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Estudo de aspectos técnicos, econômicos e sociais da produção de carvão vegetal no Município de Pedra Bela, São Paulo, Brasil

Technical, economic and social aspects of charcol production in the City of Pedra Bela, São Paulo, Brazil

Resumos

Durante o ano de 2001 foi realizado um levantamento, visando avaliar a atividade da produção de carvão vegetal no Município de Pedra Bela, Estado de São Paulo. Esse pequeno município localizado, a 150 km da Cidade de São Paulo, caracteriza-se pela sua importante dependência em relação à produção de carvão vegetal, podendo ser considerado um exemplo típico da atividade no estado paulista. Procurou-se obter informações básicas que pudessem servir para futuras definições de políticas públicas na região, ligadas à cadeia produtiva florestal e do carvão vegetal. São apresentados os principais resultados técnicos e econômicos, decorrentes da obtenção de dados coletados mediante a aplicação de questionários, entrevistas e coleta de informações secundárias pré-existentes nos produtores rurais, lideranças locais e órgãos oficiais de governo. Os resultados indicaram, sobretudo, que a madeira de eucalipto, principal matéria-prima local para obtenção de carvão vegetal, está se tornando cada vez mais escassa e a falta de novos plantios pode comprometer a atividade no município. O trabalho apontou a necessidade de ações no sentido da melhoria e fortalecimento institucional das ações ligadas à atividade na região.

Carvão vegetal; pedra bela e aspectos técnicos; econômicos e sociais


A survey was conducted in 2001 to assess the activities of charcoal production in Pedra Bela, a small city in the State of Sao Paulo, Brazil. The charcoal industry is considered the main economical activity in Pedra Bela, located at 150 km from the city of Sao Paulo,. The survey included basic questions, relevant for policy makers, and specific questions dealing with forest issues and production processes. This paper presents the main technical and economic results, obtained from direct surveys, queries and interviews applied to local farmers, community representatives and governmental agencies. The results show that eucalyptus - the main source of raw material for the charcoal production- is becoming scarce and the non-renewal of plantations can compromise the activity in the future. This work indicates the necessity of actions towards the strengthening and improvement of institutions engaged in rescuing the activity.

charcoal; economic analysis; social analysis and policy making


Estudo de aspectos técnicos, econômicos e sociais da produção de carvão vegetal no Município de Pedra Bela, São Paulo, Brasil

Technical, economic and social aspects of charcol production in the City of Pedra Bela, São Paulo, Brazil

Ana Maria de Meira; José Otávio Brito; Luiz Carlos Estraviz Rodriguez

Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - Avenida Pádua Dias, 1113420-900 Piracicaba-SP. Tel. (19) 3436-8665

RESUMO

Durante o ano de 2001 foi realizado um levantamento, visando avaliar a atividade da produção de carvão vegetal no Município de Pedra Bela, Estado de São Paulo. Esse pequeno município localizado, a 150 km da Cidade de São Paulo, caracteriza-se pela sua importante dependência em relação à produção de carvão vegetal, podendo ser considerado um exemplo típico da atividade no estado paulista. Procurou-se obter informações básicas que pudessem servir para futuras definições de políticas públicas na região, ligadas à cadeia produtiva florestal e do carvão vegetal. São apresentados os principais resultados técnicos e econômicos, decorrentes da obtenção de dados coletados mediante a aplicação de questionários, entrevistas e coleta de informações secundárias pré-existentes nos produtores rurais, lideranças locais e órgãos oficiais de governo. Os resultados indicaram, sobretudo, que a madeira de eucalipto, principal matéria-prima local para obtenção de carvão vegetal, está se tornando cada vez mais escassa e a falta de novos plantios pode comprometer a atividade no município. O trabalho apontou a necessidade de ações no sentido da melhoria e fortalecimento institucional das ações ligadas à atividade na região.

Palavras-chave: Carvão vegetal, pedra bela e aspectos técnicos, econômicos e sociais.

ABSTRACT

A survey was conducted in 2001 to assess the activities of charcoal production in Pedra Bela, a small city in the State of Sao Paulo, Brazil. The charcoal industry is considered the main economical activity in Pedra Bela, located at 150 km from the city of Sao Paulo,. The survey included basic questions, relevant for policy makers, and specific questions dealing with forest issues and production processes. This paper presents the main technical and economic results, obtained from direct surveys, queries and interviews applied to local farmers, community representatives and governmental agencies. The results show that eucalyptus - the main source of raw material for the charcoal production- is becoming scarce and the non-renewal of plantations can compromise the activity in the future. This work indicates the necessity of actions towards the strengthening and improvement of institutions engaged in rescuing the activity.

Key words: charcoal, economic analysis, social analysis and policy making.

1. INTRODUÇÃO

O Brasil é o maior produtor mundial de carvão vegetal, sendo mais de dois terços dessa produção destinados às indústrias siderúrgica e metalúrgica, principalmente em Minas Gerais. Nos demais estados brasileiros, o destaque fica por conta do seu uso na cocção de alimentos, como é o caso de São Paulo (ABRACAVE, 2002).

Apesar dos exemplos mundiais de produção de carvão vegetal, que incluem modernos processos industriais, contendo elevados índices tecnológicos, em nosso País a produção ainda é realizada, em sua maioria, em fornos de alvenaria. Comparativamente, tal prática pode ser considerada primitiva, com descarte de milhares de toneladas de componentes químicos, pois no processo de carbonização aproveitam-se apenas de 30 a 40% da madeira na forma de carvão vegetal (BRITO, 1990).

Torna-se, desse modo, cada vez mais necessário o desenvolvimento de novas tecnologias, em face das excelentes condições que o carvão vegetal oferece como eficaz alternativa energética, tanto para a produção siderúrgica quanto para diversos outros segmentos industriais, domésticos e da atividade econômica em geral, inclusive como possível substituto dos derivados do petróleo (NETTO, 1980).

A produção de carvão vegetal é também uma importante atividade econômica no Estado de São Paulo, presente em dezenas de seus municípios, como é o caso de Pedra Bela, localizado na região de Bragança Paulista.

Cerca de 79% da população de Pedra Bela está localizada na zona rural e 21%, na zona urbana (IBGE, 2000). A base econômica do município tem sido centrada, historicamente, na agropecuária e no reflorestamento com eucaliptos, principalmente Eucalyptus saligna, para fins de produção de carvão vegetal. Estima-se que 40% das atividades desenvolvidas no Município de Pedra Bela estejam ligadas ao carvão vegetal (CATI, 2001). O Município apresenta uma renda "per capita" inferior a meio salário mínimo, o que, inclusive, o levou a ser incluído no Programa Nacional de Agricultura Familiar (PRONAF).

Atualmente, a utilização da terra no Município de Pedra Bela destina-se, em sua maioria, à pastagem. Há 30 anos predominava o cultivo da batata, mas, com a exaustão do solo, passou a ser substituída pela criação extensiva de bovinos. Somente 14% da área do município é destinada a algum tipo de cultura (anual ou perene) e cerca de 16%, para fins de reflorestamento com espécies de Eucalyptus (SAAESP, 1996).

Neste contexto, o presente trabalho objetivou a realização de um levantamento de aspectos técnicos e econômicos relacionados com a produção de carvão vegetal naquele município. Da mesma forma, visou oferecer subsídios para futuras ações destinadas à solução dos problemas detectados e, sobretudo, despertar a atenção dos especialistas e autoridades responsáveis pela definição de políticas públicas para a região.

2. METODOLOGIA

O estudo foi conduzido no Município de Pedra Bela, região administrativa de Bragança Paulista, Estado de São Paulo, compreendendo o período de julho a agosto de 2001. Foram avaliados 28 produtores de carvão vegetal, o que permitiu a inclusão da maioria dos empreendimentos rurais vinculados à atividade no município.

Foram aplicados questionários aos proprietários e funcionários, buscando-se avaliar os principais aspectos técnicos, econômicos e sociais da atividade. Foram também realizadas entrevistas com lideranças locais, além da coleta de dados secundários, a partir de informações obtidas na Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo e da Casa da Agricultura do município. Realizaram-se, em seguida, estudos qualitativo e quantitativo dos resultados da aplicação dos questionários e das entrevistas.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os resultados deste estudo são apresentados nas Tabelas de 1 a 3 e nas Figuras de 1 a 9.


A produção de carvão vegetal é difundida em todo o Município de Pedra Bela. Todavia, em alguns bairros rurais, a concentração é mais intensa por tradição. A maioria das empresas é de pequeno e médio portes, apresentando entre 10 e 20 fornos e capacidade de produção entre 5 e 40 t/mês. Foi possível detectar, ainda, que a maioria dos produtores atuam na informalidade, não apresentando registro no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA), nem Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ).

Os fornos utilizados são do tipo encosta ou barranco, construídos aproveitando-se a declividade dos terrenos, que apresentam baixo custo de instalação e mão-de-obra pouco especializada para a sua construção. A capacidade média dos fornos é de 4,7 m3 de lenha por ciclo de produção. Entende-se por ciclo o período compreendido entre a colocação da lenha no forno e a retirada do carvão vegetal, que em média é de oito dias.

Conforme os dados levantados, o município produzia, na época, cerca de 1.026 t de carvão vegetal por mês, o que representava cerca de 6% de todo o carvão que circulava mensalmente no Estado de São Paulo, conforme referências de estudos da produção estadual (PRÓCARVÃO, 2000).

A média de produção por forno no município era de 473 kg de carvão vegetal para cada carga de 4,7 m3 de madeira, ou seja, para cada 1 m3 de lenha o rendimento era de 100 kg. Através dessa informação, pode-se estimar, portanto, que para manter a capacidade produtiva (1.026 t/mês) Pedra Bela consumia cerca de 122 mil m3 de madeira por ano.

Dados obtidos através do Levantamento das Unidades de Produção Agrícola do Estado de São Paulo (SAAESP, 1996) evidenciaram que o município possuía cerca de 2.165 hectares destinados ao cultivo de eucalipto, com uma produtividade relativamente baixa, estimada em 15 m3/ha/ano. Considerando tal produtividade e a área destinada ao cultivo do eucalipto no município, pode-se prever uma disponibilidade anual de madeira equivalente a 6.495 m3, se considerada uma rotação de 5 anos para a cultura. Os dados apontaram que a área destinada ao cultivo de madeira era suficiente para abastecer somente cerca de 5% das carvoarias locais. Desse modo, a produção somente estava sendo garantida, em razão de a madeira estar sendo buscada nos municípios vizinhos. A falta de matéria-prima, portanto, poderia se tornar um grande entrave para a continuidade da atividade carvoeira no município.

Segundo os produtores, o melhor carvão era o proveniente do "Eucalipto roxo" (Eucalyptus saligna), por originar carvão denso e de boa aceitação no mercado. Os produtores indicavam ainda a existência na região do que chamavam de "Eucalipto vermelho" (Eucalyptus urophylla), uma madeira de menor aceitação para carvão vegetal. Com a existência de plantios florestais estimulados por empresas de papel e celulose na região, foi introduzido o que os moradores denominaram "Eucalipto rolha" (Eucalyptus urograndis), que apresentava baixa densidade e baixo rendimento, sendo considerados impróprios para a produção do carvão.

A origem da matéria-prima para a atividade carvoeira estendia-se além dos limites do Município de Pedra Bela, no entanto os maiores proprietários rurais possuíam plantios próprios, estando alguns deles investindo na reposição de suas florestas. Todavia, principalmente no caso dos pequenos produtores, constatou-se a não disponibilidade de recursos financeiros e muito pouco ou quase nada realizado em termos de reforma, reposição ou práticas de manejo das florestas, as quais, a cada rotação, estavam apresentando decrescente produção de madeira.

A maioria dos empreendimentos (72%) utilizava sacos de ráfia de 20 kg para embalar o carvão, e cerca de 82% deles reutilizavam as mesmas embalagens diversas vezes, principalmente para minimizar custos. Existiam na região algumas empresas (14%) que, por exercerem a atividade simultânea de produtor e distribuidor de carvão vegetal, utilizavam tanto o saco de ráfia quanto o saco de papel. A maioria dos empreendimentos adquiria a embalagem fornecida pelo responsável pela compra do carvão vegetal.

Cerca de 32% dos produtores não possuíam galpão para armazenamento do carvão, que ficava exposto e, ou, coberto com lona plástica até ser transportado, o que tornava o carvão suscetível à umidade, podendo comprometer a qualidade do produto. Cerca de 33% das empresas distribuidoras dispunham de peneira elétrica para classificação do carvão, algumas tinham máquina de costura elétrica para fechamento das embalagens e balança para pesagem do produto embalado.

A produção e o processamento de carvão vegetal em Pedra Bela se mostraram tradicionais, com as mesmas técnicas sendo utilizadas há décadas. A maioria dos processos era artesanal, e apenas cerca de 9% dos produtores possuíam estrutura coberta construída de madeira e telhado de alvenaria protegendo os fornos e os operários contra as intempéries.

A maioria dos empreendimentos, principalmente por estes estarem localizados próximos às moradias, possuía energia elétrica e instalação sanitária, todavia o esgoto era lançado em fossas secas e, ou, a céu aberto, uma vez que não foi constatado saneamento básico nesses locais.

Dos empreendimentos estudados, apenas um realizava a recuperação do licor pirolenhoso, que (cerca de 50 litros/semana) era comercializado para um produtor de agricultura orgânica de São Paulo, para ser usado no controle de pragas e insetos em sua propriedade.

Foi detectado um preço médio de R$0,28/kg para o carvão vendido pelos produtores para os chamados "intermediários". Estes, por sua vez, repassavam o produto para os grandes distribuidores, a um preço médio de R$0,38/kg. Os distribuidores, por sua vez, comercializavam o carvão vegetal empacotado aos varejistas a um preço médio de R$0,48/kg.

Conforme depoimento dos entrevistados, no início eram poucos os produtores. Todavia, com o declínio da produção de batata e com a falta de opção de trabalho, muitas pequenas propriedades passaram a produzir o carvão como uma forma de geração imediata de renda, o que contribuiu para reduzir o preço do carvão e desarticular a cadeia produtiva da região. Segundo eles, o carvão era vendido pelo preço que o comprador oferecia, geralmente não suficiente para cobrir os custos de produção, proporcionando uma margem muito pequena de lucro, uma vez que a matéria-prima era, para a maioria deles, adquirida de terceiros. Mesmo assim, a atividade era considerada a mais atrativa nas pequenas propriedades, comparativamente às outras possibilidades agrícolas.

A maior margem de retorno foi observada para aqueles que produziam e distribuíam o carvão vegetal. Isso indica a importância do incentivo à agregação de valores ao carvão, levando os produtores a se tornarem também distribuidores, principalmente no que diz respeito aos pequenos proprietários, que são os que mais reclamaram do baixo valor do produto.

Muitos produtores não possuíam nenhum tipo de planejamento das atividades, bem como noções para a elaboração de planilhas de custos. Vários deles não contabilizavam a mão-de-obra nos custos de produção, por se tratar de mão-de-obra familiar, bem como não incluíam o preço da madeira quando se tratava da sua própria propriedade.

4. CONCLUSÕES

O estudo confirmou a importância da produção de carvão vegetal para o Município de Pedra Bela. A maioria dos produtores, pequenos e médios proprietários rurais, atuava na informalidade, trabalhando, em média, com 23 fornos, todos do tipo encosta.

O nível de oferta de matéria-prima para a produção de carvão vegetal, dentro do próprio município, era menor que o nível de demanda, o que apontou a necessidade de investimentos em reposição florestal. Se isso não for efetuado, haverá uma forte tendência de declínio da atividade, principalmente nas pequenas propriedades, que não têm condições de adquirir a matéria-prima de terceiros. Ficou clara a necessidade de implementação de programas de fomento para o estímulo ao reflorestamento no município, com espécies propícias à atividade de carvoejamento.

Verificou-se, ainda, a necessidade de capacitação técnica e de programas que incentivem a adoção de novas tecnologias, propiciando que os produtores de carvão vegetal se tornem mais competitivos no mercado.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido em 1º.06.2004 e aceito para publicação em 10.08.2005.

  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE FLORESTAS RENOVÁVEIS - ABRACAVE. Anuário Estatístico de Consumo de Carvão Vegetal Belo Horizonte: 2001. 10p.
  • BRITO. J. O. Princípios de produção e utilização de carvão vegetal de madeira Piracicaba: Escola Superior Luis de Queiroz, 1990. v.9. 21p. (Documentos Florestais).
  • INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Censo demográfico 2000/ Malha Municipal Digital do Brasil Brasília: 2000.
  • SECRETARIA DO AGRICULTURA E ABASTECIMENTO DO ESTADO DE SÃO PAULO - SAAESP. Projeto LUPA - Levantamento das Unidades de Produção Agrícola do Estado de São Paulo. Estatísticas agrícolas, Município de Pedra Bela, Estado de São Paulo, 1996. http://www.cati.sp.gov.br/novacati/index.php 25/03/04
  • NETTO, F. F. Estágio atual das pesquisas sobre o carvão vegetal. In: Seminário Nacional sobre Carvão Vegetal, 2., 1980, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte: ABRACAVE, 1980. 23p.
  • PROGRAMA DE QUALIFICAÇÃO E CERTIFICAÇÃO DO CARVÃO VEGETAL NO ESTADO DE SÃO PAULO - PROCARVÃO. Relatório Descritivo SEBRAE São Paulo. 2000. 68p. <www.ipef.br/tecprodutos/procarvao/procarvao.pdf> Acesso em 25/03/04.
  • COORDENADORIA TÉCNICA DE ASSISTÊNCIA INTEGRAL - CATI. Relatório Anual para o Município de Pedra Bela Pedra Bela: 2001. 15p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Nov 2005
  • Data do Fascículo
    Out 2005

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2004
  • Aceito
    10 Ago 2005
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