Acessibilidade / Reportar erro

A influência da nicotina na densidade de colágeno em cicatrizes cutâneas, em ratos

The influence of nicotine on the density of collagen in cutaneous scars in rats

Resumos

OBJETIVO: Estudar a reação inflamatória e a deposição de colágeno na cicatrização de feridas cutâneas sob a influência da nicotina. MÉTODOS: Analisaram-se as cicatrizes de feridas abdominais de ratos tratados com nicotina, 2 mg/kg/d, comparando-as às de ratos controle. O tratamento foi iniciado sete dias antes do ato operatório e mantido por sete ou 14 dias, no pós-operatório. Os cortes histológicos foram corados pela hematoxilina e eosina e neles por meio de escores estabelecidos, reconheceu-se a intensidade e o tipo da reação inflamatória. Cortes histológicos corados pelo Sirius Supra red F3BA permitiram reconhecer a densidade do colágeno. RESULTADOS: Não houve diferença quanto à intensidade da reação inflamatória na análise de sete dias (p=0,165) e nem na de 14 dias (p=0,684). Pôde-se verificar que não existiu diferença significante na densidade de colágeno tipo I, na avaliação feita com sete dias (p=0,912) e com 14 dias (p=0,211). O grupo controle mostrava mais colágeno tipo III com sete dias (p=0,004), mas aos 14 não havia diferença significante (p=0,720). A quantificação do colágeno total, embora fosse maior no grupo controle, não o foi de forma significante em nenhum dos tempos estudados (p=0,103 aos sete e p=0,549 aos 14 dias). CONCLUSÃO: Não houve, nas cicatrizes dos animais tratados com nicotina, em relação aos controles, diferença quanto à intensidade do processo inflamatório, nem quanto à densidade do colágeno.

Cicatrização de feridas; Colágeno; Nicotina; Tabaco


OBJECTIVE: To study the inflammatory reaction and deposition of collagen in the healing of cutaneous injuries under the influence of nicotine. METHODS: The scars of abdominal injuries in rats were analyzed, which had been treated with nicotine, 2 mg/kg/d, and compared with those of control rats. Treatment was begun seven days prior to operation and was maintained for seven or fourteen days after surgery. The histological cuts were stained with hematoxylin and eosin and through the established scores the intensity and type of inflammatory reaction was identified. Histological cuts stained by Sirius Supra red F3BA enabled the identification of the collagen density. RESULTS: There was no difference in intensity of the inflammatory reaction after seven days (p=0.165), nor after fourteen days (p=0.684). There was no significant difference in the type I collagen density in the evaluation carried out after seven days (p=0.912) and after fourteen days (p=0,211). The control group had more type III collagen after seven days (p=0.004), but after fourteen days there was no significant difference (p=0.720). Although the total quantification of collagen was higher in the control group, there was no significant difference at any time during this study (p=0.103 after seven days and p=0.549 after fourteen days). CONCLUSION: In the scars of the animals treated with nicotine in comparison with the control group, there was no difference in the intensity of the inflammatory process, nor in collagen density.

Wound Healing; Collagen; Nicotine; Tobacco


ARTIGO ORIGINAL

A influência da nicotina na densidade de colágeno em cicatrizes cutâneas, em ratos

The influence of nicotine on the density of collagen in cutaneous scars in rats

Maria de Lourdes Pessole Biondo-Simões, TCBC-PRI; Mariana Rocha TetillaII; Rachel Biondo-SimõesIII; Manoela Mario MartinIII; João Carlos Domingues RepkaIV; Daniele ZanatoV

IProfessora Titular de Metodologia da Pesquisa da PUCPR - PR - BR

IIAluna do Programa de Iniciação Científica da PUCPR, PIBIC-CNPq - PR-BR

IIIAlunas do Programa de Iniciação Científica da PUCPR-PR-BR

IVDoutor em Imunologia pelo Institut Pasteur, França

VPós-Graduanda do Programa de Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica da PUCPR-PR-BR

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria de Lourdes Pessole Biondo-Simões E-mail: biondo@avalon.sul.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Estudar a reação inflamatória e a deposição de colágeno na cicatrização de feridas cutâneas sob a influência da nicotina.

MÉTODOS: Analisaram-se as cicatrizes de feridas abdominais de ratos tratados com nicotina, 2 mg/kg/d, comparando-as às de ratos controle. O tratamento foi iniciado sete dias antes do ato operatório e mantido por sete ou 14 dias, no pós-operatório. Os cortes histológicos foram corados pela hematoxilina e eosina e neles por meio de escores estabelecidos, reconheceu-se a intensidade e o tipo da reação inflamatória. Cortes histológicos corados pelo Sirius Supra red F3BA permitiram reconhecer a densidade do colágeno.

RESULTADOS: Não houve diferença quanto à intensidade da reação inflamatória na análise de sete dias (p=0,165) e nem na de 14 dias (p=0,684). Pôde-se verificar que não existiu diferença significante na densidade de colágeno tipo I, na avaliação feita com sete dias (p=0,912) e com 14 dias (p=0,211). O grupo controle mostrava mais colágeno tipo III com sete dias (p=0,004), mas aos 14 não havia diferença significante (p=0,720). A quantificação do colágeno total, embora fosse maior no grupo controle, não o foi de forma significante em nenhum dos tempos estudados (p=0,103 aos sete e p=0,549 aos 14 dias).

CONCLUSÃO: Não houve, nas cicatrizes dos animais tratados com nicotina, em relação aos controles, diferença quanto à intensidade do processo inflamatório, nem quanto à densidade do colágeno.

Descritores: Cicatrização de feridas. Colágeno. Nicotina. Tabaco.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To study the inflammatory reaction and deposition of collagen in the healing of cutaneous injuries under the influence of nicotine.

METHODS: The scars of abdominal injuries in rats were analyzed, which had been treated with nicotine, 2 mg/kg/d, and compared with those of control rats. Treatment was begun seven days prior to operation and was maintained for seven or fourteen days after surgery. The histological cuts were stained with hematoxylin and eosin and through the established scores the intensity and type of inflammatory reaction was identified. Histological cuts stained by Sirius Supra red F3BA enabled the identification of the collagen density.

RESULTS: There was no difference in intensity of the inflammatory reaction after seven days (p=0.165), nor after fourteen days (p=0.684). There was no significant difference in the type I collagen density in the evaluation carried out after seven days (p=0.912) and after fourteen days (p=0,211). The control group had more type III collagen after seven days (p=0.004), but after fourteen days there was no significant difference (p=0.720). Although the total quantification of collagen was higher in the control group, there was no significant difference at any time during this study (p=0.103 after seven days and p=0.549 after fourteen days).

CONCLUSION: In the scars of the animals treated with nicotine in comparison with the control group, there was no difference in the intensity of the inflammatory process, nor in collagen density.

Key words: Wound Healing. Collagen. Nicotine. Tobacco.

INTRODUÇÃO

Não se pode precisar exatamente desde quando o tabaco é consumido pelo homem. Sabe-se que os nativos americanos tinham o hábito de fumar tabaco nas cerimônias religiosas. Nelas o sacerdote, o cacique ou o pajé e seus circunstantes aspiravam o fumo do tabaco1.

Nicotiana tabacum é originária da América do Sul. Ao que tudo indica teriam sido Rodrigo de Jerez e Luis de la Torre, companheiros de Cristovão Colombo na expedição de 1492, que levaram o tabaco para a Europa1.

O principal produto desta planta é a nicotina, uma amina terciária composta de anéis de piridina e pirolidina. Existem formas racêmicas estereoisomeras de estrutura tridimensional. No tabaco, duas estão permanentemente presentes: l-nicotina e d-nicotina. A primeira é 100 vezes mais ativa farmacologicamente, constituindo 90% do total1.

O tabagismo é considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) a principal causa de morte evitável em todo o mundo. A OMS estima que um bilhão e 200 milhões de pessoas, no mundo, sejam fumantes2. O total de mortes decorrentes do hábito de fumar atingiu a cifra de 4,9 milhões de mortes anuais, o que corresponde a sete mortes por minuto3.

O cigarro provoca prejuízo anual para o sistema público de saúde de pelo menos R$ 338 milhões, o equivalente a 7,7% do custo de todas as internações e quimioterapias no nosso País. Para o cálculo foram consideradas as custas de 32 doenças comprovadamente associadas ao tabagismo, no ano de 2005. Estima-se que 22,4% da população brasileira fume4.

A cicatrização de feridas consiste em perfeita e coordenada cascata de eventos celulares e moleculares que interagem para que ocorra a reconstituição dos tecido lesados. É processo dinâmico que envolve fenômenos bioquímicos e fisiológicos5.

A associação entre fumar e deficiências cicatriciais é muito conhecida na prática clínica, embora estudos controlados não tenham sido realizados. Mosely e Finseth, em 1977, foram os primeiros a descrever os efeitos nocivos do tabagismo sobre a cicatrização de feridas6.

Depois disto, várias publicações relataram os efeitos deletérios do tabagismo na cicatrização. Segundo Rees et al. pacientes fumantes têm 12,46 vezes mais chance de desenvolverem isquemia de retalhos quando submetidos à plástica facial7 e Reus et al. concluíram que pacientes tabagistas têm significante isquemia (p=0,03) na periferia de enxertos livres de pele8. Sorensen et al. descreveram que fumantes possuem quatro vezes mais chance de desenvolverem hérnias incisionais, após laparotomias, e 2,22 vezes mais chance de apresentarem recidiva de hérnias inguinais9,10.

Vários estudos experimentais, realizados em diferentes condições, descreveram efeito inibitório da nicotina sobre a migração e diferenciação dos queratinócitos11,12, levando ao atraso da reepitelização13. Fang e Svoboda, estudando fibroblastos humanos, cultivados com diferentes concentrações de nicotina, observaram que existia inibição da diferenciação dos fibroblastos a miofibroblastos e atribuíram a isto a diminuição da contração das feridas14.

São relatadas modificações citoplasmáticas, degeneração e inatividade dos fibroblastos15-17, além da diminuição do número destas células e da sua diferenciação13,15,16,18-20 . Estes efeitos foram também descritos nos osteoblastos, afetando a reconstituição após fraturas21. Consequentemente deficiências na síntese do colágeno são relatadas15,17,18,22,23.

Curiosamente, algumas pesquisas têm mostrado resultados contraditórios. Machado, ao estudar a cicatrização de bexigas, em ratos, não observou diferenças significantes nas concentrações de colágeno I e III e Balatsouka et al. ao estudar a restauração óssea, também não encontrou alterações24,25.

Marimoto et al. afirmaram, recentemente, que nicotina em baixas doses induzem à angiogênese e promovem a cicatrização. Efeitos que são sinérgicos ao fator de crescimento dos fibroblastos básico (bFGF)26.

O presente estudo tem por objetivo estudar a deposição de colágeno na cicatrização de feridas cutâneas sob a influência da nicotina.

MÉTODOS

O projeto que deu origem a este estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética no Uso de Animais da Pontifícia Universidade Católica recebendo o registro n.º 117. e seu sub-projeto o n.º 239. Durante a realização do trabalho seguiu-se as orientações do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA).

Utilizaram-se 40 ratos (Rattus norvegicus albinus, Rodentia mammalia) da linhagem Wistar, machos, convencionais, geneticamente indefinidos, com idade entre 200 e 220 dias e o peso variando entre 300 e 350 gramas, procedentes do Biotério Central da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Os animais foram mantidos no Biotério do Hospital Angelina Caron, localizado na cidade de Campina Grande do Sul, Estado do Paraná, alojados em caixas de polipropileno adequadas para a espécie, devidamente identificados. O ambiente oferecia temperatura de 20 ± 2º C e ciclo claro/escuro de 12 horas. A umidade era a própria do ambiente. Receberam ração padrão para a espécie e água ad libitum. As operações foram realizadas no Centro de Experimentação Animal da Coordenação de Ensino e Pesquisa do Hospital e Maternidade Angelina Caron, após período de 47 dias.

Dividiu-se a amostra, aleatoriamente, em dois grupos, controle e experimento. Aos animais do grupo experimento administrou-se 2 mg de nicotina/Kg/dia (SIGMA® (Nicotine di-tartrate salt, Sigma, Saint Louis, Missouri, EUA) - N 5260 com 99,8% de pureza), diluída em 0,3 mL de solução fisiológica a 0,9%, ajustada para pH 7,4. A dose foi dividida em duas tomadas diárias, sendo a primeira às 7 e a segunda às 19 horas, por via subcutânea, no dorso do animal. Iniciou-se sete dias antes do procedimento cirúrgico e manteve-se até o dia da eutanásia. Aos animais do grupo controle administrou-se apenas a solução aquosa em tampão fosfato pH 7,4, nos mesmos horários e via e por igual período de tempo.

Sob anestesia, conseguida com a aplicação intra-muscular, na região posterior da coxa direita, de 0,1 mL/100g de peso, da solução composta por 1 mL de quetamina (50mg) e 1 mL de xilazina (20mg)27 fez-se a tricotomia seguida de anti-sepsia com polivinilpirrolidona-iodo da parede abdominal ventral. Praticou-se uma incisão de aproximadamente dois centímetros, na parede abdominal ventral infra-umbilical, e síntese com três pontos separados de fio 5.0 monofilamentar de náilon.

Os animais receberam, imediatamente após o término do ato operatório, diclofenaco de potássio na dose única de 10 mg/kg, por via intra-muscular com finalidade analgésica e anti-inflamatória27. Após a recuperação anestésica retornaram às suas caixas e tiveram livre acesso à água e à ração.

Sortearam-se 10 animais de cada grupo para a eutanásia, no sétimo e no décimo-quarto dia de pós-operatório. Utilizou-se para o procedimento, dose letal de tiopental sódico (120mg/kg), intra-peritoneal28.

Ressecou-se um segmento de pele de três centímetros de lado que continha a cicatriz na parte central. Estendeu-se o retalho sob papel de filtro e submergiu-se em formalina para a fixação e posterior processamento para estudo histopatológico.

Dos blocos de parafina que continham o material fizeram-se cortes com quatro micrômetros de espessura que montados em lâminas foram submetidos às colorações: hematoxilina-eosina (HE) e picrosirius (Sirius Supra red F3BA)29.

Na coloração HE, foi avaliado o processo inflamatório por leitura de três campos com ampliação de 400 vezes, conforme padronização descrita por Vizzotto et al 30 (Tabela 1). Para a contagem das células adotou-se a escala: nenhuma célula = 0; até 50 células = 1; de 50 a 100 células = 2 e mais de 100 células = 3, positiva para monomorfonucleares e negativa para polimorfonucleares30. Após a atribuição dos índices, procedeu-se à somatória destes, de maneira que cada grupo de animais teve um escore final, permitindo assim a classificação dos grupos em três fases do processo inflamatório (Tabela 2)30.

Na análise dos cortes corados pelo Sírus-Red, as fibras colágenas mais espessas e birrefringentes apresentam coloração vermelho alaranjada (colágeno I), e as fibras mais finas e dispersas, fracamente birrefringentes, apresentam coloração esverdeada (colágeno III). As imagens foram captadas por uma câmera Sony, CCD101, transmitidas a um monitor colorido Trinitron Sony, congeladas e digitalizadas através de placa oculus TCX. Realizou-se a análise das imagens usando o aplicativo Image-Plus® 4.5 para Windows® da MediaCybernetics em microcomputador da linha Pentium. Foram analisados em cada corte, cinco campos com ampliação de 200x localizados na linha da cicatriz. Em cada um foi calculado o percentual de área ocupada pelas fibras vermelhas e amarelas (colágeno I) e verdes (colágeno III). Considerando que os demais tipos de colágeno constituem frações muito pequenas, para fins práticos, considerou-se a somatória dos colágenos I e III como sendo o colágeno total da cicatriz.

Os resultados obtidos no estudo foram expressos por médias, desvios-padrão, medianas, valores mínimos e máximos ou por frequências e percentuais. Para a comparação dos grupos em relação a variáveis quantitativas foi usado o teste não-paramétrico de Mann-Whitney. Valores de p<0,05 indicaram significância estatística. Os dados foram organizados em planilha Excel e analisados com auxílio do programa computacional Statistica 8.0.

RESULTADOS

Não houve perda amostral durante o período de estudo.

A análise do processo inflamatório verificou que, com sete dias, a maioria das cicatrizes (8/10), de ambos os grupos, estava em fase sub-aguda e aos 14 dias, 6/10, de ambos os grupos, estavam em fase crônica e não existiu diferença significante quanto ao nível dos escores (Tabela 3).

Pode-se verificar que não existiu diferença significante na densidade de colágeno tipo I, na avaliação feita com sete dias (p=0,912) e com 14 dias (p=0,211) (Tabela 4). O grupo controle mostrava mais colágeno tipo III com sete dias (p=0,004), mas aos 14 não havia diferença significante (p=0,720) (Tabela 5). A quantificação do colágeno total, embora fosse maior no grupo controle, não o foi de forma significante em nenhum dos tempos estudados (p=0,103 aos sete dias e p=0,549 aos 14 dias) (Tabela 6).

DISCUSSÃO

Muitos autores relataram deficiências cicatriciais em fumantes6-10 bem como aumentam as chances de hérnias incisionais e de recidiva de hérnias9-10. Além disso, em fumantes, a possibilidade de isquemia de retalhos é também maior7.

Galatz et al.23 observaram que, sob o efeito da nicotina, a fase inflamatória se estendeu por mais tempo e Machado24 referiu que na cicatrização de bexigas, em ratos, encontrou menor reação inflamatória com menor número de neutrófilos.

No presente estudo não foi observada diferença quanto ao escore inflamatório, entre os grupos, em nenhum dos tempos estudados.

Vários trabalhos experimentais revelaram que sob a influência da nicotina existiria deficiência da migração e da diferenciação dos queratinócitos e consequentemente da re-epitelização11-13. Os fibroblastos sofreriam tanto na sua estrutura15-17 quanto na proliferação e diferenciação13,15,16,18-20 . Nestes estudos estão descritas deficiências da síntese do colágeno15,17,18,22,23. Entretanto existem autores que não encontraram mudanças na síntese desta proteína24,25. Verificou-se, nas condições deste estudo, que a densidade de colágeno, embora tenha sido discretamente maior no grupo controle, não mostrou diferença significante em nenhum dos tempos estudados. No terceiro dia havia mais colágeno tipo III no grupo controle, o que poderia revelar cicatrizes mais imaturas. Na realidade a densidade de colágeno tipo I, que confere à cicatriz a condição de maturidade, era praticamente igual nos dois grupos.

Esta situação permite algumas argumentações. Marimoto et al. observaram que nicotina em baixas doses induziu a angiogênese e promoveu a cicatrização26. É possível que a dose utilizada, embora seja semelhante à usada pelos autores consultados, não tenha promovido nível sérico suficiente para atingir patamares citotóxicos31,32, ou ainda, que o tempo de administração pré-lesão não tenha sido suficiente para levar a alterações da fisiologia celular.

A nicotina estimula a produção de adrenalina, catecolaminas, vasopressina e outros hormônios. Como consequência tem-se aumento da frequência cardíaca e vaso-constrição elevando-se a pressão arterial. Por outro lado, o monóxido de carbono, possui cerca de 250 vezes maior afinidade do que o oxigênio pela hemoglobina, formando carboxihemoglobina. Desta forma diminui a oxigenação. A baixa da pressão parcial de oxigênio nos tecidos e o metabolismo anaeróbico das células torna o pH baixo, e isto é estímulo para monócitos que participam da angiogênese33. Talvez doses sub-tóxicas promovam vasoconstrição e favoreça a angiogênese. Lembrando que a síntese do colágeno é dependente do oxigênio, o estímulo à angiogênese, na medida em que melhora a circulação local melhora na sequência a síntese do colágeno, justificando os resultados deste estudo.

Concluimos que não houve, nas cicatrizes dos animais tratados com nicotina em relação aos controles, diferença quanto à intensidade do processo inflamatório, nem quanto à densidade do colágeno.

Recebido em 09/12/2008

Aceito para publicação em 28/02/2009

Conflito de interesses: nenhum

Fontes de financiamento: Bolsa PIBIC - CNPq

Trabalho realizado na Disciplina de Metodologia da Pesquisa e Programa de Pós-Graduação em Clínica Cirúrgica da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Curitiba, PR, Brasil.

  • 1. Rosenberg J. Nicotina: droga universal. Disponível em: http://www.inca.gov.br/tabagismo/publicacoes/nicotina.pdf Acesso em 07 Apr 2008.
  • 2. Organização Mundial da Saúde. Tabagismo & saúde nos países em desenvolvimento. Disponível em: http://www.inca.gov.br/tabagismo Tabagismo dados e números. Acesso em 07 Apr 2008.
  • 3. World Health Organization. Tobacco free iniciative. Disponível em: http://www.who.int/tobacco/resources/publications Acesso em 07 Apr. 2008.
  • 4
    INCA: atualidades em tabagismo. Disponível em http://www.inca.gov.br/tabagismo/frameset.asp?item=atualidades&link=lista.asp Acesso em 07 Apr 2008.
  • 5. Mandelbaum SH, Di Santis EP, Mandelbaum MHS. Cicatrização: conceitos atuais e recursos auxiliares - Parte I. An Bras Dermatol. 2003; 78(4):393-410.
  • 6. Mosely LH, Finseth F. Cigarette smoking: impairment of digital blood flow and wound healing in the hand. Hand. 1977; 9(2):97-101.
  • 7. Rees TD, Liverett DM, Guy CL. The effect of cigarette smoking on skin-flap survival in the face lift patient. Plast Reconst Surg. 1984; 73(6):911-5.
  • 8. Reus WF, Colen LB, Straker DJ. Tobacco smoking and complications in elective microsurgery. Plast Reconst Surg. 1992; 89(3):490-4.
  • 9. Sorensen LT, Hemmingsen UB, Kirkeby LT, Kallehave F, Jørgensen LN. Smoking is a risk factor for incisional hérnia. Arch Surg. 2005; 140(2):119-23.
  • 10. Sorensen LT, Friis E, Jorgensen T, Vennits B, Andersen BR, Rasmussen GI, Kjaergaard J. Smoking is a risk factor for recurrence of groin hernia. World J Surg. 2002; 26(4):397-400. Epub 2002 Jan 2.
  • 11. Zia S, Ndoye A, Lee TX, Webber RJ, Grando SA. Receptor-mediated inhibition of keratinocyte migration by nicotine involves modulations of calcium influx and intracellular concentration. J Pharmacol Exp Ther. 2000; 293(3):973-81.
  • 12. Grando SA, Horton RM, Mauro TM, Kist DA, Lee TX, Dahl MV. Activation of keratinocyte nicotinic cholinergic receptors stimulates calcium influx and enhances cell differentiation. J Invest Dermatol. 1996; 107(3):412-8.
  • 13. Bosco AF, Okamoto T, Nagata MJH, Machado GJR Efeitos da nicotina no processo de reparo de feridas cutâneas associadas à aplicação tópica de clorexedine. Rev Odonto Cienc. 2004; 19(45):207-13.
  • 14. Fang Y, Svoboda KK. Nicotine inhibits myofibroblast differentiation in human gingival fibroblasts. J Cell Biochem. 2005; 95(6):1108-19.
  • 15. Tipton DA, Dabbous MK. Effects of nicotine on proliferation and extracellular matrix production of human gingival fibroblasts in vitro. J Periodontol. 1995; 66(12):1056-64.
  • 16. Giannopoulou C, Geinoz A, Cimasoni G. Effects of nicotine on periodontal ligament fibroblasts in vitro. J Clin Periodontol. 1999; 26(1):49-55.
  • 17. Duygulu F, Karaoglu S, Zeybek ND, Kaymaz FF, Günes T. The effect of subcutaneously injected nicotine on achilles tendon healing in rabbits. Knee Surg Sports Traumatol Arthrosc. 2006; 14(8):756-61. Epub 2006 Feb 8.
  • 18. Skinovski J. A influência da nicotina na cicatrização de anastomosesdo intestino delgado em ratos [dissertação]. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná; 2000.
  • 19. Silverstein P. Smoking and wound healing. Am J Med. 1992; 93(1A):22S-24S.
  • 20. Martinez AET, Silvério KG, Rossa Júnior C. Efeito da nicotina na viabilidade e morfologia de fibroblastos - estudo in vitro. Pesq Odontol Bras. 2002; 16(3):234-8.
  • 21. Yuhara S, Kasagi S, Inoue A, Otsuka E, Hirose S, Hagiwara H. Effects of nicotine on cultured cells suggest that it can influence the formation and resorption of bone. Eur J Pharmacol. 1999; 383(3):387-93.
  • 22. Knuutinen A, Kokkonen N, Risteli J, Vähäkangas K, Kallioinen M, Salo T, Sorsa T, Oikarinen A. Smoking affects collagen synthesis and extracellular matrix turnover in human skin. Br J Dermatol. 2002; 146(4):588-94.
  • 23. Galatz LM, Silva MJ, Rothermich SY, Zaegel MA, Havlioglu N, Thomopoulos S. Nicotine delays tendon-to-bone healing in a rat shoulder model. J Bone Joint Surg Am. 2006; 88(9):2027-34.
  • 24. Machado C. A influência da nicotina na cicatrização de suturas vesicais, em coelhos [dissertação]. Curitiba (PR): Universidade Federal do Paraná; 2005.
  • 25. Balatsouka D, Gotfredsen K, Sorensen L, Lindh CH, Berglundh T. Effect of systemic administration of nicotine on healing in osseous defects. An experimental study in rabbits. Part II. Clin Oral Implants Res. 2006; 17(5):488-94.
  • 26. Morimoto N, Takemoto S, Kawazoe T, Suzuki S. Nicotine at a low concentration promotes wound healing. J Surg Res. 2008; 145(2):199-204. Epub 2007 Jul 20.
  • 27. Sharp PE, La Regina MC. The laboratory rat. Boca Raton-Florida: CRC. 1998.
  • 28
    Conselho Federal de Medicina Veterinária. Resolução n° 714 de 20 de junho de 2002. Dispõe sobre procedimentos e métodos de eutanásia em animais, e dá outras providências. Diário Oficial [da] Republica Federativa do Brasil, Brasília, 21 jun. 2002.
  • 29. Junqueira LC, Cossemelli W, Bretani R. Differencial staining of collagen type I, II and III by sirius red and polarization microscopy. Arch Histol Jpn. 1978; 41(3):267-74.
  • 30. Vizzotto Junior AO, Noronha L, Scheffel DLH, Campos AC. Influência da cisplatina administrada no pré e pós-operatório sobre a cicatrização de anastomoses colônicas em ratos. J Bras Patol Med Lab. 2003; 39(2):143-149.
  • 31. Villablanca AC. Nicotine stimulates DNA synthesis and proliferation in vascular endothelial cells in vitro. J Appl Physiol. 1998; 84(6):2089-98.
  • 32. Carty CS, Huribal M, Marsan BU, Ricotta JJ, Dryjski M. Nicotine and its metabolite cotinine are mitogenic for human vascular smooth muscle cells. J Vasc Surg. 1997; 25(4):682-8.
  • 33. Melkonian G, Le C, Zheng W, Talbot P, Martins-Green M. Normal patterns of angiogenesis and extracellular matrix deposition in chick chorioallantoic membranes are disrupted by mainstream and sidestream cigarette smoke. Toxicol Appl Pharmacol. 2000; 163(1):26-37.
  • Endereço para correspondência:
    Maria de Lourdes Pessole Biondo-Simões
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jan 2010
    • Data do Fascículo
      Out 2009

    Histórico

    • Aceito
      28 Fev 2009
    • Recebido
      09 Dez 2008
    Colégio Brasileiro de Cirurgiões Rua Visconde de Silva, 52 - 3º andar, 22271- 090 Rio de Janeiro - RJ, Tel.: +55 21 2138-0659, Fax: (55 21) 2286-2595 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: revista@cbc.org.br