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Aplicação de túnel de vento na avaliação de linhas de fluxo geradas por crepinas de filtros de areia

Application of a vertical wind tunnel to evaluate flow lines generated by sand filters underdrains

Resumos

Visando à obtenção de informações técnicas que auxiliem aprimorar a eficiência hidráulica de filtros de areia nos processos de filtragem e retrolavagem, buscou-se avaliar o potencial de utilização de uma bancada didática de túnel de vento como método de visualização e caracterização das linhas de fluxo geradas pela interação da geometria de um modelo de dreno (crepina) com diferentes velocidades de escoamento. Os ensaios foram realizados, instalando-se um modelo comercial de dreno, do tipo cilíndrico, em um módulo experimental construído para ser acoplado a um túnel de vento vertical. Simularam-se as três vazões de escoamento de ar fornecidas pelo módulo, obtendo-se registros fotográficos com uma câmara de alta velocidade, cujas imagens foram tratadas para destacar a disposição das linhas de fluxo e os caminhos preferenciais de escoamento para os sentidos de escoamento de filtragem e retrolavagem. Correlacionou-se, por similitude, o intervalo de operação do túnel de vento com valores de vazão praticados em processos de filtração com água, em filtros de areia comerciais, com 40; 60 e 100 cm de diâmetro. Os resultados obtidos validaram a metodologia proposta, permitindo analisar o efeito da geometria da crepina nas linhas de fluxo experimentais, tanto no modo de filtragem quanto no de retrolavagem.

irrigação localizada; filtração; retrolavagem


Looking for technical information to improve the hydraulic efficiency in sand filters during the filtering and backwash processes, this project had the objective to evaluate a teaching wind tunnel as a reliable method to visualize and characterize flow lines distribution generated by the interaction of a specific model of underdrain with different flow velocities. The experiment was performed by installing a commercial underdrain model, cylinder type, in an experimental section specially constructed to be coupled to a vertical wind tunnel. Three flow rate values were simulated in the tunnel, obtaining high-speed photographs. The obtained images were treated to highlight the flow lines distribution and preferred flow pathways for the filtration and backwash processes. The wind tunnel operating range was correlated by similarity with values of water flow rate in filtration processes carried out in commercial sand filters with diameters of 40, 60 and 100 cm. The obtained results validated the proposed methodology, allowing the visualization and analysis of the underdrain geometry effects on the generated flow lines, for both filtration and backwash processes.

localized irrigation; filtration; backwash


ARTIGOS TÉCNICOS

ENGENHARIA DE ÁGUA E SOLO

Marcelo B. dos SantosI; Marcio MesquitaII; Roberto TestezlafIII

IGraduando em Engenharia Agrícola, Faculdade de Engenharia Agrícola - UNICAMP, Campinas - SP

IIEngo Agrícola, M.Sc., Doutorando em Engenharia Agrícola, Faculdade de Engenharia Agrícola -UNICAMP, Campinas - SP

IIIProf. Dr., Faculdade de Engenharia Agrícola, UNICAMP, Campinas - SP

RESUMO

Visando à obtenção de informações técnicas que auxiliem aprimorar a eficiência hidráulica de filtros de areia nos processos de filtragem e retrolavagem, buscou-se avaliar o potencial de utilização de uma bancada didática de túnel de vento como método de visualização e caracterização das linhas de fluxo geradas pela interação da geometria de um modelo de dreno (crepina) com diferentes velocidades de escoamento. Os ensaios foram realizados, instalando-se um modelo comercial de dreno, do tipo cilíndrico, em um módulo experimental construído para ser acoplado a um túnel de vento vertical. Simularam-se as três vazões de escoamento de ar fornecidas pelo módulo, obtendo-se registros fotográficos com uma câmara de alta velocidade, cujas imagens foram tratadas para destacar a disposição das linhas de fluxo e os caminhos preferenciais de escoamento para os sentidos de escoamento de filtragem e retrolavagem. Correlacionou-se, por similitude, o intervalo de operação do túnel de vento com valores de vazão praticados em processos de filtração com água, em filtros de areia comerciais, com 40; 60 e 100 cm de diâmetro. Os resultados obtidos validaram a metodologia proposta, permitindo analisar o efeito da geometria da crepina nas linhas de fluxo experimentais, tanto no modo de filtragem quanto no de retrolavagem.

Palavras-chave: irrigação localizada, filtração, retrolavagem.

ABSTRACT

Looking for technical information to improve the hydraulic efficiency in sand filters during the filtering and backwash processes, this project had the objective to evaluate a teaching wind tunnel as a reliable method to visualize and characterize flow lines distribution generated by the interaction of a specific model of underdrain with different flow velocities. The experiment was performed by installing a commercial underdrain model, cylinder type, in an experimental section specially constructed to be coupled to a vertical wind tunnel. Three flow rate values were simulated in the tunnel, obtaining high-speed photographs. The obtained images were treated to highlight the flow lines distribution and preferred flow pathways for the filtration and backwash processes. The wind tunnel operating range was correlated by similarity with values of water flow rate in filtration processes carried out in commercial sand filters with diameters of 40, 60 and 100 cm. The obtained results validated the proposed methodology, allowing the visualization and analysis of the underdrain geometry effects on the generated flow lines, for both filtration and backwash processes.

Keywords: localized irrigation, filtration, backwash.

INTRODUÇÃO

Tendo em vista que a irrigação no Brasil utiliza, na maioria das vezes, águas superficiais provenientes de rios, lagos e açudes, que não se encontram em condições adequadas devido à presença de contaminações químicas, físicas ou biológicas, a caracterização da qualidade da água deve ser abordada como prioridade na definição dos parâmetros de projeto, principalmente para sistemas de irrigação localizada (RIBEIRO et al., 2010).

A presença desses contaminantes na água de irrigação tem o potencial de causar entupimentos dos emissores, responsáveis pela aplicação uniforme da água a baixas vazões, tornando-se fator limitante em um sistema de irrigação localizada, que provocará a redução de vazão e, consequentemente, a não uniformidade de distribuição de água nas linhas laterais, o aumento nos custos de manutenção do sistema e um rendimento não homogêneo da cultura (RIBEIRO et al., 2010; CARARO & BOTREL, 2007; TESTEZLAF, 2008; GOMES et al., 2010). Normalmente, as obstruções dos emissores são causadas pela combinação dos fatores físicos, químicos e biológicos presentes na água de irrigação, como, por exemplo, a presença de argila e de produtos de corrosão envoltos em massa biológica e cimentados com precipitados de CaCO3 (RIBEIRO et al., 2005).

Os problemas de entupimento de emissores por fatores físicos podem ser minimizados com o emprego de sistemas de filtragem (MAILAPALLI et al., 2007), em que a remoção de sólidos se baseia no princípio de que um meio poroso pode reter impurezas de dimensões maiores do que as dos poros da camada filtrante (MATOS et al., 2010). Os sistemas de filtragem utilizados em irrigação podem ser compostos por diferentes tipos de filtros, como tela, disco, areia ou cascalho. TESTEZLAF (2008) recomenda a utilização de filtros de areia quando a água de irrigação se caracteriza por concentrações elevadas de partículas orgânicas e algas.

Ainda segundo esse autor, os filtros de areia consistem, basicamente, em tanques ou reservatórios cilíndricos metálicos ou de poliéster, em cujo interior se coloca camada de areia através da qual se filtra a água para irrigação. Esses filtros operam pressurizados quando utilizados em sistemas de irrigação localizada, necessitando de dimensionamento mecânico correto, baseado na teoria de vasos de pressão, para evitar a ruptura de suas paredes às pressões de trabalho. O meio poroso é responsável pela remoção dos sólidos suspensos, ficando os mesmos retidos na camada filtrante, devido a três ações distintas: ação e coesão, sedimentação ou por peneiramento (PIZARRO CABELO, 1996).

O desempenho hidráulico de filtros de areia é função das características físicas de seu projeto estrutural, principalmente o tipo de sistema de distribuição de efluente sobre a camada filtrante (placa difusora), e do sistema de coleta do afluente (drenos) sob o leito poroso. Esses drenos, também chamados comercialmente de crepinas, são acessórios importantes no funcionamento dos filtros, pois suas dimensões e formatos determinam a qualidade de como são realizados os processos de filtragem e de retrolavagem (limpeza do filtro com fluxo reverso). O dimensionamento inadequado dos componentes internos dos filtros de areia pode acarretar na intensificação da turbulência do efluente sobre a superfície filtrante, movimentando as partículas de areia das extremidades para o centro do leito, criando canais e elevações na camada filtrante. Segundo MESQUITA et al. (2012), essas modificações diminuem a área efetiva e a altura do leito filtrante, intensificando o acúmulo de impurezas nos canais formados, acelerando o processo de perda da carga durante o processo de filtragem, e, consequentemente, aumentando a frequência de retrolavagem.

MESQUITA et al. (2012) avaliaram o comportamento da perda de pressão em função da velocidade de escoamento, em três modelos de filtros comerciais, e concluíram que os componentes internos dos filtros de areia afetam diretamente o desempenho hidráulico desses equipamentos, recomendando a adequação dos projetos estruturais desses componentes como forma de aprimorar esse comportamento. Tal constatação é reforçada por BURT (2010), que indicou que as crepinas de filtros testados diferiram por sua área de passagem, formato, área efetiva e espaçamento no fundo do filtro, propiciando, para cada tipo de arranjo, um diferente valor de perda de carga.

As crepinas são responsáveis por direcionar o fluido já filtrado para a tubulação de saída do filtro e, portanto, devem ser dimensionadas com o intuito de proporcionar melhor escoamento da água, tanto durante a filtragem, como da retrolavagem do filtro. A análise de seu desempenho é possível pelo estudo da trajetória das linhas de fluxo geradas dentro do reservatório, entre o sistema de entrada e as crepinas. Uma metodologia que pode ser utilizada na visualização da trajetória das linhas de fluxo, seus desvios e as turbulências existentes, é o disparo de jatos de fumaça em torno de modelos, em túneis do vento (SHAM DOL et al., 2006). Segundo MUELLER (1983), esse procedimento pode ser realizado em circuito aberto, utilizando um túnel de vento de pequeno porte, no qual se instala um injetor de fumaça na seção de testes e observa-se o campo de escoamento em torno de corpos submersos. Tais sistemas permitem analisar qualitativamente o escoamento a baixo número de Reynolds, tanto bidimensional como tridimensionalmente.

Segundo TESTEZLAF (2008), a busca por informações que aprofundem os conhecimentos envolvidos nos aspectos práticos e teóricos da operação dos filtros de areia e no entendimento de como ocorrem os processos de filtragem e de retrolavagem, pode contribuir no desenvolvimento de procedimentos metodológicos de projeto e no uso racional desses dispositivos. Dessa forma, a busca pela identificação dos caminhos preferenciais de fluxo que maximizem um determinado tipo de escoamento dentro do reservatório do filtro é fundamental para aperfeiçoar o funcionamento hidráulico dos filtros.

Portanto, visando à obtenção de informações técnicas que auxiliem no aprimoramento e na elevação da eficiência de remoção de sólidos suspensos em filtros de areia, este trabalho teve como objetivo avaliar o potencial de utilização de um túnel de vento vertical na caracterização das variações de linhas de fluxo geradas por um modelo de crepina fabricado no Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS

Túnel de vento

Para o estudo do comportamento das linhas de fluxo geradas por crepinas de filtros de areia, utilizou-se um equipamento de túnel de vento de circuito aberto (pressão atmosférica), adaptado a um módulo didático, marca TecQuipment, modelo AIR FLOW BENCH AF10, pertencente ao Laboratório de Equipamentos e Processos Térmicos, da Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas. Esse equipamento foi escolhido pela sua versatilidade, mobilidade e escala diminuta, fatores ideais para o desenvolvimento do experimento (Figura 1).


O princípio de funcionamento do módulo de ensaio a ar é idêntico ao de um túnel de vento convencional, diferenciando-se por se tratar de um sistema cíclico, com reaproveitamento do ar e da fumaça gerada em seu interior. A velocidade de sucção de ar do equipamento é constante e com valor de 30 m s-1 em sua seção de entrada de 100 x 50 mm, sendo que as variações de vazão em seu interior são realizadas pela variação da área da secção transversal de escoamento com a mudança da posição de uma chave reguladora. Foram utilizadas nos ensaios as seguintes posições da chave com os respectivos valores de vazão na seção de entrada: 1a posição (seção totalmente aberta): vazão de 540,0 m3 h-1; 2a posição (seção fechada em 50%): vazão de 270,0 m3 h-1, e 3a posição (seção fechada em 67%): vazão de 180,0 m3 h-1.

Projeto e montagem da seção de teste

Para a utilização do túnel de vento vertical, foi necessário projetar e construir uma seção de teste, permitindo o acoplamento das crepinas ao módulo, respeitando as dimensões do equipamento e atendendo às necessidades dos ensaios (Figura 2).


Optou-se por construir a seção em chapas de acrílico transparente, com 5 mm de espessura, para permitir a visualização do processo, dividindo-a em duas câmaras distintas de testes, uma superior e outra inferior, ambas com área de seção transversal de testes com 0,0529 m2, possibilitando o acoplamento da crepina em seu ponto médio. As dimensões da seção foram definidas a partir do tamanho da conexão com o túnel de vento, para evitar efeitos de parede na geração das linhas de fluxo e não causar distorções nos caminhos preferenciais do fluxo de ar e da fumaça. Foi anexada à câmara superior uma tubulação de metal com 12 mm de diâmetro interno e 12 cm de comprimento para direcionar o escoamento da fumaça, de forma que atingisse as crepinas horizontalmente e de forma centralizada, permitindo, assim, a visualização das linhas sobre os drenos. Uma das paredes da seção de ensaio foi totalmente quadriculada, com espaçamento de 2 cm, para permitir a quantificação das distâncias percorridas pelas linhas de fluxo. A seção construída permitia a avaliação da crepina, tanto na posição de filtragem quanto na de retrolavagem, a partir de sua inserção na câmara inferior, rosqueada na posição invertida, simulando, assim, a passagem inversa da fumaça sob suas cavidades (Figura 3).


Crepina ensaiada

Foi ensaiado um modelo comercial de crepina cilíndrica de fabricação brasileira, utilizada em filtros de areia e disponível no mercado nacional, constituída por anéis ranhurados superpostos, com área de passagem total de 0,0024 m2 (Figura 4).


Análise da correlação ar-água

Buscando validar a metodologia utilizada, foi realizada uma análise de correlação entre os dados experimentais com as condições operacionais de filtros de areia em campo, para garantir analogia das forças atuantes nos sistemas para os números de Reynolds ensaiados.

Como o fluido de ensaio no túnel de vento é o ar, correlacionaram-se por similitude os números de Reynolds obtidos no módulo de ensaio com as condições operacionais de utilização do filtro em campo, nos processos de filtração com água. Dessa forma, foram estimados os valores de vazão de água correspondentes aos valores de vazão de ar utilizados nos ensaios em túnel de vento (MISES et al., 1945).

Esse procedimento foi realizado estimando-se, inicialmente, pela equação da continuidade, os valores de velocidade a partir dos valores de vazão obtidos no módulo de teste com ar (eq.(1)).

em que,

V - velocidade de escoamento na seção transversal do módulo, m s-1;

Q - vazão do ponto de estudo, m3 s-1, e

A - área da seção transversal, m2.

Pela eq.(2), foram determinados os valores do número de Reynolds, correspondentes às velocidades de ensaio, tendo o ar como fluido, tomando como viscosidade cinemática do ar o valor de 1,4x10-5 m2 s-1 a uma temperatura de 20 ºC (AZEVEDO NETO, 1998).

em que,

NRe - número de Reynolds, adimensional;

V - velocidade de escoamento do fluído na seção transversal do módulo, m s-1;

D - diâmetro hidráulico da seção de testes, m, e

υ - viscosidade cinemática do fluido ar para a temperatura de 20 ºC, m2 s-1.

O diâmetro hidráulico da seção de teste foi determinado pela razão entre a área interna quadrada da seção de testes (Figura 2) e o valor de seu perímetro (AZEVEDO NETO, 1998).

A partir dos valores estimados do número de Reynolds para as condições de ensaios com ar, calcularam-se os valores de velocidades correspondentes para a água, utilizando a eq.(2), mas com o valor de viscosidade cinemática da água de 1,0x10-6 m2 s-1 à temperatura de 20 ºC (AZEVEDO NETO, 1998).

Com os valores de velocidade assim determinados, estimaram-se os valores de vazão correspondentes para três modelos comerciais de filtros de areia com diâmetros de 40; 60 e 100 cm de diâmetro, que operam com quatro, 12 e 24 crepinas instaladas em seu interior, respectivamente. Para cada um desses equipamentos, foram estimados os valores da vazão unitária por crepina para serem comparados com as condições de ensaios onde se utilizou somente uma crepina.

O valor da vazão estimada por crepina, para cada filtro, foi posteriormente comparado com o valor limite de vazão por crepina, calculada a partir do valor da vazão máxima por unidade de área recomendada para filtros de areia de 108 m3 h-1 m-2 (VERMEREIN & JOBLING, 1984), multiplicada pela área da seção transversal do filtro e dividida pelo número de crepinas presentes em cada filtro. A comparação entre esses valores permitiu verificar se as velocidades do módulo representavam a faixa de operação dos filtros para o limite de projeto recomendado para o seu uso.

Procedimento experimental

Uma vez instalada a crepina no interior do módulo, o sistema era acionado, com indução de ar na velocidade de 30 m s-1, funcionando por aproximadamente 3 minutos, tempo suficiente para o escoamento atingir regime permanente, antes de iniciar as medidas. Em seguida, injetava-se fumaça na cavidade superior do aparelho por meio de uma máquina geradora de fumaça - modelo MAGMA BRASIL.

Para permitir que a fumaça salientasse as influências e o contorno das linhas de fluxo nas crepinas, adaptou-se uma ducha de plástico com perfurações de 1 mm à saída do sistema de injeção. A partir da injeção de fumaça no interior da seção de teste, eram realizados registros fotográficos do processo de passagem do fluxo de ar e de fumaça nas crepinas por uma câmera de filmagem de alta velocidade, com resolução de 10 megapixels, marca SAMSUNG, modelo CMOS 9.0. Essa câmera foi regulada a uma velocidade de 300 quadros por segundo, que permitia a filmagem em intervalos de 10 s, produzindo uma sequência de quadros que apontavam a direção preferencial da fumaça.

Esse procedimento foi repetido seis vezes para cada valor de vazão utilizado, totalizando 18 filmagens, submetidas à análise e posterior tratamento das mesmas, escolhendo-se a imagem mais nítida para fins de comparação entre as vazões. As imagens foram tratadas com softwares de edição fotográfica, sendo as linhas de fluxo realçadas com o aumento de contorno e brilho (Figura 5).


O procedimento adotado nos ensaios e na obtenção das imagens para o processo de filtragem foi repetido para a posição de retrolavagem, com as crepinas instaladas na parte inferior da seção do módulo experimental.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise de adequação da correlação ar-água

Os valores de velocidade de escoamento do ar e do número de Reynolds, correspondente aos valores de vazão de ar, são apresentados na Tabela 1.

Qe - Vazão de ar na entrada do módulo (m3 h-1); At - Área da seção transversal (m2); Pf - perímetro da seção transversal (m); Dh - diâmetro hidráulico (m); Vt - velocidade do ar na seção transversal (m s-1); NRe - Número de Reynolds (adm.).

Na Tabela 2, constam os valores dos parâmetros de similitude correspondentes aos valores do número de Reynolds do módulo, com ar correlacionando com as respectivas vazões para escoamento de água em equipamentos comerciais, com diâmetros do corpo do filtro de 40; 60 e 100 cm.

NRe - número de Reynolds (adm.). Atf - área da seção transversal do filtro (m2); Pf - perímetro da seção transversal (m); Df - diâmetro da seção transversal (m); Vtf - velocidade calculada para o número de Reynolds correspondente (m s-1); Qtf - vazão na seção transversal do filtro (m h-1); Qc - vazão por crepina (m3 h-1 crepina-1); Qmax - vazão máxima de serviço recomendada pela literatura; Qmaxc - vazão máxima de serviço recomendada por crepina (m3 h-1 crepina-1).

Os valores do número de Reynolds característicos do módulo de ensaio resultaram em valores de vazões por crepina, superiores ao valor limite esperado para o filtro com 40 cm de 3,39 m3 h-1 (Tabela 2). Para o filtro de 60 cm, somente o menor valor de número de Reynolds gerou vazão (2,22 m3 h-1) inferior ao limite recomendado de 2,54 m3 h-1, enquanto, para o filtro maior (100 cm), os dois menores números de Reynolds, apresentaram vazões por crepinas inferiores aos limites de projeto (3,53 m3 h-1) descritos pelo fabricante (Tabela 2). A comparação desses valores mostrou que o módulo operou com valores de vazões de ar superiores aos valores recomendados para a operação do filtro, com menor diâmetro, utilizando água. O aumento do diâmetro dos filtros e do número de crepinas propiciou menores valores unitários de vazão por acessório, resultando em maior abrangência da similaridade dos ensaios com a faixa de operação nominal dos equipamentos.

Dessa forma, era necessário que o módulo operasse a velocidades inferiores ao menor valor utilizado nos ensaios, para que as condições operacionais dos filtros com menor diâmetro fossem atendidas pelo túnel de vento. Entretanto, pela impossibilidade da variação da velocidade do ar no túnel de vento para valores menores, pois a redução da área de entrada é realizada por uma chave manual, com três posições predeterminadas, uma alternativa possível para aumentar a abrangência dos ensaios poderia ser a construção de uma seção de testes com maiores dimensões, aumentando o diâmetro hidráulico da seção e, assim, obter valores menores do número de Reynolds no interior do túnel de vento.

É importante salientar que o fato de algumas condições de ensaios não apresentarem similaridade com os intervalos operacionais do filtro, não invalida o uso do método, mas indica que tais condições ocorreram fora dos valores nominais recomendados de utilização dos filtros.

Análise do processo de filtragem

A metodologia utilizada permitiu identificar a forma e a trajetória das linhas de fluxo durante o escoamento, no sentido da filtragem para as vazões de ensaio (Figura 6).


Observa-se que a parte superior da crepina causa uma dispersão do fluido desviando a trajetória da fumaça para a região de contorno do dreno (Figura 6). Esse comportamento das linhas de fluxo, além de proporcionar um aumento na perda de pressão no processo de filtragem, implica uma não uniformidade de escoamento ao longo do corpo da crepina, tornando sua parte inferior a área preferencial ao fluxo e reduzindo a área de efetividade do acessório. Adicionalmente, foi possível visualizar que o aumento no valor da velocidade do ar gerou linhas de fluxo que precisaram percorrer uma trajetória mais longa para serem assimiladas pela crepina na posição de filtragem após a dissipação da fumaça pela parte superior da crepina. Esses resultados demonstram que o formato da crepina afetou tanto a trajetória como a distorção das linhas de fluxo, o que pode reduzir o volume útil da camada de filtragem, reduzindo a eficácia do equipamento.

Análise do processo de retrolavagem

Na Figura 7, constam a forma e a trajetória das linhas de fluxo na superfície da crepina, na posição de retrolavagem para as vazões de ensaio. Observa-se pelas Figuras 7d a 7f que as linhas de fluxo geradas na crepina se distribuem de forma uniforme ao longo de toda a sua altura. Além disso, é possível visualizar que a redução dos valores de vazão resultou na geração de caminhos preferenciais de escoamento mais horizontalizados, o que pode afetar diretamente a fluidização do leito filtrante requerido para efetivar sua limpeza na retrolavagem. O comportamento das linhas de fluxo para baixas vazões pode limitar o volume e a altura da camada filtrante revolvida, estabelecendo um estado intermediário entre um regime de leito fixo ou estático e um regime de fluidização mínima ou de borbulhamento localizado (RAMIREZ, 2010).


Por outro lado, o aumento do valor da vazão produziu linhas de fluxo que tendem mais rapidamente à verticalização, o que pode gerar um arranjo desuniforme do material filtrante, dados os processos que antecedem a fluidização do leito, como o estado de leito borbulhante, que pode ser transposto com maior rapidez (RAMIREZ et al., 2011). Esse fato pode causar a formação de irregularidades superficiais no leito filtrante, como depressões ou caminhos preferenciais de escoamento de curto percurso nas filtragens, afetando a eficiência dos filtros de areia.

No fluxo com sentido de retrolavagem, observou-se que, em função da geometria da crepina avaliada, a região lateral da mesma é a primeira a apresentar concentração ou fluxo preferencial das linhas de fluxo, o que, para a retrolavagem, implicaria maior perda de carga do sistema devido ao caminho mais longo, em contraste uma movimentação unicamente vertical destas linhas. Entretanto, tal disposição de linhas de fluxo possibilita maior remoção de impurezas aderidas aos grãos de areia, pois há atuação de maiores forças de cisalhamento durante o fluxo de água em torno das partículas e por um maior período de tempo (RAMIREZ, 2010).

Discussão sobre a metodologia proposta

A metodologia proposta de aplicação de um túnel de vento com injeção de fumaça na análise de geração de linhas de fluxo, em uma crepina de filtro de areia comercial, mostrou-se viável para qualificar a trajetória produzida para diferentes valores de vazão. O equipamento utilizado apresentou limitações para se atingir valores menores de vazão, reduzindo assim sua faixa de validação com filtros operando em condições de campo. A metodologia caracterizou-se pela facilidade da montagem dos equipamentos e pelo emprego de materiais de fácil aquisição no mercado, apesar do custo elevado do acrílico. Entretanto, apresentou limitações com relação ao perfeito direcionamento dos jatos de fumaça sobre as crepinas, o que gerou, em alguns ensaios, sua dispersão pela seção de teste, dificultando a visualização das linhas de fluxo. Outra condição operacional obrigatória para a realização dos ensaios é a utilização de câmera de filmagem de alta velocidade, pois em função da seção de ensaio e do sistema de injeção de fumaça utilizados, a visualização do fenômeno somente foi possível com a velocidade de captura mínima de 300 quadros por segundo.

CONCLUSÕES

A metodologia utilizada, baseada no uso de um túnel de vento vertical operando à pressão atmosférica, permitiu a visualização e a análise de linhas de fluxo geradas pela crepina selecionada, tanto no processo de filtração como na retrolavagem, apresentando potencial para a análise do desempenho de modelos e de geometrias de crepinas utilizadas em filtros de areia.

O módulo de teste apresentou a limitação para obtenção de valores menores de velocidade de ar compatíveis com as condições operacionais recomendadas pelos fabricantes de filtros de areia.

Recebido pelo Conselho Editorial em: 4-4-2011

Aprovado pelo Conselho Editorial em: 2-11-2013

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  • Aplicação de túnel de vento na avaliação de linhas de fluxo geradas por crepinas de filtros de areia

    Application of a vertical wind tunnel to evaluate flow lines generated by sand filters underdrains
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      04 Abr 2011
    • Aceito
      02 Nov 2013
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