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Cirurgia Endoscópica Subfascial de veias Perfurantes Insuficientes (CESPI): experiência inicial

Subfascial endoscopic perforator venous surgery: initial experience

Resumos

OBJETIVO: Estudar os resultados imediatos e a médio prazo da cirurgia endoscópica subfascial de perfurantes. MÉTODO: Estudo clínico, prospectivo e descritivo. Critérios de inclusão: insuficiência venosa crônica primária ou secundária, sistema venoso profundo pérvio e índice tornozelo/braço maior que 0,8. Critérios de exclusão: ocorrência da trombose venosa profunda, ou trauma ou cirurgia ortopédica e cirurgia sobre o sistema venoso profundo durante o período de seguimento pós-operatório. Todos doentes foram examinados pelo ecodoppler colorido antes da operação. RESULTADOS: Foram operados 43 membros a partir de junho/1997. Eram 27 doentes com média de idade 56,5 anos. A insuficiência venosa crônica era secundária à trombose venosa em dois membros. Três membros foram classificados como C3, 15 como C4, 11 como C5 e 14 como C6. A retirada das veias safena interna, safena externa e tributárias foi associada em 35 membros. Foram ligadas três a cinco perfurantes por membro; não houve óbitos no pós-operatório imediato; houve três infecções e as úlceras cicatrizaram em períodos variáveis de duas a 15 semanas. Dezenove doentes obtiveram alta hospitalar no primeiro dia de pós-operatório, seis no segundo e dois no terceiro. Houve uma recidiva de úlcera (4,0%) durante o período de seguimento de 25 meses (média) por causa de perfurante não-ligada. CONCLUSÕES: A cirurgia endoscópica subfascial de veias perfurantes insuficientes associada à cirurgia radical de varizes é segura, acompanha-se de baixo índice de complicações, pode ser adaptada aos instrumentos comuns da cirurgia laparoscópica, indicada para doentes classificados como C4, C5 e C6 e se acompanha de bons resultados imediatos e a médio prazo.

Insuficiência venosa; Cirurgia vídeo-assistida; Procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos; Varizes; Veia safena


BACKGROUND: Prevalence of varicose ulcers in Brazil has been estimated as high as 3.6%. Perforator vein insufficiency is the main source for the development of these ulcers. The recently proposed SEPS technique is regarded as minimally invasive approach followed by low complication rates and short in-hospital stay. Our objective is to study the results of subfascial endoscopic perforator surgery associated or not to superficial venous system surgery. METHODS: Prospective, non-controlled ,clinical study. Inclusion criteria were patent deep venous system, patient with primary or secondary venous insufficiency (congenital not included) and an ankle/arm index higher than 0.8; exclusion criteria were: deep vein thrombosis, trauma or orthopedic surgery and deep venous system surgery occurring during post-operative follow-up. All patients had a duplex-scan perfomed before operation. RESULTS: Forty-three lower limbs were operated on since june/97; there were 27 patients with mean age 56.6 years; great saphenous vein, lesser saphenous vein and tributaries stripping were associated in 29 limbs; three limb were classified as C3, 15 as C4, 11 as C5 and 14 as C6. Venous insufficiency was secondary to deep venous thrombosis in 2 limbs. There were no immediate deaths; three to five perforators per limb were ligated; all ulcers healed during a period from two to 15 weeks; there were three infections (6.9%); 19 patients left hospital on 1st, six on 2nd and two on 3rd post-operative day. There was one ulcer recurrence (4.0%) after 10 months (perforator vein left in place). CONCLUSION: the procedure is safe, the hospitalization time is short, ulcer healing occurs mostly within two weeks and recurrence rate depends on a follow-up period at least of five years.

Venous insufficiency; Video-assisted surgery; Minimally invasive surgical procedures; Varicose veins; Saphenous vein


ARTIGO ORIGINAL

Cirurgia Endoscópica Subfascial de veias Perfurantes Insuficientes (CESPI). Experiência inicial

Subfascial endoscopic perforator venous surgery. Initial experience

Eduardo Toledo de Aguiar , TCBC- SPI ; Alex LedermanII; Marina A. FarjallatIII; Mônica A. RudnerIII

IProfessor Associado do Departamento de Cirurgia - Disciplina de Cirurgia Vascular – da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IIMédico Residente do Departamento de Cirurgia - Disciplina de Cirurgia Vascular – da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

IIIAcadêmica de Medicina do Departamento de Cirurgia - Disciplina de Cirurgia Vascular – da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Eduardo Toledo de Aguiar Rua Padre João Manuel, 222, conj. 40 CEP: 01411-000 - São Paulo, SP, Brasil Fone/Fax: 11-3085-3894 e-mail: etaguiar@usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Estudar os resultados imediatos e a médio prazo da cirurgia endoscópica subfascial de perfurantes.

MÉTODO: Estudo clínico, prospectivo e descritivo. Critérios de inclusão: insuficiência venosa crônica primária ou secundária, sistema venoso profundo pérvio e índice tornozelo/braço maior que 0,8. Critérios de exclusão: ocorrência da trombose venosa profunda, ou trauma ou cirurgia ortopédica e cirurgia sobre o sistema venoso profundo durante o período de seguimento pós-operatório. Todos doentes foram examinados pelo ecodoppler colorido antes da operação.

RESULTADOS: Foram operados 43 membros a partir de junho/1997. Eram 27 doentes com média de idade 56,5 anos. A insuficiência venosa crônica era secundária à trombose venosa em dois membros. Três membros foram classificados como C3, 15 como C4, 11 como C5 e 14 como C6. A retirada das veias safena interna, safena externa e tributárias foi associada em 35 membros. Foram ligadas três a cinco perfurantes por membro; não houve óbitos no pós-operatório imediato; houve três infecções e as úlceras cicatrizaram em períodos variáveis de duas a 15 semanas. Dezenove doentes obtiveram alta hospitalar no primeiro dia de pós-operatório, seis no segundo e dois no terceiro. Houve uma recidiva de úlcera (4,0%) durante o período de seguimento de 25 meses (média) por causa de perfurante não-ligada.

CONCLUSÕES: A cirurgia endoscópica subfascial de veias perfurantes insuficientes associada à cirurgia radical de varizes é segura, acompanha-se de baixo índice de complicações, pode ser adaptada aos instrumentos comuns da cirurgia laparoscópica, indicada para doentes classificados como C4, C5 e C6 e se acompanha de bons resultados imediatos e a médio prazo.

Descritores: Insuficiência venosa; Cirurgia vídeo-assistida; Procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos; Varizes; Veia safena.

ABSTRACT

BACKGROUND: Prevalence of varicose ulcers in Brazil has been estimated as high as 3.6%. Perforator vein insufficiency is the main source for the development of these ulcers. The recently proposed SEPS technique is regarded as minimally invasive approach followed by low complication rates and short in-hospital stay. Our objective is to study the results of subfascial endoscopic perforator surgery associated or not to superficial venous system surgery.

METHODS: Prospective, non-controlled ,clinical study. Inclusion criteria were patent deep venous system, patient with primary or secondary venous insufficiency (congenital not included) and an ankle/arm index higher than 0.8; exclusion criteria were: deep vein thrombosis, trauma or orthopedic surgery and deep venous system surgery occurring during post-operative follow-up. All patients had a duplex-scan perfomed before operation.

RESULTS: Forty-three lower limbs were operated on since june/97; there were 27 patients with mean age 56.6 years; great saphenous vein, lesser saphenous vein and tributaries stripping were associated in 29 limbs; three limb were classified as C3, 15 as C4, 11 as C5 and 14 as C6. Venous insufficiency was secondary to deep venous thrombosis in 2 limbs. There were no immediate deaths; three to five perforators per limb were ligated; all ulcers healed during a period from two to 15 weeks; there were three infections (6.9%); 19 patients left hospital on 1st, six on 2nd and two on 3rd post-operative day. There was one ulcer recurrence (4.0%) after 10 months (perforator vein left in place).

CONCLUSION: the procedure is safe, the hospitalization time is short, ulcer healing occurs mostly within two weeks and recurrence rate depends on a follow-up period at least of five years.

Key words: Venous insufficiency; Video-assisted surgery; Minimally invasive surgical procedures; Varicose veins; Saphenous vein.

INTRODUÇÃO

A insuficiência venosa crônica representa grande desafio para o médico moderno principalmente quanto ao tratamento de suas formas mais graves. Estima-se que aproximadamente 1% da população adulta européia tem úlceras abertas ou cicatrizadas causadas pela hipertensão venosa crônica.1 Estudos brasileiros relatam prevalência ainda maior deste problema. Em Botucatu, no Estado de São Paulo, estima-se a prevalência de 1,5% de casos graves de insuficiência venosa crônica e em Belo Horizonte, capital do Estado de Minas Gerais, a prevalência é 2,6%.2,3 Esta prevalência maior pode ser explicada pelo nível sócio-econômico mais baixo da população brasileira em relação ao dos países do primeiro mundo.

Já em 1917, John Homans4 escreveu a respeito da "úlcera varicosa" do membro inferior, a "doença do homem pobre, trabalhador" e reconheceu a presença, abaixo do leito da úlcera, "da perfurante grande, dilatada e insuficiente". A ligadura das veias perfurantes comunicantes tornou-se o ponto-chave do tratamento das úlceras de hipertensão venosa crônica. Esta ligadura foi proposta há anos por Linton5,6 (1938 e 1953) e era feita por meio de longas incisões na perna que atravessavam a pele, subcutâneo e fascia. Estas ligaduras eram feitas no espaço subfascial, já que no subcutâneo é muito difícil reconhecer e ligar adequadamente as perfurantes em função da fibrose conseqüente ao processo inflamatório. As incisões cutâneas eram dolorosas e complicavam com freqüência. Cicatrização demorada, necrose de pele e infecções da ferida cirúrgica ocorriam em aproximadamente 58% dos casos.7,8

A técnica da ligadura endoscópica subfascial das veias perfurantes, desenvolvida nos últimos anos, visa a diminuir o trauma cirúrgico e as complicações de cicatrização. Uma ou duas pequenas incisões localizadas em áreas fora da zona de dermatite ocre permitem a introdução de sistemas ópticos e pinças de trabalho no espaço subfascial e, deste modo, visualizar as perfurantes diretamente ou por meio de monitor de vídeo, o que permite sua ligadura. Vários cirurgiões já realizaram estes procedimentos de maneiras diversas, com diferentes aparelhos e obtiveram bons resultados imediatos e a médio prazo, isto é, cicatrização das úlceras e melhora da dermatofibrose e hiperpigmentação.9-11

O objetivo deste trabalho é apresentar a experiência inicial com a cirurgia endoscópica subfascial das veias perfurantes comunicantes insuficientes de membros inferiores, associada ou não à cirurgia radical de varizes, para tratamento de pacientes portadores da insuficiência venosa crônica.

MÉTODO

Trabalho clínico, prospectivo e descritivo. Doentes com o diagnóstico de hipertensão venosa crônica foram incluídos no protocolo segundo os seguintes critérios de inclusão: sistema venoso profundo pérvio, etiologia primária ou secundária e índice tornozelo/braço maior ou igual a 0,8. Os critérios de exclusão de pacientes foram: apresentar trombose venosa profunda (TVP) durante o período de seguimento, trauma que implicasse em imobilização ou cirurgia ortopédica de membros inferiores e cirurgia sobre o sistema venoso profundo.

Todos os doente foram avaliados pelo eco-Doppler colorido antes de serem operados para verificar o funcionamento dos sistemas venosos superficial, profundo e perfurante, com o objetivo de estudar refluxo e obstrução. A flebografia não foi feita rotineiramente.

A técnica cirúrgica empregada foi a seguinte: paciente em decúbito dorsal e preparo habitual do campo operatório. Incisão de 1,5 cm, dez centímetros abaixo da borda inferior da rótula, na face medial da perna a três centímetros da crista tibial. Dissecção do subcutâneo até aponeurose superficial, incisão de um centímetro na aponeurose superficial, introdução do trocater ("Space-maker") com seu mandril e balão de dissecção até ao nível do maléolo interno pelo espaço subaponeurótico. Retirada da capa protetora do balão, insuflação do balão com aproximadamente 300 ml de solução salina, verificando a dilatação provocada no espaço sub-aponeurótico pela saliência na pele (cuidando para que atingisse o nível do maléolo e ajudando com compressão manual quando necessário). Desinsuflação e retirada do balão, introdução da óptica pelo trocarte no espaço subaponeurótico, insuflação de CO2 com pressão variando entre 25 e 30 mmHg através de entrada adequada no trocarte e visualização do espaço subaponeurótico pelo monitor de vídeo. Introdução de trocarte de 5 mm de calibre três centímetros abaixo da incisão anterior e oito centímetros medial à crista tibial. Introdução das pinças de trabalho por este trocater para dissecção, ligadura com "clips" e secção das perfurantes (Figura 1). A figura 2 mostra veia perfurante-comunicante como é vista por meio do monitor de vídeo antes e após ligadura. Safenectomia interna e externa ou re-explorações de crossas de safena interna e retirada de veias tributárias dilatadas nos moldes habituais foram realizadas a seguir, quando indicados.



RESULTADOS

Foram operados 27 doentes, 17 do sexo feminino e 10 do masculino, com idades variando de 33 a 88 anos (média: 56,5±14,0). Em 16 doentes foram realizadas operações bilaterais, sendo duas em dois tempos cirúrgicos diferentes e as outras no mesmo tempo cirúrgico o que resulta no total de 43 membros inferiores operados. Apenas dois membros (de dois pacientes diferentes) apresentavam insuficiência venosa crônica secundária à trombose venosa profunda e 41 membros apresentavam insuficiência venosa crônica primária. O quadro clínico, baseado na classificação CEAP, variou. Três membros foram classificados como C3, 15 como C4, 11 como C5 e 14 como C6. O "eco-Doppler" colorido demonstrou refluxo nos três sistemas de veias dos membros inferiores em apenas um membro, nos sistemas profundo e perfurante em dois, somente no sistema perfurante em cinco e nos sistemas superficial e perfurante em 35. Havia estenose da veia femoral superficial em um membro associado a refluxo dos sistemas superficial e perfurante.

Os resultados imediatos da cirurgia foram: não houve óbito; duas a cinco perfurantes ( média: 3,7±0,7) por membro foram ligadas; a retirada das veias safena interna, safena externa, re-exploração de crossas e retirada de tributárias foi associada em 35 membros; houve três infecções (6,9%); a alta hospitalar foi dada no primeiro dia de pós-operatório para 19 doentes, no segundo dia para seis doentes e no terceiro para dois; as úlceras cicatrizaram durante período variável de duas a 15 semanas (Figura 3). Em relação aos resultados tardios verificou-se que durante tempo de seguimento variável de quatro a 43 meses (média: 24,5±12,0) os membros classificados como C4 e C5 melhoraram, isto é, diminuiu a área de dermatofibrose e a pigmentação clareou e os membros classificados como C6 tiveram suas úlceras cicatrizadas. Houve apenas uma recidiva de úlcera que ocorreu após 10 meses da cirurgia, num membro em que restou perfurante não-ligada. Este paciente foi reoperado com sucesso. Considerando os doentes portadores de úlceras cicatrizadas (C5) e ativas (C6) encontrou-se taxa de recidiva de 4.0% (1/25).


DISCUSSÃO

A repercussão econômica e social da insuficiência venosa crônica é bastante sensível. Na Alemanha verifica-se que 10% dos doentes que procuram consulta médica ou que são hospitalizados apresentam doença venosa crônica de membros inferiores e um terço dos incapacitados para o trabalho são portadores de doença venosa; em Portugal, no ano de 1991, a média de dias de incapacidade para o trabalho por paciente portador de doença venosa crônica foi 38,7.12,13 No Brasil os dados a respeito das repercussões da insuficiência venosa crônica ainda não refletem a realidade. Segundo Castro Silva14. baseado em informações do Ministério da Previdência e Assistência Social (Brasília, 1984), a insuficiência venosa crônica (tratamento clínico) é a 14ª causa de afastamento do trabalho; no pós-operatório (de qualquer cirurgia) é considerada a primeira causa de afastamento. Como o tratamento cirúrgico da insuficiência venosa crônica é freqüente, muitos casos de afastamento por este problema estão mascarados sob o termo "pós-operatório".14

O resultado do tratamento clínico deixa a desejar em função do alto índice de recidiva da úlcera, principalmente por causa da dificuldade do doente em manter o regime de compressão elástica associado a períodos de repouso, durante toda sua vida. As altas temperaturas do verão brasileiro são a justificativa para o abandono do uso de meias elásticas nesta época e o conseqüente abandono da terapêutica. Segundo Blair et al 15 49% das úlceras recidivam três meses após o tratamento e 69% após um ano. Mayberry et al 16 estudaram as recidivas de úlceras de insuficiência venosa crônica por meio de curvas de sobrevivência e encontraram taxa de 29% de recidiva após cinco anos no grupo de pacientes que aderiram ao tratamento; no grupo que não aderiu ao tratamento todos apresentaram recidiva da úlcera após 36 meses.

A terapêutica cirúrgica tem o objetivo de minimizar o índice de recidivas relacionado ao tratamento clínico. Estudos publicados após 1980, de autores que utilizaram a técnica de Linton com modificações ou não, nos quais a média de tempo de seguimento dos doentes foi de três anos ou mais, relataram taxas de recidivas variáveis de 13% a 51%.17-20. É difícil explicar esta variação. O mais provável é a diferença entre doentes componentes das diversas casuísticas, confundindo insuficiência venosa crônica de etiologia primária com secundária que não podem ser evidenciadas na publicação, por exemplo, sem falar na possível variedade de técnicas entre os cirurgiões. Estes resultados não são diferentes dos obtidos com o tratamento clínico.

Até 1994 não havia consenso quanto à classificação e graduação da gravidade da insuficiência venosa crônica, o que impediu a comparação dos resultados publicados nos diversos artigos. Naquele ano, o "American Venous Forum" elegeu comitê para estudo do problema e produziu um documento de consenso que classificou e graduou a insuficiência venosa crônica segundo a manifestação clínica (C), etiologia (E), extensão do comprometimento anatômico (A) e fisiopatologia (P), o que ficou conhecido como classificação CEAP. Nesta classificação a manifestação clínica é dividida em sete grupos: C0 - ausência de sintomas e sinais, C1 - presença de teleangiectasias e varizes reticulares, C2 - presença das varizes e dor vespertina, C3 -varizes, dor e edema vespertinos, C4 - varizes dor, edema e pigmentação, C5 - os anteriores mais úlcera cicatrizada e C6 - os anteriores mais úlcera ativa. A etiologia pode ser primária (p), secundária à trombose venosa profunda na grande maioria (s) e congênita (c). O comprometimento anatômico se refere ao comprometimento dos sistemas venosos superficial (s), profundo (d - "deep" em inglês) e perfurante (p) e a fisiopatologia é definida pelo mapeamento ultrassonográfico duplex (eco-Doppler) que verifica se há refluxo (r), obstrução (o) ou ambos (r+o).21 A partir de então foi possível comparar os resultados das diversas publicações.

Em 1985 Hauer22 introduziu a técnica da ligadura endoscópica das veias perfurantes que foi adotada e realizada por meio de sistemas diversos. Nos anos 90 ficou demonstrada a vantagem do método endoscópico em relação à técnica aberta: não há incisões na área comprometida da pele, não há complicações de cicatrização e permite pós-operatório confortável com alta hospitalar precoce (após 24 horas) 9,10. Também foi demonstrada a melhora da hemodinâmica venosa do membro inferior após a cirurgia endoscópica subfascial de perfurantes insuficientes, principalmente quando o refluxo do sistema superficial é tratado conjuntamente11,23.

Sybrandy et al 24 compararam a técnica endoscópica com a técnica aberta em estudo prospectivo randomizado e verificaram que ambas produzem os mesmos resultados em relação à cicatrização das feridas e sua manutenção durante o período de seguimento de 50 meses (média). Relatam taxa de recidiva de úlceras de 22% para o método aberto e 12% para o método endoscópico, diferença esta não-significativa do ponto de vista estatístico. Este estudo demonstra que o método cirúrgico diminui a taxa de recidivas a longo prazo

A casuística aqui apresentada é comparável à dos trabalhos publicados em relação à idade, distribuição dos membros operados em relação à classificação CEAP, número de perfurantes ligadas por membro e os resultados imediatos e a médio prazo 9-11,25. Chama a atenção a taxa de recidiva de 4,0% durante tempo de seguimento de 25 meses (média). Este resultado é comparável ao obtido por outros autores durante o mesmo período de seguimento 9-11,25. É necessário enfatizar que neste trabalho procurou-se tratar não só a insuficiência do sistema de veias perfurantes isoladamente, mas associado ao tratamento da insuficiência do sistema superficial. Já foi demonstrado que doentes com úlceras venosas e insuficiência valvular do sistema superficial isolado ao terem este sistema operado (safenectomias e retirada de tributárias apenas), cicatrizam suas úlceras sem que seja necessário tratamento compressivo complementar26. Verificou-se também que a medida que se agrava o quadro clínico aumentam o número e o calibre de perfurantes insuficientes de perna27. Stuart et al verificaram que a erradicação do refluxo do sistema superficial corrige o refluxo do sistema perfurante em 80% dos casos, porém isto não ocorre em 20%; se houver refluxo do sistema profundo associado ao do superficial, mantém-se o refluxo pelas perfurantes em 72% dos casos, se este também não for tratado. Estes dados justificam a opção adotada pelos autores por tratar o refluxo do sistema perfurante sempre associando o tratamento do refluxo do sistema superficial, assim como outros também o fazem.29

Infelizmente não foi possível avaliar a dinâmica venosa nestes pacientes antes e após a operação. Os métodos estão em fase de padronização e não puderam ser aplicados. O mesmo se diga em relação aos dados obtidos do mapeamento ultrassonográfico duplex que tem sido feito por operadores diferentes e as informações sobre perfurantes não estão completamente padronizadas.

Apresentam-se apenas os achados clínicos pré e pós-operatórios e de uma experiência inicial. Esta é uma limitação importante e deve ser enfatizada. Há dúvidas quanto à aplicabilidade do método para ligadura de perfurantes nos membros com pele sã, classificados como C2 e C3. Não há dados que indiquem que este método diminua a taxa de recidiva de varizes após cirurgia. A cirurgia endoscópica subfascial de perfurantes insuficientes é indicada nos membros de doentes classificados como C4,C5 e C6. Estes pacientes continuam em seguimento até que seja possível determinar, por meio de curva de sobrevivência, a taxa de recidivas de úlceras num número maior de doentes classes C5 e C6.

Concluindo, a cirurgia endoscópica subfascial de veias perfurantes insuficientes associada à cirurgia radical de varizes é segura, acompanha-se de baixo índice de complicações, pode ser adaptada aos instrumentos comuns da cirurgia laparoscópica, o tempo de internação hospitalar é curto, deve ser indicada para doentes classificados como C4, C5 e C6, o tempo de cicatrização das úlceras é de duas semanas para a maioria dos doentes e se acompanha de bons resultados a médio prazo.

Recebido em: 12/03/2002

Aceito para publicação em: 11/06/2002

Trabalho realizado no Departamento de Cirurgia - Disciplina de Cirurgia Vascular – da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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  • Endereço para correspondência:
    Eduardo Toledo de Aguiar
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      15 Set 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2003

    Histórico

    • Recebido
      12 Mar 2002
    • Aceito
      11 Jun 2002
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