondência:
    Roberto Alexandre Franken
    Rua Doutor Franco da Rocha, 163 - apto 52
    Perdizes
    CEP. 05015-040 - São Paulo - SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jun 2009
    • Data do Fascículo
      Mar 2009

    Histórico

    • Aceito
      31 Mar 2008
    • Revisado
      26 Mar 2008
    • Recebido
      23 Nov 2007
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