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Carcinoma hepatocelular apresentado por metástase óssea

Hepatocellular carcinoma presented with bone metastasis

Resumo

Patients with hepatocellular carcinoma usually present with signs of liver disease, but bone metastasis at the initial presentation is a rare condition. We report a case of bone metastasis at the initial presentation in a patient with hepatocellular carcinoma. A 39 years old man complained of abdominal pain, fever, and weight loss. Computed tomography revealed osteolytic lesions in the body of the lumbar vertebra. Histological examination of the liver showed to be hepatocellular carcinoma. The authors believe that hepatocellular carcinoma should be included in the protocols in patients with clinical manifestations of bone disease.

Hepatocellular carcinoma; Bone metastasis


Hepatocellular carcinoma; Bone metastasis

RELATO DE CASO

Carcinoma hepatocelular apresentado por metástase óssea

Hepatocellular carcinoma presented with bone metastasis

Orlando Jorge Martins Torres, TCBC-MAI; Sebastião dos Santos Sousa JuniorII; Itágores Hoffman I Lopes S. CoutinhoIII

IProfessor Adjunto – Doutor e Coordenador da Disciplina de Clínica Cirúrgica III da UFMA

IIResidente de Cirurgia Geral da UFMA

IIIAluno de Medicina da UFMA

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Dr. Orlando Jorge Martins Torres Rua Ipanema, 1/204 Bloco I 65076-060 — São Luís-MA E-mail: otorres@elo.com.br

ABSTRACT

Patients with hepatocellular carcinoma usually present with signs of liver disease, but bone metastasis at the initial presentation is a rare condition. We report a case of bone metastasis at the initial presentation in a patient with hepatocellular carcinoma. A 39 years old man complained of abdominal pain, fever, and weight loss. Computed tomography revealed osteolytic lesions in the body of the lumbar vertebra. Histological examination of the liver showed to be hepatocellular carcinoma. The authors believe that hepatocellular carcinoma should be included in the protocols in patients with clinical manifestations of bone disease.

Key words: Hepatocellular carcinoma; Bone metastasis.

INTRODUÇÃO

A apresentação clínica de pacientes com carcinoma hepatocelular depende principalmente da extensão da doença. Particular interesse tem sido aplicado à possibilidade de identificar a doença assintomática em pacientes de alto risco, em especial aqueles portadores de cirrose ou hepatite crônica por vírus B, devido às vantagens da intervenção precoce antes do aparecimento de metástase1.

O pulmão é o local mais comum de metástase do carcinoma hepatocelular. O envolvimento ósseo por metástase pode ocorrer em dois a 16% dos pacientes. O diagnóstico precoce da doença primária pode oferecer a única real possibilidade para se estabelecer o tratamento efetivo e aumentar a sobrevida a longo prazo1. Tem sido incomum o primeiro sinal clínico do paciente ser devido à metástase óssea.2 Apresentamos o caso de um paciente com carcinoma hepatocelular cuja manifestação clínica inicial foi relacionada com a metástase óssea.

RELATO DO CASO

Paciente do sexo masculino, 39 anos, foi atendido na Disciplina de Clínica Cirúrgica III (UFMA) apresentando dor no hipocôndrio direito há duas semanas, associada a perda de peso e aumento de volume abdominal. Neste período apresentou alguns episódios de febre (38ºC). Os antecedentes pessoais revelou uma história de dor lombar há três meses, diagnosticada como hérnia de disco e em tratamento com antiinflamatório não hormonal. O paciente apresentava história de etilismo social.

Ao exame físico, encontrava-se com sinais vitais normais, deambulação prejudicada, emagrecido e hipocorado (++/4). O abdome estava flácido e o fígado palpável a 10cm do rebordo costal direito. A coluna lombar estava dolorosa à palpação.

Realizou exames laboratoriais que demonstraram: hematócrito 32%; hemoglobina 9g/dl; bilirrubina total 3,2mg/dl (direta 2,3mg/dl); fosfatase alcalina 450 U/l; AST 1.275 U/l; ALT 1.351 U/l. A tomografia computadorizada do abdome evidenciou fígado aumentado de volume com múltiplas massas heterogêneas, com componentes císticos e sólidos de dimensões variadas distribuídas difusamente no parênquima hepático com focos de calcificação em algumas lesões (Figura 1) e lesões osteolíticas com componentes de partes moles em L5 (Figura 2).



Na internação, o paciente evoluiu com dor abdominal e sinais de choque hipovolêmico. Foi submetido a tratamento cirúrgico de urgência e se observaram hemoperitônio e rotura de lesão em lobo esquerdo do fígado. A hemostasia foi realizada por rafia da lesão e o material enviado para estudo anatomopatológico. À exploração da cavidade abdominal, não foram observadas outras alterações. O paciente ficou internado por dois dias em Unidade de Terapia Intensiva, evoluiu com melhora do estado geral, recebendo alta hospitalar no 14º dia do período pós-operatório e evoluindo para óbito após 33 dias da cirurgia. O resultado do estudo anatomopatológico da lesão revelou carcinoma hepatocelular com extensas áreas de necrose.

DISCUSSÃO

A metástase óssea devida a carcinoma hepatocelular é condição incomum em sua apresentação como primeiro sinal clínico. A localização mais comum da metástase é a coluna vertebral, seguida por costelas e ossos longos2. O paciente refere história de etilismo e clinicamente pode apresentar dor na coluna lombar, dificuldade de deambulação, massa óssea palpável, fraturas patológicas ou lesão espinhal e sintomas de compressão neurológica. A paraplegia pode ser um outro sinal precoce devido à metástase vertebral. Os sintomas ósseos podem ser observados por muito tempo antes da manifestação da doença hepática.3 Em nosso estudo, o paciente se referia a queixas de dor lombar há três meses, o que fora interpretado como doença benigna e tratado com sintomáticos, tendo somente procurado auxílio médico quando já apresentava sintomas abdominais.

A tomografia computadorizada da coluna é o exame que melhor demonstra massa expansiva em tecidos moles com lesões osteolíticas. Esta destruição óssea sugere comprometimento por doença metastática e o carcinoma hepatocelular deve ser descartado nestas situações. Outros exames, como a radiografia simples da coluna e a cintilografia óssea, têm sido incluídos no protocolo de estudo dos pacientes com carcinoma hepatocelular. A angiografia mostra aparência hipervascular sobre a área de destruição óssea2,3. No presente estudo, a tomografia computadorizada foi decisiva no diagnóstico, entretanto, em uma fase tardia, comprometendo uma melhor condução no tratamento destes pacientes.

Dos exames laboratoriais, a fosfatasemia alcalina ligeiramente elevada parece ser a primeira anormalidade detectável no estágio precoce da doença. Níveis séricos de alfa fetoproteína acima de 500ng/dl confirmam o diagnóstico. A biópsia da lesão óssea é útil em casos em que o carcinoma hepatocelular é bem ou moderadamente diferenciado e pode proporcionar o diagnóstico correto2.

A rotura hepática espontânea pode ser observada em até 15% dos pacientes com carcinoma hepatocelular, mesmo naqueles assintomáticos em que o primeiro sintoma é o choque hipovolêmico. Esta possibilidade pode ser confirmada pelos achados clínicos de aumento do volume do fígado associado à hipersensibilidade local. Ocasionalmente, o tumor com 5 cm de diâmetro ou menos, sem hepatomegalia franca, também pode romper.3

Não há tratamento efetivo para o carcinoma hepatocelular com metástase. Este se baseia na paliação e melhora da qualidade de vida. A mortalidade depende do local da metástase no momento do diagnóstico e 90% dos pacientes morrem da doença hepática. A radioterapia pode ser utilizada em regime ambulatorial sem recorrência por até cinco anos. A melhor resposta à radioterapia é observada naqueles que apresentam manifestações ósseas após a ressecção hepática4,5. A dor e os sintomas neurológicos melhoram com a radioterapia ou embolização, através de cateter transarterial. Quando diagnosticados precocemente, a sobrevida, que normalmente varia de três a 14 meses, pode chegar a cinco anos5.

Estes dados sugerem que o carcinoma hepatocelular deve ser descartado em pacientes com sintomas ósseos e lesões osteolíticas, uma vez que o diagnóstico precoce e o tratamento radioterápico, com sucesso, da metástase óssea, associados à hepatectomia, aumentam a sobrevida a longo prazo destes pacientes.

Recebido em 19/8/99

Aceito para publicação em 22/5/2000

Trabalho realizado na Disciplina de Clínica Cirúrgica III da Universidade Federal do Maranhão – UFMA.

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  • Endereço para correspondência:

    Dr. Orlando Jorge Martins Torres
    Rua Ipanema, 1/204 Bloco I
    65076-060 — São Luís-MA
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Dez 2008
    • Data do Fascículo
      Out 2000

    Histórico

    • Aceito
      22 Maio 2000
    • Recebido
      19 Ago 1999
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