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Avaliação do banco de sementes do solo para fins de restauração florestal em Carandaí, MG

Evaluation of soil seeds bank for forest restoration in Carandaí, MG

Resumos

O conhecimento do banco de sementes do solo fornece informações essenciais sobre o potencial de regeneração de determinada área, permitindo que se façam inferências sobre a sua restauração. Por meio de 20 parcelas de dimensões 25 x 25 cm e 5 cm de profundidade, foram coletadas amostras de solos de diferentes situações ambientais (pasto limpo, pasto sujo, capoeira, eucalipto e mata) identificadas numa propriedade rural do município de Carandaí, MG. O material coletado foi colocado para germinar em casa de vegetação e analisado durante oito meses, sendo avaliadas a composição e a densidade das espécies (herbáceas, subarbustivas, arbustivas e arbóreas). As situações ambientais apresentaram diferentes expressões de regeneração natural. O pasto sujo foi a situação que apresentou maior número de indivíduos herbáceos regenerantes, o que a torna mais problemática para fins de restauração florestal. Todas as situações ambientais apresentaram banco de sementes de plântulas arbustivo-arbóreas, o que poderá auxiliar no processo de restauração. Entretanto, o sucesso dessa atividade estará diretamente vinculado às atividades de controle de competidores, principalmente gramínea reconhecidamente agressiva que germinou amplamente em todas as situações ambientais. Devido à ausência de espécies de estádios finais de sucessão no banco de sementes no solo, deverá haver outras intervenções complementares, como plantio de mudas, semeadura direta de espécies arbóreas e/ou implantação de poleiros artificiais para acelerar a sucessão vegetal.

Regeneração natural; Restauração ecológica; Recuperação de áreas degradadas


ABSTRACT - The knowledge of soil seeds bank provides essential information on the potential of regeneration in a particular areas, allowing inferences on its restoration. By using 20 plots with 25 x 25 cm and 5 cm deep, samples of soils from different environmental situations, identified in a rural property in Carandaí, MG, were collected (clean pasture, dirty pasture, coppice, eucalyptus and forest). The collected material was put to be germinated in a greenhouse and analyzed for eight months, where composition and the density of the species (herbaceous, sub-shrubby, shrubby and arboreal) were evaluated. The environmental situations presented different expressions of natural regeneration. The dirty pasture was the situation that presented the largest number of regenerating herbaceous trees, what makes it more problematic for forest restoration. All the environmental situations presented bank of seeds of arboreal and shrubby seedlings, which may help the restoration process. However, the success of this activity will be directly linked to the activities of competitor control, mainly of Urochloa decumbens (Stapf) R. D. Webster, an aggressive grass that germinates in every environmental situation. Due to the absence of species in final succession stage in the seed bank in the soil, there might have been other complementary interventions such as planting of seedlings, direct sowing of tree species and/or implantation of artificial galleries to accelerate the vegetable succession.

Ecological restoration; Natural regeneration; Seed ecology


Leandro CalegariI; Sebastião Venâncio MartinsII; Lilian Cristina CamposIII; Elias SilvaII ; José Marinaldo GlerianiII

IUniversidade Federal de Campina Grande, Centro de Saúde e Tecnologia Rural - CSTR, Campina Grande, PB. E-mail: <leandrocalegari@yahoo.com.br>

IIUniversidade Federal de Viçosa, Centro de Ciências Agrárias, Departamento de Engenharia Florestal. E-mail: <venancio@ufv.br>, <eshamir@ufv.br> e <gleriani@gmail.com>

IIICimento Tupi S/A. Departamento de Meio Ambiente, Carandaí, MG

RESUMO

O conhecimento do banco de sementes do solo fornece informações essenciais sobre o potencial de regeneração de determinada área, permitindo que se façam inferências sobre a sua restauração. Por meio de 20 parcelas de dimensões 25 x 25 cm e 5 cm de profundidade, foram coletadas amostras de solos de diferentes situações ambientais (pasto limpo, pasto sujo, capoeira, eucalipto e mata) identificadas numa propriedade rural do município de Carandaí, MG. O material coletado foi colocado para germinar em casa de vegetação e analisado durante oito meses, sendo avaliadas a composição e a densidade das espécies (herbáceas, subarbustivas, arbustivas e arbóreas). As situações ambientais apresentaram diferentes expressões de regeneração natural. O pasto sujo foi a situação que apresentou maior número de indivíduos herbáceos regenerantes, o que a torna mais problemática para fins de restauração florestal. Todas as situações ambientais apresentaram banco de sementes de plântulas arbustivo-arbóreas, o que poderá auxiliar no processo de restauração. Entretanto, o sucesso dessa atividade estará diretamente vinculado às atividades de controle de competidores, principalmente de Urochloa decumbens (Stapf) R.D. Webster, gramínea reconhecidamente agressiva que germinou amplamente em todas as situações ambientais. Devido à ausência de espécies de estádios finais de sucessão no banco de sementes no solo, deverá haver outras intervenções complementares, como plantio de mudas, semeadura direta de espécies arbóreas e/ou implantação de poleiros artificiais para acelerar a sucessão vegetal.

Palavras-chave: Regeneração natural; Restauração ecológica; Recuperação de áreas degradadas.

ABSTRACT

ABSTRACT - The knowledge of soil seeds bank provides essential information on the potential of regeneration in a particular areas, allowing inferences on its restoration. By using 20 plots with 25 x 25 cm and 5 cm deep, samples of soils from different environmental situations, identified in a rural property in Carandaí, MG, were collected (clean pasture, dirty pasture, coppice, eucalyptus and forest). The collected material was put to be germinated in a greenhouse and analyzed for eight months, where composition and the density of the species (herbaceous, sub-shrubby, shrubby and arboreal) were evaluated. The environmental situations presented different expressions of natural regeneration. The dirty pasture was the situation that presented the largest number of regenerating herbaceous trees, what makes it more problematic for forest restoration. All the environmental situations presented bank of seeds of arboreal and shrubby seedlings, which may help the restoration process. However, the success of this activity will be directly linked to the activities of competitor control, mainly of Urochloa decumbens (Stapf) R. D. Webster, an aggressive grass that germinates in every environmental situation. Due to the absence of species in final succession stage in the seed bank in the soil, there might have been other complementary interventions such as planting of seedlings, direct sowing of tree species and/or implantation of artificial galleries to accelerate the vegetable succession.

Keywords: Ecological restoration; Natural regeneration; Seed ecology.

1. INTRODUÇÃO

As primeiras tentativas de restauração florestal foram realizadas de forma empírica, buscando reproduzir ecossistemas maduros de referência, por meio de plantios de mudas de espécies finais de sucessão e aplicando técnicas agronômicas e silviculturais. Essa fase da tentativa de restaurar florestas foi bastante influenciada pelo paradigma clássico da ecologia, em que ecossistemas eram considerados sistemas fechados, pouco sujeitos a perturbações, de modo que a sucessão culminava em um clímax único. No entanto, com a mudança dos paradigmas da ecologia (ecologia contemporânea), os ecossistemas passaram a ser entendidos como sistemas abertos e sujeitos a variados tipos de distúrbios bem como susceptíveis a influências por uma série de fatores após esses distúrbios (PARKER; PICKETT, 1997).

Devido a não consideração dos atuais aspectos ecológicos que regem a organização florística e estrutural das populações de plantas ao longo do tempo, inúmeros projetos de recuperação de áreas degradadas com base apenas em técnicas silviculturais e agronômicas de plantio de mudas de poucas espécies arbóreas (inclusive exóticas e até gramíneas) mostraram-se ineficientes para resgatar a integridade dos ecossistemas e para garantir sua sustentabilidade, logo têm sido substituídos por modelos e técnicas de restauração florestal com base no paradigma contemporâneo. Dentre esses modelos e técnicas, destacam-se a transposição da serapilheira e banco de sementes do solo, uso de galhadas oriunda de podas e o resgate de plântulas em áreas a serem desmatadas ou de plântulas oriundas de germinação do banco de sementes do solo (MARTINS et al., 2007).

Outra técnica bastante promissora é a avaliação do banco de sementes. Trata-se da busca do conhecimento sobre a regeneração natural e dinâmica do banco de sementes no solo para avaliar o potencial de autorrecuperação.

O banco de sementes representa um dos componentes mais importantes no processo de regeneração florestal em áreas degradadas, por isso, sua caracterização (riqueza e abundância de espécies) é extremamente importante para a definição de metodologias diferenciadas de restauração. Através da avaliação do banco de sementes nas diferentes situações, é possível identificar casos em que, por exemplo, apenas o isolamento dos fatores de degradação garantiria a regeneração florestal. Em situações contrárias (áreas onde o banco de sementes não se apresenta promissor), deve haver outras intervenções complementares, como práticas de enriquecimento e reintrodução de espécies através de sementes e mudas. Assim, este método apresenta grande importância, não apenas devido à possibilidade de conservação da diversidade genética, mas também em virtude de fatores econômicos, podendo tornar o processo de revegetação mais barato e eficiente em alguns casos. A dificuldade de obtenção de mudas da maioria das espécies nativas em viveiros florestais, tanto pela dificuldade de coleta de suas sementes quanto pela falta de tecnologia para sua produção, é ainda alta. Dessa forma, esta técnica também favorece a recuperação de ecossistemas pela restauração com alta diversidade (NAVE, 2005; VIANI, 2005; MARTINS et al., 2007).

O banco de sementes do solo é um estoque de sementes dormentes, mas potencialmente capazes de germinar e substituir plantas adultas anuais ou perenes que desapareceram por causa natural ou não, por doenças, distúrbios ou consumo por animais. Entretanto, além da presença de plantas desejáveis e com número suficiente de espécies, o banco sempre contém, em maior ou menor escala, sementes de plantas indesejáveis (daninhas), geralmente com efeitos negativos de competição (SOUZA, 2003).

Neste sentido, este trabalho teve como objetivo conhecer a composição e densidade das espécies do banco de sementes do solo de cinco diferentes situações ambientais em uma propriedade rural localizada no município de Carandaí, MG, a fim de propor métodos de restauração florestal para cada uma das situações.

2. MATERIAL E MÉTODOS

As amostras de solo para a avaliação do banco de sementes foram obtidas de uma propriedade rural denominada Fazenda do Gabriel, pertencente à empresa Cimento Tupi S.A., onde será realizado um projeto de restauração florestal. Essa propriedade localiza-se no município de Carandaí, MG, e apresenta ponto de referência 20º 53' 41" de latitude Sul e 43º 47' 37" de longitude Oeste, relevo bastante acidentado e numa altitude superior a 1000 m. O clima da região, segundo a classificação de Köppen, é do tipo Cwb, tropical de altitude, com verões quentes e chuvosos, e invernos frios e secos, com temperatura do mês mais frio inferior a 18°C e do mês mais quente superior a 22°C (GOOGLE EARTH, 2008).

A partir de um estudo de zoneamento ambiental realizado com base em interpretação de imagem em satélite e checagem em campo, foram identificadas na propriedade cinco situações ambientais:

a) Pasto limpo (pasto sem regeneração florestal): pasto formado por braquiária (Urochloa decumbens (Stapf) R.D. Webster) de baixo porte (rasteira);

b) Pasto sujo (pasto com regeneração arbustiva): pasto formado por braquiária de baixo porte localizado em área de terreno declivoso, com a existência de indivíduos esparsos de espécies arbustivo-arbóreas regenerantes, com altura máxima de até 3 m;

c) Capoeira (pasto com regeneração arbórea e árvores esparsas): porção da propriedade também ocupada por pasto de braquiária, porém com elevada densidade de indivíduos arbóreos;

d) Eucalipto: talhão de Eucalyptus spp. com sub-bosque ocupado por braquiária e regeneração de espécies nativas arbustivo-arbóreas;

e) Mata nativa: fragmento de Floresta Estacional Semidecidual Montana secundária em estádio médio de sucessão e bom estado de conservação.

Em cada uma dessas situações ambientais, 20 amostras de solo foram retiradas com o auxílio de um gabarito de madeira de dimensões 25 x 25 cm e até 5 cm de profundidade, desconsiderando toda a serapilheira dura que se encontrava sob o solo. Estas amostras foram retiradas de forma sistemática nas áreas centrais de cada situação ambiental, evitando-se as bordas e áreas de transição. Foi demarcada uma rede de parcelas formada por 5 linhas e 4 colunas, distantes 5 m, sendo as amostras retiradas nas interseções. Portanto, foi coletado um total de 100 amostras de solo (5 situações x 20 repetições).

Além do gabarito de madeira, pás e enxadas também foram utilizadas para a coleta do solo, sendo este imediatamente armazenado em sacos plásticos pretos, identificados e transportados para casa de sombra (sombrite 50%) no viveiro da Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa, MG. Na casa de sombra, as amostras foram transferidas para bandejas plásticas, em que foram mantidas durante oito meses (setembro/2006 a maio/2007).

Por apresentar sistema de irrigação por nebulização automática, a casa de sombra não permitiu que amostras sofressem estresse hídrico e, sendo coberta por tela sombrite de malha fina (1,0 mm), impediu que as bandejas fossem contaminadas por propágulos. Junto às bandejas com solo, também foram colocadas bandejas contendo areia grossa esterilizada, para o controle da eventual contaminação das amostras por eventual chuva de sementes local. Caso isso ocorresse, a(s) espécie(s) contaminante(s) seria(m) desconsiderada(s) das análises. Todas as bandejas foram dispostas aleatoriamente no interior do viveiro para garantir as mesmas condições ambientais.

As plântulas emergentes foram contadas semanalmente, identificadas e retiradas imediatamente após seu registro. A identificação taxonômica das plântulas foi feita por meio de consultas à especialista, à bibliografia especializada (LORENZI, 2002, 2006, 2008) e ao herbário VIC da UFV. Adotou-se o sistema de classificação APG II (ANGIOSPERM PHYLOGENY GROUP II, 2003; SOUZA; LORENZI, 2005), sendo que os nomes das espécies, das autoridades e das famílias foram confirmados e atualizados através do site do Missouri Botanical Garden (www.mobot.org/w3t/search/vast.html).

Categorizaram-se as plântulas emergentes quanto à sua forma de vida (erva, arbusto e árvore). As espécies arbóreas, devido à sua importância ecológica para a restauração florestal, foram classificadas em função de sua síndrome de dispersão e classe sucessional, classificando-as em pioneiras (pioneira + secundárias iniciais) e não-pioneiras (secundárias tardias + climácicas) por ser a classificação mais utilizada em projetos de restauração. Devido à expressividade da braquiária [Urochloa decumbens (Stapf) R.D. Webster] e à sua agressividade, foram realizadas análises em separado para esta espécie.

Considerando-se cada situação ambiental (pasto limpo, pasto sujo, capoeira, eucalipto e mata nativa) como um tratamento e cada amostra de solo como uma repetição, foram conferidas as preposições de normalidade e homocedasticidade e, quando possível, a análise foi realizada através de análise de variância (teste de F) e comparação de médias pelo teste de Tukey. Quando não conferidas essas pressuposições, mesmo após transformação dos dados, os tratamentos foram comparados pelo teste não paramétrico de Kruskal-Wallis. As análises foram realizadas com auxílio do pacote estatístico ACTION versão 2.5 (ESTATCAMP, 2013), ao nível de significância de 5%.

3. RESULTADOS

Considerando todas as situações ambientais, germinaram 10.427 indivíduos de 21 famílias e 70 morfoespécies, sendo 54 identificadas em nível de espécie, 1 em nível de gênero, 2 em nível de família e 13 não identificados, distribuídas entre herbáceas, subarbustivas, arbustivas e arbóreas.

Ocorreu predomínio da família Asteraceae (16 espécies), e 32,3% dos indivíduos germinados corresponderam à braquiária [Urochloa decumbens (Stapf) R.D. Webster], gramínea perene que foi identificada em todas as situações ambientais, em maior ou menor densidade. O pasto sujo correspondeu à situação em que ocorreu predomínio da espécie, situação contrária da mata nativa, onde foi observado o menor número de indivíduos. As demais situações apresentaram-se em condições intermediárias (Figura 1).


A totalidade das espécies germinadas no banco de sementes, excluindo-se os indivíduos de braquiária é apresentada na Tabela 1.

A totalidade das espécies germinadas no banco de sementes, excluindo-se os indivíduos de braquiária, é apresentada na Tabela 1.

No pasto limpo, houve predomínio de indivíduos herbáceos, com os indivíduos das espécies Spermacoce palustris e Scoparia dulcis, perfazendo quase 50% da totalidade. Leandra purpurascens, Vernonia polyanthes, Artemisia dracunculifolia e Croton urucurana foram as poucas espécies arbustivo-arbóreas observadas, todas pioneiras.

Situação semelhante foi observada no pasto sujo, com predomínio de herbáceas, sendo que Scoparia dulcis e Leonotis nepetifolia perfizeram praticamente 60% do total de indivíduos germinados. Leandra purpurascens, Vernonia polyanthes, Vernonia diffusa e Vernonia westiniana, Chromolaena laevigata foram algumas espécies arbustivas observadas. Não ocorreram espécies arbóreas.

A situação capoeira também apresentou-se dominada por ervas, sendo que Scoparia dulcis, Leonotis nepetifolia e Leandra purpurascens perfizeram 65% do total de indivíduos germinados. Houve uma maior participação de espécies arbustivo-arbóreas do que nas situações anteriores. Rapanea ferruginea, Luehea grandiflora e Sapium glandulatum foram as espécies arbóreas encontradas, todas pertencentes ao estádio inicial de sucessão (pioneiras e secundárias iniciais).

Também dominada por espécies herbáceas, a situação eucalipto apresentou 73% dos indivíduos pertencentes às espécies Scoparia dulcis, Leandra purpurascens, Leonotis nepetifolia e Mitracarpus hirtum. Não houve presença de espécies arbóreas nesta situação, somente arbustivas: Leandra purpurascens, Vernonia westiniana, Vernonia polyanthes, Chromolaena laevigata e Baccharis dracunculifolia.

A situação mata nativa destacou-se por apresentar a maior quantidade de espécies arbóreas, incluindo espécies secundárias tardias, apesar do predomínio de indivíduos herbáceos. Leandra purpurascens e uma espécie da família Poaceae participaram com 67% do total de indivíduos. As espécies arbóreas encontradas foram as pioneiras Rapanea ferruginea, Croton urucurana, Trema micrantha, Luehea grandiflora, Sapium glandulatum, e as não-pioneiras Carpotroche brasiliensis e Cupania vernalis.

A mata nativa também correspondeu à situação em que foi encontrada maior riqueza (41 morfoespécies), seguida das situações pasto sujo e capoeira (35 morfoespécies cada). Eucalipto e pasto limpo foram às situações em que foram observadas as menores riquezas, com 27 e 26 morfoespécies, respectivamente.

Não ocorreu germinação de espécies arbóreas nas situações de pasto sujo e eucalipto. Nas demais situações, germinaram pouco ou nenhum indivíduo em cada amostra (repetição), motivo pelo qual apresentaram altos coeficientes de variação (Figura 2).


No pasto limpo, apenas um indivíduo de Croton urucurana germinou do banco de semente. Na situação capoeira, germinaram 5 indivíduos de Rapanea ferruginea, 1 indivíduo de Luehea grandiflora e 1 indivíduo de Sapium glandulatum. Na situação mata nativa, germinaram 41 indivíduos de Rapanea ferruginea, 3 de Trema micrantha, 3 de Croton urucurana, 2 de Luehea grandiflora, 2 de Sapium glandulatum, 1 de Carpotroche brasiliensis e 1 indivíduo de Cupania vernalis.

4. DISCUSSÃO

A presença de espécies não identificadas no presente estudo deveu-se ao fato de serem herbáceas e subarbustivas, grupo normalmente de difícil identificação e, por isso, alguns estudos nem as incluem na avaliação do banco (NAVE, 2005). Além disso, a maior parte dos indivíduos não identificados corresponderam a espécies que germinaram com reduzido número, o que dificultou ainda mais a identificação. Contudo, optou-se por incluí-las, pois apenas o valor de densidade dessas espécies auxilia a interpretação da resiliência dos ecossistemas.

Estudos sobre banco de sementes realizados em Minas Gerais apresentaram números de famílias e de espécies divergentes. Em Viçosa, Braga et al. (2007) descreveram um total de 22 famílias e 38 espécies, Franco (2005) listou 21 famílias e 66 espécies, e Leal Filho (1992), 24 morfoespécies. Em Paula Cândido, Costalonga (2006) citou a ocorrência de 22 famílias e 67 espécies na primeira etapa do estudo e 26 famílias e 80 espécies na segunda etapa. Em Brás Pires, Martins et al. (2008) identificaram 17 famílias e 36 espécies. Essa divergência reflete, além das diferenças de metodologias (ausência de padronização para amostragens de banco de sementes), a grande influência dos fatores como histórico de ocupação, exploração, proximidades de fontes de propágulos, uso atual e localização. Essas mesmas variáveis também influenciaram a germinação nas diferentes situações ambientais.

O menor pastoreio do gado, na situação pasto sujo, provavelmente foi responsável pela maior germinação de braquiária, superior inclusive ao pasto limpo, uma vez que colabora para que os indivíduos adultos de braquiária consigam florescer e dispersar sementes. Já na situação pasto limpo, o pastoreio mantém a braquiária sempre baixa, não favorecendo a produção de sementes, motivo pelo qual apresenta diferença estatística significativa em relação ao pasto sujo. Na situação mata nativa, por sua vez, a presença do dossel fechado da floresta dificulta a entrada das sementes de braquiária via dispersão, e a sombra impede a germinação e o estabelecimento de indivíduos a partir de sementes que eventualmente consigam atingir o solo, o que não ocorre na situação eucalipto, o qual apresenta dossel aberto que favorece a entrada de semente e luz (Figura 1).

A maior diversidade de espécies arbóreas em solo com remanescentes arbóreos era esperado em função da proximidade da fonte de propágulos (GANDOLFI et al., 2007; MARTINS, 2007). Com o avanço da sucessão, ocorre uma redução na densidade de sementes herbáceas e finalmente um aumento na densidade de sementes arbustivas e arbóreas.

Em todas as situações ambientais, predominaram espécies herbáceas. Seu predomínio é comum em estudos de banco de sementes, sendo observados por Souza (2003), Franco (2005), Costalonga (2006) e Martins et al. (2008), como uma característica de ambientes perturbados. Fatores como mecanismos eficientes de dispersão, tamanho e dormência das espécies herbáceas pioneiras colaboram para a dominância destas nas diferentes situações ambientais. A grande quantidade de sementes de espécies herbáceas encontradas na área de estudo pode estar relacionada ao ciclo de vida das espécies, à produtividade de sementes, à ausência ou não da continuidade do dossel, que facilitaria a entrada de suas sementes e sua incorporação no solo.

Das espécies arbóreas que germinaram, predominantemente na situação mata nativa, Lorenzi (2002) descreveu que Rapanea ferruginea diz respeito a uma árvore com frutos com polpa, avidamente consumidos por várias espécies de aves; Sapium glandulatum apresenta frutos de abertura espontânea e sementes de arilo vermelho, motivo pelo qual é também atrativa a avifauna; e Trema micrantha apresenta frutos de queda espontânea, sendo também avidamente consumidos por várias espécies da avifauna. Devido a essas características, são espécies com síndrome de dispersão zoocórica. Croton urucurana, por sua vez, apresenta frutos de abertura espontânea (deiscência explosiva), sendo classificada como autocórica. Luehea grandiflora apresenta frutos de abertura espontânea e liberação de sementes aladas, sendo então dispersas pelo vento, o que permite classificá-las como anemocóricas. Carpotroche brasiliensis e Cupania vernalis tratam-se de espécies arbóreas com frutos comestíveis e muito apreciados por animais silvestres, apresentando, assim, síndrome de dispersão zoocóricas. Portanto, dentre as espécies arbóreas, ocorreu predomínio de espécies zoocóricas e pioneiras. Conforme Dalling (2002), espécies arbóreas pioneiras são comumente encontradas em maiores densidades no banco de sementes do solo, devido a suas características de grande produção de sementes, eficiente dispersão e dormência das sementes.

Uso de plantio de enriquecimento com espécies de grupos ecológicos mais avançados foi indicado por Costalonga (2006) ao verificar a predominância de espécies pioneiras dentre as arbustivo-arbóreas no banco de sementes de três tipos de cobertura vegetal (pastagem, plantio de eucalipto e Floresta Estacional Semidecidual) em Paula Candido, MG. Analisando o banco de sementes do solo de uma Floresta Estacional Semidecidual em Viçosa, MG, Batista Neto (2005) também concluiu haver predomínio de espécies pioneiras, não tendo sido registrada nenhuma espécie secundária tardia.

O gradiente de situações ambientais estudadas neste trabalho (pasto limpo, pasto sujo, capoeira, eucalipto e mata nativa) pode ser comparado ao trabalho realizado por Longhi et al. (2005). Ao avaliarem o banco de sementes de espécies arbóreas de três fases sucessionais (capoeirão, floresta secundária e floresta madura), esses autores observaram que os mecanismos de regeneração que predominam nas fases sucessionais de capoeirão e floresta secundária foram compostos por espécies pioneiras e secundárias iniciais. No decorrer da sucessão florestal, ocorreu diminuição gradativa da presença de espécies pioneiras e secundárias iniciais e o aumento da participação de secundárias tardias e de sub-bosque no banco de sementes. Porém, isso não indica o fim do banco de espécies pioneiras que ainda permanece na dinâmica dos estádios sucessionais mais avançados, o que deve auxiliar na regeneração de clareiras ocasionais nesses locais.

5. CONCLUSÃO

As situações ambientais identificadas apresentaram diferentes expressões de regeneração natural. A situação ambiental pasto sujo foi a que apresentou maior número de indivíduos herbáceos regenerantes, o que a torna mais problemática para fins de restauração.

A braquiária [Urochloa decumbens (Stapf) R.D. Webster], gramínea reconhecidamente agressiva e que pode inibir a regeneração de espécies arbóreas, germinou em todas as situações ambientais avaliadas, indicando que esta deve ser manejada cuidadosamente para o êxito do projeto de restauração.

Diante dos resultados do estudo, a restauração florestal nas diferentes situações ambientais não pode estar baseada somente no banco de sementes disponível no solo, tendo em vista que muitas espécies, principalmente aquelas de estádios finais de sucessão, não possuem representantes no banco. Dessa forma, são indicadas as seguintes técnicas de restauração florestal para cada situação ambiental:

a) Pasto limpo: plantio em área total, com coroamento das mudas, utilizando-se alta diversidade de espécies arbóreas nativas regionais, combinando-se espécies pioneiras sombreadoras de copa ampla e não-pioneiras. Instalação de poleiros artificiais de bambu no sentido de cortar toda a área até atingir remanescentes florestais do entorno, para facilitar o deslocamento e pouso da avifauna desses fragmentos para a área de pasto, visando a favorecer a dispersão de sementes de espécies arbustivo-arbóreas;

b) Pasto sujo: adensamento com plantio de mudas e semeadura direta de espécies arbóreas pioneiras e não-pioneiras;

c) Capoeira: adensamento e enriquecimento com plantio de mudas e semeadura direta de espécies arbóreas não-pioneiras;

d) Eucalipto: enriquecimento com plantio de mudas e semeadura direta de espécies arbóreas não-pioneiras;

e) Mata nativa: apenas isolamento de possíveis fatores de degradação e implantação de corredor florestal para conectar a área estudada e os demais remanescentes florestais da propriedade.

Para todas as situações ambientais, recomenda-se ainda o isolamento de possíveis fatores de degradação como entrada de gado bovino e fogo, através da construção de cercas e aceiros.

6. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem a Cimento Tupi S/A pelo apoio financeiro (projeto Restauração Florestal convênio LARF-UFV), ao CNPq pela bolsa de produtividade em Pesquisa de S.V. Martins e E. Silva e à FAPEMIG pela bolsa de Doutorado de L. Calegari.

7. REFERÊNCIAS

Recebido em 17.06.2011

Aceito para publicação em 02.07.2013

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  • Avaliação do banco de sementes do solo para fins de restauração florestal em Carandaí, MG

    Evaluation of soil seeds bank for forest restoration in Carandaí, MG
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Dez 2013
    • Data do Fascículo
      Out 2013

    Histórico

    • Recebido
      17 Jun 2011
    • Aceito
      02 Jul 2013
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