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Caracterização química e mineralógica de carvões vegetais coletados em diferentes ambientes

Chemical and mineralogical properties of charcoals from different environments

Resumos

O aumento das emissões dos gases de efeito estufa vem motivando diversos estudos sobre as formas de captura e sequestro de C. A incorporação do biocarvão no solo é uma forma eficiente de manter o C do biocarvão estabilizado, além de propiciar benefícios à produção agrícola. Este trabalho teve como objetivo caracterizar carvões vegetais coletados em diferentes ambientes. Foram determinados os teores de C total e C orgânico; análise elementar através da calcinação; e caracterização das amostras por difratometria de raios X, espectroscopia de absorção e microscopia eletrônica de varredura. As amostras em contato com o solo apresentaram maiores teores de COT, enquanto os teores de C total foram maiores nos carvões sem contato com o solo. Os valores de pH em H2O nas amostras de carvões em contato com o solo variaram de 4,42 a 7,24, com média de 6,8. Já o pH em KCl variou entre 2,91 e 6,88, com média de 4,68. Os teores de nutrientes foram baixos em todas as amostras. Nos carvões em contato com o solo, foram detectados caulinita, quartzo, grafite e gibbsita. Os principais grupos funcionais identificados foram O-H, C=O, C=C e C-O. A MEV das amostras 1 e 2 estruturas da madeira ficaram menos evidentes, e houve influência dos componentes e organismos dos solos nesses carvões..

Biocarvão; Sequestro de carbono; Reatividade


The increased emissions of greenhouse gases have motivated researches about capture and sequestration of C. The use of biochar in soils is an efficient way to maintain the C in the biochar stabilized and benefit the crop yield. The objective of this research was to characterize charcoals collected at different places.It was determined: total and organic C contents; elementary analysis by calcination; characterization of the samples by X-ray diffractometry, absorption spectroscopy and scanning electron microscopy. The samples in contact with soil showedhigher TOC contents, while total C contents were higher in the charcoals without contact with soil. The pH-H2O values of charcoal samples in contact with soil ranged between 4,42-7,24, average 6,8, while pH-KCl values ranged between 2,91-6,88, average 4,68. All samples presented low nutrient contents. In the samples of charcoal in contact with soil,kaolinite, quartz, graphite and gibbsitewere detected.The main functional groups identified were O-H, C=O, C=C and C-O. In the SEM of thesamples 1 and 2,wood structures were less evident and there was influence of the soil components and organisms in these charcoals.

Biochar; Carbon sequestration; Reactivity


Caracterização química e mineralógica de carvões vegetais coletados em diferentes ambientes

Chemical and mineralogical properties of charcoals from different environments

Natália Aragão FigueredoI; Liovando Marciano da CostaII; Evair Antônio SiebeneichlerIII; Renato Ribeiro PassosIV; Jairo TrontoIV

IUniversidade Federal de Viçosa, Programa de Pós-Graduação em Solos e Nutrição de plantas, MG – Brasil. E-mail: <nat_figueredo@hotmail.com> e <evair_eas@yahoo.com.br>

IIUniversidade Federal de Viçosa, Departamento de Solos, Vicosa, MG – Brasil. E-mail: <liovandomc@yahoo.com.br>

IIIUniversidade Federal do Espírito Santo, Centro de Ciências Agrárias, Departamento de Produção Vegetal, Alegre, ES – Brasil. E-mail: <renatoribeiropassos@hotmail.com>

IVUniversidade Federal de Viçosa, Departamento de química, Viçosa, MG – Brasil. E-mail: <jairotronto@gmail.com>

RESUMO

O aumento das emissões dos gases de efeito estufa vem motivando diversos estudos sobre as formas de captura e sequestro de C. A incorporação do biocarvão no solo é uma forma eficiente de manter o C do biocarvão estabilizado, além de propiciar benefícios à produção agrícola. Este trabalho teve como objetivo caracterizar carvões vegetais coletados em diferentes ambientes. Foram determinados os teores de C total e C orgânico; análise elementar através da calcinação; e caracterização das amostras por difratometria de raios X, espectroscopia de absorção e microscopia eletrônica de varredura. As amostras em contato com o solo apresentaram maiores teores de COT, enquanto os teores de C total foram maiores nos carvões sem contato com o solo. Os valores de pH em H2O nas amostras de carvões em contato com o solo variaram de 4,42 a 7,24, com média de 6,8. Já o pH em KCl variou entre 2,91 e 6,88, com média de 4,68. Os teores de nutrientes foram baixos em todas as amostras. Nos carvões em contato com o solo, foram detectados caulinita, quartzo, grafite e gibbsita. Os principais grupos funcionais identificados foram O-H, C=O, C=C e C-O. A MEV das amostras 1 e 2 estruturas da madeira ficaram menos evidentes, e houve influência dos componentes e organismos dos solos nesses carvões..

Palavras-chave: Biocarvão; Sequestro de carbono; Reatividade.

ABSTRACT

The increased emissions of greenhouse gases have motivated researches about capture and sequestration of C. The use of biochar in soils is an efficient way to maintain the C in the biochar stabilized and benefit the crop yield. The objective of this research was to characterize charcoals collected at different places.It was determined: total and organic C contents; elementary analysis by calcination; characterization of the samples by X-ray diffractometry, absorption spectroscopy and scanning electron microscopy. The samples in contact with soil showedhigher TOC contents, while total C contents were higher in the charcoals without contact with soil. The pH-H2O values of charcoal samples in contact with soil ranged between 4,42-7,24, average 6,8, while pH-KCl values ranged between 2,91-6,88, average 4,68. All samples presented low nutrient contents. In the samples of charcoal in contact with soil,kaolinite, quartz, graphite and gibbsitewere detected.The main functional groups identified were O-H, C=O, C=C and C-O. In the SEM of thesamples 1 and 2,wood structures were less evident and there was influence of the soil components and organisms in these charcoals.

Keywords: Biochar; Carbon sequestration; Reactivity.

1. INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, as atividades antrópicas têm provocado uma série de alterações na paisagem terrestre e, mais recentemente, na atmosfera. A necessidade de reduzir as emissões de gases de efeito estufa (GEEs) para tentar mitigar o aquecimento global vem motivando diversos estudos, principalmente no que se refere a emissões e captura do CO2 da atmosfera. O cenário atual é preocupante, pois a concentração de CO2 na atmosfera está chegando a 400 ppm, enquanto a concentração adequada, sugerida pelo IPCC, seria de 350 ppm (IPCC, 2005). A taxa média anual de aumento da quantidade de CO2 na atmosfera foi de 3,2 ± 0,1 Gtano-1 na década de 1990 e de 4,1 ± 0,1 Gt ano-1 de 2000 a 2005 (MATOVIC, 2011).

O Painel Internacional de Mudanças Climáticas (IPCC) tem reconhecido sete formas de mitigação do aquecimento global: captura e estoque de carbono (C); uso de combustíveis com baixo teor de carbono; energia nuclear; energia renovável; uso eficiente da energia; aumento do dreno biológico; e redução da emissão dos GEEs (IPCC, 2005). A alternativa mais promissora é o aproveitamento energético da biomassa, sendo a pirólise uma forma "promissora" para esse fim.

Algumas pesquisas têm encontrado carvão em depósitos sedimentares e em solos com idades que variam de centenas a milhares de anos. O material termicamente alterado se degrada muito lentamente, criando um estoque de carbono no solo de longo prazo. Esse tempo de preservação do carbono pelo biocarvão é cerca de 1.500 a 2.000 vezes maior do que o da matéria orgânica não pirolisada (REZENDE et al., 2011). A presença de estruturas internas semelhantes às do grafite contribui para que o biocarvão tenha sua recalcitrância mantida. Já a persistência do carvão por longo tempo no ambiente deve-se aos átomos de carbono que estão arranjados numa estrutura aromática policíclica (GLASER et al., 2001). Os materiais carbonizados apresentam alguns grupos funcionais, principalmente os carboxílicos, fenólicos, carbonilas, hidroxilas e quinonas, que podem ser ionizados, através dos quais são capazes de associarem aos componentes do solo e fazerem parte de sua estrutura.

Alguns estudos demonstram que a aplicação de biocarvão em áreas agrícolas tem proporcionado resultados positivos, principalmente no que se refere à rentabilidade agrícola, gestão da poluição e eutrofização do ambiente, restauração dos solos degradados, sequestro de C da atmosfera, redução da acidez do solo, melhoria da capacidade de troca catiônica dos solos, retenção de água e benefícios no hábitat dos microrganismos dos solos (CUNHA, 2005).

Liang et al. (2006), estudando quatro solos de Terra Preta de Índio (TPI) da Amazônia brasileira, encontraram que os resíduos de carvão são responsáveis por 70 a 90% da capacidade de troca catiônica (CTC) desses solos e o carvão possui maior CTC por quantidade de carbono, em comparação com o restante da matéria orgânica daqueles solos. Os valores de CTC do carvão são muito baixos logo após a sua produção. No entanto, com o passar do tempo, o carvão é gradativamente oxidado por mecanismos bióticos e abióticos, ocorrendo a decomposição dos grupos aromáticos e a formação de grupos carboxílicos e fenólicos, principalmente na superfície das partículas, fazendo que sua capacidade de retenção de íons aumente (ZIMMERMAN, 2010). A qualidade determinante do carvão vegetal está diretamente ligada às principais fases das reações de liberação ou absorção de energia e perda de massa (PEREIRA et al., 2013).

Nesse sentido, o uso do biocarvão no manejo dos solos depende da eficiência do aproveitamento energético dos materiais orgânicos, do tempo que o biocarvão é capaz de manter o carbono numa forma estável e dos benefícios à produção agrícola. A ciência do solo é necessária para esclarecer como o biocarvão se comporta no ambiente, ou seja, estudando as interações químicas que ele pode sofrer ou participar nos solos. Desse modo, este trabalho teve como objetivo caracterizar química e mineralogicamente carvões vegetais coletados em diferentes ambientes e as alterações por que passaram.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Identificação das amostras

As amostras de carvões foram coletadas em diferentes ambientes, no solo, na superfície e sem contato com o solo e produzido em condições controladas. Foram coletadas em contato superficial com o solo as amostras 1 e 6 em Alegre, Espírito Santo. As amostras 2, 3, 5, 7, 9, 10 e 11 foram coletadas em Viçosa, Juiz de Fora e Carmo Paranaíba, Minas Gerais. A amostra 4 foi coletada em profundidade de 40 cm de um Latossolo de uma propriedade rural no Município de Guiricema, MG. Nessa área não ocorre queimadas há 20 anos, e atualmente o uso é de pastagem. A amostra 8 também foi coletada em contato com o Latossolo Vermelho de textura média, numa área de plantio de eucalipto no Município de Brasilândia, MS, e era anteriormente ocupados por pastagem.

A amostra 12 foi considerada amostra-referência por ter sido produzida em condições controladas no Laboratório de Painéis e Energia da Madeira, Departamento de Engenharia Florestal da UFV, Viçosa, MG, a partir de madeira de Eucalyptus sp. (8 anos de idade) em temperatura de carbonização de 470 ºC. Em relação aos solos coletados, foram identificados como: 13. Latossolo coletado em Guiricema, MG; e 14. Latossolo Vermelho coletada, Brasilândia, MS.

2.2. Caracterizações química e mineralógica

As amostras de carvões foram moídas e passadas em peneira de 0,100; 0,149; e 0,250 mm de abertura de malha. Foram realizadas as determinações dos teores de C total em analisador elementar (Perkin Elmer 2400 Series II CHNS/O). O teor de carbono orgânico total (COT) foi determinado pelo método de Walkley-Black, conforme descrito por Mendonça e Matos (2005). Esse carbono determinado pelo método Walkley-Black é considerado neste estudo como facilmente oxidado.

Para análise do 13C/12C (‰), as amostras de carvão foram passadas em peneiras de 100 mesh (0,149 mm) e determinados em espectrômetro de massa de razão isotópica de fluxo contínuo (ANCA-GSL, 20-20, Sercon, Crewe, UK).

As concentrações de Al, As, B, Ca, Cr, Cu, Fe, K, Mg, Mn, Na, Ni, P, Pb, S e Zn foram determinados pela calcinação das amostras em forno tipo mufla, usando taxa de aquecimento de 3 ºC min-1 até atingir 550 ºC, permanecendo nessa temperatura durante 6 h. Após, as cinzas foram solubilizadas em uma solução de ácido nítrico (HNO3) 1 mol L-1 e a leitura, feita por espectrofotometria de emissão atômica com plasma induzido (EEA-PI). Também, realizou-se a extração de Ca2+ em solução de KCl 0,1 mol L-1 e leitura em espectrofotômetro de absorção atômica. O fósforo remanescente (P-rem) foi determinado conforme Alvarez V. et al. (2000).

As amostras também foram caracterizadas por difratometria de raios X no pó (DRXP) e por análise de espectrofotometria na região do infravermelho com acessório de refletância total atenuada (FTIR-ATR). Utilizou-se um Espectrofotômetro Jasco FTIR 4100. Os espectros foram obtidos com 60 varreduras, em uma faixa de comprimento de onda de 4.000 a 400 cm-1. Para a DRXP, o aparelho utilizado foi o PAN analytical, modelo X' Pert Pro com tubo de cobalto e filtro de níquel, no intervalo de 4 a 50º2θ e velocidade de varredura de 10º por segundo, com tensão de 40 kV e corrente de 30 mA.

As amostras 1, 2 e 12 foram metalizadas em películas de ouro no aparelho Sputtering-Palzers, modelo FDU-010, e levadas à Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV).

3. RESULTADOS

3.1. Concentração dos elementos químicos nos carvões e nos solos após a calcinação

Os valores de CO dos solos estudados que continham carvão foram muito baixos, de 1 a 0,41 dag kg-1. No Latossolo coletado em Guiricema, MG, a concentração de CO foi 0,92 dag kg-1 e no Latossolo Vermelho coletado em Brasilândia, 1,0 dag kg-1.

O teor médio de C total nos carvões em contato com o solo foi de 58 dag kg-1 e nos carvões sem contato com o solo, 71,19 dag kg-1. Já o teor médio de CO nos carvões em contato com o solo foi de 21 dag kg-1, diminuindo para 11 dag kg-1 nas amostras de carvões sem contato com o solo. O valor mais alto de CT (83,52 dag kg-1) ocorreu na amostra 7, mas o teor de CO foi de apenas 9,35 dag kg-1, o que demonstra alta resistência à oxidação desse C (Figura 1).


A amostra 12, produzida em condições controladas em temperatura de 470 ºC, apresentou 75,7 dag kg-1 de CT, o que corresponde ao encontrado por Antal e Grønli (2003) na biomassa carbonizada, 70 a 80 dag kg-1 após a pirólise, entre 250 ºC e 600 ºC. Com o aumento da temperatura de carbonização, o teor de CT pode chegar a 90%.

Em todas as amostras, os teores dos macro e micronutrientes foram baixos (Tabela 1). O teor mais abundante foi o Fe, com valores entre 4,23 e 808 mg kg-1.

Em relação às amostras 4 e 8, que estavam em contato direto com o solo em profundidade de 20-40 cm, os teores de macro e micronutrientes foram mais elevados do que nas demais amostras. Os maiores teores de Ca foram obtidos na amostra 1, com 20,27 g kg-1 e na amostra 4, 12,88 g kg-1. Em relação aos demais macronutrientes, os teores foram análogos, à exceção do P na amostra 6, com 3,06 g kg-1. As amostras 1 e 8 também apresentaram altos teores de Al, com 18,51 g kg-1 e 10,47 g kg-1, respectivamente.

Comparando as amostras de carvões 4 (Guiricema) e 8 (Brasilândia, MS) com os respectivos solos que estavam em contato, amostra 13, Latossolo Vermelho-Amarelo (Guiricema, MG) e amostra 14, Latossolo Vermelho (Brasilândia, MS), alguns elementos apresentaram diferenças significativas.

A amostra-controle (12) apresentou baixos teores dos elementos analisados, mas em relação às demais amostras em contato superficial com os solos, os teores foram equivalentes, Ca (1,08 g kg-1), K (0,96 g kg-1), P (0,09 g kg-1), Mn (21,91 mg kg-1) e Cu (18,30 mg kg-1).

Foram encontrados em amostras de carvão alguns elementos-traços, como As, Cr e Pb. Os valores de As e Cr na amostra 10 foram de 592,49 e 960,81 mg kg-1 e na amostra 11, de 147,73 e 226,29 mg kg-1, respectivamente. Estes podem estar associados a algum tratamento da madeira.

Os resultados dos teores de P-rem variaram de 14,81 a 57,9 mg L-1. Essas concentrações englobam desde as classes baixas até a extremamente alta, de acordo com os níveis de adsorção de fosfato (ALVAREZ V. et al., 2000).

Os valores de pH em H2O nas amostras de carvões em contato com o solo variaram de 4,42 a 7,24, com média de 6,8. O pH em KCl variou na faixa de 2,91 a 6,88, com média de 4,68. Já os carvões que não tiveram contato com o solo (amostras 10, 11 e 12) apresentaram valores de pH em H2O entre 4,94 e 5,22 e de pH em KCl de 2,98 a 4,63. Nas amostras de solos, os resultados foram semelhantes aos dos carvões coletados. Nas amostras 4 e 8, os valores de pH em H2O foram 5,68 e 4,91, enquanto nos solos correspondentes foram de 5,67 e 5,52, respectivamente.

O ΔpH fornece informações sobre o balanço de cargas elétricas no solo e também sobre o grau de intemperização. O ΔpH da amostra 12 de carvão sem contato com o solo foi de -0,59. Em todas as amostras, o valor de ΔpH é negativo, caracterizando eletronegatividade.

Em amostras de TPI coletadas por Falcão et al. (2003) no Amazonas, o ΔpH foi mais negativo (-1,48), e a amplitude de variação encontrada foi associada a uma concentração de Al3+ trocável mais elevada. Nos carvões estudados, as maiores amplitudes do ΔpH foram dos carvões que estavam em contato com o solo, entre -1,37 a -2,02. Esses estudos evidenciam a participação dos componentes do solo nas características do carvão, e, assim, existe uma relação desses valores de ΔpH com o balanço de cargas negativas e a presença de caulinita presentes em algumas amostras desses carvões. Essas cargas negativas podem ser o resultado da dissociação dos grupos funcionais presentes na estrutura desses carvões.

3.2. Características mineralógicas e espectroscopia de absorção molecular na região do infravermelho, com transformada de Fourier

Foram identificados na DRXP, em todas as amostras em contato com o solo, os picos de caulinita (716; 357; 433; 249; 228 pm); de quartzo (334; 425; 181 pm); de grafite (336; 167; 203 pm). Nas amostras 1 e 2, foram detectadas também picos da gibbsita (485; 437; 432; 238 pm). Joseph et al. (2009) encontraram diferentes minerais no biocarvão, que incluem silvinita, quartzo, sílica amorfa, calcita, hidroxiapatita e, em menores proporções, fosfatos de cálcio, anidrita, nitratos variados, óxidos e hidróxidos de Ca, Mg, Al, Ti, Mn, Zn ou Fe.

Nos carvões produzidos a partir de madeira de eucalipto e sem contato com o solo, os difratogramas não apresentaram picos de nenhum mineral, exceto picos de grafite (202; 336; 213 pm), e na amostra 9 foram encontrados picos de quartzo (334; 246; 228 pm).

Os principais grupos nas amostras de carvões vegetais coletadas foram: O–H; C=O; C=C; e C–O. Nas amostras foram identificadas bandas com número de onda de 3.700, 2.360, 1.700, 1.600, 1.585, 1.200, 1.030 e 1.020 cm"1.

3.3. Microscopia eletrônica de varredura dos carvões

Nas amostras 1, 2 e 12, é possível identificar a morfologia de estrutura do xilema de madeira, menos alterada na amostra 12, que teve condições controladas (470 ºC) de carbonização (Figura 2).


Na amostra 2, a MEV demonstrou a colonização de fungos no interior desse carvão. Keechet al. (2005) identificaram área do carvão vegetal derivado de madeira de aproximadamente de 10 ìm2 a 3.000 ìm2, enquanto algumas células microbianas normalmente possuem tamanhos entre 0,5 ìm de 5ìm e são, predominantemente, constituídos por bactérias, fungos, actinomicetos e liquens.

4. DISCUSSÃO

4.1. Concentração dos elementos químicos nos carvões e nos solos após a calcinação

As amostras que estavam em contato diretamente com o solo (amostras 1, 2, 4 e 8) apresentaram valores mais altos de CO, o que sugere que os componentes dos solos favorecem a oxidação do carbono total. Os valores de CO indicam a capacidade de retenção de C pelo carvão vegetal ou carbono pirogênico nesses solos.

Em relação aos micronutrientes, nas amostras de carvões coletados em contato com o solo, apresentaram interferências dos solos que estavam em contato apresentando valores muito superiores aos encontrados na literatura, no que se refere ao teor de Fe em madeira de eucalipto (150-200 mg kg-1) (ABREU et al., 2007).

As amostras de carvão (4 e 8) apresentaram teores maiores de Ca2+, K+, Fe. O teor de Ca2+ nas amostras de carvão foi superior ao solo em contato, cerca de 80 vezes. Esses valores podem ser provenientes da biomassa que deve ser considerada como importante reserva de nutrientes, bem como trocas realizadas com a solução do solo.

Em geral, as concentrações desses nutrientes foram baixas, mas os valores se aproximam ao compará-los com as concentrações médias dos macronutrientes em diferentes partes do eucalipto. A variação da quantidade de nutrientes nas várias partes da árvore de Eucaluptus citriodora com idade de 7 anos foi determinada por Barros (1990), os teores de N, P, K, Ca e Mg em kg ha"1: para o lenho, 80,8; 10; 92,9; 221,4; e 30,9; para a casca, 58,6; 7,4; 126,9; 221,6; e 45,7.

De modo geral, as concentrações de P-rem são maiores nos carvões considerados puros, sem contato com o solo, o que indica menor adsorção de fosfato. Esse processo pode estar associado às maiores concentrações de Ca e teores mais baixos de Al e Fe. As amostras que estavam em contato com o solo (1, 4, 8 e 9) apresentaram os menores valores de P-rem, o que pressupõe maior capacidade-tampão desses e maior adsorção de fosfato. Os valores baixos de P-rem das amostras 1, 8 e 9 podem estar associados aos minerais como caulinita e gibbsita, identificados através das análises mineralógicas, como também pelos altos teores de Fe. Podem ocorrer reações de precipitação do fosfato com formas iônicas de Al e Fe em meio ácido e Ca2+ em meio básico, formando compostos de baixa solubilidade (NOVAIS; SMYTH, 1999).

4.2. Características mineralógicas e espectroscopia de absorção molecular na região do infravermelho com transformada de Fourier

Nas amostras de carvões que estão apenas na superfície do solo (amostras 3, 5, 7 e 9), esse contato não influenciou consideravelmente na mineralogia. Nessas amostras foram encontrados apenas quartzo e grafite; na amostra 9, madeira semicarbonizada coletada na represa da UFV, em que não se identificou nenhum mineral, sendo, portanto, amorfo.

Comparando a mineralogia das amostras 4 e 8 com os respectivos solos que estavam em contato, eles se mostraram semelhantes entre si. Na fração argila do solo do Município de Guiricema, MG, foram detectados os minerais caulinita, gibbsita e quartzo, os mesmos encontrados no carvão vegetal coletados nesses solos. A amostra de carvão apresentou também picos de grafite. Na amostra 8, foram identificados picos de caulinita, quartzo e grafite; já na fração argila do Latossolo coletado nessa área foram detectados caulinita, gibbsita e quartzo.

Os carvões coletados apresentaram estrutura molecular semelhante entre si, na absorção da radiação do infravermelho. A banda que se estende de 3.700 a 3.400 cm-1 é atribuída a ligações O–H, que podem pertencer aos grupos fenol, álcool e ácidos carboxílicos e da água. A banda de 1.700 cm-1 caracteriza o grupo C=O, referente ao estiramento do grupo carboxílico. A vibração molecular de 1.585-1.600 cm-1 é referente ao estiramento do grupamento C=C de compostos aromáticos (1.500-1.600 cm-1).

A banda de 1.300 a 1.000 é atribuída às ligações C–O. A região de 1.750 a 1.000 cm-1 apresenta picos de uma grande diversidade de grupos funcionais, sendo difícil a atribuição exata dos picos nessa região do espectro. Segundo Pastor-Villegas et al. (2006), algumas bandas entre 900 e 1.300 cm-1 podem ser atribuídas ao grupo C–O–C presente em folhas de grafite, ou entre duas folhas, onde o oxigênio pode agir como ponte entre as lâminas aromáticas.

4.3. Microscopia eletrônica de varredura dos carvões

Nas amostras 1 e 2, as estruturas ficaram menos evidentes, e percebe-se que houve influência dos componentes e organismos dos solos nesses carvões. A complexidade do material de origem como dos componentes do ambiente solo e também as possíveis variações no grau de carbonização podem ter contribuído para esse arranjo estrutural modificado (Figuras 1 e 2). Assim, esses carvões podem exibir diferentes tamanhos de partículas e várias feições morfológicas, que estão relacionadas ao material do qual se originou (GRIFFIN; GOLDBERG, 1975), como também a influência dos componentes solúveis e bióticos do solo.

Figura 4


O biocarvão tem estrutura de poros pequenos que se relacionam à morfologia da madeira e ao binômio tempo-temperatura de carbonização natural ou em laboratório. Tais poros podem ser preenchidos com material argilo-orgânico em suspensão. Observa-se na Figura 3, o preenchimento de alguns poros, o que poderia ser evidências de deposições de material argiloso em suspensão ou alguns elementos químicos contidos na solução do solo em processo de cristalização. Nesse material, foram identificados caulinita, quartzo, gibbsita e grafite em sua composição.


5. CONCLUSÕES

1. Os componentes dos solos favorecem a oxidação do carbono nos carvões vegetais coletados.

2. Os carvões contidos no solo apresentaram teores maiores de Ca, K, Fe, Mn, Cu e Ni, comparados com as amostras de carvão na superfície dos solos.

3. As amostras contidas no solo (1, 4, 8 e 9) apresentaram os menores valores de P-rem, o que indica maior capacidade-tampão desses e maior adsorção de P.

4. Os carvões vegetais encontrados nos solos são de materiais vegetais desconhecidos. As condições de carbonização deles não são controladas e podem causar mudanças no arranjo estrutural.

5. Nas amostras em contato com o solo, foram identificados caulinita, quartzo e grafite e, nas amostras 1 e 2, gibbsita.

6. Os grupos funcionais foram semelhantes entre as diferentes amostras de carvões, com sistemas de ligações C=O; C=C; C–O e C–H.

7. O grupo carboxílico identificado nos carvões vegetais coletados pode aumentar a reatividade desses materiais nos solos.

8. Existe interação entre o carvão e o solo, o que influencia nas características químicas e mineralógicas do carvão vegetal.

6. AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, pelo apoio financeiro e pela concessão da bolsa de estudo.

7. REFERÊNCIAS

Recebido em 01.07.2014

Aceito para publicação em 02.10.2014

ERRATA

No artigo “CARACTERIZAÇÃO QUÍMICA E MINERALÓGICA DE CARVÕES VEGETAIS COLETADOS EM DIFERENTES AMBIENTES”, publicado no número 6, volume 38, da Revista Árvore, na página 998, onde se lê:

Figura 2 – Imagens de microscopia eletrônica de varredura da amostra 12 (carvão de eucalipto produzido no Laboratório

de Painéis e Energia, UFV).

Figure 2 – Images of scanning electron microscope of sample 12 (eucalyptus charcoal produced in the Laboratory of Panels

and Energy, UFV).

Leia-se:

  • ABREU, C. A.; LOPES, A. S.; SANTOS, G. C. G. Micronutrientes. In: NOVAIS, R. F. et al. Fertilidade do solo Viçosa, MG: Sociedade Brasileira de Ciência do Solo, 2007. p.645-736.
  • ALVAREZ V., V.H.; NOVAIS, R.F.; DIAS, L.E.; OLIVEIRA, J.A. Determinação e uso do fósforo remanescente. Boletim Informativo da Sociedade Brasileira de Ciência Solo, v.25, p.27-32, 2000.
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  • CUNHA, T. J. F. Ácidos húmicos de solos escuros da Amazônia (Terra Preta do Índio). 2005. 138f. Tese de doutorado em Ciência Agronômica) Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, 2005.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 2014

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2014
  • Aceito
    02 Out 2014
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