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Análise dos Níveis de Empatia de Estudantes de Medicina

Analysis of Empathy Levels of Medicine Students

RESUMO

Objetivo:

Analisar os níveis de empatia em estudantes de Medicina pertencentes a uma universidade filantrópica, avaliando a evolução do cuidado compassivo, da capacidade de se colocar no lugar do paciente e da tomada de perspectiva em alunos ingressantes e concluintes de um curso de Medicina.

Métodos:

Trata-se de um estudo transversal descritivo com abordagem quantitativa. Dois questionários foram aplicados, um com dados sociodemográficos e o outro com a Escala Jefferson, que avalia a empatia médica. Foram incluídos na pesquisa 152 acadêmicos do segundo, terceiro, 11° e 12° períodos de um curso de Medicina de uma universidade filantrópica da cidade de Goiânia (GO).

Resultados:

A média de idade foi de 22,7 anos (± 3,7), sendo 64,5% do sexo feminino e 98,0% de solteiros. A maioria tem renda familiar acima de dez salários mínimos (49,3%) e reside em casa própria (84,2%). O escore global dos ingressantes foi de 116,9 (± 13,0) e o dos concluintes de 117,1 (± 15,1). Acerca do cuidado compassivo, os escores foram 69,4 (± 8,0) e 68,8 (± 9,4); na capacidade de se colocar no lugar do paciente, 8,4 (± 3,0) e 8,6 (± 2,9); e na tomada de perspectiva 39,1 (± 6,3) e 39,7 (± 6,3), respectivamente. No conjunto da população pesquisada, os escores foram: global (117,0 ± 13,9), cuidado compassivo (69,1 ± 8,6), colocar-se no lugar do paciente (8,5 ± 3,0) e tomada de perspectiva (39,4 ± 6,3). Em relação a “colocar-se no lugar do paciente”, os escores das idade foram: 18 a 24 anos de 8,6; 25 a 29 anos de 8,2 e 30 a 45 anos de 7,8. O sexo feminino teve escores maiores em relação à empatia (119,0) e no “cuidado compassivo” (70,7).

Conclusão:

Os dados apontaram uma tendência discreta dos concluintes em serem mais empáticos do que os ingressantes. Dados sociodemográficos, como gênero feminino, ausência de doença pessoal, morar em residência própria e a menor idade foram preditores que indicaram maior capacidade empática na relação com os pacientes.

PALAVRAS-CHAVE
Educação Médica; Empatia; Estudantes de Medicina

ABSTRACT

Objective:

To analyze the levels of empathy among medical students attending a philanthropic university, evaluating the evolution of compassionate care, the ability to put oneself in the patient's place and to look at things in perspective, among first-year and final-year medical students.

Methods:

This is a cross-sectional descriptive study with a quantitative approach. Two questionnaires were applied, one with sociodemographic data and the other the Jefferson Scale that evaluates medical empathy. Included in the survey were 152 academics from the first, second and sixth years of a medical course at a philanthropic university in the city of Goiânia/GO.

Results:

The mean age was 22.7 years (± 3.7), 64.5% female and 98.0% single. The majority reported a family income of more than 10 minimum wages (49.3%) and live in their own homes (84.2%). The overall score of the participants was 116.9 (± 13.0) and the final score was 117.1 (± 15.1). As regards compassionate care, the scores were 69.4 (± 8.0) and 68.8 (± 9.4), for the capacity to place themselves in the patient's position, 8.4 (± 3.0) and 8.6 (± 2.9), and looking at things in perspective, 39.1 (± 6.3) and 39.7 (± 6.3), respectively. In the entire sample population the scores were: overall (117.0 ± 13.9), compassionate care (69.1 ± 8.6), putting oneself in the place of the patient (8.5 ± 3.0) and taking a view of things in perspective (39.4 ± 6.3). In relation to “putting themselves in the patient's place” the age scores were: 18 to 24 years old, 8.6; 25 to 29 years of 8.2 and 30 to 45 years of 7.8. The female gender produced higher scores regarding empathy (119.0) and “compassionate care” (70.7).

Conclusion:

The data pointed to a discrete tendency of the graduating students to be more empathic than the newcomers. Sociodemographic data, such as female sex, the absence of personal illness, living in their own home and being a younger age were predictors that indicated greater empathic capacity in the relationship with the patients.

KEYWORDS:
Medical education; Medical students; Empathy

INTRODUÇÃO

Em meados do século XX, frente às transformações econômicas e às descobertas microbiológicas, Abraham Flexner propôs um novo modelo para o conceito de saúde e doença, fortemente alicerçado em aspectos biomédicos11. Provenzano BC, Machado APG, Rangel MTAS, Aranha RN. A empatia médica e a graduação em medicina. Rev. HUPE, 2014;13(4):119-25.. Tal modelo contribuiu significativamente para o afastamento entre o conhecimento médico e o cuidado clínico, ou seja, o médico se tornou incapaz de enxergar a doença no paciente como um conjunto de fatores e não algo isolado, restrito a um único sistema. Desenvolveu-se uma visão cientificista e hospitalocêntrica, que acabou por desvalorizar o lado humanista da prática médica11. Provenzano BC, Machado APG, Rangel MTAS, Aranha RN. A empatia médica e a graduação em medicina. Rev. HUPE, 2014;13(4):119-25..

Já no século XXI, a lógica do modelo Flexner se inverteu, dando ênfase ao encontro mais empático do médico com seu paciente. Esse fato está claro nas Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Medicina, onde se afirma que o futuro médico deve ter uma formação generalista, humanista, crítica e reflexiva22. Brasil. Ministério da Educação. Resolução n. 3, de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Brasília; Ministério da Educação, 2014.. Capacitado a atuar, pautado em princípios éticos, no processo de saúde-doença em seus diferentes níveis de atenção, com ações de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação à saúde, na perspectiva da integralidade da assistência, com senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania, como promotor da saúde integral do ser humano22. Brasil. Ministério da Educação. Resolução n. 3, de 20 de junho de 2014. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Brasília; Ministério da Educação, 2014..

A qualidade de uma entrevista clínica tem base primordial na comunicação entre médico e paciente. Cabe ao médico aprimorar a sua sensibilidade em reconhecer o que a enfermidade representa na vida das pessoas. O principal fator é reconhecer que o médico não trata a doença, mas, sim, a pessoa. Os médicos precisam ter a consciência de que é necessário manter certa aproximação emocional com os pacientes durante a entrevista clínica. Isto porque os resultados que uma relação empática traz ao paciente, ao médico e ao tratamento como um todo são diversos e, por vezes, mais benéficos que qualquer tipo de medicação33. Balint M. O médico, seu paciente e a doença. Rio de Janeiro; Atheneu, 1988.,44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

Em se tratando do conceito de empatia, foco de análise do presente estudo, o termo inglês empathy foi criado em 1909, proveniente da palavra alemã Einfûhlung, designada para demonstrar emoções e sentimentos das pessoas que observavam algum tipo de obra de arte. Em 1915, o termo incluiu a visão da empatia como a capacidade de compreender o ser humano. Em 1918, a empatia começou a se aproximar do campo da relação médico-paciente, utilizando-a como ferramenta para aprimorar a entrevista médica55. Moreto G, Gonzáles-Blasco P, Pessini L, Craice-de-Benedetto. La erosión de la empatía en estudiantes de Medicina: reporte de un estudio realizado en una universidad en São Paulo, Brazil. Atención Familiar. 2014;21(1):16-9..

O conceito de empatia na medicina segue por várias correntes, e uma delas o define como variáveis emocionais e cognitivas que possibilitam o entendimento do paciente e a compreensão de suas experiências66. Suartz CV, Quintana MI, Lucchese AC, Marco MA. Avaliação de empatia em residentes de especialidades clínicas e cirúrgicas da Universidade Federal de São Paulo. Rev. Bras. Educ. Med. 2013;37(3):320-5.. Outra compreensão de empatia a identifica como uma disposição genuína de ser capaz de ouvir, compreender, compadecer-se por meio de deduções, de informações retidas na memória ou colocando-se no lugar do outro, prestando apoio a outro indivíduo, fazendo com que essa pessoa se sinta compreendida44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

Entende-se também a empatia como uma habilidade social que distingue as espécies humanas e não humanas, sendo que na espécie humana existe a tomada de perspectiva, autoconsciência, consciência do outro, reavaliação da emoção, além de expressão verbal e não verbal de entendimento77. Falcone EMO, Ferreira MC, Luz RCM, Fernandes CS, D'Augustin JF, Sardinha A, et al. Inventário de empatia (I.E.): desenvolvimento e validação de uma medida brasileira. Aval. Psicol. 2008;7(3):321-34.. No campo médico, o conceito da empatia consiste em identificar e compreender os sentimentos do doente, promovendo aumento da confiança, da lealdade e do respeito entre médico e paciente66. Suartz CV, Quintana MI, Lucchese AC, Marco MA. Avaliação de empatia em residentes de especialidades clínicas e cirúrgicas da Universidade Federal de São Paulo. Rev. Bras. Educ. Med. 2013;37(3):320-5..

O aprimoramento da empatia enquanto parte fundamental do encontro clínico deve ocorrer desde a graduação, quando os alunos têm oportunidade de manter contato precoce com os pacientes, podendo, assim, desenvolver suas habilidades empáticas44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93.. No contexto do desenvolvimento das habilidades empáticas dos acadêmicos de Medicina no Brasil, muitas universidades estão se adaptando aos novos modelos de ensino que se afastam do modelo biomédico, cuja interpretação da doença é vista preferencialmente com foco em parâmetros somáticos44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

A avaliação da empatia em estudantes de Medicina é parte fundamental na formação. Um dos objetivos em um currículo para a educação médica deve incluir a melhoria da empatia. Ressalta-se, portanto, que a empatia é essencial nas características profissionais dos futuros médicos, pois é um fator importante na relação estabelecida com os pacientes e tem efeitos benéficos sobre a prática médica88. Khademalhosseini M, Khademalhosseini Z, Mahmoodian F. Comparison of empathy score among medical students in both basic and clinical levels. J AdvMedEduc Prof. 2014;2(2):88-91.. A transmissibilidade é fortemente influenciada por características de personalidade e biografia do estudante que reforçam positivamente o treinamento de habilidades voltadas à consolidação de práticas e à vivência de uma relação médico-paciente salutar, podendo ter como alicerce a empatia99. Costa FD, Azevedo RCS. Empatia, relação médico-paciente e formação em medicina: um olhar qualitativo. Rev. bras. educ. Med. 2010;34(2):261-9..

Neste sentido, o foco da análise deste estudo situa-se na avaliação da empatia de estudantes de Medicina, refletindo sobre a diferença entre os alunos que estão entrando no curso médico e aqueles que estão quase se graduando. Assim, o presente estudo teve por objetivo analisar os níveis de empatia em estudantes de Medicina pertencentes a uma universidade filantrópica.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal com abordagem quantitativa. Não há um acompanhamento das informações durante um período de tempo. Estudos transversais visualizam a situação de uma população em determinado momento, como instantâneos da realidade investigada1010. Almeida Filho N, Rouquayrol MZ. Introdução à epidemiologia. 4. ed. São Paulo; Guanabara Koogan, 2006..

A pesquisa foi realizada por meio de questionários aplicados aos acadêmicos ingressantes e concluintes de um curso de Medicina de uma universidade filantrópica situada na cidade de Goiânia (GO). Foram incluídos na pesquisa os acadêmicos que estavam cursando o segundo, terceiro, 11° e 12° períodos. A coleta de dados ocorreu entre setembro e dezembro de 2016, com os alunos que estavam regularmente matriculados e que frequentavam o curso de Medicina. Não foram pesquisados os acadêmicos que estavam com a matrícula trancada ou com algum tipo de licença, sem estarem frequentando o curso.

No desenvolvimento da pesquisa, foram utilizados dois instrumentos. O primeiro era um questionário semiestruturado para avaliar questões sociodemográficas ocupacionais e que continha perguntas sobre idade, sexo, estado civil, módulo em que se encontrava no curso de Medicina, renda, religião, emprego, bolsa de estudo, experiência com doença grave pessoal, experiência com doença grave na família, escolaridade do pai, escolaridade da mãe, se possuía pai ou mãe médicos, estágios extracurriculares, atividades de iniciação científica, especialidade pretendida após a conclusão do curso.

O segundo instrumento utilizado foi a Escala Jefferson de Empatia Médica (versão para estudantes), que avalia o nível de empatia em estudantes de Medicina predominantemente sob uma ótica cognitiva. Foi desenvolvido em 2001 por um grupo de pesquisadores da instituição Jefferson Medical College, na Filadélfia (EUA)1111. Hojat M, Mangione S, Nasca TJ, Magee M. The Jefferson Scale of Physician Empathy (JSPE): development and preliminary psychometric data. Educ. Psychol. Meas. 2001;(61):349-65., e adaptado e validado no Brasil1212. Paro HBMS, Gallotti RMD, Tibério IC, Pinto RMC, Martins MA. Brazilian version of the Jefferson Scale of Empathy: psychometric properties and factor analysis. BMC Med Educ. 2012;12(73):1-7..

Tem por objetivo a análise de três fatores principais: cuidado compassivo (compassionate care), capacidade de se colocar no lugar do paciente (standing in the patient's shoes) e tomada de perspectiva (perspective taking)1111. Hojat M, Mangione S, Nasca TJ, Magee M. The Jefferson Scale of Physician Empathy (JSPE): development and preliminary psychometric data. Educ. Psychol. Meas. 2001;(61):349-65..

É uma escala composta de 20 perguntas que utilizam uma escala de Likert cujos valores vão de um a sete, onde um seria “discordo totalmente” e sete seria “concordo totalmente”. As pontuações mínimas e máximas possíveis são, respectivamente, 20 e 140 pontos para o escore global; 11 a 77 para o cuidado compassivo; 2 a 14 para a capacidade de se colocar no lugar do paciente; e 7 a 49 para a tomada de perspectiva. Não existe um ponto de corte na avaliação produzida; a pontuação é gradativa, e, quanto maior o escore obtido, mais empático seria o estudante avaliado1111. Hojat M, Mangione S, Nasca TJ, Magee M. The Jefferson Scale of Physician Empathy (JSPE): development and preliminary psychometric data. Educ. Psychol. Meas. 2001;(61):349-65..

Os dados coletados foram utilizados para a confecção de um banco de dados no software Excel. Posteriormente, foi utilizado o software BioEstat 3.0 para realizar estatística descritiva com o cálculo de medidas de tendência central para as variáveis contínuas, como média, mediana e desvio padrão, e cálculo das frequências absoluta e relativa percentual para as variáveis descontínuas. Em seguida, aplicou-se um teste de normalidade (D'Agostino-Pearson) para distinguir as distribuições paramétricas e não paramétricas, com o intuito de comparar os resultados do questionário estratificados pelas variáveis sociodemográficas. Assim, foram utilizados, para as distribuições paramétricas, os testes t de Student e Anova, e para as distribuições não paramétricas os testes Mann-Whitney e Kruskal-Wallis. Para todos os testes comparativos foi assumido p-valor igual ou inferior a 0,05 como significativo.

Em acordo com a resolução 466/2012, antes da aplicação dos questionários, os participantes foram devidamente orientados em relação às questões éticas da pesquisa. Após orientação, o estudante lia e assinava o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que deixava clara a garantia de sigilo sobre a sua identidade. A pesquisa foi registrada na Plataforma Brasil do Ministério da Saúde sob o protocolo CAAE: 56701416.2.0000.0037 e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC Goiás com o parecer n° 1.592.033.

RESULTADOS

A pesquisa englobou 152 acadêmicos do curso de Medicina de uma universidade filantrópica, com a participação de 88 ingressantes e 64 concluintes. No conjunto de todos os estudantes entrevistados, a idade variou entre 18 e 45 anos (média 22,7 ± 3,7). A maioria dos entrevistados era do sexo feminino (64,5%) e solteiros (98,0%). A maioria afirmou ter moderado envolvimento religioso (40,8%), sendo a religião católica a predominante na amostra pesquisada (53,3%) (Tabela 1).

Tabela 1
Proporções de alunos ingressantes, concluintes e total, segundo variáveis do questionário sociodemográfico ocupacional

A maioria dos acadêmicos tinha renda familiar mensal acima de dez salários mínimos em todos os grupos pesquisados (49,3%) e residia em casa própria (84,2%). A porcentagem de estudantes com bolsa de estudos foi de 20,4%. A maioria dos pais (65,1%) e das mães (71,7%) tinha escolaridade superior ou acima. Apenas 5,9% dos acadêmicos do estudo tinham um emprego (Tabela 1).

Os estudantes afirmaram ter doença grave na família em 58,6% das respostas e doença grave pessoal (9,2%). Sobre o principal motivo que os levou a se graduar em Medicina, 60,5% afirmaram ser aptidão pessoal e vocacional, e 17,8% disseram poder contribuir com a sociedade (Tabela 1).

Na análise dos escores da Escala Jefferson de Empatia Médica (versão para estudantes), foram separados o escore global, bem como os três fatores que avaliam o cuidado compassivo, a capacidade de se colocar no lugar do paciente e a tomada de perspectiva. Assim, os escores ficaram assim discriminados: global (ingressantes = 116,9 ± 13,0 e concluintes = 117,1 ± 15,1); cuidado compassivo (ingressantes = 69,4 ± 8,0 e concluintes = 68,8 ± 9,4); capacidade de se colocar no lugar do paciente (ingressantes = 8,4 ± 3,0 e concluintes = 8,6 ± 2,9); tomada de perspectiva (ingressantes = 39,1 ± 6,3 e concluintes = 39,7 ± 6,3).

No conjunto de todos os estudantes pesquisados (n = 152), os escores ficaram: global (117,0 ± 13,9), cuidado compassivo (69,1 ± 8,6), colocar-se no lugar do paciente (8,5 ± 3,0) e tomada de perspectiva (39,4 ± 6,3). Os dados da análise global e de todos os fatores evidenciaram condutas muito empáticas dos estudantes frente a seu paciente. Em contrapartida, verificou-se que estatisticamente não há diferença entre os escores dos ingressantes e dos concluintes, o que pode indicar apenas uma tendência dos concluintes em serem mais empáticos.

Na análise estatística utilizando-se os valores obtidos na Escala Jefferson de Empatia Médica (versão para estudantes) do conjunto de toda a amostra dos estudantes pesquisados juntamente com as variáveis sociodemográficas, identificou-se influência significativa na empatia dos estudantes. Isto porque os dados obtidos indicaram que, quanto mais novo o estudante (18 a 24 = 8,6; 25 a 29 anos: 8,2; 30 a 45 = 7,8), maior foi o escore relativo a “colocar-se no lugar do paciente”, com p < 0,001.

O sexo também se apresentou como um importante preditor de empatia. Identificou-se que, no escore global da escala, estudantes do sexo feminino (119,0) tiveram escores maiores do que os do sexo masculino (113,4), com p = 0,018. Tal achado em relação ao sexo também foi identificado no fator “cuidado compassivo”, com feminino (70,7) e masculino (66,4) com p = 0,004.

O tipo de residência (moradia) dos estudantes também apareceu como estatisticamente significativo na análise. Aqueles que afirmaram morar em residência própria apresentaram escores mais altos no global (118,8 e p = 0,001), no cuidado compassivo (70,2 e p = 0,002) e no fator tomada de perspectiva (40,0 e p = 0,004) em relação àqueles que moravam em residência alugada ou financiada.

Um achado estatisticamente significativo ocorreu em relação àqueles que não tinham doença pessoal (8,6), que apresentaram melhor escore no fator “colocar-se no lugar do paciente” do que aqueles que tinham doença pessoal (7,1), com p = 0,038. Outro achado foi em relação à escolaridade do pai: quanto mais escolarizado o pai do estudante, maior o escore no fator “colocar-se no lugar do paciente”, com média na pós-graduação (72,8) com p = 0,033.

DISCUSSÃO

O presente estudo identificou que o escore global de empatia, bem como os três fatores analisados da escala não sofreram variação significativa entre os estudantes ingressantes e concluintes do curso de Medicina investigado. A realidade complexa em que os pacientes estão inseridos não pode ser desprezada pela prática médica. Simplificar essa realidade significa minimizar fatores de fundamental importância para a compreensão e resolução dos problemas de saúde1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010..

Um médico cuja empatia é exercida no encontro clínico se preocupa com tudo o que cerca seu paciente, entende que ele é fruto de suas escolhas e do meio em que vive; logo, de maneira empática, se compadece dos problemas apresentados1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010.. Além disso, um médico empático busca da melhor maneira possível servir como instrumento de melhora para aquele indivíduo que o procura num momento de necessidade ou desamparo1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010..

A capacidade do médico em conhecer e se aprofundar nas perspectivas e experiências de um paciente incrementa a relação empática1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010.,1414. Chen D, Lew R, Hershman W, Orlander J. A cross-sectional measurement of medical student empathy. J Gen Intern Med. 2007;22(10):1434-8.. A empatia é o ponto fundamental para a relação médico-paciente. Em vista disso, ela não se baseia apenas na percepção frente ao que a enfermidade significa para o paciente, mas também em como transmitir tal compreensão de volta1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010.,1414. Chen D, Lew R, Hershman W, Orlander J. A cross-sectional measurement of medical student empathy. J Gen Intern Med. 2007;22(10):1434-8.. Assim, a empatia visa também promover um feedback da satisfação do paciente para o médico1414. Chen D, Lew R, Hershman W, Orlander J. A cross-sectional measurement of medical student empathy. J Gen Intern Med. 2007;22(10):1434-8.. Dessa forma, a empatia é essencial na formulação de uma boa anamnese, diagnóstico e terapêutica, melhorando a qualidade da relação médico-paciente e, consequentemente, do encontro clínico1313. Porto CC. O encontro clínico: uma abordagem multiprofissional. Monografia preparada para o curso da Disciplina “Relação dos Profissionais da Saúde com o Paciente” do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da UFG, 2010.,1414. Chen D, Lew R, Hershman W, Orlander J. A cross-sectional measurement of medical student empathy. J Gen Intern Med. 2007;22(10):1434-8..

No contexto analisado, um estudo que objetivou avaliar o grau de empatia em estudantes de Medicina em comparação com variáveis sociodemográficas e a evolução durante os anos de formação médica identificou um aumento do nível de empatia no curso de Medicina analisado com o passar dos anos1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14.. Constatou também que o aumento da empatia é atribuído a fatores emocionais, como a alegria empática, por exemplo, mas não ao aumento da perspectiva de tomada de atitudes1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14..

Em contraste com os achados do presente estudo, que identificou um leve aumento dos níveis de empatia nos concluintes, mas significativamente empatado com os dos ingressantes, no Japão uma pesquisa demonstrou que a empatia aumentou entre o primeiro ano e o final do ano de graduação em Medicina1616. Kataoka HU, Koide N, Ochi K, Hojat M, Gonnella JS. Measurement of empathy among Japanese medical students: psychometrics and score differences by gender and level of medical education. Acad Med. 2009;84(9):1192-7.. Além disso, outro estudo sobre a empatia dos alunos de ensino médico realizado numa escola médica coreana também revelou que os anos mais avançados da formação médica foram associados significativamente a melhor empatia1717. Hong M, Lee WH, Park JH, Yoon TY, Moon DS, Lee SM, et al. Changes of empathy in medical college and medical school students: 1-year follow up study. BMC Med Educ. 2012;12(122):1-5..

Uma pesquisa com alunos de Medicina de uma universidade federal no Brasil demonstrou que não foi possível identificar resultados significativos em relação a aumento ou diminuição dos níveis de empatia com os pacientes nos alunos do primeiro ano e depois quando esses mesmos alunos já se encontravam no quarto ano44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

Alguns fatores podem influenciar a visão do acadêmico frente à situação do paciente e, consequentemente, da empatia, como características pessoais, estilo de aprendizagem e até abusos estudantis44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93.. Um estudo observou que a relação dos acadêmicos desde o início da graduação com os pacientes e a inserção de aulas e discussões de outras áreas do conhecimento, principalmente das disciplinas humanísticas, estavam relacionadas com os niveis de empatia44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

Médicos com mais habilidade para lidar com seus pensamentos, sentimentos e o manejo de suas emoções teriam habilidades sociais no que tange aos matizes da empatia, contribuindo para a melhor compreensão da relação empática criada entre médico e paciente1818. Dantas NDSM. Ideação suicida e empatia: um estudo correlacional em estudantes de medicina de uma universidade pública. [Dissertação]. Recife, Programa de Pós-Graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Pernambuco, 2015.. Isto possibilita um movimento psicoeducativo entre a classe médica, em que o próprio autoconhecimento seria o responsável por essa educação tanto no âmbito profissional como em processos terapêuticos que aprimoram questões emocionais essenciais à profissão médica1818. Dantas NDSM. Ideação suicida e empatia: um estudo correlacional em estudantes de medicina de uma universidade pública. [Dissertação]. Recife, Programa de Pós-Graduação em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Pernambuco, 2015..

Quanto à variável gênero, identificou-se que foi significativamente determinante do nível global de empatia e do fator cuidado compassivo. Pode-se afirmar que estudantes do sexo feminino, no conjunto de toda a amostra pesquisada, apresentaram-se mais empáticas no geral e com maior preocupação com os cuidados dispensados aos pacientes. Essa constatação também ocorreu em outra pesquisa, que identificou uma evolução da empatia nas mulheres, tendo os homens apresentado empatia estável e com menores índices modificáveis com a experiência do curso1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14..

O aumento da participação das mulheres na profissão médica não é um fenômeno recente. A feminização do exercício da medicina não era uma realidade como nos dias atuais. A crescente atuação da mulher no campo das áreas médicas proporcionou o aumento da confiança da mulher no exercício da medicina, e isso mudou a visão feminina sobre si, a família e o lar1919. Grinberg M, Lopes ASSA. Feminização da medicina. Arq. Bras. Cardiol. 2013;101(3):283..

Um estudo demonstrou que as mulheres tinham níveis mais expressivos de empatia em comparação aos homens. As mulheres médicas apresentaram maior capacidade de se identificar com os pacientes e com seus sentimentos. Existe uma grande evidência no estudo de que o gênero influencia o compromisso do olhar da perspectiva humanista em sentir respeito pelo outro na prática médica2020. Anaya MVM, Amador LRT, Martínez FG. Factores relacionados con la empatía en estudiantes de medicina de la Universidad de Cartagena. Rev Clín Med Fam. 2015;8(3):185-92.. Outro estudo que investigou se as taxas de mortalidade e de readmissão hospitalar diferiam entre pacientes tratados por médicas ou médicos identificou que nos pacientes idosos tratados por médicas houve menos mortalidade e menos readmissão, confirmando, assim, que a diferença de gênero na medicina pode ter implicações clínicas importantes no processo saúde-doença dos pacientes2121. Tsugawa Y, Jena AB, Figueroa JF, Orav EJ, Blumenthal DM, Jha AK. Comparison of hospital mortality and readmission rates for medicare patients treated by male vs female physicians. JAMA Intern Med. 2016;177(2):206-13..

Do ponto de vista estritamente organicista e unilateral, explica-se que a morfofisiologia cerebral diverge entre os sexos. Assim, as mulheres apresentam mais neurônios interligados entre os dois hemisférios cerebrais. Essa composição possibilita que esse sexo tenha mais habilidades empáticas do que os homens2222. Montilva M, García M, Torres A, Puertas M, Zapata E. Empatía según la escala de Jefferson en estudiantes de medicina y enfermería en Venezuela: Inv Ed Med. 2015;4(16):223-8.. Sobretudo, essas conexões permitem uma rápida transferência de informações, possibilitando maior visão do sentimento compassivo do outro2222. Montilva M, García M, Torres A, Puertas M, Zapata E. Empatía según la escala de Jefferson en estudiantes de medicina y enfermería en Venezuela: Inv Ed Med. 2015;4(16):223-8..

É fato que o perfil demográfico da medicina vem passando por uma grande mudança no âmbito do gênero. A mulher se tornou mais presente no campo médico e nesse meio-tempo procura estabelecer relações mais empáticas na prática médica. As mulheres médicas tendem a estabelecer relações médico-paciente mais harmoniosas. Isto porque proporcionam relações mais colaborativas, além de estabelecerem uma forma de comunicação mais democrática2323. Scheffer MC, Cassenote AJF. A feminização da medicina no Brasil. Rev. Bioét. 2013;21(2):268-77.. A mulher médica é capaz de entender com mais facilidade as particularidades e preferências de cada paciente, uma vez que esse indivíduo se insere em diferentes âmbitos culturais, não se limitando a questões reducionistas e biológicas2323. Scheffer MC, Cassenote AJF. A feminização da medicina no Brasil. Rev. Bioét. 2013;21(2):268-77..

Além do gênero, a idade também foi um fator que teve resultados relevantes no estudo, conforme as análises estatísticas e significativas. Ao se questionar a importância da empatia no contexto temporal, observou-se, num estudo no Japão, que as atitudes empáticas já eram observadas precocemente nas crianças2424. Formiga NS. A medida da empatia na internalidade familiar: a reatividade interpessoal entre pais e filhos. [homepage da internet]. [Acesso em 12 mar 2016]. Disponível em: http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0669.pdf
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. Em algumas, isso já é constatado em demonstrações de sentimentos e emoções antes mesmo de aprenderem a falar2424. Formiga NS. A medida da empatia na internalidade familiar: a reatividade interpessoal entre pais e filhos. [homepage da internet]. [Acesso em 12 mar 2016]. Disponível em: http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0669.pdf
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Observa-se, então, que, quanto mais novo o estudante, mais se torna evidente a capacidade de “colocar-se no lugar do paciente”, como observado no presente estudo. O avanço da idade é uma questão que influencia o modo de percepção do sentimento do próximo. Corroborando o resultado do presente estudo, uma pesquisa identificou que a capacidade de sentir empatia seria mais preponderante no indivíduo mais jovem2525. Ramírez GJP, Vallejos RMC. Nivel de empatía médica y factores asociados en estudiantes de medicina. Inv Ed Med. 2016. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.riem.2016.11.001 [in press].
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Outro ponto importante é a relação dos níveis de empatia com a presença de doença própria ou de familiares. Fatores relacionados com mais empatia foram o fato de terem participado de algum trabalho social voluntário e o contato próximo com a enfermidade de um amigo1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14.. No entanto, em constrate com essa informação, o achado do presente estudo evidenciou que a presença de doença pessoal não foi fator de melhor nível de empatia.

Sob o mesmo ponto de vista, pais que têm maior escolaridade constituem um fator mais influenciador dos filhos em termos da capacidade de colocar-se no lugar do outro1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14.. Atribui-se esse desenvolvimento de habilidades empáticas à característica de papel de tutor da família1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14..

A empatia no encontro clínico permite ao médico compreender melhor seu paciente. No entanto, essa visão do paciente com um olhar global, na maioria das vezes, não é observada no aprendizado e desenvolvimento de habilidades nas escolas médicas2525. Ramírez GJP, Vallejos RMC. Nivel de empatía médica y factores asociados en estudiantes de medicina. Inv Ed Med. 2016. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.riem.2016.11.001 [in press].
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,2626. Carvalho IGM. Avaliação do desenvolvimento de atitudes dos estudantes de medicina da Pontifícia Universidade Católica de Goiás [tese]. Goiânia, Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Goiás, 2014.. Pode-se inferir que o olhar global do médico é desenvolvido e influenciado por características próprias da personalidade de cada pessoa99. Costa FD, Azevedo RCS. Empatia, relação médico-paciente e formação em medicina: um olhar qualitativo. Rev. bras. educ. Med. 2010;34(2):261-9., sendo esta uma provável explicação para a dificuldade de ensinar ou desenvolver a capacidade de ser empático nas escolas médicas99. Costa FD, Azevedo RCS. Empatia, relação médico-paciente e formação em medicina: um olhar qualitativo. Rev. bras. educ. Med. 2010;34(2):261-9.. O desenvolvimento dessa habilidade também é visto como algo intrínseco a cada indivíduo2323. Scheffer MC, Cassenote AJF. A feminização da medicina no Brasil. Rev. Bioét. 2013;21(2):268-77..

Compreender e servir como uma ferramenta de apoio para os pacientes é uma tarefa que exige do médico o desenvolvimento de habilidades empáticas. Para ser um bom médico, é indispensável adquirir os conhecimentos técnicos fundamentais para conhecer as diversas enfermidades, diagnosticar e realizar a terapêutica. Não obstante, a medicina não se baseia apenas na ciência que é abordada na doença em si44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

A capacidade de compreender o ser humano é um dos elementos mais difíceis numa relação médico-paciente porque a empatia é vista como uma habilidade social. Tal habilidade, acima de tudo, é importante para a tomada de consciência do “outro” e para se ter a capacidade de tomar atitudes77. Falcone EMO, Ferreira MC, Luz RCM, Fernandes CS, D'Augustin JF, Sardinha A, et al. Inventário de empatia (I.E.): desenvolvimento e validação de uma medida brasileira. Aval. Psicol. 2008;7(3):321-34.. Além disso, a empatia não pode ser ensinada, mas apenas induzida por exemplos de atitudes empáticas1515. Esquerda M, Yuguero O, Viñas J, Pifarré J. La empatía médica, ¿nace o se hace? evolución de la empatía en estudiantes de medicina. Aten Primaria. 2016;48(1):8-14..

Nessa mesma abordagem, a empatia deve ser encarada como um elemento fundamental à relação médico-paciente, pois é vista como uma ligação entre a medicina baseada em evidências e a prática clínica centrada no paciente2727. Moreto G, Gonzáles-Blasco P, Piñero. Reflexiones sobre la deshumanización de la educación médica: empatía, emociones y posibles recursos pedagógicos para la educación afectiva del estudiante de medicina. Educ Med. 2017. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.edumed.2016.12.013 [in press].
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. Assim, os futuros médicos devem ter a consciência dessa aproximação mais emocional com os pacientes a fim de exercerem uma medicina focada na abordagem integral dos indivíduos44. Thomazi L, Moreira F, Marco MA. Avaliação da evolução da empatia em alunos do quarto ano da graduação em medicina da Unifesp em 2012. Rev. Bras. Educ. Med. 2014;38(1):87-93..

CONCLUSÃO

Identificou-se que não há diferença significativa entre os escores avaliados em termos de empatia global, tomada de perspectiva, cuidado compassivo e se colocar no lugar do outro entre alunos ingressantes e concluintes do curso de Medicina avaliado. Não obstante, os dados apontaram uma tendência dos concluintes em serem mais empáticos.

Em relação aos dados obtidos avaliando-se a associação com fatores sociodemográficos, o gênero feminino, ausência de doença pessoal e menor idade foram os escores que apresentaram dados estatísticos significativos. Isto porque as mulheres indicaram maior capacidade empática na relação com os pacientes e no contexto pessoal. Esses dados confirmaram outros achados na literatura pesquisada. Morar em residência própria foi outra variável analisada que apresentou maior escore em relação à empatia.

Dessa forma, outros estudos são necessários para confirmar os resultados e analisar melhor outros fatores que podem contribuir para modificar ou moldar os níveis de empatia nos estudantes de Medicina, como, por exemplo, pesquisas que abordem se o desenvolvimento e o aprimoramento de disciplinas e a capacitação de professores seriam fundamentais na formação médica, bem como investigar possíveis associações entre as metodologias de ensino emergentes e sua influência no desenvolvimento da empatia.

À guisa de conclusão, o presente estudo ressalta que o caráter mais humanizado do exercício da medicina é essencial à entrevista clínica, e, por isso, são fundamentais novas abordagens sobre esse tema, tendo em vista a importânica de atitudes empáticas na formação médica e no futuro exercício da medicina.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2018

Histórico

  • Recebido
    24 Jul 2017
  • Aceito
    20 Set 2017
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