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Currículo Orientado por Competência para a Compreensão da Integralidade

Curricula Oriented According to Competencies and Students’ Understanding of Integrality

RESUMO

Esta pesquisa avalia como o currículo de uma faculdade do interior paulista contribui para a compreensão da integralidade pelos estudantes das duas primeiras séries dos cursos de Enfermagem e Medicina, estruturados conforme as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). Esta compreensão é importante desde as séries iniciais para avançar do modelo biomédico para o biopsicossocial. Trata-se de um estudo de caso educacional qualitativo, realizado por meio de entrevista com quatro perguntas abertas: 1.Qual a sua compreensão sobre integralidade e necessidades de saúde?2.Como você entende o ser humano após um/dois ano(s) de experiência na Famema?3. Como as atividades das Unidades, Educacional Sistematizada (UES) e de Prática Profissional (UPP) têm contribuído para sua compreensão do que são necessidades de saúde?4. Como as atividades das UES e UPP têm contribuído para o seu entendimento de cuidado à pessoa na perspectiva da integralidade? A interpretação dos resultados foi realizada pela técnica de Análise de Conteúdo, na modalidade temática. Essa análise possibilitou a organização de cinco categorias temáticas: compreensão parcial de integralidade e Necessidade de Saúde (NS)- compreendem integralidade como um dos princípios do SUS e um conceito importante para abordar na faculdade e na pesquisa; compreensão de integralidade além do princípio do Sistema Único de Saúde- referem aos aspectos biológicos, psicológicos e sociais da pessoa e à influência do meio ambiente como promotor do processo saúde-doença; entendimento biopsicossocial do ser humano- que aborda o entendimento do ser humano após o tempo de experiência na Famema, tanto da Problematização quanto da ABP; entendimento fragmentado do ser humano- evidencia que eles não entendem o ser humano na sua totalidade, de acordo com o esperado para um profissional de saúde; e contribuição teórica das atividades desenvolvidas na Unidade Educacional Sistematizada e prática das atividades da Unidade de Prática Profissional- revelaram também o que apreenderam na articulação e na complementaridade entre os cenários e descreveram que a UES contribui prioritariamente com a teoria e a UPP da mesma maneira com a prática do cuidado a partir das NS da população. Esse resultado indica que a organização curricular propicia a formação de profissionais segundo o perfil preconizado pelas Diretrizes Curriculares Nacionais, mas, demonstra também dificuldades de entendimento sobre integralidade, NS e ser humano, resultado perfeitamente compreensível, visto que a população estudada se encontra nas séries iniciais dos cursos.

Aprendizagem Baseada em Problemas; Currículo; Educação Baseada em Competências; Educação Médica; Educação em Enfermagem; Assistência Integral à Saúde

ABSTRACT

This research evaluates how the curriculum of a university in the interior of São Paulo contributes to the comprehension of integrality by the students of the first and two series of Nursing and Medicine courses, structured according to the National Curricular Guidelines (DCN). This understanding is important since the initial series to advance from the biomedical model to the biopsychosocial. This is a qualitative educational case study, carried out through an interview with four open questions: 1. What is your understanding of integrality and health needs? 2. How do you understand the human being after one / two year (s) experience in Famema? 3. How have Unit, Systematized Educational (UES) and Professional Practice (UPP) activities contributed to their understanding of what health needs are? 4. How have the activities of the UES and UPP contributed to their understanding of care for the person in the perspective of integrality? The interpretation of the results was performed by the Content Analysis technique, in the thematic modality. This analysis allowed the organization of five thematic categories: partial comprehension of integrality and Health Need (NS) — comprehend integrality as one of the SUS principles and an important concept to approach in the faculty and research; Comprehension of integrality beyond the principle of the Unified Health System — refer to the biological, psychological and social aspects of the person and to the influence of the environment as promoter of the health-disease process; Biopsychosocial understanding of the human being — that approaches the understanding of the human being after the time of experience in Famema, of both Problematization and PBL; Fragmented understanding of the human being — shows that they do not understand the whole human being, as expected for a health professional; And theoretical contribution of the activities developed in the Systematized Educational Unit and practice of the activities of the Professional Practice Unit — also revealed what they learned in the articulation and complementarity between the scenarios and described that the UES contributes primarily to theory and UPP in the same way with The practice of care from the NS of the population. This result indicates that the curricular organization provides the training of professionals according to the profile recommended by the National Curricular Guidelines, but also demonstrates difficulties of comprehension about integrality, NS and human being, a perfectly understandable result, since the studied population is in the initial series of Courses.

Problem-Based Learning; Curriculum; Competency-Based Education; Medical Education; Nursing Education; Comprehensive Health Care

INTRODUÇÃO

Os currículos da maioria das escolas médicas em nosso país são tradicionais, divididos em ciclos. Os estudantes são preparados por meio de aulas elaboradas pelo professor, que escolhe os conteúdos sem a preocupação de articulá-los com outras disciplinas do curso. Essa formação tem contribuído para a evolução no tratamento e cura de muitas doenças, mas ainda há necessidade de refletir sobre os problemas dessa organização curricular, evidenciados por queixas cada vez mais frequentes dos pacientes aos profissionais, que não atendem às reais necessidades daqueles11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.. Considerando a importância desta mudança, as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) propõem um currículo integrado, orientado por competência profissional, e a utilização de processos de ensino-aprendizagem ativos, centrados no estudante22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38,33. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11..

Em consonância com as DCN, os projetos pedagógicos dos cursos de Medicina e Enfermagem da Faculdade de Medicina de Marília (Famema) são organizados neste formato. O currículo é integrado e orientado por competência profissional. Os processos de ensino-aprendizagem são desenvolvidos prioritariamente por meio da Aprendizagem Baseada em Problema (ABP) e Problematização. Neles, há a participação ativa dos estudantes, que constroem os próprios conhecimentos com base na vivência em cenários de prática profissional44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...
. Deste modo, os cursos visam à formação do profissional: generalista, humanista, crítico e reflexivo, qualificando-o para o exercício com base no rigor científico e intelectual; pautado em princípios éticos; capaz de conhecer e intervir sobre as situações/problemas de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, identificando as dimensões biopsicossociais; com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38. Em Medicina, desde 2014, no que se refere à atenção à saúde, o estudante deve considerar, no desenvolvimento de todas as atividades, “a diversidade biológica, subjetiva, étnico-racial, de gênero, orientação sexual, socioeconômica, política, ambiental, cultural, ética e demais aspectos que singularizam a pessoa ou o grupo social”33. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11.(p. 21).

A Lei Orgânica de Saúde refere-se à integralidade como princípio do Sistema Único de Saúde (SUS), entendido como um conjunto articulado das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, em todos os níveis de complexidade do sistema88. Brasil. Presidência da Republica. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Diário Oficial União, Brasília (DF); 20 set 1990, Seção 1: p.18055.. A integralidade é polissêmica e polifônica, e pode ser compreendida como uma possibilidade de ampliar o cuidado, propiciando o replanejamento do sistema de saúde e sua estrutura, incluindo a organização de suas práticas cotidianas. Portanto, ela projeta a imagem da assistência à saúde desejada pelos profissionais e pela população em sua concepção. Nesse sentido, a integralidade vem sendo compreendida como prática social resultante da relação profissional-paciente, prática da boa medicina e organização do processo de trabalho por meio de políticas especiais para responder a problemas de saúde das pessoas. Assim, a integralidade pode ser exercida numa relação atenta em escutar a subjetividade do outro, aliada ao atendimento de necessidades de saúde múltiplas88. Brasil. Presidência da Republica. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Diário Oficial União, Brasília (DF); 20 set 1990, Seção 1: p.18055.

9. Soares MOM, Higa EFR, Passos AHR, Ikuno MRM, Bonifácio LA Mestieri CP, et al. Reflexões contemporâneas sobre anamnese na visão do estudante de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014; 38(3):314-22.

10. Luz MT. Fragilidade social e busca de cuidado na sociedade civil hoje. In:Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco; 2013. p. 11-22.

11. Guizardi FL, Stelet BP, Pinheiro R, Ceccim RB A formação de profissionais orientada para a integralidade e as relações político-institucionais na saúde: uma discussão sobre a interação ensino-trabalho. Rio de Janeiro: CEPESC: ABRASCO; 2011. p. 153-77.

12. Albuquerque PC, Stotz EM. A educação popular na atenção básica à saúde no município: em busca da integralidade. Interface Comun Saúde Educ. 2004; 8(15):259-74.

13. Junqueira MFPS. [Resenha] Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(3):784-5.
-1414. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudanças na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade Cad Saúde Pública.2004;20(5):1400-10., que podem ser entendidas como autonomia, vínculo, boas condições de vida e acesso à tecnologia1515. Cecílio LCO. As necessidades de saúde como conceito estruturante na luta pela integralidade e equidade na atenção em saúde In Pinheiro R, Mattos RA, organizadores Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde Rio de Janeiro: ABRASCO; 2001.p.113-26..

A visão biopsicossocial do ser humano, que é histórico, único e constituído por mente, corpo e o seu contexto11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010., é o ponto de partida, a nosso ver, para o cuidado na perspectiva da integralidade.

Ainda nas DCN do curso de Medicina promulgadas em 2014, a integralidade pode ser desenvolvida por meio do trabalho interprofissional, com a realização de projetos terapêuticos compartilhados, considerando a liberdade e a dignidade humanas para além das necessidades de saúde33. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11..

Esta pesquisa busca compreender como o currículo organizado por competência profissional e desenvolvido pelas Unidades de Prática Profissional (UPP) e Unidade Educacional Sistematizada (UES) contribui para a compreensão da integralidade pelos estudantes das duas primeiras séries dos cursos da Famema.

A palavra competência remete a capacidade, aptidão, habilidades articuladas com mobilização de recursos cognitivos psicomotores e afetivos de modo circunstancial para a resolução de problemas complexos. O ensino fundamentado no desenvolvimento de competência profissional parte do mundo do trabalho e volta ao ponto de partida com a intenção de transformá-lo. Portanto, sua organização curricular difere da tradicional11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.

2. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38

3. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11.
-44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.,1616. Mattos RA. A integralidade na prática (ou sobre a prática da integralidade) Cad Saúde Pública. 2004; 20(5):1411-6..

Na Famema, os processos de ensino-aprendizagem ativos (ABP e Problematização) estão em consonância com as exigências da formação profissional. Tais processos incentivam a busca de informações e o trabalho em equipe e em pequenos grupos. Com isso, proporcionam a análise crítica das fontes consultadas, o que desenvolve a habilidade dos estudantes em avaliar a si e colegas quanto ao desenvolvimento de sua aprendizagem. Além disso, reconhecem a importância da inter-relação nesta construção44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.,55. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014., 1717. Tonhom SFR, Higa EFR, Pinheiro OL, Hafner MLMB, Moreira HM, Taipeiro EF, et al. Indicadores de Avaliação do Cuidado Individual Rev Bras Educ Méd 2014;38(3):331-6..

Aprendizagem Baseada em Problema

Na Famema, a ABP parte de problemas ou situações simuladas que têm o propósito de gerar dúvidas, desequilíbrios ou perturbações intelectuais, e o professor é o provocador do raciocínio do estudante, a fim de possibilitar interações ativas que promovam a aprendizagem significativa. Desta forma, os estudantes utilizam diferentes processos mentais e assumem a responsabilidade por seu aprendizado. A ABP apresenta problemas definidos antecipadamente ao professor-tutor, que deve dar sequência à discussão dos problemas para o alcance dos objetivos também predefinidos44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...
.

Os passos desenvolvidos por essa instituição no processo tutorial11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.,44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
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estão apresentados a seguir (adaptado de Tsuji e Silva11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.).

P1 – Apresentação do problema

Consiste em leitura individual e/ou grupal para que os participantes tomem ciência dos dados do problema. As informações devem ser retidas na memória de cada participante, condição básica para a participação ativa na discussão11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P2 – Esclarecimento de dúvidas e dos termos desconhecidos11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.

P3 – Definição e resumo dos dados do problema com identificação de áreas/pontos relevantes

Deve ser realizado por um estudante, sem consultar os apontamentos. Se necessário, com o auxílio dos colegas. Serve para certificar se os estudantes apreenderam os dados do problema, condição indispensável às etapas posteriores11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P4 – Chuva de ideias ou brainstorming

É o momento em que todos devem expressar as suas ideias sobre o problema em 10 a 15 minutos. Não deve haver preocupações quanto às ideias serem certas ou erradas11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P5 – Análise do problema e identificação das lacunas de conhecimento

É o momento de confirmar ou excluir as ideias elencadas no P4, utilizando as experiências e conhecimentos prévios. Os recursos que faltarem para confirmar ou excluir essas ideias são as lacunas de conhecimento ou dúvidas. Geralmente, a articulação interdisciplinar e o reconhecimento das necessidades de saúde começam neste passo11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P6 – Elaboração das questões de aprendizagem e discussão da estratégia de busca de informações

A questão de aprendizagem (QA) pode ser básica (Anatomia, Fisiologia, Bioquímica, Histologia, etc.) ou estruturada (questão com articulação interdisciplinar), sempre relacionada ao problema em discussão. A qualidade da QA influi positiva ou negativamente na construção do conhecimento. Daí a importância de discutir a estratégia de busca de informação visando fontes diferenciadas e confiáveis11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P7 – Avaliação crítica dos artigos e estudo individual

Após a busca de informações, procede-se à avaliação crítica (validade, importância e aplicabilidade) do artigo e ao estudo individual. A prática repetida deste passo contribui para o desenvolvimento da capacidade de atualização, autoaprendizagem, reflexão e crítica11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P8 – Compartilhamento de informações obtidas e aplicação na resolução do problema

Ao compartilhar os resultados do estudo individual, deve ser mencionada a fonte, título do artigo, periódico, título do livro, edição, capítulo e nome dos autores. Este passo proporciona o desenvolvimento da capacidade de síntese, comunicação clara, objetiva e argumentação. Além disso, contribui para desenvolver a ética, liderança, aplicação dos recursos adquiridos, fazer e receber críticas. Os conhecimentos adquiridos devem ser compartilhados de maneira sintética, clara e objetiva, sem consultar os apontamentos, visando à resolução do problema11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

P9 – Avaliação do trabalho do grupo e de seus membros

O objeto da avaliação é a competência profissional. Pode começar por qualquer participante até mesmo pelo tutor. Esta atividade favorece também o desenvolvimento da capacidade de observação, de pensar, refletir, sintetizar, comunicar, fazer e receber críticas11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010..

Problematização

A Problematização é desenvolvida por meio do ciclo pedagógico, constituído das seguintes etapas: vivência da prática (confronto experiencial); síntese provisória; busca qualificada de informações; nova síntese11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.,44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...
. Além do que foi citado no ciclo pedagógico da Famema44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008., esta pesquisa considera as três primeiras etapas (confronto experiencial, síntese provisória e elaboração de QA) como momentos ricos para a identificação das NS, como ilustra a Figura 1.

FIGURA 1
Ciclo pedagógico – Problematização na Famema Discussão em Grupo

Essa figura representa o caminho que o estudante percorre para o desenvolvimento da aprendizagem, constituído por: confronto experiencial, que é a vivência da prática e se caracteriza pelo encontro dos estudantes com a realidade; síntese provisória, realizada ao término das tarefas e na qual o estudante reflete sobre a prática vivenciada. Esta reflexão lhe permite elaborar uma primeira síntese, utilizando os conhecimentos prévios e lacunas de conhecimento. A partir daí, os estudantes formulam hipóteses e elaboram questões de aprendizagem. Partem, então, para a busca qualificada de informações para fundamentar a prática. Esta etapa consiste no estudo individual, que requer pensamento reflexivo, utilização de critérios científicos e fontes bibliográficas confiáveis44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
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. Então, os estudantes realizam a nova síntese, que se caracteriza pela reflexão acerca da prática, com o intuito de transformá-la (movimento de ação-reflexão-ação)1818. Freire P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. 47ª ed. São Paulo: Paz & Terra; 2013..

Ainda constituem ações educativas da Famema: a organização dos currículos dos dois cursos, que são integrados, orientados por competência profissional, e os estudantes da primeira e segunda séries realizam as mesmas tarefas44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
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,1717. Tonhom SFR, Higa EFR, Pinheiro OL, Hafner MLMB, Moreira HM, Taipeiro EF, et al. Indicadores de Avaliação do Cuidado Individual Rev Bras Educ Méd 2014;38(3):331-6.. Os currículos estão estruturados em unidades educacionais longitudinais: a UES e a UPP. A primeira é implementada pela ABP, e a segunda, pela Problematização. Há, também, a unidade educacional eletiva a partir da segunda série dos cursos44. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.
-77. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...
.

OBJETIVOS

Frente ao exposto, os objetivos desta pesquisa são: avaliar a contribuição da UPP e da UES no currículo orientado por competência profissional para a compreensão da integralidade pelos estudantes das duas primeiras séries dos cursos da Famema, caracterizar a compreensão dos estudantes sobre integralidade, necessidades de saúde e ser humano, e descrever como a UES e a UPP contribuem para essa compreensão.

MÉTODO

Considerando os aspectos éticos da pesquisa, que envolve seres humanos, o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Famema sob o parecer consubstanciado número 411.396, atendendo às Resoluções 196/96 e 466/13 do Conselho Nacional de Saúde1919. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União, Brasília (DF); 16 out 1996. Seção 1: 21082.,2020. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União, Brasília (DF); 13 jun 2013. Seção 1: 59.. Trata-se de um estudo de caso educacional2121. Lüdke M, André MED. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU; 1986.,2222. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3.ed. Porto Alegre: Bookman; 2005.. com abordagem qualitativa, que discute a investigação particular de um programa, uma instituição, uma turma ou entidade social. É ideal para investigação de problemas práticos e muito utilizado nas ciências sociais como estratégia de pesquisa2121. Lüdke M, André MED. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU; 1986.,2222. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3.ed. Porto Alegre: Bookman; 2005..

A pesquisa foi realizada nas dependências do Complexo Famema. Foram selecionados 20 estudantes dos cursos de Medicina e Enfermagem de um universo de 240 por sorteio simples, que respeitou a distribuição de cinco estudantes por série. Destes, 50% eram estudantes do curso de Medicina e 50% do curso de Enfermagem. Os selecionados foram convidados pessoalmente e entrevistados no final da primeira e segunda séries, respectivamente. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista semiestruturada com as seguintes questões abertas2323. Minayo MCS. O desafio da pesquisa social. In: Minayo MCS, organizadora, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32.ed. Petrópolis: Vozes; 2012. p. 9-29.-2424. Minayo MCS. Trabalho de campo: contexto de observação, interação e descoberta. In: Minayo MCS, organizadora, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32ª ed. Petrópolis: Vozes; 2012. p. 61-77.: Qual a sua compreensão sobre integralidade e necessidades de saúde?; Como você entende o ser humano após um/dois ano(s) de experiência na Famema?; Como as atividades das UES e UPP têm contribuído para a sua compreensão do que são necessidades de saúde e do cuidado à pessoa na perspectiva da integralidade? Antes de cada entrevista, os estudantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). As entrevistas foram gravadas em áudio com o consentimento dos estudantes e transcritas posteriormente1919. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União, Brasília (DF); 16 out 1996. Seção 1: 21082.,2020. Brasil. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 dezembro de 2012. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União, Brasília (DF); 13 jun 2013. Seção 1: 59.. Os dados obtidos foram analisados pela técnica de Análise de Conteúdo Modalidade Temática, constituída por três etapas: pré-analise, exploração do material e interpretação dos dados2323. Minayo MCS. O desafio da pesquisa social. In: Minayo MCS, organizadora, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32.ed. Petrópolis: Vozes; 2012. p. 9-29.

24. Minayo MCS. Trabalho de campo: contexto de observação, interação e descoberta. In: Minayo MCS, organizadora, Deslandes SF, Gomes R. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 32ª ed. Petrópolis: Vozes; 2012. p. 61-77.

25. Rosa PRS. Uma introdução à pesquisa qualitativa em ensino [Internet] Campo Grande (MS): UFMS; 2013: [citado 6 jul 2013]. Disponível em: http://www.paulorosa.docente.ufms.br/Uma_Introducao_Pesquisa_Qualitativa_Ensino_Ciencias.pdf.
http://www.paulorosa.docente.ufms.br/Uma...

26. Strauss A, Corbin J. Pesquisa qualitativa: técnicas e procedimentos para o desenvolvimento de teoria fundamentada. 2ªed. Porto Alegre: Artmed; 2008.
-2727. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2012..

Os estudantes foram representados pelos seguintes códigos “AE1...EE1” “AE2...EE2”, “AM1...EM1”, “AM2...EM2”. A primeira letra maiúscula representa os cinco estudantes de cada série dos cursos. A segunda letra maiúscula, acompanhada do número ordinal, significa os cursos (Enfermagem e Medicina), primeira e segunda séries (E1; M1; E2; M2).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A análise dos dados obtidos deu origem a cinco categorias temáticas. Considerando que as respostas das duas séries e dos dois cursos foram semelhantes, estas foram analisadas e discutidas em conjunto, tendo em vista os critérios observados na Análise de Conteúdo, Modalidade Temática, como explicitado no Quadro 1.

QUADRO 1
Passos da Tutoria

Compreensão parcial de integralidade e NS

Os estudantes compreendem integralidade como um dos princípios do SUS e um conceito importante para abordar na faculdade e na pesquisa. Compreendem também como o entendimento do ser humano, da sociedade e o atendimento necessário ao paciente. Alguns não conseguem conceituar integralidade. As seguintes falas expressam isto:

Eu compreendo que a integralidade é compreender o ser humano no seu íntegro e toda a sociedade no seu âmbito de atendimento e tudo mais [...] (AE1)

Integralidade é um dos princípios do SUS, mas muito difícil de definir, acho que todas as atenções têm que oferecer essa integralidade... (BM2)

[...] integralidade não sei como definir. (DE1)

[...] não sei conceituar integralidade. (EE1)

Em suas respostas, os estudantes demonstraram uma compreensão parcial da integralidade. Em sua maioria, dizem compreendê-la de acordo com o que se encontra na literatura consultada, incluindo cadernos das séries projetos pedagógicos dos cursos e a Lei Orgânica de Saúde22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38

3. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11.

4. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.

7. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...

8. Brasil. Presidência da Republica. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Diário Oficial União, Brasília (DF); 20 set 1990, Seção 1: p.18055.

9. Soares MOM, Higa EFR, Passos AHR, Ikuno MRM, Bonifácio LA Mestieri CP, et al. Reflexões contemporâneas sobre anamnese na visão do estudante de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014; 38(3):314-22.

10. Luz MT. Fragilidade social e busca de cuidado na sociedade civil hoje. In:Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco; 2013. p. 11-22.

11. Guizardi FL, Stelet BP, Pinheiro R, Ceccim RB A formação de profissionais orientada para a integralidade e as relações político-institucionais na saúde: uma discussão sobre a interação ensino-trabalho. Rio de Janeiro: CEPESC: ABRASCO; 2011. p. 153-77.

12. Albuquerque PC, Stotz EM. A educação popular na atenção básica à saúde no município: em busca da integralidade. Interface Comun Saúde Educ. 2004; 8(15):259-74.

13. Junqueira MFPS. [Resenha] Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(3):784-5.

14. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudanças na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade Cad Saúde Pública.2004;20(5):1400-10.
-1515. Cecílio LCO. As necessidades de saúde como conceito estruturante na luta pela integralidade e equidade na atenção em saúde In Pinheiro R, Mattos RA, organizadores Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde Rio de Janeiro: ABRASCO; 2001.p.113-26.. Alguns demonstram dificuldade no entendimento da integralidade e referem que não conseguem conceituá-la ou defini-la. A nosso ver, alguns fatores contribuem para a complexidade desse entendimento: o fato de os estudantes estarem nas séries iniciais dos cursos; a polissemia e a polifonia descritas pela Lei Orgânica de Saúde. Além disso, a literatura aponta a necessidade de transformar profissionais praticantes da medicina fragmentada em praticantes da medicina holística11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.,2828. Minayo MCS. Saúde e ambiente: uma relação necessária. In: Campos, GWS, Minayo MCS, Akerman M, Drumond Júnior M, Carvalho YM. Tratado de saúde coletiva. São Paulo: Hucitec; 2006. p. 93-121. por meio de lei ou norma, uma área em que a compreensão do ser humano em sua singularidade ainda é pouco enfatizada. Esta compreensão representa um dos requisitos fundamentais para a prática do cuidado na perspectiva da integralidade.

Os estudantes demonstraram compreender NS segundo as definições que Cecílio2727. Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2012. propõe, a visão que as atividades da UPP proporcionam, que se traduzem no plano de cuidados ao paciente e início do trabalho em saúde. As falas a seguir expressam isto:

[...] necessidades de saúde eu compreendo as opções do Cecílio que ele fala quanto aos atendimentos, mas agora não me lembro dos pontos exatos que a gente tem [...] (AE1)

[...] o profissional tem que ter esse olhar pra família, indispensável, todos os profissionais devem estar unidos para o reconhecimento das NS do paciente, todo mundo integrado mesmo [...] (BE1)

[...] NS é levantar os problemas do paciente e desses problemas elaborar um plano de cuidado. (BM1)

NS é subjetiva, é bem difícil, pois a gente tem a teoria de como fazer, mas é bem difícil. (BM2)

Da mesma forma, os estudantes indicam que conhecem a literatura adotada pela escola a respeito de NS. Mas também se percebe aqui uma compreensão parcial do que preconizam os referenciais teóricos. Alguns dos estudantes remetem aos conceitos propostos por Cecílio, mas não se lembram da taxonomia adotada pelo autor para facilitar a compreensão das NS (autonomia, vínculo, boas condições de vida e acesso à tecnologia)2929. Cecílio LCO. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde Interface Comunic. Saúde Educ.2011;15(37):589-99..

Em 2011, esse mesmo autor aprofunda a discussão sobre as NS, indicando os principais fatores para operacionalizar o cuidado, que respeita a necessidade humana de modo individual ou coletivo. Assim, seria pertinente que os profissionais de saúde e também os estudantes pudessem refletir sobre esses fatores: individual, familiar, profissional, organizacional, sistêmico e societário2929. Cecílio LCO. Apontamentos teórico-conceituais sobre processos avaliativos considerando as múltiplas dimensões da gestão do cuidado em saúde Interface Comunic. Saúde Educ.2011;15(37):589-99..

Compreensão da integralidade além do princípio do SUS

Os estudantes explicitaram uma compreensão da integralidade que vai além do princípio do SUS. Eles se referem aos aspectos biológicos, psicológicos e sociais da pessoa e à influência do meio ambiente como promotor do processo saúde-doença:

Pelo que a gente está estudando aqui, nós temos que dar ao paciente o que ele está precisando. Tem que ver a necessidade da pessoa, não só olhar o biológico, mas também o psicológico, a gente vê a pessoa como um todo, a gente estuda tudo, tanto o psicológico como o social, todo o meio em que ela está, é como um todo. (CE1)

Integralidade é olhar o paciente como um todo, como um ser do meio em que ele está inserido, o social, cultural, familiar, pessoal, espiritual, não só o biológico. Eu acredito muito nisso, entendeu? Tem diversos fatores que influenciam a saúde, aí você identifica a necessidade de saúde não tratar só do biológico, tentar orientar a parte emocional do paciente. Pode desenvolver várias coisas, tem o comportamento dele que influencia o problema que está apresentando. Não sei se eu deixei claro. (AM1)

Integralidade é tentar olhar como um todo para não negligenciar algum aspecto [...] (CM2)

Esse posicionamento dos estudantes pode indicar uma evidência do movimento de transformação na educação em saúde desenvolvido pela Famema. Para os estudiosos22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38

3. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11.

4. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.

7. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...

8. Brasil. Presidência da Republica. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Diário Oficial União, Brasília (DF); 20 set 1990, Seção 1: p.18055.

9. Soares MOM, Higa EFR, Passos AHR, Ikuno MRM, Bonifácio LA Mestieri CP, et al. Reflexões contemporâneas sobre anamnese na visão do estudante de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014; 38(3):314-22.

10. Luz MT. Fragilidade social e busca de cuidado na sociedade civil hoje. In:Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco; 2013. p. 11-22.

11. Guizardi FL, Stelet BP, Pinheiro R, Ceccim RB A formação de profissionais orientada para a integralidade e as relações político-institucionais na saúde: uma discussão sobre a interação ensino-trabalho. Rio de Janeiro: CEPESC: ABRASCO; 2011. p. 153-77.

12. Albuquerque PC, Stotz EM. A educação popular na atenção básica à saúde no município: em busca da integralidade. Interface Comun Saúde Educ. 2004; 8(15):259-74.

13. Junqueira MFPS. [Resenha] Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(3):784-5.

14. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudanças na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade Cad Saúde Pública.2004;20(5):1400-10.
-1515. Cecílio LCO. As necessidades de saúde como conceito estruturante na luta pela integralidade e equidade na atenção em saúde In Pinheiro R, Mattos RA, organizadores Os sentidos da integralidade na atenção e no cuidado à saúde Rio de Janeiro: ABRASCO; 2001.p.113-26., a integralidade pode ser compreendida como prática da boa medicina, princípio de organização do processo de trabalho e políticas desenhadas para dar respostas a certos tipos de problemas. A literatura aponta também a necessidade de compreender a integralidade não apenas como um princípio do SUS, extrapolando a estrutura hierárquica da assistência. Para isso, é importante, entre outros aspectos, desenvolver uma visão ampliada do ser humano em seu contexto social, histórico, cultural e ambiental22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38

3. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3 de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, 23 jun. 2014; Seção 1, p. 8-11.

4. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de enfermagem. Marília: Famema; 2008.

5. Faculdade de Medicina de Marília. Projeto pedagógico do curso de medicina. Marília: Famema; 2014.

6. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 1ª série dos cursos de enfermagem e medicina. Marília: Famema; 2012.

7. Faculdade de Medicina de Marília. Caderno da 2ª série dos cursos de enfermagem e medicina: necessidades de saúde 2 e prática profissional 2 [Internet]. Marília: Famema; 2014. [citado15 set 2014]. Disponível em: http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/Caderno%20da%202%C2%AA%20s%C3%A9rie%20de%20Medicina%20e%20Enfermagem.pdf.
http://www.famema.br/ensino/cursos/docs/...

8. Brasil. Presidência da Republica. Lei nº 8080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e da outras providencias. Diário Oficial União, Brasília (DF); 20 set 1990, Seção 1: p.18055.

9. Soares MOM, Higa EFR, Passos AHR, Ikuno MRM, Bonifácio LA Mestieri CP, et al. Reflexões contemporâneas sobre anamnese na visão do estudante de medicina. Rev Bras Educ Méd. 2014; 38(3):314-22.

10. Luz MT. Fragilidade social e busca de cuidado na sociedade civil hoje. In:Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Rio de Janeiro: Hucitec-Abrasco; 2013. p. 11-22.

11. Guizardi FL, Stelet BP, Pinheiro R, Ceccim RB A formação de profissionais orientada para a integralidade e as relações político-institucionais na saúde: uma discussão sobre a interação ensino-trabalho. Rio de Janeiro: CEPESC: ABRASCO; 2011. p. 153-77.

12. Albuquerque PC, Stotz EM. A educação popular na atenção básica à saúde no município: em busca da integralidade. Interface Comun Saúde Educ. 2004; 8(15):259-74.

13. Junqueira MFPS. [Resenha] Pinheiro R, Mattos RA, organizadores. Cuidado: as fronteiras da integralidade. Ciênc Saúde Coletiva. 2005;10(3):784-5.
-1414. Ceccim RB, Feuerwerker LCM. Mudanças na graduação das profissões de saúde sob o eixo da integralidade Cad Saúde Pública.2004;20(5):1400-10.,3030. Masson W. Contribuição do currículo orientado por competência para a atuação do enfermeiro no cuidado integral em urgência. Marília; 2014. Mestrado [Dissertação] — Faculdade de Medicina de Marília..

Entendimento biopsicossocial do ser humano

As respostas à segunda pergunta, que aborda o entendimento do ser humano após o tempo de experiência na Famema, tanto da Problematização quanto da ABP, revelaram que os estudantes entendem o ser humano em seus aspectos biológicos, psicológicos e sociais, que este deve ser respeitado na sua individualidade e que tudo que ele carrega faz parte dele:

Eu entendo o ser humano no seu âmbito psicossocial. A gente não pode olhar pro ser humano e pensar que ele é um cadáver vivo, que a gente pode desmontar ele e investigá-lo em todos os seus aspectos apenas biológicos. Ele tem a sua individualidade, a sua personalidade e também as suas necessidades com o cuidado, que tem que ser respeitado então em todos esses aspectos assim. (AE1)

O ser humano deve ser visto como um todo. Na Famema, aprendi a respeitar as pessoas, a respeitar a individualidade e tentar me superar sempre. Depois de dois anos de Famema, aprendi a lidar melhor com o ser humano, acho que as experiências de tutoria e UPP me ensinaram. (AE2)

Na Famema, a gente vê bastante o psicossocial, aqui se lê muito sobre isso. Depois da Famema, eu vejo o quanto é mais importante ainda essa parte psicológica, essa parte humana mesmo. Depois de um ano de Famema, estudando, eu vejo o quanto isso afeta [...] (AM1)

O ser humano é tudo o que ele carrega desde o nascimento e, ao mesmo tempo, tudo o que o meio e a questão espiritual influenciam também. São bem difíceis todos esses conceitos que envolvem o ser, acho que é isso, não sei. (EM2)

Alguns estudantes disseram que antes do curso na Famema não enxergavam o ser humano sob um ângulo biopsicossocial:

Eu acho que a gente já consegue ver o lado biológico e o psicológico do paciente. A gente quando vai fazer visita domiciliar, agora, tenta sempre prestar atenção no lado psicológico porque antes a gente ia estudar somente as doenças [...] (DE1)

Na Famema, a gente liga muito pro psicossocial, eu nunca vi na faculdade, eu nunca imaginei também que a gente fosse estudar essas coisas. É que aqui a gente lê muito sobre isso e vê a importância do desenvolvimento social mesmo, psicossocial, como isso interfere em alguns comportamentos que trazem danos pra gente [...] (AM1)

Então, eu entendo muito mais ele agora em todas essas dimensões. Antes eu pessoalmente pensava muito em doença, só pensava se está saudável ou se está doente. Na Famema, você vê tudo isso de maneira geral [...] (CE2)

Estar aqui na Famema e ter a possibilidade, nestes dois anos, de ter feito a prática, visitar as famílias e conversar com as pessoas, acho que essa complexidade do ser humano que me chamou atenção, esse contato na faculdade, me trouxe à tona assim, me fez pensar em toda essa surpresa que pode ser o ser humano. (CM2)

As manifestações dos estudantes de ambas as séries e cursos apresentam o entendimento do ser humano nas dimensões biopsicossociais. Do ponto de vista da formação em saúde, essa evidência demonstra uma resposta positiva à reorganização curricular, desenvolvida por meio da Problematização e da ABP, conforme preconizam as DCN, para além de um modelo biologicista. Entre os aspectos a serem observados para o cuidado biopsicossocial, é relevante a reflexão sobre o significado de saúde, que também é histórico e socialmente constituído. O que se entende por saúde depende da concepção que se possua do organismo vivo e de sua relação com o meio ambiente. A amplitude deste significado de saúde requerido para uma assistência de qualidade inclui a valorização das dimensões individuais, sociais e ecológicas que envolvem o ser humano22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38,3030. Masson W. Contribuição do currículo orientado por competência para a atuação do enfermeiro no cuidado integral em urgência. Marília; 2014. Mestrado [Dissertação] — Faculdade de Medicina de Marília.,3131. Soares MOM. Reflexões contemporâneas sobre anamnese na visão do estudante de medicina. Marília; 2013. Mestrado [Dissertação] — Faculdade de Medicina de Marília..

Entendimento fragmentado do ser humano

Alguns estudantes que responderam à segunda pergunta, acerca do seu entendimento sobre o ser humano, demonstraram uma visão fragmentada, como nas seguintes falas:

Como é que é? [repito a pergunta]. Ah, não sei, acho que da minha percepção, o contato assim com as diferentes realidades. Eu nunca tive assim, eu vivia [...] relativamente bem, nunca tive contato com gente assim, mais pobre, mais humilde, eu acho que é nesse sentido, você passa a entender vendo a realidade da maioria das pessoas, você passa a entender algumas atitudes com relação a ter uma vida bem sofrida assim. Então, acho que é mais nesse sentido. (CM1)

Um ser passível de modificações, muito influenciável, difícil de lidar às vezes, que pode atrapalhar o seu tratamento e relacionamento com o médico por ouvir conversas de vizinho, não sei como definir. (BM2)

Como eu entendo o ser humano? Primeiro eu acho que o maior impacto que eu tive foi social porque pelo menos eu entrei na faculdade muito pensando na medicina hospital, como eu tive muito contato com a saúde da família [...] eu gostei porque uma coisa é receber um paciente de uma classe baixa que você cria um distanciamento, outra coisa é você ir à casa da pessoa, saber como ela mora, saber onde ela dorme. Então eu fui em casas de famílias bem simples. A pergunta foi como eu vejo o ser humano? O ser humano, como eu vejo o ser humano? Que pergunta difícil, em questão a saúde é isso [...], mas quanto ao ser humano? É uma coisa mais filosófica? Eu posso responder o que eu quiser? Eu vejo o ser humano meio como um erro da natureza [...] e eu acho que foi meio isso que me motivou a entrar na faculdade, pra descobrir todas as peculiaridades de um ser que se diferenciou de toda a natureza. (DM2)

O posicionamento destes três estudantes de Medicina evidencia que eles não entendem o ser humano na sua totalidade, de acordo com o esperado para um profissional de saúde. Eles expressaram preconceitos e dificuldades relacionais quando questionados sobre seu entendimento do que é o ser humano. A esse respeito, é perceptível na literatura específica da formação em saúde que ela aborda os vários aspectos que envolvem o ser humano sem preocupação conceitual3232. Capra F. O ponto de mutação, a ciência a sociedade e a cultura emergente. 28.ed. São Paulo: Cultrix; 2007.

33. Stotz EN. Necessidades de saúde: mediações de um conceito: contribuição das Ciências Sociais para a fundamentação teórico-metodológica de conceitos operacionais da área de Planejamento em Saúde. Rio de Janeiro; 1991. Doutorado [Tese] — Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz.
-3434. Matsumoto NF. A operacionalização do PAS de uma unidade básica de saúde do município de São Paulo, analisada sob o ponto de vista das necessidades de saúde. São Paulo; 1999. Mestrado [Dissertação] — Universidade de São Paulo.. A compreensão do que é o ser humano é fundamental para avançar do modelo biologicista, arraigado na prática do cuidado em saúde, para o cuidado biopsicossocial, que respeita o ser humano em todas as suas dimensões e como um ser comunicante com o meio ambiente em que vive11. Tsuji H, Silva RHA. Aprender e ensinar na escola vestida de branco: do modelo biomédico ao humanístico. São Paulo: Phorte; 2010.,3535. Perestrello D. A medicina da pessoa. 4.ed. Rio de Janeiro: Atheneu; 1996..

Contribuição teórica da UES e prática da UPP

As perguntas de número três e quatro abordaram a contribuição das atividades da UES e UPP para a compreensão de NS e integralidade. As respostas dos estudantes a estas perguntas revelaram que as atividades da UES contribuem prioritariamente com a teoria, e as da UPP com a prática:

A UES contribui com a parte teórica em relação ao conteúdo, é um caso real, mas não deixa de ser teoria. A teoria também não se resume ao aspecto biológico, aborda o total, e a UPP seria uma forma de aplicar isso. Na UPP há o contato direto com o paciente, vai começar a observar vários aspectos da vida dele, não é uma coisa que está no papel, é uma coisa mais prática que, aí sim, vai moldando a sua qualidade de lidar com a pessoa... (EM1)

A UES contribui com o estudo teórico e na UPP vamos estar aplicando, presenciando e entendendo o porquê do estudo. A soma das duas é o que vai resultar na formação, conhecimento teórico e aplicação na prática. (DE2)

A UES e a UPP articulam muito a teoria com a prática. Aqui na UES a gente vê a teoria através dos casos e tem que estudar tudo [...] fica muito preso no biológico, é uma coisa pronta. Na UPP a gente acaba vendo a realidade e aprende a ter o olhar sobre o que realmente o paciente precisa, auxiliando nas NS como um todo. (AM2)

Eu acho que a UES estruturada em casos é bem interessante, mas a compreensão de NS é mais pontual, engloba o psicossocial, mas é mais voltada para o biológico. A UPP talvez traga isso de forma mais clara e é mais interessante, pois através das visitas a gente acaba conhecendo o meio em que vive a pessoa e percebendo a NS, mas as duas unidades se complementam bastante. (CM2)

O posicionamento dos estudantes sobre a contribuição das atividades desenvolvidas na UES e na UPP para a compreensão da integralidade e NS apresentou predominantemente a estrutura organizacional da aprendizagem. Os estudantes revelaram também o que apreenderam na articulação e na complementaridade entre os cenários e descreveram que a UES contribui prioritariamente com a teoria e a UPP da mesma maneira com a prática do cuidado a partir das NS da população. Desse modo, eles evidenciam a contribuição de cada cenário de aprendizagem para a compreensão da integralidade e NS.

Esse posicionamento apresenta indícios de uma aprendizagem que preconiza a formação para o desenvolvimento do cuidado na perspectiva da integralidade22. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 4 de 7 de novembro de 2001. Institui diretrizes curriculares nacionais do curso de graduação em Medicina. Diário Oficial da União. Brasília, 9 nov. 2001; Seção 1, p.38.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Levando em conta os objetivos desta pesquisa, foi possível avaliar as principais contribuições do currículo orientado por competência, que, por meio das experiências vivenciadas na UPP e na UES, propicia a compreensão da integralidade aos estudantes das duas primeiras séries dos cursos de Medicina e Enfermagem. A análise dos resultados apontou cinco categorias analíticas, nas quais os estudantes das duas séries dos dois cursos demonstraram que o currículo integrado e orientado por competência profissional promove um aprendizado articulado para o desenvolvimento do cuidado na perspectiva da integralidade.

Além disso, esse tipo de organização curricular está de acordo com as recomendações das DCN e propicia a formação de profissionais com o perfil almejado nesse documento. Foi possível perceber ainda que existem dificuldades de entendimento de integralidade, NS e sobre o que é o ser humano, tanto durante as atividades desenvolvidas na UPP por meio da Problematização, quanto no processo tutorial pela ABP, embora os estudantes tenham apontado a articulação entre elas e a contribuição de cada uma na construção do conhecimento. Esse resultado é perfeitamente compreensível, visto que a população estudada nesta pesquisa se encontra nas séries iniciais dos cursos.

É necessário lembrar que estes estudantes se tornarão profissionais e, para que desenvolvam o cuidado na perspectiva da integralidade ao final da formação, deverão ter aprofundado seus conhecimentos sobre integralidade em saúde, para identificar as necessidades de saúde das pessoas individual e coletivamente. Diante disto, deverão conhecer melhor o conceito de ser humano em todas as suas dimensões e de necessidade de saúde como sendo os aspectos objetivos e subjetivos deste ser humano, expostos ou não durante o cuidado em saúde. É a interação pessoal (atendendo o paciente, familiares, comunidade) que propicia a percepção da participação dos fatores sociais, ambientais e emocionais na ruptura da homeostase do frágil equilíbrio do binômio saúde-doença, o que talvez seja mais bem desenvolvido se a compreensão da integralidade na sua profundidade e amplitude for incluída com maior riqueza de detalhes nas pesquisas realizadas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2015
  • Aceito
    15 Fev 2016
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