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Pró-Saúde e PET-Saúde: experiências exitosas de integração ensino-serviço

Pró-Saúde and PET-Saúde: successful experience in service learning integration

EDITORIAL

Pró-Saúde e PET-Saúde: experiências exitosas de integração ensino-serviço

Pró-Saúde and PET-Saúde: successful experience in service learning integration

É com satisfação que se apresenta, por meio da parceria estabelecida entre o Ministério da Saúde, a partir da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), e em parceria com os editores da Revista Brasileira de Educação Médica (Rbem), dois números especiais dedicados a artigos selecionados entre as experiências desenvolvidas pelo Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde) e pelo Programa de Educação pelo Trabalho em Saúde (PET-Saúde).

O Ministério da Saúde, por meio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES), e o Ministério da Educação, a partir da Secretaria de Educação Superior (Sesu), vêm formulando e desenvolvendo as políticas nacionais de educação superior e formação dos profissionais da saúde em progressiva articulação e integração.

O periódico The Lancet publicou, na sua edição de maio de 2011, um número especial com uma série de artigos exclusivos sobre a saúde no Brasil e os resultados, avanços e desafios do Sistema Único de Saúde (SUS). Os editores daquela publicação introduzem o assunto relatando que, desde janeiro deste ano, o País foi assumido por um novo governo que tem no seu comando, pela primeira vez, uma mulher, a presidente Dilma Rousseff. Fazem referência à posição de destaque que o Brasil assumiu, passando para a a ser a quinta economia do mundo, com uma taxa de crescimento econômico que atingiu 7,5% no ano passado. O editorial menciona que em 1989 o Brasil era um dos países com maior desigualdade no mundo e que, nas duas últimas décadas, o SUS melhorou sensivelmente o acesso da população à atenção primária à saúde e ao atendimento de urgência e emergência.

Nesse mesmo periódico, Almeida-Filho (2011) escreve sobre Educação Superior e Saúde no Brasil. O autor cita que a força de trabalho em saúde no Brasil é composta por 1,5 milhão de trabalhadores, a maioria deles com vínculo no serviço público (52% dos enfermeiros, 44% dos médicos, 27% dos dentistas, 11% dos farmacêuticos e 10% dos psicólogos). Cita também que são oferecidos no País 3.493 cursos de graduação na área da saúde, dos quais 185 cursos são de Medicina, com 97.994 estudantes matriculados. O autor fala dos desafios e dificuldades enfrentadas para a formação na saúde no Brasil e menciona como importantes fatores de superação: o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), que aproxima a educação superior no Brasil das diretrizes estabelecidas pelo Processo de Bolonha e dobra o número de vagas públicas no ensino superior, entre outros; e o Programa Nacional de Reorientação da Formação Profissional em Saúde (Pró-Saúde), que investe na reorientação da formação para atender às demandas do SUS por profissionais de saúde com formação mais humanista, socialmente comprometida, orientada ao conceito ampliado de saúde, com foco na atenção primária.

Decorridos seis anos do processo de implantação do Pró-Saúde e três anos da implementação do Programa de Educação pelo Trabalho em Saúde (PET-Saúde), é possível identificar que há efetivamente um processo de mudanças que estão ocorrendo nos cursos de graduação na área da saúde e nos serviços nela envolvidos em todo o País. Isso tem-se refletido na massiva apresentação de trabalhos nos congressos científicos das áreas, na publicação de artigos resultantes das experiências desenvolvidas e da reflexão sobre eles.

Foi aberto e divulgado amplamente entre os projetos um convite para a apresentação de trabalhos. Foram apresentados 186 artigos, o que demonstra a necessidade de buscarmos ampliar os espaços de publicação para que os registros, a troca de experiências e lições aprendidas possam ser compartilhados em uma ação articulada entre ensino, pesquisa e extensão.

Os artigos apresentados são elaborados não apenas por docentes das universidades que participam dos referidos programas, mas contam também com amplo envolvimento dos alunos de graduação e dos profissionais dos serviços. Foram analisados 186 trabalhos, incluindo 14 áreas profissionais relacionadas com o setor da saúde (Medicina, Enfermagem, Odontologia, Farmácia, Nutrição, Psicologia, Fisioterapia, Educação Física, Terapia Ocupacional, Serviço Social, Biomedicina, Fonoaudiologia, Biologia e Medicina Veterinária). A leitura atenta desse material, que alcançou quase 2.000 páginas, representou uma tarefa significativa, que foi suavizada pelo valor das contribuições apresentadas, gerando um reconhecimento do êxito e a validação dessa experiência inovadora, que se vem consolidando no cenário educacional brasileiro.

Entre os temas metodológicos, que constituíram grande parte dos trabalhos, os aspectos relativos ao processo de ensino-aprendizagem, incluindo avaliação, aprendizagem, o trabalho multiprofissional e a intersetorialidade foram muito frequentes. O interesse por essa temática, que poderia ser considerado natural por tratar-se de um programa de caráter educacional, pode ser também atribuído ao reconhecimento da importância dessa iniciativa em apoio a uma melhor formação profissional, especialmente tendo em vista as observações referidas, em geral amplamente favoráveis na maioria dos trabalhos apresentados. Reforçam essa suposição os trabalhos adicionais, que tratam do acolhimento de pacientes e humanização da atenção, grupos etários (infância, adolescência e idosos), problemas socioculturais e participação social, e que também refletem o grau de interesse despertado para o objetivo central do programa, que visa a uma maior qualificação da atenção básica de saúde.

Em outros estudos, os autores se propuseram a analisar comparativamente a resolubilidade dos programas de Saúde da Família (ESF) em que estavam inseridos com o atendimento das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e puderam observar, em primeiro lugar, um atendimento quase três vezes maior na primeira instância (por aceitarem o atendimento não agendado) e a comprovação de que a referência de pacientes para outros serviços foi 67% menor nas Unidades de Saúde da Família do que nas UBS, sinalizando a melhor resolubilidade do modelo de atenção da Estratégia de Saúde da Família (ESF) em comparação a outros de Unidades Básicas de Saúde que não a implementaram. Destacando a busca de maior eficiência da atenção primária, outro grupo realizou um estudo da abordagem de agravos evitáveis e internações desnecessárias, que podem ser atendidas no nível da atenção primária.

Uma iniciativa que merece igualmente um destaque especial foi apresentada por um grupo que, com vistas à análise dos problemas a serem enfrentados, criou uma sala de situação para observar como estava o acompanhamento da população e pensar várias formas de melhorá-lo com o planejamento adequado, a promoção da saúde e a prevenção de doenças, assegurando, dessa forma, não só a prática assistencial, mas também uma boa orientação da saúde pública.

Em uma abordagem mais ampla dos determinantes sociais da saúde, algumas pesquisas enfocaram o estudo da caracterização de risco familiar, ressaltando elementos como situação financeira, condições de habitação, educação, hábitos culturais correlacionados à disponibilidade de serviços adequados às suas necessidades, tendo por base levantamentos realizados com os agentes comunitários de saúde, o que permitiu apontar riscos que não haviam sido detectados e a importância de uma maior atenção do estado de saúde-doença dos indivíduos. Em outra abordagem, relacionada aos agentes comunitários (ACS), foram analisados os fatores de risco a que eles estariam expostos, com o objetivo de sua superação e de aumentar a motivação e valorização desses profissionais, possibilitando maior aproximação com a realidade e um melhor aprendizado das práticas nesse nível.

Um estudo chegou a integrar 1.400 estudantes das diversas profissões da saúde em uma rede de 37 serviços da área, buscando planejar a articulação das matrizes curriculares, a melhor compreensão do papel de cada uma das profissões para a integralidade do cuidado, a promoção de encontros de formação coletiva e alcançar um trabalho mais efetivo da equipe multiprofissional, contribuindo para a melhoria dos indicadores de saúde da população.

Foi identificado que a gestação não planejada, não só atribuída a fatores sociais, como também à deficiência de programas de educação para a saúde, é um problema recorrente e frequente nos serviços de saúde do SUS. A partir dessa análise, foram desenvolvidos programas de orientação afetivo-sexual e reprodutiva para adolescentes, promovendo melhor utilização de métodos contraceptivos.

Na abordagem de doenças específicas, predominaram os estudos relativos à hipertensão e diabetes, tendo sido frequente a detecção de pouca ou nenhuma preocupação preventiva pelos pacientes, que, em geral, buscam essencialmente os tratamentos farmacológicos. Em vários estudos foi possível demonstrar alta incidência da obesidade e sobrepeso como fatores de risco, contribuindo inclusive para uma maior mortalidade. Diante dessa situação, procurou-se em vários trabalhos uma melhor compreensão da atitude dos usuários, usualmente causada por desconhecimento, daí resultando a reorientação do processo assistencial com maior humanização e preocupação especial com a realidade de cada paciente. É interessante destacar a conclusão de um dos estudos que indicou não ser suficiente apenas aconselhar novos hábitos alimentares, sendo necessário abordar aspectos subjetivos, culturais e emocionais que influenciam na adesão ao tratamento e no autocuidado.

Em pesquisas relacionadas com doenças infectoparasitárias, foram analisados aspectos relativos às patologias específicas, assim como a fatores culturais, sociais e psicológicos, como elementos importantes de controle e disseminação das doenças. Entre os estudos epidemiológicos descritos, predominaram verminose, hanseníase, dengue e hepatite A. No caso da hanseníase, foram intensificadas as ações de busca, triagem populacional de manchas suspeitas e realização de campanhas de sensibilização da comunidade para uma maior autovigilância. Em relação à dengue e à hepatite, foram propostos estudos do déficit de saneamento básico associados à conscientização da população, para a quebra da cadeia de transmissão dessas doenças.

Algumas iniciativas internacionais recentes, promovidas por fundações e/ou organismos multinacionais (como a própria OMS), tomando em conta a comemoração do centenário do Relatório Flexner, vêm promovendo estudos e debates visando a uma possível reorientação da formação de pessoal da saúde, em um processo designado como "Transformative scale-up of Educationof Health Personnel". Entre as recomendações desses grupos, destaca-se a necessidade de que se tome em conta iniciativas com base em evidências que permitam assegurar sua possível adequação. O fato, entretanto, de que esse tipo de iniciativa, com vistas a superar os esquemas tradicionais vigentes, envolve necessariamente importantes abordagens inovadoras, em grande medida representa um obstáculo ao prévio registro de evidências e obriga a aceitar maior flexibilidade nesse prejulgamento das soluções adotadas.

No caso em tela, consideramos as opiniões emitidas pelos trabalhos apresentados como uma evidência importante da força indutiva da presente experiência educacional que vem sendo promovida pelo governo brasileiro, resultando em uma boa indicação do sucesso dessa programação e favorecendo a sua continuidade e permanente aperfeiçoamento. O ano recém-terminado (2010), que corresponde à etapa de realização desses trabalhos, ao tempo que marca os 100 anos do Relatório Flexner, registra igualmente o acerto dessa experiência que abre novos horizontes para a formação da força de trabalho em saúde, mostrando já em estágio avançado de desenvolvimento o que as iniciativas internacionais referidas no parágrafo anterior estão ainda procurando delinear.

José Roberto Ferreira

Ana Estela Haddad

Sigisfredo Luiz Brenelli

Geraldo Cunha Cury

Rosana Fiorini Puccini

Milton de Arruda Martins

Francisco Eduardo Campos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Ago 2012
  • Data do Fascículo
    Mar 2012
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