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Desenvolvimento e Validação de Instrumento para Avaliação das Competências Gerais nos Cursos da Área da Saúde

RESUMO

A avaliação das competências gerais nas graduações da área da saúde permanece desafiante.

Objetivos

Desenvolver um instrumento para apoiar os docentes na avaliação das competências gerais dos graduandos de cursos da área da saúde; testar a confiabilidade do instrumento com professores e estudantes do mesmo campo de atuação; validar o instrumento de competências gerais, direcionado aos professores e graduandos da área da saúde.

Métodos

A pesquisa foi do tipo metodológico, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa nº 826.770. Foram realizadas a validação de constructo, a de critério e a de conteúdo com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) e na busca de referencial teórico, além de testes estatísticos como alfa de Cronbach, test t, valor de p, análise fatorial, correlação do coeficiente de Pearson e Akaike information criterion (AIC), que também garantiram a confiabilidade. O estudo foi desenvolvido em uma instituição de ensino superior de Curitiba (PR), nos cursos de Enfermagem, Biomedicina, Farmácia, Psicologia e Medicina, sendo a sua população composta de 50 avaliações de estudantes e 50 de professores, o que contemplou todos os períodos e cursos em andamento no segundo semestre de 2014.

Resultados

Foi possível a confecção de um modelo com três versões de instrumentos que avaliam as competências gerais para os cursos da área da saúde. A primeira englobou as competências gerais de 10 cursos da área da saúde, que se subdividem em: atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação permanente. A segunda e terceira versões contam com três dimensões, atenção à saúde, gestão em saúde e educação em saúde, voltadas para as competências gerais da nova formulação das DCNs do curso de Medicina. As três versões contam com um instrumento voltado para o professor e outro, espelho, dirigido ao estudante.

Conclusão

Para validar o instrumento sobre competências gerais, direcionado aos professores e graduandos de cursos da área da saúde, foram utilizadas, no que se refere ao seu conteúdo, a busca de referencial teórico, as DCNs e a avaliação de experts; para a validação de critério, o teste t, o teste χ2e a correlação de coeficiente de Pearson; e para validade de constructo, os testes estatísticos de análise fatorial exploratória e confirmatória e o AIC. Para validade de conteúdo, recorreu-se aos mesmos passos descritos para o primeiro objetivo, a fim de garantir a confiabilidade dos instrumentos, e empregaram-se o alfa de Cronbach e o AIC. Após esse processo, foi possível o desenvolvimento de três versões do instrumento, sendo as duas primeiras para utilização de professores e para professores e estudantes em conjunto; e a versão 3 foi apropriada para professores ou estudantes e ainda para professores e estudantes em conjunto, porém ela pode ser utilizada por todos os cursos da área da saúde estudados.

Competência Profissional; Ensino; Avaliação do Ensino; Educação Superior; Estudos de Validação

ABSTRACT

The evaluation of the General Competencies in undergraduate courses in the healthcare area remains challenging.

Objectives

To develop an instrument for supporting teaching staff in evaluating the General Competencies of undergraduate students in the healthcare area; to test the reliability of the instrument with teachers and students of the same working field; validate the instrument of General Competencies, directed to teachers and students from the health area.

Methods

the present was a Methodological study, approved by REC N. 826.770. The validation of the construct, criterion and content based on the National Curricular Guidelines (NCG), and the search for a theoretical framework were performed, as well as statistical tests such as alpha Cronbach, t Test, p-value, Factorial Analysis, Pearson’s Correlation Coefficient and Akaike Information Criterion, which also ensured the reliability. The study was performed in a Higher Education Institution in Curitiba/PR, in the courses of Nursing, Biomedical Sciences, Pharmacy, Psychology and Medicine. The study population consisted of 50 evaluations of students and 50 of teachers, covering all the periods and courses during the second half of 2014.

Results

it was possible to create one model with three versions of instruments that evaluated the general competencies for the healthcare area courses. One of these was directed towards the general competencies of 10 courses in the healthcare area, subdivided in Health Care, Decision-making, Communication, Leadership, Administration and Management and Continuing Education, with one instrument directed at the student and another ‘mirror’ at the professor. The second and third versions had three dimensions: Health Care, Management in Healthcare and Education in Health, directed towards the general competencies of the new structure of the NCG of the medical course. The three versions also had an instrument for teachers and a mirror one for students.

Conclusion

To validate the instrument on General Competencies, directed to teachers and undergraduate students of health area courses, the theoretical search, the NCG and the experts’ evaluation were used for Content Validity; the t Test, Chi-square Test and Pearson’s correlation coefficient were used for Criterion Validation; statistical tests of exploratory and confirmatory factorial analysis and the AIC were used for Construct Validity; and Cronbach’s alpha and the AIC were used for Content validity, using the same steps described for the first goal, to ensure the reliability of the instruments. After this process three versions of the instrument were developed, the first two to be used with teachers and with teachers and students together; and the third version is adequate to be used with students or teachers; and also, for teachers and students together. However, it can be used by all health courses studied.

Professional Competency; Teaching; Educational Measurement; Education, Higher; Validation Studies

INTRODUÇÃO

As profissões da área da saúde, no contexto mundial, têm compartilhado desafios em relação à qualidade da formação profissional e à ampliação dos campos de prática, ocasionados, consequentemente, pelas mudanças nos processos de trabalho. No Brasil, ainda se acrescentam aos desafios as políticas públicas do sistema de saúde.

Nesse sentido, surgiram novas necessidades de superação e adaptação dos modelos de formação propostos para a área da saúde, fato que vem ao encontro dos desafios que agregam à competência profissional, definida como a capacidade de mobilizar, articular e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho11 Brasil. Ministério da Educação. Resolução CEB n.4, de 8 de Dezembro de 1999. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico. Brasília, 1999. .

As competências têm sido amplamente discutidas na literatura com diferentes conceitos. Uma das definições de competência é a capacidade de fazer e fazer-se oportunidade, que inclui o questionamento reconstrutivo como base inovadora para o processo de formação do sujeito histórico capaz. O conhecimento é uma ferramenta importante da competência, mas não assegura uma ação competente, pois são a capacidade e a coragem para inovar, associadas a outras habilidades cognitivas e comportamentais, que configuram o perfil do indivíduo competente22 Demo P. Educar pela pesquisa. Campinas: Autores Associados, 2011. . Esse conceito tem sido bem-aceito e utilizado para instrumentalizar os indivíduos com conhecimento adequado para que possam, com base nele, refletir acerca de sua realidade crítica33 Leonello VM, Oliveira MAC. Competencies for educational activities in nursing. Rev. Latinoam de Enfermagem 2008; 16(2)177-183. . O desenvolvimento de competências dirige-se à busca da integralidade da atenção à saúde, contribuindo para a formação de um profissional que agregue aptidões para tomada de decisões, comunicação, liderança, gerenciamento e educação permanente44 Silva KL, Sena RR. Nursing education: seeking critical-reflexive education and professional competencies. Rev. Latinoam de Enfermagem 2006; 14(5)755-761. .

As Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) de 2014 trazem, já no seu escopo, a definição de competência a ser assumida pelo ensino médico. No Brasil, as DCNs homologadas entre 2001 e 2004 trouxeram à discussão competências gerais para 11 dos 14 cursos definidos como integrantes da área da saúde pela Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 287, de 1998, e foram definidas com base em um contexto dos interesses e das orientações para o Sistema Único de Saúde, que enfoca o caráter público e democrático e a busca pela universalidade e integralidade da atenção55 Feuerwerker LCM. A construção de sujeitos no processo de mudança da formação dos profissionais de saúde. Divulgação em Saúde para Debate 2000; (22)18-24. . Portanto, as competências gerais deveriam ser a expressão do compromisso que a mudança na formação teria ao posicionar a universidade perante seu papel social nos campos de saúde e educação.

As competências gerais dividem-se em dois grandes blocos: seis contemplam atenção à saúde, tomada de decisão, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação permanente e são comuns para os cursos de Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Terapia Ocupacional e Biomedicina; e as demais, para o curso de Medicina, até recentemente iguais às dos cursos citados, em 2014 foram reformuladas em três blocos: atenção à saúde, gestão em saúde e educação em saúde. Os cursos de Biologia, Serviço Social e Educação Física possuem a estrutura das DCNs diferenciadas, não contemplando competências gerais nem as competências específicas de cada curso.

O papel potencializador das DCNs de mudanças nas graduações em saúde trouxe importantes contribuições para a implementação de currículos baseados em competências, modificações nas práticas e uso de metodologias ativas. No entanto, Feuerwerker55 Feuerwerker LCM. A construção de sujeitos no processo de mudança da formação dos profissionais de saúde. Divulgação em Saúde para Debate 2000; (22)18-24. afirma que essas mudanças ainda são incipientes, enfatizando a existência de imprecisões no texto das diretrizes, decorrentes de disputas em torno das futuras mudanças e que permitiram brechas nas orientações adotadas, não favorecendo a superação das abordagens tradicionais.

Assim sendo, a avaliação de competências tem ocupado lugar de destaque nessa discussão. Nesse contexto, cada vez mais se quer descobrir, explorar e extrair lições positivas de práticas de avaliação na busca da superação de situações complexas associadas ao ensino, que necessitam de concepções inovadoras de avaliação e amadurecimento do estudante66 Vasconcellos MMM, Oliveira CC, Berbel NAN. The university teacher and appropriated evaluation practices in higher education: a student’s perspective. Interface. Botucatu: Selected Edition v3, 2007. .

Portanto, no sentido de aprofundar-se nos meandros das competências e de suas inserções no processo de formação em saúde, destacam-se como objetivos deste estudo: desenvolver um instrumento para apoiar os docentes na avaliação das competências gerais dos graduandos de cursos da área da saúde; testar a confiabilidade do instrumento com professores e estudantes de cursos da área da saúde; e validar o instrumento sobre competências gerais.

MÉTODOS

O estudo foi uma pesquisa do tipo metodológico, que se refere à investigação dos métodos de obtenção, organização e análise dos dados, discorrendo sobre a elaboração, validação e avaliação dos instrumentos e das técnicas de pesquisa, tendo como objetivo a construção de um instrumento que fosse confiável, preciso e utilizável para que possa ser aplicado por outros pesquisadores77 Polit DF, Hungler BP. Fundamentos da pesquisa em enfermagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. .

Para o processo de validação de instrumentos, foi usado o modelo proposto por Raymundo88 Raymundo VP. Construção e validação de instrumentos: um desafio para a psicolingüística. Letras de Hoje 2009; 44(3)86-93. e Anastasi99 Anastasi A. Psychological testing. New York: MacMillan, 1988. , autores que apontam a validade de conteúdo, a validade de critério e a validade de constructo.

A validade de conteúdo , compreendida como o exame sistemático do conteúdo do instrumento, determinando sua abrangência em relação ao objeto a ser medido1010 Anastasi A, Urbina S. Testagem Psicológica. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.

11 Cronbach LJ. Fundamentos da testagem psicológica. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
- 1212 Menezes PR. Validade e confiabilidade das escalas de avaliação em psiquiatria. Revista de Psiquiatria Clínica 1998; 25(5)214-216. , foi seguida da validade de critério , entendida como a capacidade de o instrumento funcionar como um preditor futuro, de uma variável operacionalmente independente chamada critério1313 Fachel JMG, Camey SA. Avaliação Psicométrica: a qualidade das medidas e o entendimento dos dados. In: Cunha JA, org. Psicodiagnóstico. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. , por não existir instrumento semelhante validado que objetive avaliar as competências gerais.

A fim de avaliar a significância estatística da diferença entre duas médias amostrais para uma única variável dependente, foram escolhidos o teste t e ainda o teste do χ2, procedimento não paramétrico usado para testar hipóteses sobre a proporção geral1414 Polit DF, Beck CT, Hungler BP. Fundamentos de Pesquisa em Enfermagem métodos, avaliação e utilização. Porto Alegre: Artmed, 2004. . Também, optou-se pelo coeficiente de correlação linear de Pearson, para medir a relação linear entre os valores quantitativos emparelhados entre variáveis da amostra1515 Triola MF. Introdução à Estatística. Rio de Janeiro: LTC, 2008. , 1616 Vieira S. Estatística Básica. São Paulo: Cengage Learning, 2013. .

Segundo Callegari-Jacques1717 Callegari-Jacques SM. Bioestatística: princípios e aplicações. Porto Alegre: Artmed, 2003. , o coeficiente de correlação linear pode ser avaliado da forma apresentada na Tabela 1 .

TABELA 1
Correlação do coeficiente de Pearson

Após a implementação dos testes estatísticos descritos, foi avaliado o Akaike information criterion (AIC), que auxilia no reconhecimento da importância de uma remodelagem, em alguns casos, do modelo inicial proposto1818 Bozdogan H. Model selection and akaike’s information criterion (aic): the general theory and its analytical extensions. Psychometrika 1987; 52(3)345-370. .

A validade de constructo foi realizada para identificar e agrupar as medidas diferentes de algum atributo e distingui-las, mediante procedimentos lógicos e empíricos1414 Polit DF, Beck CT, Hungler BP. Fundamentos de Pesquisa em Enfermagem métodos, avaliação e utilização. Porto Alegre: Artmed, 2004. . Para a validade de constructo, utilizou-se a análise fatorial1919 Hair JF, Black WC, Babin BJ. Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Bookman, 2009. .

Já para a confiabilidade, definida como grau de consistência entre múltiplas medidas de uma variável e que indica a extensão em que ela pode ser reproduzida de forma estável2020 Vianna HM. Testes em educação. São Paulo: Ibrasa, 1976. , 2121 Schuwirth LWT, Vleuten CPM. General overview of the theories used in assessment. AMEE Guides in Medical Education 57, 2012. , foi empregado o coeficiente alfa de Cronbach.

No estudo, usou-se como base a classificação proposta por Freitas e Rodrigues2222 Freitas ALP, Rodrigues SG. A avaliação da confiabilidade de questionário: uma análise utilizando o coeficiente alfa de Cronbach. In: XII Simpósio de Engenharia de Produção Bauru: UNESP; 2005. , que apresenta a escala exibida no Quadro 1 para análise do coeficiente alfa de Cronbach. Após essa avaliação, também se utilizou o AIC, como maneira de garantir que as versões propostas neste estudo eram confiáveis.

QUADRO 1
Escala de consistência interna do coeficiente alfa de Cronbach

Para melhor visualização, o Quadro 2 contém um esquema de validação e as técnicas/os procedimentos utilizados em cada um dos aspectos considerados nesse processo de validação dos instrumentos para avaliação das competências gerais.

QUADRO 2
Esquema de validação e confiabilidade/fidedignidade do instrumento de avaliação das competências gerais dos cursos da área da saúde

O local de coleta de dados para a validação foi uma instituição de ensino superior (IES) em Curitiba (PR) que possui cursos da área da saúde de Enfermagem, Biomedicina, Farmácia, Psicologia e Medicina.

Em relação à amostragem utilizada, foi de conveniência ou acidental, que seleciona as pessoas disponíveis como participantes do estudo1414 Polit DF, Beck CT, Hungler BP. Fundamentos de Pesquisa em Enfermagem métodos, avaliação e utilização. Porto Alegre: Artmed, 2004. .

Os critérios de inclusão utilizados foram:

  • para os professores: ter a maior carga horária do semestre no período do curso estudado; ter sido graduado no mesmo curso que está sendo aplicado o instrumento;

  • para os estudantes: fazer parte do período avaliado;

  • Foram excluídos desta pesquisa:

  • todos os professores e estudantes que iniciaram e não completaram o instrumento.

O instrumento utilizado foi construído no software LimeSurvey, ambiente livre escolhido para aplicar o instrumento de pesquisa online .

Com o objetivo de atender às diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos, estabelecidas pela Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob nº 826.770.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para a validade de conteúdo , foram realizados um levantamento das DCNs de todos os cursos da área da saúde e também uma pesquisa na Biblioteca Virtual em Saúde, que contempla as bases Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Índice Bibliográfico Espanhol de Ciências de Saúde (IBECS), Sistema Online de Busca e Análise de Literatura Médica (MEDLINE), Biblioteca Cochrane e Biblioteca Eletrônica Científica Online (SciELO), para fundamentar a construção dos instrumentos. Com isso, fez-se a revisão de literatura para cada uma das competências gerais (atenção à saúde, tomada de decisões, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação permanente). No momento da busca pelas informações, em algumas competências gerais houve a necessidade de a palavra-chave ser acrescida de “na área da saúde”, “e área da saúde” ou “competências gerais”, como forma de refinamento, pelo grande número de publicações relacionadas ao tema. Finalizou-se com 93 artigos avaliados.

Após alinhamento às DCNs dos 11 cursos que possuem as competências gerais com o referencial teórico da busca, foi possível desenvolver a versão 1 do instrumento para avaliação das competências gerais da área da saúde, na opção direcionada aos professores e na opção em espelho, adaptada para o estudante (autoavaliação).

Em seguida, fez-se o levantamento de 22 experts das áreas trabalhadas, escolhidos com base no currículo lattes , nas publicações na área de ensino, na atuação na coordenação de cursos, com mestrado ou doutorado na área. Dois experts de cada curso foram convidados a contribuir para o instrumento proposto. Após as devolutivas, foi confeccionada a versão 2 do instrumento, mantendo-se as duas opções (professor/estudante).

Essa versão foi repassada para os participantes da pesquisa por intermédio do software LimeSurvey, após o envio de e-mail convite contendo apresentação pessoal, breve relato do projeto, objetivos, prazos para a devolutiva e o papel esperado no estudo, além do link para resposta do instrumento. Cada professor participou como respondente de apenas um curso e período. Houve retorno de 51 instrumentos por parte dos estudantes e de 50 instrumentos por parte dos professores. Foi descartado um instrumento dos estudantes que não possuía a versão do professor respondida, totalizando 50 instrumentos para cada grupo, todos com o espelho correspondente.

Os dados coletados foram organizados e submetidos à análise estatística efetuada com três classificações de grupos diferentes: uma avaliação será chamada de professores, que considerou apenas a avaliação feita pelos docentes; outra de estudante, que levou em conta apenas as avaliações dos estudantes; e a terceira de professores e estudantes em conjunto, que contempla o resultado das avaliações de professores e estudantes conjugadamente.

Os resultados para validade de critério e constructo foram descritos e discutidos em conjunto, seguindo as análises estatísticas utilizadas para as duas etapas da validação.

A análise fatorial verificou a adequação dos itens às dimensões, bem como mensurou o grau de efeito de cada item nessa dimensão. Essa análise propôs o agrupamento das seis dimensões iniciais – atenção à saúde, tomada de decisão, comunicação, liderança, administração e gerenciamento e educação permanente – em três dimensões: atenção à saúde, gestão em saúde e educação em saúde. A proposta vem ao encontro das novas DCNs homologadas para a Medicina em 2014, que trazem as três dimensões descritas, sem prejuízo de informações a serem avaliadas.

Os critérios empregados para o agrupamento das informações foram o teste χ2, o valor de p de cada item e o AIC, que permitiram identificar as melhorias no modelo.

Como resultado, obteve-se a versão 3 do instrumento, direcionada para o professor e com uma versão para o estudante, que teve quatro questões desconsideradas, somando então 44 perguntas (o modelo original tinha 48), e distribuídas em três dimensões, em vez de seis, como no início.

A análise fatorial exploratória, tanto nos dados dos professores quanto nos dados dos estudantes, indicou ser esse o modelo mais adequado, podendo ser aplicado para professores isoladamente, para estudantes de forma isolada ou em conjunto. Estes apresentaram em todas as questões valor de p significativo – p < 0,05.

O coeficiente de correlação de Pearson (r) para essa versão mostra que existe correlação forte entre todas as dimensões, e nenhuma delas tem valores negativos. Observa-se forte relação entre a dimensão atenção à saúde e a gestão em saúde (r = 0,74) na avaliação dos estudantes, bem como relação muito forte (r = 0,92) entre as mesmas dimensões na avaliação do professor. Quando avaliamos professores e estudantes em conjunto, a relação mantém-se forte também (r = 0,88). As demais relações entre as dimensões estão muito próximas, confirmando a relação de todas as dimensões.

Quanto ao teste χ2, este apresentou p < 0,001, mostrando aceitabilidade dos professores e dos estudantes para todas as versões do instrumento.

No que se refere à confiabilidade, os resultados foram seguros e confiáveis, com menor alfa de Cronbach (valor de 0,758) na dimensão atenção à saúde para os estudantes, considerado como um valor forte na avaliação de Freitas e Rodrigues2222 Freitas ALP, Rodrigues SG. A avaliação da confiabilidade de questionário: uma análise utilizando o coeficiente alfa de Cronbach. In: XII Simpósio de Engenharia de Produção Bauru: UNESP; 2005. . Concernente aos demais valores, são todos fortes ou muito fortes, o que desejamos para todas as avaliações. Dessa maneira, os instrumentos dessa versão indicam segurança na sua utilização nesses grupos separadamente ou em conjunto.

TABELA 2
Avaliação do alfa de Cronbach para os instrumentos dos estudantes

TABELA 3
Avaliação do alfa de Cronbach para os instrumentos dos professores

TABELA 4
Avaliação do alfa de Cronbach para os instrumentos dos professores e estudantes avaliados em conjunto

Na comparação do instrumento versão 2 com a versão 3, observa-se que todos os valores assinalaram a versão 3 como a mais recomendada. Quando avaliados apenas os professores, o valor de AIC foi de 4.338 para a versão 3, enquanto para a versão 2 foi de 4.791. Na avaliação apenas dos estudantes, o valor de AIC foi de 4.331 para a versão 3 e de 4.871 para o modelo da versão 2. Quando avaliados professores e estudantes em conjunto, o valor para o AIC da versão 3 foi de 8.849 e da versão 2 de 9.854. Quanto menor o valor na comparação, maior é a indicação.

Assim, os resultados sugerem que os cursos que possuem as seis competências gerais poderiam realinhá-las em três dimensões, pois estatisticamente o trabalho demonstrou que as seis competências gerais podem estar direcionadas em três, diminuindo o número de dimensões sem alterar sua essência.

Com base nas DCNs, as competências são fundamentais para os cursos da área de saúde. Ao avaliar o aluno, é importante incluir vários aspectos que fazem parte da sua formação, e não somente seu entendimento durante o curso, o que acaba incluindo a forma como ele se relaciona e suas habilidades2323 Gontijo ED, Alvim C, Megale L. Matriz de Competências Essenciais para a Formação e Avaliação de Desempenho de Estudantes de Medicina. Rev. Brasileira de Educação Médica 2013; 37(4)526-539. .

Logo, espera-se que o estudante consiga aplicar seus conhecimentos nas mais diversas situações, por mais desafiantes que sejam, fazendo jus à sua competência quando necessário. Nesse sentido, um dos principais desafios é avaliar como está ocorrendo a formação desse estudante por meio de suas competências.

Para tanto, é imperativo o empoderamento do acadêmico para ser protagonista do processo de formação de sua aprendizagem, sabendo como e onde buscar e tendo a capacidade de interpretação da qualidade das informações. Cabe ao curso incentivar essas competências de autonomia, crítica e reflexão nos futuros médicos.

Desde a implementação das DCNs em 2001, visa-se modificar o foco do ensino brasileiro para o que a população de fato precisa. Não compreender a visão social dos cursos e a falta de pesquisa na educação atrapalham o desenvolvimento do currículo. É preciso aprender a atrelar o conhecimento às habilidades, às emoções, ao raciocínio e aos valores para consolidar a competência em prol do paciente. Isso pode ser desenvolvido com a imersão precoce acadêmica na prática pensando no ensino centrado na pessoa, demonstrando que a ética é muito mais do que a memorização do código de ética médica, chegando mais próximo do que é preconizado pelas DCNs2424 Franco RS, Franco CAGS, Portilho EML. O conceito de Competência: uma Análise do Discurso Docente. Rev. Brasileira de Educação Médica 2014; 38(2)173-181. . O foco da graduação deve extrapolar o ambiente técnico para uma formação justa.

As competências podem avaliar a qualidade no processo de formação dos profissionais. Segundo o Código do Trabalho francês, o desenvolvimento das competências deve integrar a teoria do ensino com a experiência pessoal e profissional2525 Fragelli TB, Shimizu HE. Competências profissionais em Saúde Pública: conceitos, origens, abordagens e aplicações. Rev. Brasileira de Enfermagem 2012; 60(4)667-674. .

Nos objetivos centrais das mudanças das novas diretrizes nacionais, encontra-se o foco no aprendizado por competências somado à visão holística do ser humano, considerando este um todo, bem como seu contexto social. Uma das formas de se conseguir isso é unir a equipe multiprofissional aos alunos, professores e pacientes. É imperativo aplicar na formação a humanização e a ética com a mesma ênfase com que se abordam as pesquisas disciplinares, atentando-se para não focar apenas na cura, mas também no cuidado do indivíduo. Para isso, é interessante reforçar a inserção de um eixo humanístico nas matrizes curriculares de Medicina, desenvolvendo habilidades adequadas para cada período da graduação2626 Franco CAGS, Cuba MR, Franco RS. Currículo de Medicina e as Competências Propostas pelas Diretrizes Curriculares. Rev. Brasileira de Educação Médica 2014; 38(2)221-230. .

Com isso, o profissionalismo sofreu alterações em razão dos contextos sociais e das relações econômicas das profissões ao longo do tempo. Faz-se importante saber quais são os valores, as regras e as normas da profissão e qual é a contribuição da sociedade no desenvolvimento desses conceitos. O profissionalismo vai muito além do código de ética, e para isso é interessante que tanto os docentes como os discentes tenham consciência do profissionalismo como fundamento do contrato social para legitimar sua profissão, sendo importante garantir a formação adequada sob a correta compreensão desse tema e o respeito de seus princípios, como considerar sempre primeiramente o bem-estar e a autonomia do paciente e o comprometimento do profissional com a competência, confidência e qualidade do cuidado – suas responsabilidades profissionais2727 Rego S. O Profissionalismo e a Formação Médica. Rev. Brasileira de Educação Médica 2012; 36(4)446. .

Retomar os assuntos abordados permite a possiblidade de contextualizar o aprendizado, associando teoria com prática em saúde, entretanto é comum questionar o motivo de o conhecimento se dar de forma separada se o intuito é almejar a prática profissional integrada. Assim, atenta-se já na integração curricular, que permite novas estratégias de ensino/aprendizagem e avaliação acadêmica. Para isso, a multidisciplinariedade promove um aprendizado mais integrado2828 Iglesias AG, Bollela VR. Integração curricular: um desafio para os cursos de graduação da área da saúde. Rev. Da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto 2015; 48(3)265-272. .

Não se observa ainda um modelo que abranja o profissionalismo na matriz curricular dos cursos. Caso se deseje, ele deve ser adaptado ao contexto de ensino local nas diferentes realidades de educação2929 Birden H, Glass N, Wilson I. Teaching professionalism in medical education: A Best Evidence Medical Education (BEME) systematic review. BEME Guide, Australia 2013; (25)1252-1266. .

A aquisição de conhecimentos atualmente evidencia as habilidades técnicas e científicas. Dessa maneira, o profissionalismo emerge para renovar o processo de ensino-aprendizagem de forma justa. Apesar de inúmeros estudos estarem sendo realizados para a avaliação das competências, ainda são de baixa confiabilidade, existindo poucos instrumentos objetivos que avaliam apenas alguns aspectos do profissionalismo. Por conseguinte, há carência na literatura no aspecto de métodos de avaliação do profissionalismo e de uso de instrumentos, sendo esse o foco atual sobre o tema, além da importância da inserção desse assunto nos currículos. Em tal avaliação, é relevante incluir estudantes, profissionais da saúde e pacientes. Como nenhum instrumento isoladamente contempla todos os aspectos do desempenho de uma pessoa, faz-se importante enfatizar a sua expertise , a validade dos instrumentos e a amostragem adequada dos participantes3030 Mendonça ET, Cotta RMM, Lelis VP. Avaliação do profissionalismo em estudantes da área de saúde: uma revisão sistemática. Interface: Comunicação Saúde Educação 2016; 20(58)649-690. .

CONCLUSÕES

O estudo trouxe, na versão 3, um modelo de avaliação das competências gerais válido e adequado para o uso em professores, estudantes e em conjunto, direcionado para as DCNs de dez cursos da área da saúde que subdividem suas competências gerais em seis dimensões, além da Medicina, agora subdividida em três dimensões.

A versão 3 é ideal para os 11 cursos (Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Medicina, Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia, Terapia Ocupacional e Biomedicina) da área da saúde. Esse instrumento tem o intuito de minimizar os desafios enfrentados diante da avaliação das competências gerais, visto sua dificuldade de efetivação nas IES.

Sua implantação poderá contribuir para que as IES tenham subsídios para avaliar o processo de formação integral dos estudantes da área da saúde com base nas competências gerais esperadas dos egressos. O modelo permite identificar fragilidades no processo e corrigi-las antes do término do curso, podendo ser utilizado do início ao fim da graduação.

O estudo sugere a consolidação de modelos de avaliação claros e objetivos, tanto para o professor quanto para o estudante, auxiliando na desmistificação do processo avaliativo.

ORGANIZAÇÃO DE FOMENTO

Todo o trabalho foi desenvolvido com recursos financeiros dos autores.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    15 Abr 2019
  • Aceito
    19 Jun 2019
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