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Ressecção laparoscópica do segmento lateral esquerdo do fígado em doador para transplante hepático inter-vivos

Laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in living donor liver transplantation

Resumo

Laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in donors of living liver transplantation. The authors present a case of laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in a donor of living liver transplantation. The procedure was done in six hours and the left lateral segment of the liver was removed through a 15 cm right subcostal incision. The patient was discharged on the 5th post-operative day. A 40 mL intrabdominal collection of bile was percutaneously drained guided by ultra-sonography. The drain was removed after five days. Afterwards, the patient had good recovery with no other complication.

Liver transplantation; Laparoscopy; Hepatectomy


Liver transplantation; Laparoscopy; Hepatectomy

RELATO DE CASO

Ressecção laparoscópica do segmento lateral esquerdo do fígado em doador para transplante hepático inter-vivos

Laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in living donor liver transplantation

Julio Cezar Uili Coelho TCBC-PRII; Alexandre Coutinho Teixeira de Freitas TCBC-PRI; Jorge Eduardo Fouto MathiasIII

IMédico do Serviço de Transplante Hepático do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná- Curitiba - PR- BR

IIProfessor titulare chefe do Serviço de Transplante Hepático do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná- Curitiba - PR- BR

IIIProfessor adjuntoda Disciplina de Técnica Operatória da Universidade Federal do Paraná- Curitiba - PR- BR

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Júlio Coelho E-mail: coelhojcu@yahoo.com.br

ABSTRACT

Laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in donors of living liver transplantation. The authors present a case of laparoscopic resection of the left lateral segment of the liver in a donor of living liver transplantation. The procedure was done in six hours and the left lateral segment of the liver was removed through a 15 cm right subcostal incision. The patient was discharged on the 5th post-operative day. A 40 mL intrabdominal collection of bile was percutaneously drained guided by ultra-sonography. The drain was removed after five days. Afterwards, the patient had good recovery with no other complication.

Key words: Liver transplantation. Laparoscopy. Hepatectomy.

INTRODUÇÃO

A vídeolaparoscopia atualmente é considerada padrão ouro em diversas intervenções no aparelho digestivo. Na cirurgia hepática ainda é pouco difundida devido a fatores como antecipação de dificuldade técnica em manobras como palpação, mobilização hepática, controle vascular, e secção do parênquima. Considera-se ainda o risco de embolia gasosa e a controversa eficácia da laparoscopia no tratamento das neoplasias, que corresponde à maioria das indicações.

O objetivo desse estudo é descrever a realização de hepatectomia esquerda por vídeolaparoscopia em um doador para transplante hepático intervivos.

RELATO DO CASO

EPS, masculino, 25 anos, tio do receptor, tipo sanguíneo O, com 77,3 kg de peso, 1,78 m de altura e IMC de 24,3 kg/m2. Paciente hígido, sem operações prévias ou co-morbidades. Investigação pré-operatória de protocolo de transplante hepático intervivos normal. Ressonância magnética de abdome com volume hepático total de 1843 cm3, lobo direito com 1090 cm3, lobo esquerdo com 653 cm3, veia porta e vias biliares com anatomia normal. Arteriografia celíaca e mesentérica mostraram anatomia normal da artéria hepática.

O procedimento cirúrgico foi realizado com utilização de quatro trocartes: um de 12 mm em hipocôndrio esquerdo; um de 10mm supra-umbilical e dois de 5mm em epigástrio e em hipocôndrio direito. Inicialmente foi realizada dissecção cuidadosa do hilo hepático com isolamento da artéria hepática esquerda, ramo esquerdo da veia porta e ducto biliar esquerdo (Figuras 1 e 2). Os elementos contralaterais foram identificados, mas não dissecados. Foi identificada uma variação da anatomia da artéria hepática esquerda, caracterizada por ramo acessório de fino calibre, com origem na artéria hepática própria, o qual foi ligado. O ducto biliar esquerdo foi seccionado e seu coto distal suturado com fio de PDS 7-0. A seguir foi identificada a veia supra-hepática esquerda e realizada a secção do parênquima hepático 1 cm à direita do ligamento falciforme com auxílio do ligasure (Valley Lab). Ao final do procedimento foi realizada laparotomia subcostal direita com aproximadamente 15 cm de extensão, finalizando-se a secção dos 3 cm do parênquima hepático junto à veia supra-hepática esquerda, ligadura da artéria hepática, veia porta, veia supra-hepática esquerda e retirada do lobo hepático esquerdo da cavidade para perfusão com solução de preservação em mesa auxiliar (ex-vivo).



O tempo total da opeação foi de seis horas. O paciente recebeu alta no 5° do pós-operatório. No 12° retornou com dor abdominal e abaulamento na ferida operatória. Foi submetido à drenagem sob anestesia local com saída de secreção com aspecto biliar. Ultra-sonografia abdominal mostrou coleção localizada na área cruenta da secção hepática com aproximadamente 40 mL que foi drenada via percutânea. Houve diminuição progressiva da drenagem com retirada do dreno após cinco dias. Recebeu alta em bom estado geral e atualmente com sete meses de seguimento pós-operatório não apresenta complicações ou sequelas.

DISCUSSÃO

A realização de cirurgia hepática laparoscópica deve ser analisada sob três pontos de vista: a possibilidade técnica, a eficácia e a reprodutibilidade. Tecnicamente a operação é possível com auxílio da tecnologia atual. Alguns quesitos não utilizados na prática laparoscópica habitual são de grande auxílio se disponíveis: o ultra-som laparoscópico; o bisturi harmônico; grampeadores vasculares; cola de fibrina e "hand assistant".

Em um estudo com 89 casos de operações hepáticas laparoscópicas, a indicação do procedimento foi a ressecção de metástases de neoplasia de cólon em 46%; ressecção de doença benigna, como cisto hidático e hemangioma em 27%; carcinoma hepatocelular com cirrose associada em 9%; carcinoma hepatocelular sem cirrose associada em 9% e outras neoplasias em 9%1. Somente em 42% dos casos foram realizadas hepatectomias anatômicas, no restante operações hepáticas menores. Em 23% dos casos foi necessária conversão para via aberta, a morbidade e mortalidade foi de 4,5% e 1,1% respectivamente.

Não existem publicações de estudos prospectivos randomizados comparando operações hepáticas laparoscópicas com a via aberta. Estudos de caso controle demonstram taxas semelhantes de mortalidade, maior tempo cirúrgico e maior tempo de duração da manobra de Pringle na operação laparoscópica2.

Existem poucos relatos na literatura de ressecção hepática laparoscópica para doação de órgãos. Trata-se de procedimento tecnicamente mais complexo devido à impossibilidade de clampeamento vascular para evitar isquemia no lobo hepático a ser doado. Em um estudo, dois casos de ressecção laparoscópica do segmento lateral esquerdo para transplante hepático intervivos pediátrico foram realizados sem complicações3. Outro estudo com 16 ressecções laparoscópicas do segmento lateral esquerdo para transplante intervivos pediátrico mostrou igual morbidade e tempo de internação, maior tempo de operação e menor perda sanguínea em relação a 14 pacientes submetidos à ressecção por laparotomia4. Recentemente foi publicado artigo relatando a primeira hepatectomia direita para doador de transplante intervivos realizada por laparoscopia5.

A cirurgia hepática laparoscópica é tecnicamente factível, apresenta bons resultados e deve ser realizada somente em centros de excelência em cirurgia hepática e laparoscópica avançada.

REFERÊNCIAS

1. Vibert E, Perniceni T, Levard H, Denet C, Shahri NK, Gayet B. Laparoscopic liver resection. Br J Surg. 2006; 93(1):67-72.

2. Lesurtel M, Cherqui D, Laurent A, Tayar C, Fagniez PL. Laparoscopic versus open left lateral hepatic lobectomy: a case-control study. J Am Coll Surg. 2003; 196(2):236-42.

3. Cherqui D, Soubrane O, Husson E, Barshasz E, Vignaux O, Ghimouz M et al. Laparoscopic living donor hepatectomy for liver transplantation in children. Lancet. 2002; 359(9304):392-6.

4. Soubrane O, Cherqui D, Scatton O, Stenard F, Branchereau S, Martelli H, Gauthier F. Laparoscopic left sectionectomy in living donors: safety and reproducibility of the technique in a single center. Ann Surg. 2006; 244(5):815-820.

5. Koffron AJ, Kung R, Baker T, Fryer J, Clark L, Abecassis M. Laparoscopic-assisted right lobe donor hepatectomy. Am J Transplant. 2006; 6(10): 2522-5. Epub 2006 Aug 4.

Recebido em 03/05/2006

Aceito para publicação em 07/07/2006

Conflito de interesse: nenhum

Fonte de financiamento: nenhuma

Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia do Aparelho Digestivo do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná- Curitiba - PR- BR.

  • 1. Vibert E, Perniceni T, Levard H, Denet C, Shahri NK, Gayet B. Laparoscopic liver resection. Br J Surg. 2006; 93(1):67-72.
  • 2. Lesurtel M, Cherqui D, Laurent A, Tayar C, Fagniez PL. Laparoscopic versus open left lateral hepatic lobectomy: a case-control study. J Am Coll Surg. 2003; 196(2):236-42.
  • 3. Cherqui D, Soubrane O, Husson E, Barshasz E, Vignaux O, Ghimouz M et al. Laparoscopic living donor hepatectomy for liver transplantation in children. Lancet. 2002; 359(9304):392-6.
  • 4. Soubrane O, Cherqui D, Scatton O, Stenard F, Branchereau S, Martelli H, Gauthier F. Laparoscopic left sectionectomy in living donors: safety and reproducibility of the technique in a single center. Ann Surg. 2006; 244(5):815-820.
  • 5. Koffron AJ, Kung R, Baker T, Fryer J, Clark L, Abecassis M. Laparoscopic-assisted right lobe donor hepatectomy. Am J Transplant. 2006; 6(10): 2522-5. Epub 2006 Aug 4.
  • Endereço para correspondência:
    Júlio Coelho
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      05 Fev 2010
    • Data do Fascículo
      Dez 2009

    Histórico

    • Recebido
      03 Maio 2006
    • Aceito
      07 Jul 2006
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