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Utilização da Aprendizagem Baseada em Equipes como Método de Avaliação no Curso de Medicina

The Use Of Team-Based Learning As An Evaluation Method On The Medicine Course

RESUMO

A educação de adultos pressupõe a utilização de metodologias ativas de ensino-aprendizagem, que proponham concretamente desafios a serem superados pelos estudantes, tendo o professor como facilitador e orientador do processo. O objetivo deste estudo foi relatar o uso da Aprendizagem Baseada em Equipes (ABE) como estratégia de avaliação dos alunos na disciplina Interação Ensino-Serviço na Comunidade (Iesc) no curso de Medicina. A aplicação da ABE ocorreu em duas turmas da Iesc, respeitando as três etapas previstas na metodologia. A experiência obtida com a aplicação da ABE em substituição à prova tradicional demonstrou aspectos relevantes, como: na preparação, é fundamental que o acadêmico se comprometa a estudar os temas propostos; a utilização de aplicativo foi uma estratégia inovadora; o desempenho da equipe superou o individual. A aplicação dos conceitos ocorreu nas aulas de campo da Iesc, pois esta propõe a observação de casos clínicos reais nas unidades de saúde e comunidade, utilizando os conhecimentos teóricos adquiridos para direcionar intervenções. A aplicação da ABE se mostrou um método eficiente para avaliação na Iesc, que se pauta na perspectiva da interação e processos colaborativos. O uso do recurso tecnológico como ferramenta despertou interesse entre os estudantes, minimizando a tensão que geralmente ocorre durante o processo da avaliação tradicional. É importante que os cursos de formação em saúde façam uma análise constante para que práticas do ensino tradicional não sejam supervalorizadas em detrimento das práticas ativas de aprendizagem.

Medicina; Aprendizagem; Educação Superior

ABSTRACT

Adult education presupposes the use of active teaching and learning methodologies that propose challenges to be overcome by students, with the teacher acting as facilitator and guiding the process. The objective of this study was to report the use of Team-Based Learning (TBL) as one of the methods used to evaluate students in the subject Teaching-Service interaction in the Community (IESC), of the Medicine Course. TBL was applied with two classes IESC classes. The experience gained through the application of TBL, instead of the traditional test, demonstrated some relevant aspects, for example: in the preparation, it is fundamental that the student is committed to studying the proposed topics; the use of application was an innovative strategy that motivated the academics to participate actively in the process; the performance of the team took precedence over individual performance. The concepts learned were put into practice in the IESC field classes, since they involve observation of real clinical cases in the Health Units and in the community, using the theoretical knowledge acquired, in the interventions. The application of TBL proved to be an efficient evaluation method in the IESC, which is based on the perspective of interaction and collaborative processes. The use of the technological resource as a tool sparked the students’ interest, minimizing the stress that usually occurs during the traditional assessment. It is important that health training courses provide a review, to ensure that traditional teaching practices are not given too much weight, at the expense of active learning practices.

Medicine; Learning; Education Higher

INTRODUÇÃO

No Brasil, a formação superior na área da saúde, seguindo as atuais Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para graduação em Medicina, apresenta a necessidade de adequação dos cursos de graduação e desafia seus docentes a formar profissionais tecnicamente competentes, com perfil crítico, reflexivo, ético e humanista, aptos para trabalhar em equipe de forma colaborativa e com responsabilidade social11. Brasil. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Superior. Resolução CNE/CES nº 3, de 20 de junho de 2014 - Institui Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Medicina e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 23 de Junho de 2014 – Seção 1 – pp. 8-11..

Ciente de suas responsabilidades sociais, a Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat) implantou o primeiro curso de Medicina numa instituição pública, no interior do estado. O bacharelado em Medicina é diferenciado em vários aspectos segundo seus pressupostos, tendo como finalidade central contribuir para aprimorar o processo de ensino-aprendizagem, apoiando a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e, ainda, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida do cidadão. Assim, os objetivos do curso de Medicina estão em conformidade com as DCN e preveem, além disso, que a formação do médico se dê com base numa reflexão acerca da prática, em um ciclo que retorna à mesma, transformando a realidade. Para isso, são valorizados não só os aspectos cognitivos na formação do estudante, mas também os atitudinais e psicomotores.

A formação médica nesta universidade apresenta uma interação que envolve três componentes curriculares: módulos temáticos, habilidades profissionais e interação ensino-serviço na comunidade (Iesc). Esses três componentes se articulam a fim de proporcionar ao estudante uma formação voltada à solução de problemas. A disciplina Iesc é um componente curricular longitudinal ministrado do primeiro ao oitavo semestre e tem por objetivo articular as bases teóricas do processo formativo com a realidade das práticas profissionais nos serviços de saúde. Didaticamente, a Iesc integra as disciplinas ministradas no semestre de forma prática, ou seja, correlaciona a formação teórica adquirida nos módulos de habilidades médicas, morfofuncional e tutoria, aplicando-a na comunidade atendida pelos serviços de saúde disponíveis no município22. Estado de Mato Grosso. Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia. Universidade do Estado de Mato Grosso. Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão – CONEPE. Resolução Nº 032/2016 – CONEPE. Aprova o Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado em Medicina, a ser executado no Campus Universitário “Jane Vanini”, no município de Cáceres-MT. Cáceres, 22 a 24 Agosto de 2015..

Diversas metodologias e técnicas educacionais construtivistas têm sido utilizadas para contemplar essa formação a fim de desenvolver as competências necessárias à atuação profissional33. Limberger, JB. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem para educação farmacêutica: um relato de experiência. Interface (Botucatu). 2013; 17(47):969-975., entre elas a Aprendizagem Baseada em Equipes (ABE), que pode contribuir para o processo de ensino-aprendizagem ao modificar os métodos tradicionais. A ABE tem sua fundamentação teórica baseada no Construtivismo, em que o professor se torna um facilitador da aprendizagem, que é baseada no diálogo e na interação entre os alunos, o que abrange as habilidades de comunicação e trabalho colaborativo em equipes, além de permitir a reflexão do aluno sobre a prática, o que leva à mudança de raciocínios prévios44. Bollela VB, Senger MH, Tourinho FSV, Amaral E. Aprendizagem baseada em equipes: da teoria à prática. Medicina (Ribeirão Preto). 2014;47(3):293-300..

Assim, com o intuito de melhorar o processo de ensino-aprendizagem, minimizar as fragilidades e ampliar o uso de metodologias ativas, em consonância com o projeto pedagógico do curso, uma equipe docente propôs a modificação de um dos métodos de avaliação do aluno, substituindo a prova escrita individual pelo uso da ABE.

Neste contexto, o objetivo deste estudo foi relatar o uso da ABE como um dos métodos de avaliação dos alunos na disciplina Iesc em um curso de bacharelado em Medicina.

PERCURSO METODOLÓGICO

A aplicação da ABE ocorreu no curso de bacharelado em Medicina da Unemat, com alunos do terceiro semestre, na disciplina Iesc, nos semestres letivos 2017/1 e 2017/2. Nesta etapa, a ementa da disciplina inclui conteúdos relacionados aos programas do Sistema Único de Saúde relacionados à atenção à saúde da criança e do adolescente, bem como de saúde perinatal. Mesmo o método principal do curso de Medicina da Unemat sendo o Problem Based Learning (PBL), no qual os conteúdos teóricos são aprendidos em sessões tutoriais e estudos individuais, a disciplina Iesc contempla a parte teórica mais voltada à execução da ementa proposta, ou seja, saúde pública e sua aplicação na prática. Para concretizar este objetivo, são direcionados estudos para os seguintes temas: programas do Ministério da Saúde para a criança/adolescente; nutrição infantil e vacinação; crescimento e desenvolvimento infantil; saúde do adolescente.

A disciplina Iesc emprega como métodos de avaliação instrumentos que avaliam o acadêmico de forma tanto somativa quanto formativa. São eles:

Seminários preparados e apresentados por grupos de alunos com os temas abordados durante o semestre. Os professores aprofundam o nível de discussão dos temas e os avaliam desde a apresentação até a habilidade em responder perguntas;

Prova escrita, utilizada para verificar os conceitos apreendidos;

Avaliação processual diária, que consiste em avaliar o aluno ao final de cada aula de campo para verificar se as metas esperadas de aprendizagem foram atingidas, além das experiências e desempenho individual. Este método verifica quesitos como pontualidade, comprometimento, trabalho em equipe, articulação teórico-prática e uso do material de campo;

Portfólio redigido pelo aluno referente às aulas de campo; neste é observada a capacidade de compreensão da realidade vivenciada pelo aluno em suas atividades e sua proatividade na busca de conhecimento teórico;

Plenária, que ocorre ao final do semestre, quando os grupos de trabalho são reunidos numa sessão plenária para discutir e apresentar suas experiências, bem como as informações colhidas e contextualizadas, com reflexões sobre facilidades e/ou dificuldades no desenvolvimento das atividades e proposição de ações a serem executadas e modificadas nas turmas seguintes. Um docente fica responsável pelo registro das informações apresentadas, com uso de um formulário padronizado que avalia aspectos como apresentação oral, conteúdo da introdução, relato das atividades, análise crítica, levantamento de problemas, sugestões e conclusão. Essas informações são anotadas, categorizadas e analisadas posteriormente em reuniões pedagógicas para identificação das potencialidades e fragilidades da disciplina e do curso.

No término dos referidos semestres, os docentes tiveram sessões de reuniões pedagógicas nas quais o relatório da plenária foi apresentado com o apontamento das fragilidades e potencialidades da disciplina. O déficit de conteúdo teórico para a prática nas unidades de saúde foi uma fragilidade identificada e considerada grave pelos docentes. Diante dos fatos, o grupo dos docentes decidiu modificar a metodologia de aplicação da prova teórica com uso da ABE e que isto seria feito antes das aulas de campo nas unidades de saúde, corroborando a metodologia do ABE.

Assim, no início do semestre, foi apresentado aos estudantes o plano de ensino, esclarecendo seus objetivos, metodologias e formas de avaliação. Nesse momento, os professores expuseram a metodologia de ensino ABE, descrevendo detalhadamente cada etapa e destacando a importância de respeitar cada fase do processo, desde a preparação individual até a aplicação de conceitos. A implantação da ABE como um dos métodos de avaliação discente ocorreu em três etapas, descritas a seguir:

1ª etapapreparação: os alunos estudaram individualmente a bibliografia disponibilizada no plano de ensino e apresentaram seminários;

2ª etapagarantia de preparo: foi realizado um teste composto de dez questões de múltipla escolha projetadas de forma eletrônica para a visualização da questão. Elaboradas pelos docentes, as questões procuraram abranger todo o conteúdo programático da etapa. O tempo de exposição de cada questão foi de quatro minutos para aquelas com resposta única e de oito minutos para questões com análise de todos os itens. Após o tempo de exposição da questão e a garantia verbal de que todos os alunos haviam respondido a ela, as respostas foram coletadas pelo Plickers® por meio de um aparelho smartphone. O aplicativo Plickers® é uma ferramenta eletrônica que combina cartões com símbolos semelhantes a códigos Quick Response (QR) – que corresponde a um código de barras bidimensional, de fácil reconhecimento por leitores de celulares equipados com câmera, e convertido em texto – com as tecnologias móveis. Para a utilização dessa ferramenta, foram distribuídos os cartões-resposta, previamente cadastrados para cada estudante, que contavam com quatro opções de respostas, sinalizadas pelas letras “a” até “d”. Ao escolherem a alternativa que julgavam estar correta, todos os alunos, ao mesmo tempo, posicionavam o cartão com sua alternativa escolhida para face superior, e o docente coletava as respostas com o uso de smartphone.

Além da coleta das respostas pelo aplicativo, todas as respostas foram anotadas manualmente em gabarito próprio, tanto na avaliação individual como na da equipe, como contraprova em caso de recursos. No segundo momento, os professores separaram os alunos em quatro grupos de forma equilibrada, garantindo que os alunos com relações de proximidade pessoal estivessem em grupos diferentes. O grupo de ABE teve a missão de responder às mesmas questões respondidas individualmente, mas com o intuito de desenvolver uma discussão entre eles para um consenso geral e o registro em um gabarito único. As respostas desse gabarito também foram coletadas pelo aplicativo, e os alunos recebiam o feedback da resposta correta imediatamente após responderem a cada questão. Ainda nessa etapa, ocorreu a fase de apelação, ou seja, os alunos tiveram o prazo de dois dias para recorrer das questões que julgassem incorretas; quando a apelação era procedente, a equipe apeladora recebia o ponto da questão. A avaliação da ABE foi realizada de forma somativa, consistindo no número de acertos de questões individuais e em grupos; na sequência, foi realizada uma média aritmética que atribuiu o peso de 40% aos acertos individuais e de 60% aos acertos do grupo;

3ª etapaaplicação de conceitos: ocorreu durante todo o semestre na Unidade Básica de Saúde (UBS) nos momentos em que os discentes se deparavam com os casos clínicos reais e se reportavam aos conhecimentos teóricos adquiridos para realizar uma prática adequada e assim sedimentar o aprendizado.

Durante a execução de cada etapa, os docentes realizaram anotações acerca do processo, pontuando as dificuldades e os avanços e pontos positivos revelados.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A apresentação da plenária pelos acadêmicos na disciplina Iesc gerou a criação de relatórios que revelaram fragilidades e potencialidades. O uso de dados qualitativos, com a criação de uma análise coerente e perceptiva que se mantenha baseada nesses dados, proporciona boas evidências de sustentação55. Gibbs G. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre: Artmed; 2009.. Após a análise desses relatórios pelo corpo docente, categorização dos dados e discussão entre os pares, foram feitas proposições de mudanças para aprimorar a disciplina.

A Figura 1 apresenta a condução da disciplina Iesc antes da utilização da Aprendizagem Baseada em Equipes: os alunos eram divididos em grupos para a apresentação do seminário, esses grupos iam à prática na UBS e após o retorno realizavam a avaliação (prova escrita) e finalizavam o semestre com a plenária.

FIGURA 1
Condução da disciplina Iesc antes da utilização da Aprendizagem Baseada em Equipes

A principal fragilidade detectada na plenária foi a falta de preparo teórico dos estudantes para as atividades práticas na UBS, mesmo após discussão conjunta com os docentes. Esse déficit era percebido quando o aluno entrava em contato com o paciente e com a comunidade, e foi observado pelos docentes em relatos de insegurança e superficialidade por parte dos alunos na identificação de problemas e na proposição de intervenções de saúde dos pacientes acompanhados. Como a disciplina era eminentemente prática, esperava-se que o aluno compreendesse conceitos mínimos para conduzir uma avaliação de crescimento e desenvolvimento de uma criança e diagnosticar um possível atraso da mesma ou ainda detectar uma caderneta de vacinas em atraso ou orientar a suplementação de vitaminas e minerais preconizada pelo SUS, mas isso não acontecia a contento. Desse modo, após análise crítica dos docentes, proposições de mudanças nas estratégias que melhorassem o processo de ensino-aprendizagem e decisão consensual, a avaliação teórica tradicional e individual (prova) foi substituída pela avaliação conceitual ABE após a apresentação dos seminários e antes da aula de campo na UBS, como apresentado na Figura 2.

FIGURA 2
Condução da disciplina Iesc com a utilização da Aprendizagem Baseada em Equipes

Na fase de preparo, além dos estudos individuais dos conteúdos abordados no semestre com apoio das referências bibliográficas sugeridas, os discentes foram divididos em grupos e orientados a preparar e apresentar seminários sobre os principais pontos. Nessa etapa, observou-se, por meio da apresentação oral, que os acadêmicos não estudaram todos os temas, eles os dividiram entre os membros do grupo. Portanto, o estudo foi fragmentado, e a preparação individual para a apresentação não ocorreu de forma longitudinal por cada membro da equipe, uma prática comum entre os estudantes. Realizar a verificação dos conceitos próximo a essa etapa pode estimular o interesse dos acadêmicos por todo o conteúdo do seminário e até mesmo o daqueles que estarão na plateia no momento da apresentação.

Autores com experiência nesta metodologia relatam que os estudantes devem ser responsáveis por se preparar individualmente para o trabalho em grupo – leituras prévias ou outras atividades definidas pelo professor com antecedência, como assistir à realização de um experimento, a uma conferência, a um filme, realizar entrevista, entre outras. A preparação da atividade individual pré-classe é uma etapa crítica. Esses autores afirmam ainda que, se não completarem as tarefas pré-classe individualmente, os alunos não serão capazes de contribuir para o desempenho de sua equipe. A falta dessa preparação dificulta o desenvolvimento de coesão do grupo e resulta em ressentimento dos alunos que se prepararam, pois estes percebem a sobrecarga causada pelos colegas menos dispostos e/ou menos capazes44. Bollela VB, Senger MH, Tourinho FSV, Amaral E. Aprendizagem baseada em equipes: da teoria à prática. Medicina (Ribeirão Preto). 2014;47(3):293-300..

Como a ABE é uma metodologia ativa, espera-se que ela estimule a aprendizagem significativa, uma vez que é por meio de atos que se adquire o conhecimento. Esse processo é facilitado quando o aluno participa responsavelmente. Portanto, para que o estudante realmente aprenda e se beneficie das metodologias ativas, é fundamental que ele se comprometa com a fase de preparação individual, realizando a atividade solicitada pelo professor66. Gadotti M. Histórias das ideias pedagógicas. São Paulo: Ática; 1995..

No início da atividade, observou-se certa agitação dos acadêmicos, bem como a demonstração de insegurança com a apresentação da avaliação apenas em formato eletrônico, sem a presença da prova impressa. Esses comportamentos foram diminuindo à medida que a atividade foi se desenvolvendo, e os alunos compreenderam que, embora a apresentação digital das questões fosse uma estratégia nova, seu desempenho não seria prejudicado.

Um estudo realizado em 201677. Portes SS. Intervenção pedagógica mediada com metodologia ativa teambasedlearning na educação profissional: uma experiência no Instituto Federal de Brasília, campus Taguatinga. Periódico Científico Outras Palavras. 2016;12(2):78-92. afirmou que a receptividade dos alunos em relação à prática da metodologia ABE foi boa e relatou que a turma se manteve ativa e atenta a todas as instruções, apesar de os alunos estarem mais agitados do que o normal. Descreveu que a ABE é uma metodologia pouco utilizada nos cursos de formação em saúde e por isso pode provocar insegurança dos discentes no início da execução das atividades.

O tempo proposto para a resolução das questões foi adequado, pois todos os alunos conseguiram responder aos testes sem que o professor precisasse projetá-los novamente no final da avaliação. O emprego de tempo adequado à resolução de cada questão permite que alunos com diferentes níveis de conhecimento sobre o assunto consigam responder em tempo hábil e que todos os alunos sejam capazes de ler e resolver a questão88. Morgado F, Barbosa NM, Mota EFRO. Criando, validando e aplicando testes de progresso nos cursos de Engenharia do UNIFESO. Cobenge XL Congresso Brasileiro de Educação em Engenharia, 03 a 06 de Setembro de 2012, Belém/PA..

Após a projeção de cada questão, as respostas foram coletadas por meio do aplicativo Plickers®, instrumento que tem como finalidade favorecer uma avaliação dinâmica, que permita mensurar instantaneamente o nível de aprendizado. O relatório gerado no final de cada questão possibilita uma análise do aprendizado de cada conteúdo estudado, promovendo, se necessário, uma revisão direcionada ao tema que apresentou baixo rendimento99. Nunes VWN, Couto RR. Uso do aplicativo Plickers como recurso de metodologia ativa. II Congresso sobre Tecnologias na Educação,18 a 20 de Maio de 2017,Universidade Federal da Paraíba - Campus IV Mamanguape, Mamanguape, Brasil.,1010. Nunes VWN, Bessa RC. Metodologias ativas apoiadas por recursos digitais: usando os aplicativos Prezi e Plickers. Challenges 2017: Aprender nas Nuvens, Learning in theClouds (Atas da X Conferência Internacional de Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação), 8 a 10 de Maio de 2017, Universidade do Minho, Braga, Portugal, p.23-39..

Tal tecnologia móvel online foi uma estratégia inovadora que motivou os acadêmicos a participar ativamente do processo. Essa tecnologia também poderia ser utilizada se não houvesse disponibilidade de internet. Nesse caso, os alunos não poderiam acompanhar a coleta da sua resposta em tempo real. Considerando que os jovens da atualidade vivenciam e valorizam o uso de tecnologias nos diversos contextos do seu cotidiano, a integração de Tecnologias da Informação e Computação (TIC) pode promover mudanças significativas nos processos de ensino-aprendizagem, fazendo com que os alunos desenvolvam uma autonomia intelectual que lhes permita continuar a aprender ao longo da vida99. Nunes VWN, Couto RR. Uso do aplicativo Plickers como recurso de metodologia ativa. II Congresso sobre Tecnologias na Educação,18 a 20 de Maio de 2017,Universidade Federal da Paraíba - Campus IV Mamanguape, Mamanguape, Brasil.,1010. Nunes VWN, Bessa RC. Metodologias ativas apoiadas por recursos digitais: usando os aplicativos Prezi e Plickers. Challenges 2017: Aprender nas Nuvens, Learning in theClouds (Atas da X Conferência Internacional de Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação), 8 a 10 de Maio de 2017, Universidade do Minho, Braga, Portugal, p.23-39..

A fase de discussão em grupo foi, a priori, o ponto-chave dessa atividade, na qual foi possível observar que os alunos se posicionaram e discutiram todas as alternativas de cada questão que compunha a avaliação, recorrendo à fundamentação teórica individual para a defesa de sua resposta e tomada de decisão do grupo, além de exercerem seu papel questionador, comunicativo e ativo. É na interação entre as pessoas que em primeiro lugar se constrói o conhecimento, que depois será intrapessoal, ou seja, será partilhado pelo grupo em que foi conquistado ou construído1111. Martins, MA et al. Aprendizagem colaborativa na formação médica. Editorial Profissão Docente. USP: 2015 apud Portes SS. Intervenção pedagógica mediada com metodologia ativa teambasedlearning na educação profissional: uma experiência no Instituto Federal de Brasília, campus Taguatinga. Periódico Científico Outras Palavras. 2016;12(2):78-92.. Neste sentido, a avaliação formativa ganha dimensão participativa e colaborativa, quando o aluno percebe que sua produção é individual, mas pode melhorar com ajuda coletiva1212. Tavares DE. Aspectos da história deste livro. In: Fazenda, Ivani (org.). Práticas interdisciplinares na escola. 11 ed. São Paulo: Cortez; 2009..

Na ABE, a estratégia educacional central consiste em não só propiciar ao estudante um protagonismo ativo, o que lhe confere maior autonomia no processo de construção do seu conhecimento, mas também estimular o comprometimento do estudante com o resultado do trabalho em equipe, uma vez que o sucesso da equipe advém de uma interação eficaz entre os seus membros, possibilitando uma aprendizagem significativa e transformadora77. Portes SS. Intervenção pedagógica mediada com metodologia ativa teambasedlearning na educação profissional: uma experiência no Instituto Federal de Brasília, campus Taguatinga. Periódico Científico Outras Palavras. 2016;12(2):78-92..

Um aspecto a considerar é o número de questões, pois provas muito extensas interferem na duração da segunda etapa, bem como na atenção e na motivação dos alunos na execução da atividade. Um estudo nacional1313. Gatti BA. O professor e a avaliação em sala de aula. Est AvalEducSão Paulo [online]. 2003; 27(65):97-114. Disponível em: http://publicacoes.fcc.org.br/ojs/index.php/eae/article/view/2179/2136.
http://publicacoes.fcc.org.br/ojs/index....
relata que a extensão da prova deve ser cuidada e calibrada, pois a avaliação pode provocar cansaço e interferir no tempo disponível para a sua realização. Por outro lado, menor quantidade de questões e maior disponibilidade de tempo na etapa da discussão em grupo podem ser benéficas. Uma pesquisa recente1414. Torres J, Almeida A, Vasconcelos C. Questionamento em manuais escolares: um estudo no âmbito das Ciências Naturais. CiêncEduc (Bauru) [online]. 2015;21(3):655-71. mostrou que esse período de espera pode originar respostas mais longas, mais argumentadas e com maior lógica, aumentar o número de voluntários a participar, reduzir o número de respostas erradas, desenvolver competências de ordem superior e aumentar o número de questões levantadas pelos alunos.

Neste estudo, foi possível observar que os alunos utilizaram de forma satisfatória a fase da apelação, elaborando o apelo com embasamento bibliográfico e argumentação coerente. A possibilidade de discordar e questionar gera credibilidade para os acadêmicos, fortalecendo o objetivo principal, focado na aprendizagem. A apelação proporciona aos alunos senso de justiça, incentiva o envolvimento de todos os alunos no sucesso do desempenho da equipe, motiva os alunos a avaliar criticamente seu desempenho, além de auxiliar o professor a reformular algumas perguntas do teste para as aulas seguintes1515. Parmelee D, Michaelsen LK, Cook S, Hudes PD. Team-based learning: a practical guide: AMEE guide no. 65. Med Teach. 2012;34(5):e275-e7.. Bollela et al.44. Bollela VB, Senger MH, Tourinho FSV, Amaral E. Aprendizagem baseada em equipes: da teoria à prática. Medicina (Ribeirão Preto). 2014;47(3):293-300. afirmaram que a fase de apelação é mais uma possibilidade para a coesão da equipe e seu exercício de aprendizagem.

Verificou-se ainda que o desempenho da equipe superou o desempenho individual, além de inexistirem conflitos entre os membros do grupo a ponto de impactarem seu desempenho avaliativo geral, dispensando a intervenção direta do professor. Os estudos mostram que, em 98% das vezes, o desempenho da equipe supera o desempenho do melhor membro da equipe isoladamente1616. Michaelsen, LK, Black RH. Building learning teams: the key to harnessing the power of small groups in higher education, Collaborative Learning: A Sourcebook for Higher Education (Vol. 2). State College, PA: National Center for Teaching, Learning & Assessment, 1994 apudBollela VB, Senger MH, Tourinho FSV, Amaral E. Aprendizagembaseadaemequipes: da teoria à prática. Medicina (Ribeirão Preto). 2014;47(3):293-300..

A fase de aplicação dos conceitos ocorreu nas aulas de campo da disciplina Iesc, uma vez que esta propõe a observação de casos clínicos reais na UBS e na comunidade, utilizando os conhecimentos teóricos adquiridos para direcionar intervenções ou resoluções dos problemas observados.

Ao término dos semestres letivos 2017/1 e 2017/2, nas plenárias apresentadas, os relatos dos acadêmicos registraram que a modificação da prova escrita para a ABE antes das aulas de campo nas UBS possibilitou melhor preparo teórico dos conteúdos a serem praticados e, como consequência, maior segurança na condução dos casos reais. Esse fato também foi relatado pelos docentes na reunião pedagógica ao término do semestre, quando perceberam que os alunos estavam mais preparados para a vivência das situações reais no campo, exigindo menos intervenções do docente relacionadas ao conteúdo teórico.

Nessa experiência, a ABE mostrou-se uma ferramenta pedagógica que pode ser adaptada a vários contextos e conteúdos. A oportunidade de praticar o uso de conceitos aplicados ao pensamento crítico, resolução de problemas e a interação entre alunos e professores são garantidas no processo, estimulando o trabalho em equipe e a capacidade de pactuação1717. Bandeira DMA, Silva MA, Vilela RQB. Aprendizagem Baseada em Equipe. RevistPort: Saúde e Sociedade. 2017;2(1):371-79..

A aprendizagem abrange o crescimento e desenvolvimento da pessoa em sua totalidade, abarcando minimamente quatro grandes áreas: conhecimento, afetivo-emocional, habilidades, e atitudes e valores. Esse modelo de aprendizagem envolve o estudante como pessoa, valorizando suas ideias, sentimentos, valores, cultura, sociedade e experiências pessoais.

Na aplicação da ABE no curso de Medicina da Unemat, os alunos puderam perceber a diferença da aprendizagem por meio dos métodos tradicionais e das metodologias ativas, uma vez que houve maior compreensão dos conteúdos estudados; o trabalho em grupo realmente faz outro sentido, aprende-se com o outro e tem-se a oportunidade de tirar dúvidas com outras pessoas além do professor; vai-se além de conceitos e procedimentos, mas se chega à metacognição.

CONCLUSÃO

A aplicação da Aprendizagem Baseada em Equipes apresentou-se como um método eficiente para avaliação, principalmente no contexto da disciplina Iesc, que se pauta na perspectiva da interação e processos colaborativos, preparando o aluno para futuras atuações em equipe e formando profissionais críticos e reflexivos.

O uso de um recurso tecnológico como ferramenta despertou dinamismo e interesse entre os estudantes, minimizando a tensão que geralmente ocorre durante o processo de avaliação tradicional.

Concluiu-se que é fundamental fazer uma análise crítica constante para que práticas do ensino tradicional não sejam supervalorizadas em detrimento das práticas ativas de aprendizagem e os docentes recebam formação permanente a fim de se sentirem confortáveis para mudar sua práxis.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    19 Nov 2018
  • Aceito
    17 Dez 2018
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