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Análise da exigência física do trabalho em fábricas de móveis no Distrito Federal

Physical requirements in carpentry in Brasília - Brasil

Resumos

A presente pesquisa foi realizada em fábricas de móveis no Distrito Federal, com o objetivo de avaliar a carga de trabalho físico dos funcionários nas funções de operador de aparadora, coladora de bordas, desengrossadeira, esquadrejadeira, furadeira, lixadeira, plaina, prensa, seccionadeira, serra circular, serra de fita, torno e tupia. A carga de trabalho físico foi obtida através do levantamento da freqüência cardíaca no trabalho. As atividades exercidas pelos operadores de desengrossadeira foram classificadas como pesadas, as exercidas pelos operadores de plaina e serra circular como moderadamente pesadas, enquanto as demais foram classificadas como de exigência física leve. Para haver um desempenho contínuo no trabalho sem desgaste, os operadores precisam de uma pausa média de 16 minutos por hora trabalhada na desengrossadeira e de 2,5 minutos na plaina.

Ergonomia; carga de trabalho físico; fabricação de móveis


This research was carried out in a carpentry in Brasília, F.D. (Brazil) aiming to evaluate the physical work load of the employees in different furniture manufacturing activities. Physical work load was obtained by assessing cardiac frequency at work. The activities performed by the ax operators were classified as heavy while those performed by the plane and circular saw operators as moderately heavy, with the remaining activities being classified as light. It was concluded that in order to achieve an adequate continuous performance at work, ax operators need to have an average break period of 16 minutes per hour, and plane operators a break periods of 2.5 minutes.

Ergonomics; physical work load; carpentry


Análise da exigência física do trabalho em fábricas de móveis no Distrito Federal

Physical requirements in carpentry in Brasília - Brasil

Nilton Cesar FiedlerI; Natália Santiago de MenezesII; Luciano José MinettiIII ; Ildeu Soares MartinsI

IProfessor Adjunto, Universidade de Brasília – UnB, <fiedler@unb.br>

IIEngenheiro Florestal – UnB, Caixa Postal 04357, 70910-900 Brasília-DF

III Pesquisador Titular do Dep. de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa – UFV, 36570000 Viçosa-MG, <minetti@ufv.br>

RESUMO

A presente pesquisa foi realizada em fábricas de móveis no Distrito Federal, com o objetivo de avaliar a carga de trabalho físico dos funcionários nas funções de operador de aparadora, coladora de bordas, desengrossadeira, esquadrejadeira, furadeira, lixadeira, plaina, prensa, seccionadeira, serra circular, serra de fita, torno e tupia. A carga de trabalho físico foi obtida através do levantamento da freqüência cardíaca no trabalho. As atividades exercidas pelos operadores de desengrossadeira foram classificadas como pesadas, as exercidas pelos operadores de plaina e serra circular como moderadamente pesadas, enquanto as demais foram classificadas como de exigência física leve. Para haver um desempenho contínuo no trabalho sem desgaste, os operadores precisam de uma pausa média de 16 minutos por hora trabalhada na desengrossadeira e de 2,5 minutos na plaina.

Palavras-chave: Ergonomia, carga de trabalho físico e fabricação de móveis.

ABSTRACT

This research was carried out in a carpentry in Brasília, F.D. (Brazil) aiming to evaluate the physical work load of the employees in different furniture manufacturing activities. Physical work load was obtained by assessing cardiac frequency at work. The activities performed by the ax operators were classified as heavy while those performed by the plane and circular saw operators as moderately heavy, with the remaining activities being classified as light. It was concluded that in order to achieve an adequate continuous performance at work, ax operators need to have an average break period of 16 minutes per hour, and plane operators a break periods of 2.5 minutes.

Key words: Ergonomics, physical work load and carpentry.

1. INTRODUÇÃO

As empresas que desempenham atividades de fabricação de móveis no Distrito Federal têm buscado, nos últimos anos, melhorar as condições de trabalho, criando situações mais cômodas para os trabalhadores, o que reflete diretamente na sua qualidade e produtividade. No entanto, Fiedler et al. (2001) constataram que diversas atividades ainda são executadas com a exigência de grandes esforços físicos e com posturas potencialmente lesivas aos trabalhadores.

A avaliação da carga física de trabalho foi o primeiro problema tratado pela fisiologia do trabalho e continua sendo uma questão central para a maioria dos trabalhadores do mundo, inclusive para aqueles que trabalham em setores com maior nível tecnológico e com esforços físicos menores (Iida, 1990). Em estudos ergonômicos medem-se os índices fisiológicos para determinar o limite de atividade física que o indivíduo pode exercer. Desta forma é possível reorganizar o trabalho, determinando o melhor modo de execução, a duração ótima da jornada de trabalho e a freqüência ideal de pausas orientadas (Couto, 1995).

O limite de carga máxima no trabalho pode ser calculado indiretamente com base na freqüência cardíaca do trabalho (FCT) ou na carga cardiovascular (CCV). O limite de aumento da freqüência cardíaca durante o trabalho, aceitável para um "desempenho" contínuo, é de 35 bpm para os homens e de 30 bpm para as mulheres, o que significa que o limite é atingido quando a freqüência cardíaca do trabalho estiver 35 ou 30 bpm acima da freqüência cardíaca média de repouso (FCR) (Apud, 1989).

A carga cardiovascular corresponde à porcentagem da freqüência cardíaca do trabalho (FCT), em relação à freqüência cardíaca máxima utilizável (FCM), não devendo ultrapassar 40% da freqüência cardíaca do trabalho (Fiedler, 1998).

O estudo ergonômico do trabalho em indústrias fabricantes de móveis e a conseqüente aplicação prática de seus resultados podem levar a condições mais seguras e saudáveis no ambiente de trabalho, melhorando sensivelmente a adaptação da atividade à pessoa que a realiza e proporcionando-lhe um trabalho com maior conforto, bem-estar, produtividade e qualidade.

O aparecimento de sintomas de fadiga por sobrecarga física depende do esforço desenvolvido, da duração do trabalho e das condições individuais, como estado de saúde, nutrição e condicionamento físico. À medida que a fadiga aumenta, o ritmo de trabalho, a atenção e a rapidez de raciocínio ficam reduzidos, tornando o operador menos produtivo e mais sujeito a erros e acidentes (Silva, 1999).

Os objetivos desta pesquisa foram analisar a carga de trabalho físico, exigida nas operações de fabricação de móveis no Distrito Federal, e fornecer subsídios para reorganização ergonômica do trabalho.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Área de Estudo

A pesquisa foi realizada em sete empresas fabricantes de móveis situadas em diferentes cidades do Distrito Federal, selecionadas a partir da relação de Empresas da Indústria do Mobiliário do Distrito Federal, obtida no Sindicato das Indústrias de Madeira e do Mobiliário (Sindimam, 2001). Os dados foram coletados de janeiro a junho de 2002.

2.2. População e Amostragem

A amostra foi composta por 33 trabalhadores envolvidos na fabricação de móveis no Distrito Federal e por 13 máquinas, totalizando 93 observações, uma vez que, dependendo da estrutura da empresa, muitos trabalhadores desempenhavam mais de uma função, como demonstra o Quadro 1.


O ciclo de trabalho em cada máquina foi dividido em levantamento da peça, alimentação da máquina e deposição da peça beneficiada no piso.

A população pesquisada nas sete empresas fabricantes de móveis tinha idade média de 31,5 anos, sendo a maioria casada (60%), totalmente alfabetizada, com peso médio de 65 kg, estatura média de 1,65 m e tempo de trabalho médio na empresa de oito anos. O Índice de Bulbo Úmido e Termômetro de Globo (IBUTG) médio durante a jornada de trabalho foi de 21,4 ºC, com máximo de 21,7 ºC e mínimo de 21,0 ºC, portanto sem sobrecarga térmica. A renda média mensal da família na época era de US$ 240,00.

As máquinas avaliadas estão descritas no Quadro 2.


O tamanho da amostra dos trabalhadores e o número de amostras da freqüência cardíaca por fase do ciclo foram estabelecidos com o uso da seguinte fórmula, proposta por Conaw (1977):

em que n = número de amostras ou pessoas necessárias; t = valor tabelado em nível de 5% de probabilidade (distribuição t de Student); s = desvio-padrão da amostra; e e = erro admissível = 5%.

2.3. Coleta de Dados

A carga física de trabalho foi obtida por intermédio do levantamento da freqüência cardíaca durante a jornada de trabalho do operador, o que possibilitou avaliar a necessidade de pausas durante as atividades e classificar a carga física de trabalho. Os dados foram obtidos com o uso de um sistema de coleta e análise de dados de freqüência cardíaca que consiste em um receptor digital de pulso, uma correia elástica e um transmissor com eletrodos.

A carga física de trabalho foi classificada de acordo com a metodologia proposta por Apud (1997), mostrada no Quadro 3.


Para coleta dos dados de freqüência cardíaca, o equipamento foi fixado ao trabalhador durante a jornada de trabalho. Os valores foram armazenados em intervalos de 15 segundos e posteriormente transferidos para o computador, por meio de um equipamento próprio ("interface") para análise em "software" desenvolvido pelo fabricante. Paralelamente, foi feito um estudo de tempos pelo método de tempos contínuos, com o objetivo de analisar a carga de trabalho de acordo com a atividade.

Através dos dados coletados (freqüência cardíaca de repouso, freqüência cardíaca de trabalho e idade), determinou-se a carga cardiovascular no trabalho, que corresponde à porcentagem da freqüência cardíaca durante o trabalho, em relação à freqüência cardíaca máxima utilizável. Para calcular a carga cardiovascular, utilizou-se a seguinte equação:

em que CV = carga cardiovascular, em %; FCT = freqüência cardíaca de trabalho, em bpm (batimentos por minuto); FCR = freqüência cardíaca de repouso, em bpm; e FCM = freqüência cardíaca máxima (220 – idade).

Para um desempenho contínuo no trabalho a carga cardiovascular não deverá ultrapassar 40%. Desta forma, a freqüência cardíaca-limite (FCL) em bpm, para a carga cardiovascular de 40%, foi obtida pela seguinte fórmula:

FCL = 0,40*(FCM – FCR) + FCR

Para saber se existiam diferenças significativas entre os valores de batimentos cardíacos registrados em cada operação, foi aplicado o teste t (P<0,05).

O tempo de repouso (pausa) necessário para reorganizar o trabalho (Apud, 1989), quando a carga cardiovascular ultrapassou 40% (acima da freqüência cardíaca-limite), foi determinado pela equação:

em que Tr = tempo de repouso, descanso ou pausa, em min; e Ht = duração do trabalho, em min.

2.4. Análise Estatística dos Dados

Os dados de freqüência cardíaca do trabalho e a carga cardiovascular foram analisados nas fases do ciclo de cada máquina (levantamento, alimentação e deposição) e entre máquinas, por meio da análise de variância com o uso do teste F, a 1% de probabilidade, e onde houve diferença significativa foi utilizado o teste de Scott-Knott, a 1% de probabilidade. Foi utilizado o programa SAEG para as análises.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

No Quadro 4 estão os resultados do estudo de tempos para cada máquina avaliada.


Em todas as máquinas o maior porcentual de tempos é gasto na alimentação da máquina, destacando-se a lixadeira (65%), a serra circular (62%), o torno (61%), a esquadrejadeira (61%) e a desengrossadeira (58%).

O Quadro 5 mostra a freqüência cardíaca média em repouso e no trabalho e freqüência cardíaca máxima; a carga cardiovascular; a freqüência cardíaca-limite; o tempo necessário de pausa na jornada de trabalho; e a classificação do trabalho.


De acordo com o resultado da análise estatística, constatou-se não houve diferença significativa entre as fases do ciclo de trabalho de cada máquina avaliada pelo teste F, a 1% de probabilidade. Na análise de variância entre máquinas, considerando a freqüência cardíaca no trabalho, houve diferença significativa a 1% de probabilidade. Segundo o teste Scott-Knott, houve diferença significativa entre as médias da desengrossadeira, plaina e serra circular com relação a todas as demais. Não houve diferença significativa entre a seccionadora, a serra de fita e a esquadrejadora; a tupia e a coladora de bordas; aparadora, o torno e a furadeira; e a prensa e a lixadeira. Considerando a carga cardiovascular, houve diferença significativa entre as médias na desengrossadeira, plaina, serra circular e seccionadora. Não houve diferença significativa entre a serra de fita, a esquadrejadeira, a tupia e a coladora; a aparadora, o torno e a furadeira; e entre a prensa e a lixadeira.

Os dados mostraram que a maior exigência física foi encontrada na desengrossadeira, em todas as fases do ciclo, consideradas de exigência pesada. Nesta atividade, como o trabalhador executa o levantamento, a alimentação e a deposição, há a necessidade de um repouso médio de aproximadamente 16 minutos para cada hora trabalhada. A exigência física do trabalho na serra circular e na plaina foram consideradas moderadamente pesadas. Nesta última, há a necessidade de repouso de aproximadamente 2,5 minutos por hora trabalhada na fase de alimentação (19,3 minutos em toda a jornada de trabalho). As demais atividades tiveram exigência física leve. A carga cardiovascular média por fase do ciclo em cada máquina é mostrada na Figura 1.


Todas as fases do ciclo de trabalho na desengrossadeira tiveram a carga cardiovascular acima do limite máximo de 40%, ou seja, os trabalhadores executavam a função acima da freqüência cardíaca-limite. Esta elevada carga pode ser devido à grande dimensão das peças nessa fase de processamento da madeira. Para diminuir a carga de trabalho nesta fase pode ser utilizado mais de um trabalhador no levantamento da peça e na alimentação, ou optar por peças de menores dimensões.

Na fase de alimentação na operação com a plaina, a carga cardiovascular também foi acima do limite máximo permitido. Para reorganizar o trabalho nessas funções há a necessidade de pausas orientadas, conforme calculado no Quadro 3, de redimensionamento das peças ou de atuar no projeto da máquina para diminuir principalmente o esforço de alimentação.

Em pesquisa relativa aos fatores humanos e as condições de trabalho em marcenarias no Distrito Federal, Fiedler et al. (2001) constataram que as máquinas de maior risco, na opinião dos operadores, eram exatamente a tupia (44%), a desengrossadeira e plaina (34%) e a serra circular (17%).

4. CONCLUSÕES

• A carga de trabalho físico exigida por trabalhadores nas fábricas de móveis no Distrito federal foi considerada pesada na desengrossadeira, moderadamente pesada na plaina e serra circular e leve nas demais máquinas.

• Para um desempenho contínuo no trabalho sem riscos na desengrossadeira há a necessidade de reorganização ergonômica do trabalho, com pausas orientadas médias de 16 minutos por hora trabalhada.

• O operador que executa suas funções na plaina necessita de uma pausa de 2,5 minutos por hora trabalhada na alimentação da máquina.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido para publicação em 31.1.2003

Aceito para publicação em 4.11.2003

Pesquisa Financiada pelo CNPq

  • APUD, E. Guidelines on ergonomic study in forestry Genebra: ILO, 1989. 241 p.
  • APUD, E. Temas de ergonomia aplicados al aumento de la productividad de la mano de obra en cosecha florestal. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO SOBRE COLHEITA E TRANSPORTE FLORESTAL, 3., 1997, Vitória. Anais... Vitória: SIF/DEF, 1997. p. 46-60.
  • CONAW, P. L. Estatística São Paulo: Edgard Blucher, 1977. 264 p.
  • COUTO, H. A. Ergonomia aplicada ao trabalho o manual técnico da máquina humana. Belo Horizonte: Ergo, 1995. 353 p.
  • FIEDLER, N. C. Análise de posturas e esforços despendidos em operações de colheita florestal no litoral norte do Estado da Bahia 1998. 103 f. Tese (Doutorado em Ciências Florestais) Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 1998.
  • FIEDLER, N. C. et al. Diagnóstico de fatores humanos e condições de trabalho em marcenarias no Distrito Federal. Floresta, v. 31, n. 1/2, p. 105-112, 2001.
  • IIDA, I. Ergonomia: projeto e produção. São Paulo, Edgard Blucher, 1990. 465 p.
  • SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL SENAI. Curso sobre fabricação de móveis. Belo Horizonte: 1987. (Módulos de curso não paginados).
  • SILVA, K. R. Análise de fatores ergonômicos em marcenarias do município de Viçosa-MG 1999. 97 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Florestais) Universidade Federal de Viçosa, 1999.
  • SINDIMAM. Relação de empresas da indústria do mobiliário do Distrito Federal 2001. 17 p. Brasília, Sindicato das Indústrias de Madeira e do Mobiliário do Distrito Federal.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Abr 2004
  • Data do Fascículo
    Dez 2003

Histórico

  • Recebido
    31 Jan 2003
  • Aceito
    04 Nov 2003
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