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Duplicações do aparelho digestivo

Digestive tract duplications

Resumos

OBJETIVO: Mostrar os aspectos fisiopatológicos e as várias formas de apresentação clínica e tratamento das duplicações do tubo digestivo, através da análise de seis casos operados pela equipe de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro. MÉTODO: Foram analisados a evolução clínica, os meios empregados no diagnóstico e a conduta terapêutica em seis pacientes portadores de duplicação, cada um deles se apresentando de forma diferente. Uma era duodenal, quatro jejuno-ileais e uma não era ligada ao tubo digestivo e sim ao pâncreas. RESULTADOS: Todos os casos foram operados, sendo que o cisto duodenal foi comunicado por meio de uma janela ao duodeno, os quatro jejuno-ileais foram ressecados juntamente com o intestino adjacente e o cisto que parecia se originar no pâncreas foi ressecado. Em dois casos houve complicações pós-operatória, mas não houve óbitos. CONCLUSÕES: As duplicações devem ser lembradas no diagnóstico diferencial dos tumores torácicos e abdominais, bem como nos quadros de obstrução intestinal e enterorragia. O conhecimento da existência e das características desta malformação possibilitará ao cirurgião agir da melhor forma possível no caso do seu encontro inesperado durante uma operação. É importante lembrar que podem haver anomalias associadas ou mais de uma duplicação. Se houver suspeita antes da operação, elas devem ser estudadas pelos meios semióticos apropriados, para se tomar a melhor conduta para o caso.

Anormalidades do sistema digestório; Obstrução Intestinal; Hemorragia gastrointestinal; Tratamento


BACKGROUND: The authors present the physiological and clinical aspects,as well as the treatment of the digestive tract duplications. They analyse six patients operated on by the surgical staff of Pediatric Surgery at Hospital da Lagoa. METHODS: Authors analysed clinical outcome, diagnostic methods and treatment of six children with digestive tract duplications. All cases differed from each other. There were one duodenal, four jejunoileal and one patient whose duplication was connected only to the pancreas. RESULTS: Every patient was operated on. The duodenal duplication was connected to duodenum by one window. The four jejunoileal duplications were treated by resection of the segment of bowel connected to it. Finally, the cyst that seemingly originated from the pancreas was resected. There were two post operative complications, but there was no death in the series. CONCLUSION: Duplications of digestive tract need to be kept in mind for the differential diagnosis of thoracic and abdominal tumours, as well as intestinal obstruction and enterorrhagy. Knowledge of the existency and characteristics of these malformations will become possible the better conduct when they appear unexpectedly during surgery. It is important to search for associated anomalies or multiple duplications. If the diagnosis is suspected before surgery, the appropriate diagnosis recours will be employed in order to obtain better results.

Digestive system abnormalities; Intestinal obstruction; Gastrointestinal hemorrhage; Treatment


ARTIGO ORIGINAL

Duplicações do aparelho digestivo

Digestive tract duplications

Ennio Gabriel, ECBC-RJI; Jean Jacques Marie CarisII; Harold Magosso MartinelliIII; Carlos Alberto de OliveiraIV; Renata Machado Barbosa LimaV; Cinira de Souza Camurça LimaVI

ILivre Docente em Cirurgia Pediátrica pela U.F.F; Cirurgião Pediátrico do Hospital da Lagoa - Rio de Janeiro

IIChefe do Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa

IIIChefe do Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital N.S. do Loreto; Cirurgião Pediátrico do Hospital da Lagoa

IVCirurgião Pediátrico do Hospital da Lagoa

VEx-Residente do Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa

VIResidente do Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Recebido em 28/04/2004 Aceito para publicação em 12/08/2004

RESUMO

OBJETIVO: Mostrar os aspectos fisiopatológicos e as várias formas de apresentação clínica e tratamento das duplicações do tubo digestivo, através da análise de seis casos operados pela equipe de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro.

MÉTODO: Foram analisados a evolução clínica, os meios empregados no diagnóstico e a conduta terapêutica em seis pacientes portadores de duplicação, cada um deles se apresentando de forma diferente. Uma era duodenal, quatro jejuno-ileais e uma não era ligada ao tubo digestivo e sim ao pâncreas.

RESULTADOS: Todos os casos foram operados, sendo que o cisto duodenal foi comunicado por meio de uma janela ao duodeno, os quatro jejuno-ileais foram ressecados juntamente com o intestino adjacente e o cisto que parecia se originar no pâncreas foi ressecado. Em dois casos houve complicações pós-operatória, mas não houve óbitos.

CONCLUSÕES: As duplicações devem ser lembradas no diagnóstico diferencial dos tumores torácicos e abdominais, bem como nos quadros de obstrução intestinal e enterorragia. O conhecimento da existência e das características desta malformação possibilitará ao cirurgião agir da melhor forma possível no caso do seu encontro inesperado durante uma operação. É importante lembrar que podem haver anomalias associadas ou mais de uma duplicação. Se houver suspeita antes da operação, elas devem ser estudadas pelos meios semióticos apropriados, para se tomar a melhor conduta para o caso.

Descritores: Anormalidades do sistema digestório; Obstrução Intestinal; Hemorragia gastrointestinal; Tratamento

ABSTRACT

BACKGROUND: The authors present the physiological and clinical aspects,as well as the treatment of the digestive tract duplications. They analyse six patients operated on by the surgical staff of Pediatric Surgery at Hospital da Lagoa.

METHODS: Authors analysed clinical outcome, diagnostic methods and treatment of six children with digestive tract duplications. All cases differed from each other. There were one duodenal, four jejunoileal and one patient whose duplication was connected only to the pancreas.

RESULTS: Every patient was operated on. The duodenal duplication was connected to duodenum by one window. The four jejunoileal duplications were treated by resection of the segment of bowel connected to it. Finally, the cyst that seemingly originated from the pancreas was resected. There were two post operative complications, but there was no death in the series.

CONCLUSION: Duplications of digestive tract need to be kept in mind for the differential diagnosis of thoracic and abdominal tumours, as well as intestinal obstruction and enterorrhagy. Knowledge of the existency and characteristics of these malformations will become possible the better conduct when they appear unexpectedly during surgery. It is important to search for associated anomalies or multiple duplications. If the diagnosis is suspected before surgery, the appropriate diagnosis recours will be employed in order to obtain better results.

Key words: Digestive system abnormalities; Intestinal obstruction; Gastrointestinal hemorrhage; Treatment.

INTRODUÇÃO

O termo "duplicação" foi introduzido em 1937 por Ladd1 para englobar um grupo de anomalias congênitas que apresentam, segundo Gross 2 três características:

1. A presença de uma camada bem desenvolvida de tecido muscular liso.

2. Um revestimento epitelial que representa alguma porção do trato alimentar.

3. Uma ligação íntima com alguma porção do trato alimentar.

Com esta designação Ladd e Gross procuraram abranger uma série de malformações que eram até então conhecidas por diversos nomes: cisto entérico, íleo duplex, divertículo intestinal gigante etc.

As duplicações são formações esféricas ou tubulares que podem ocorrer da língua até o ânus3,4. As tubulares se apresentam como um divertículo ou uma estrutura alongada paralela ao tubo digestivo. A definição clássica tem dificuldade em acomodar algumas variedades, como é o caso de algumas duplicações intratorácicas que podem ser afastadas do esôfago sem com ele compartilhar uma parede muscular5. Ou de alguns cistos com mucosa gástrica que podem ser separados do estômago, comunicar-se com o pâncreas e desencadear episódios de pancreatite5-10. Embriologicamente, o pâncreas provém de um broto do intestino anterior primitivo, e como tal pode ser considerado como parte do tubo digestivo6.

A explicação embriológica para as duplicações é controversa. Várias teorias foram propostas, como defeitos de recanalização do estágio sólido do intestino, persistência de divertículos embrionários, acidentes vasculares intra-uterinos, gemelaridade incompleta e defeitos na formação do notocórdio11. Nenhuma teoria explica todas as suas características, como a localização constante na borda mesentérica, e parece que podem atuar diversos mecanismos.

MÉTODO

Análise retrospectiva de seis pacientes portadores de duplicação intestinal, operados no Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa durante o período de 1984 a 2003.

RESULTADOS

Caso 1 – Paciente com dois anos e quatro meses, sexo feminino, com crises de dor abdominal acompanhadas de distensão e vômitos biliosos em jato desde o primeiro mês de vida. Apresentava constipação intestinal e atraso no desenvolvimento pondo-estatural. Radiografia simples de abdome evidenciou massa com densidade de partes moles no epigástrio e mesogástrio, de forma arredondada, deslocando para baixo o cólon transverso (Figura 1). A ultra-sonografia mostrou massa cística de paredes espessas e contornos lobulados com débris no seu interior. Trânsito do delgado revelou compressão extrínseca do arco duodenal, medial e lateralmente, desvio do ângulo de Treitz e deslocamento das alças intestinais para baixo. Com a suspeita de duplicação duodenal foi submetida à laparotomia por incisão transversa supra-umbilical. Havia tumor cístico com parede comum ao duodeno. A abertura do cisto mostrou não haver comunicação entre ele e a luz duodenal. Ressecção parcial da parede comum, fazendo ampla janela entre o cisto e a luz duodenal. Ressecção de parte da parede do cisto sob visão direta, seguida de seu fechamento em dois planos. A paciente apresentou parada cárdio-respiratória durante a recuperação anestésica, que foi revertida. Teve grave evolução pósoperatória, mas completa recuperação. O exame histopatológico do cisto mostrou mucosa duodenal. Exames contrastados pósoperatórios mostraram ampla comunicação entre o duodeno e o cisto remanescente, que apresentou regressão gradativa. A paciente foi acompanhada por pouco mais de um ano, sem voltar a apresentar sintomas.


Caso 2 – Paciente do sexo masculino, seis anos e nove meses, com crises de dor abdominal há quatro meses e três episódios de enterorragia. Exame cintilográfico do abdome com tecnécio mostrou fixação do rádio-fármaco na fossa ilíaca direita. Laparotomia por incisão transversa infra-umbilical revelou formação diverticular localizada na borda mesentérica do íleo, a 35 centímetros da válvula íleocecal. Ressecção do segmento intestinal que continha a duplicação, seguida de anastomose término-terminal. O exame da peça revelou divertículo da borda mesentérica do íleo, revestido por mucosa gástrica (Figura 2).


Caso 3 – Sexo feminino, um ano e dois meses. Há 10 dias crises de dor abdominal tipo cólica e vômitos com restos alimentares. Massa palpável esférica no hipogástrio, móvel, indolor, de mais ou menos sete centímetros de diâmetro. Ultrasonografia: massa cística móvel com contornos regulares, sem débris, na fossa ilíaca direita. Laparotomia por incisão de Pffannenstiel, com a suspeita de cisto de ovário. Encontrado tumor cístico aderido à borda mesentérica do íleo a 30 centímetros da válvula íleocecal. Ressecção do tumor com o íleo adjacente, seguida de anastomose término-terminal. Histopatologia: cisto de duplicação sem comunicação com a luz ileal, revestido por mucosas gástrica e entérica (Figuras 3 e 4).



Caso 4 - Sexo feminino, 23 dias de vida. Vômitos biliosos e distensão abdominal desde o nascimento. Radiografia simples do abdome mostrou alças proximais do delgado dilatadas, com edema de parede. Ultra-sonografia apenas confirmou a distensão das alças do delgado com conteúdo líquido. À laparotomia por incisão transversa no quadrante superior direito do abdome observou-se volvo do delgado que foi desfeito.O ceco se apresentava em posição muito alta. Havia um tumor cístico aderido à borda mesentérica de uma alça distal ao volvo. Ressecção deste segmento intestinal junto com a formação tumoral, seguida de afunilamento da boca proximal e anastomose término-terminal (Figura 5). Histopatologia: duplicação ileal sem comunicação com a alça adjacente e com mucosa do tipo entérico. Evoluiu com quadro de sepse por infecção na ferida operatória, mas se recuperou bem.


Caso 5 – Sexo feminino, com quatro anos de idade. Crises de dor abdominal tipo cólica desde o nascimento. Há seis meses apareceu massa de consistência cística no flanco esquerdo, móvel e indolor, com crescimento progressivo. Radiografia simples de abdome revelou massa com densidade de partes moles no flanco esquerdo. Ao exame ultra-sonográflco a massa deslocava o rim esquerdo, sugerindo cisto da cauda do pâncreas. Urografia excretora normal. O trânsito do delgado evidenciou massa intra-peritonial deslocando as alças intestinais. Durante a exploração por meio de laparotomia transversa supra-umbilical foram observadas manchas pretas sobre o mesocólon, epiplon e cólon transverso. Havia um tumor cístico com conteúdo também de cor preta, muito aderente ao pâncreas, meso e epiploo. Observava-se um ducto comunicando o cisto com a parede posterior do pâncreas. Ressecção do cisto com ligadura do ducto. Histopatologia: tumor cístico com parede formada por túnica muscular revestida por mucosa intestinal.

Caso 6 – Sexo feminino, sete meses de idade. Vômitos biliosos e com restos alimentares que apareciam de forma intermitente desde o nascimento. Havia distensão do andar superior do abdome. Seriografia mostrou estômago e duodeno normais e grande distensão de alça jejunal proximal. Laparotomia transversa no quadrante superior direito do abdome. Havia massa cística aderida à borda mesentérica do jejuno a 10 centímetros do ângulo de Treitz. A alça proximal ao cisto se apresentava dilatada. Exerese do cisto e da alça intestinal a ele adjacente. Afunilamento da alça proximal ao cisto para permitir uma anastomose término-termlnal. Histopatologia: duplicação intestinal tubular cuja extremidade proximal se comunicava com o jejuno adjacente. Mucosa do tipo gástrico (Figura 6).


DISCUSSÃO

É interessante observar que cada caso foi diferente dos outros. No caso 1 havia obstrução intestinal alta intermitente por duplicação duodenal não comunicante. No caso 2, crises de dor abdominal e episódios de enterorragia e um exame por cintigrafia mostrou mucosa gástrica ectópica. Pensou-se em Meckel, mas uma formação diverticular foi encontrada na borda mesentérica do íleo terminal. No caso 3 havia história de dor abdominal e palpava-se uma massa abdominal móvel que fez pensar em cisto de ovário. A 4º paciente tinha apenas 23 dias, obstrução intestinal parcial desde o nascimento e volvo do delgado. O 5º caso era uma formação cística, revestida com mucosa intestinal, aderida ao pâncreas, com o qual se comunicava através de um ducto. Finalmente, o caso 6 apresentava obstrução intermitente por compressão extrínseca desencadeada pela entrada do conteúdo intestinal, através de uma comunicação, em uma duplicação jejunal.

As duplicações variam muito em sua localização, volume, tipo de mucosa, e relação com o tubo digestivo. Podem ser múltiplas e acompanhadas de outras malformações. Como formam massas, às vezes palpáveis, elas podem comprimir os órgãos vizinhos, como vias aéreas, esôfago, etc., acarretando fenômenos obstrutivos. A distensão acentuada da própria duplicação pode originar dor. Ela pode ainda servir como cabeça de invaginação12 ou desencadear volvo13,14, como no paciente nº 4, se bem que nesse caso não se pode subestimar o papel da malrotação associada.

Contrariamente ao que acontece no divertículo de Meckel, as duplicações estão localizadas na borda mesentérica, compartilhando seu suprimento sangüíneo com o do intestino ao qual estão ligadas4.

É freqüente haver uma parede muscular comum entre a duplicação e o intestino adjacente, embora cada um tenha o seu revestimento mucoso.

As duplicações podem conter mucosa ectópica, isto é, que não corresponde ao segmento digestivo ao qual elas estão apensas, o que acontece em aproximadamente em um terço dos casos3. Mucosa gástrica é comum e pode desencadear ulceração dentro da própria duplicação ou no intestino adjacente (se houver comunicação entre ambos), com hemorragia e perfuração. Também pode estar presente tecido pancreático ectópico15.

Pode haver uma ou mais comunicações entre a duplicação e o tubo digestivo. Quando há comunicação apenas na extremidade proximal de uma duplicação, pode aparecer tumor de volume crescente com compressão da própria víscera de origem ou órgãos adjacentes, como ocorreu no caso 6. Isto não ocorre se a comunicação for proximal e distal, ou apenas distal.

No caso 5 havia um cisto não ligado ao estômago, mas com uma comunicação por meio de um canal com o pâncreas. As características do caso sugerem a existência de episódios prévios de pancreatite. Moss9 chamou a atenção para o fato de que cistos de duplicação com mucosa gástrica comunicando- se com o canal pancreático podem aderir ao estômago ou existir como cistos anatomicamente distintos. Estes casos são às vezes de difícil diagnóstico diferencial com os pseudocistos do pâncreas6.

Em alguns casos de duplicação esofageana, em cuja origem parece estar envolvido um defeito na formação do notocórdio, pode haver um prolongamento da duplicação para dentro do canal vertebral3.

Algumas duplicações do colo e reto se originam de uma gemelaridade incompleta e podem se acompanhar de duplicações gênito-urinárias3.

Existem casos raros de duplicações tóraco-abdominais, que se originam do duodeno ou jejuno, atravessam o diafragma e se dirigem para o tórax2.

Uma duplicação pode se localizar posteriormente ao canal anal, com uma abertura no períneo situada logo atrás do ânus16,17.

Podemos pois afirmar que elas são grandes simuladoras, muitas vezes só reconhecidas em ato operatório praticado na suposição de um problema mais comum. Seu diagnóstico deve sempre ser confirmado pelo exame histopatológico.

Os meios empregados para o seu diagnóstico são os mais variados, a começar pela palpação do abdome que pode mostrar tumor, geralmente móvel.

A ultra-sonografia mostra massa cística. É característica a imagem de uma camada interna hiperecóica, que é produzida pela mucosa, e uma camada externa relativamente hipo-ecóica produzida pelo músculo liso5. Com o uso crescente de ultra-som na gestação, alguns casos são suspeitados já no período pré-natal 12,18.

A radiografia simples mostra tumor de tecidos moles rechaçando os tecidos vizinhos, e pode fornecer alguns dados para o diagnóstico etiológico. Como exemplo, na avaliação de um tumor cístico torácico, a presença de malformação vertebral sugere duplicação esofágica. Os exames contrastados, como esofagograma, trânsito gastrointestinal e clister opaco, mostram o efeito da duplicação sobre os órgãos vizinhos e podem delinear uma comunicação com o aparelho digestivo 5. A tomografia computadorizada pode definir bem os limites da lesão e das estruturas vizinhas. A ressonância magnética, alem de fornecer essas informações, detecta anomalias da coluna e da medula espinhal que podem estar associadas a algumas duplicações.

Em certos casos estão indicados exames especiais, como a colangiopancreatografia endoscópica retrógrada para visualizar a relação de duplicações gástricas ou duodenais com o pâncreas e as vias biliares. Ou uma cintigrafia com tecnécio quando há história de hemorragia digestiva, na qual o diagnóstico de duplicação e não de divertículo de Meckel (que é mais freqüente) será feito à cirurgia, como ocorreu no caso 2 19. Recentemente tem sido ressaltado o papel da laparoscopia diagnóstica, que pode às vezes ser acompanhada da ressecção da lesão 12,20.

Quanto ao tratamento, é sempre cirúrgico. A conduta expectante em um caso de duplicação assintomática que for encontrada ocasionalmente não é recomendável, porque a maioria mais cedo ou mais tarde apresentará complicações5.

Nas duplicações jejunoileais, que são as mais freqüentes, geralmente não é possível a sua ressecção isolada, devido a se situarem na borda mesentérica e terem com o intestino uma vascularização e uma parede muscular em comum. A operação habitual é a ressecção do segmento intestinal que contém a duplicação seguida de anastomose términoterminal 23, que foi efetuada nos casos 2, 3, 4 e 6. Nos casos 4 e 6 foi necessário um afunilamento da boca proximal para permitir uma boa anastomose.

Nas duplicações muito extensas, geralmente formações tubulares do delgado ou do cólon, em que a ressecção da lesão juntamente com o intestino acarretaria uma síndrome da alça curta, Bishop e Koop 24 sugeriram ressecar a parede da duplicação até o ponto em que ela se torna comum com o segmento adjacente do intestino, retirando depois por dissecção romba a mucosa remanescente.

Quando houver comunicação apenas proximal e não for possível a ressecção do segmento intestinal adjacente pode-se criar uma comunicação da extremidade distal da duplicação com o intestino vizinho. A presença de mucosa gástrica desaconselha esta alternativa e foi proposta a retirada apenas da mucosa por incisões escalonadas25.

As duplicações do cólon e do reto podem muitas vezes ser ressecadas, com ou sem a ressecção de um segmento do intestino. Todavia, elas são às vezes associadas a anomalias genito-urinárias complexas e o seu tratamento deverá ser individualizado.

Algumas duplicações podem ser extirpadas por cirurgia láparo ou toracoscópica vídeo-assistida 12,20.

Dr Ennio Gabriel

Rua Roberto Dias Lopes, 25, apto 1401- Leme

22010-110 - Rio de Janeiro – RJ

E-mail: egabriel@nextcon.com

Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Pediátrica do Hospital da Lagoa - Rio de Janeiro.

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  • Endereço para correspondência

    Recebido em 28/04/2004
    Aceito para publicação em 12/08/2004
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Fev 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2004

    Histórico

    • Aceito
      12 Ago 2004
    • Recebido
      28 Abr 2004
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